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Entrevista

Em meio a crise com Samu, José Antonio Rodrigues diz que concorda com as reivindicações da categoria - 08/04/2013

Por Evilásio Júnior / Rodrigo Aguiar / Lucas Franco / Bárbara Affonso

Em meio a crise com Samu, José Antonio Rodrigues diz que concorda com as reivindicações da categoria - 08/04/2013
Foto: Tiago Melo/Bahia Notícias

Após a ameaça de greve de profissionais do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), na última semana, em Salvador, o secretário municipal da Saúde, José Antonio Rodrigues, conta ao Bahia Notícias que concorda com as reivindicações da categoria. “Tanto a Central de Regulação do Samu quanto as bases onde esses profissionais exercem suas atividades estão completamente comprometidas. Algumas delas eu chego a dizer que são insalubres”, opina o gestor, que identificou um erro na contratação dos médicos do Samu e estabeleceu prazos para a resolução dos problemas com os profissionais: junho para a adequação dos locais de trabalho e abril para o pagamento dos direitos dos terceirizados posteriormente convocados em concurso público. Profissionais de outras áreas médicas também foram citados pelo gestor, que deu prazo até meados do mês de abril para o estabelecimento de cronograma para chamar os aprovados. “São cerca de 600 profissionais que ainda estão nessa convocação”, informou. José Antonio Rodrigues criticou diversos pontos da gestão da pasta nos últimos oito anos, com destaque para a “desorganização administrativa dentro da secretaria”, o que considera um dos seus maiores problemas. Ele lembrou a dívida da pasta, de R$ 159 milhões, sendo R$ 50 milhões apenas com as entidades filantrópicas, ainda sem previsão para divulgar um cronograma de pagamento. “Existe uma expectativa de que, se o governo federal aumentar nosso teto orçamentário da média e da alta complexidade, a gente possa estabelecer um cronograma de pagamento”, estimou, segundo o que chamou de “solução bipartite”. Em relação aos rumores de favorecimento de clínicas particulares controladas por vereadores ou ex-vereadores de Salvador, o secretário se resumiu ao dizer que “essas coisas fazem parte de uma verdade”. “Eu sou apenas secretário municipal de Saúde, não perguntei quem eram os donos das clínicas. Não associo isso a nenhum movimento político”, comentou.

 
Bahia Notícias - Como estão as negociações com o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu)?
 
José Antonio Rodrigues - Já estamos conversando com os médicos do Samu há cerca de dois meses. Sobre as reivindicações em relação à infraestrutura, eles estão cobertos de razão. Tanto a Central de Regulação do Samu quanto as bases onde esses profissionais exercem suas atividades estão completamente comprometidas. Algumas delas eu chego a dizer que são insalubres. Em uma das nossas unidades, o local onde o médico faz sua alimentação é o mesmo em que ele dorme e onde há as instalações sanitárias. Só para vocês terem uma ideia de como estes profissionais têm comprometida a sua capacidade de trabalho. Nós estamos cuidando desse processo. Começamos a execução nesta segunda-feira (8) de obras na Central de Regulação do Samu e, em breve, teremos instalações mais adequadas. Temos, ainda, uma licitação em curso para readequação de todas as bases do Samu, para criar um ambiente de conforto para estes profissionais. A nossa expectativa é de que até o dia 30 de junho a gente não tenha mais pendências dessa natureza. Algumas bases vão ter que ser realocadas, outras serão praticamente construídas. Nosso interesse é de sanar este problema o mais rápido possível. No Samu, temos profissionais concursados e profissionais terceirizados. Alguns concursados também trabalham como prestadores de serviço, através de alguma pessoa jurídica ou de outro vínculo de contratação. Existe um erro original na contratação destes profissionais, porque não houve um concurso público especificamente para o Samu. Houve um concurso público para atividades de urgência da prefeitura, de uma maneira geral. Só que trabalhar no Samu é algo diferente. Os profissionais estão expostos a risco, com uma capacidade de alerta e treinamento específico. A inserção deles na rede foi feita juntamente com outros grupos de profissionais, que são tão importantes quanto, mas não são sujeitos às intempéries que eles são. A nossa ideia é manter a qualificação e buscar uma solução conjuntamente para resolver os problemas salariais. O problema mais gritante era com um grupo de profissionais terceirizados que passaram em concurso público e estavam ganhando menos que ganhavam antes, porque não estavam recebendo por insalubridade devido ao processo lento que, muitas vezes, a prefeitura tem para fazer a avaliação da insalubridade, individualmente, por funcionário. A ideia é que nesse mês de abril isso seja 100% resolvido e essas pessoas recebam o que têm direito, inclusive do retroativo.
 
BN - Para além do Samu, em outras áreas da Secretaria Municipal da Saúde há uma cobrança de profissionais em relação a concursos públicos nos quais eles foram aprovados, porque ainda não houve convocação.
 
JAR- Três mil e quatrocentas pessoas lograram êxito no concurso da Secretaria e cerca de 1,5 mil foram convocadas no segundo semestre do ano passado. Delas, cerca de 600 já compareceram ao serviço. Em algumas categorias, já foi chamado todo o quadro de aprovados, e só resta o quadro reserva. Grande parte desses profissionais, inclusive, acabou pedindo demissão por incompatibilidade de carga horária, por questões salariais ou porque logrou êxito em seleção para alguma residência médica, e imediatamente foram chamadas pessoas das colocações seguintes. Existem algumas atividades em que foram chamados todos os profissionais disponíveis e em outras o chamamento foi muito tímido. Outros 240 que já estavam aptos ao trabalho já estão se apresentando ao serviço e a nossa expectativa é que até meados de abril a gente estabeleça um cronograma para chamar o restante, que são cerca de 600 profissionais que ainda estão nessa convocação.
 
BN - O senhor disse, certa vez, que o ex-prefeito João Henrique Carneiro convocou mais gente que o necessário e que não tinha como convocar todo mundo.
 
JAR - É. Em algumas atividades, por exemplo, os enfermeiros. Quando existiam enfermeiros cujos contratos por meio do Reda [Regime Especial de Direito Administrativo] só venceriam no final deste ano. Chegamos a ter algumas situações no mês de janeiro de demitir funcionários do Reda, aptos, treinados e em serviço, porque tinham sido convocados outros profissionais exatamente para aquela função de forma desnecessária. Por exemplo, na UPA [Unidade de Pronto Atendimento] Adroaldo Albergaria, que fica em Periperi, existem postos para 51 enfermeiros. Encontramos o Eduardo Albergaria com 96 enfermeiros lotados. Tivemos que fazer uma ampla redistribuição desses profissionais na rede, para avaliarmos o que tínhamos de sobra de profissionais que precisavam ser lotados em locais com falta de pessoal. São esses 240 profissionais que agora são lotados na rede. Grande parte deles, na hora da convocação, pede mais 30 dias para se apresentar. Isso cria uma distorção dentro do nosso sistema. A saúde é uma coisa que a gente faz artesanalmente, a gente precisa das mãos do homem para poder fazer acontecer. Estamos às vésperas de uma campanha de vacinação, em um momento importante, porque conseguimos uma adesão significativa via Provab [Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica]. O próprio recadastramento da prefeitura realocou uma série de profissionais médicos e temos, muitas vezes, que dispensar um prestador de serviços para colocar um concursado no local, e é exatamente esse que pede mais 30 dias para se apresentar, deixando o posto descoberto. É preciso que a gente veja isso de uma forma racional para não prejudicar a assistência da população. Precisamos de pelo menos 90 após o recadastramento. A convocação está feita, as pessoas vão trabalhar. Mas, onde vão trabalhar? De que maneira? Precisamos definir isso, para que as pessoas não fiquem nesse ping-pong, tendo que se deslocar de posto de saúde. Fatalmente isso vai acontecer em alguns momentos, mas vamos fazer um esforço para evitar.

 
BN - Então não houve planejamento?
 
JAR - Não houve. Na verdade, o chamamento foi feito de uma forma desordenada. Muitas pessoas foram convocadas para postos em que existiam prestadores de serviços, e esses prestadores de serviço não foram desligados. Isso resulta em algumas situações de ter chegado ao final do ano, ter dado posse a um número significativo de pessoas e provavelmente faltou dinheiro. Tanto que tinha uma folha de pagamento de 1,5 mil pessoas que não receberam pelo mês de dezembro porque um número de concursados entrou na folha e isso gerou dificuldade de honrar o pagamento. Isso, nós regularizamos no mês de março. Aliás, a desorganização administrativa dentro da secretaria é um fato e talvez seja um dos meus maiores problemas. Nós tivemos um período de oito anos com oito, sete, nove secretários municipais da Saúde. Ninguém sabe ao certo o número de secretários que tomaram posse. Essa descontinuidade da administração, muitas vezes, causa esse tipo de transtorno que estamos vivendo.
 
BN - Qual é a dívida da prefeitura com as entidades filantrópicas? Já existe um cronograma de pagamento do valor devido?
 
JAR - Não temos cronograma de pagamento previsto e a dívida inteira da secretaria gira em torno de R$ 159 milhões. Portanto, dos R$ 500 milhões da dívida de curto prazo da prefeitura, a secretaria de Saúde é a que tem mais pendências. Existia um processo de execução orçamentária totalmente irregular na pasta. Por exemplo, você tinha um contrato de 12 meses e ele não era lançado dentro dos 12 meses. Se só tivesse dinheiro pra lançar esse contrato em três meses, só era lançado em três meses, mas era executado um contrato de 12 meses. Então, muitas vezes a vítima do processo fornecedor-prestador de serviço recebia ao longo de três meses e no quarto mês já começava a atrasar, com a desculpa de que não tinha orçamento. Essa desorganização administrativa refletia na questão orçamentária e a gente acaba sendo vitima disso. Ao longo de 2013 estamos trabalhando com um orçamento insuficiente. Talvez Salvador tenha sido a única capital brasileira cujo orçamento previsto diminuiu do ano de 2012 para o ano de 2013. Porém, nós temos feito um esforço. Talvez vocês não tenham ouvido falar de atrasos referentes a este ano. Nós temos conseguido honrar os pagamentos de 2013 mês a mês. Nosso grande problema é o que a gente herda de dívida e estamos fazendo um forte movimento no sentido de renegociar os contratos. Os empresários e os profissionais que trabalham com a Saúde começaram a ficar mais sensíveis a esse problema, têm flexibilizado. As filantrópicas vivem um momento muito difícil. A remuneração que é feita ao SUS [Sistema Único de Saúde] de forma geral, para filantrópicas e privados, é muito ruim. Os valores muitas vezes chegam a ser insignificantes. A filantrópica não tem a oportunidade de escolher aquilo que vai atender, ela atende o que a regulação encaminha. O paciente, ao chegar ali, não tem mais para onde ir, é ali que ele vai ter que ser atendido. Eu queria destacar aqui hospitais que atendem 100% o SUS, como o Martagão Gesteira, o Hospital Aristides Maltez ou mesmo hospitais que trabalham com serviços de alta complexidade, como o Santa Izabel e o São Rafael. São hospitais importantes. A pessoa chega ali e tem, definitivamente, um problema resolvido. Essa luta é uma luta nacional. Salvador vive uma situação ainda pior, porque, além de nós termos essa condicionante do SUS, que foge aos nossos limites de solução, a gente vive a realidade de atrasos nos pagamentos. Temos atrasos com as filantrópicas desde o mês de agosto do ano passado. A ideia do prefeito é efetivar esse pagamento e existe uma expectativa de que, se o governo federal aumentar nosso teto orçamentário da média e da alta complexidade, a gente possa estabelecer um cronograma de pagamento. Mas essa solução vai ter que ser bipartite, entre o governo municipal e o governo federal. Eles estão cientes do problema, outros municípios também pleiteiam esse aumento. O prefeito esteve, no final do mês de fevereiro, com o ministro da Saúde, que se mostrou preocupado com a situação. O ministro pediu que nós fizéssemos um consenso interno, porque às vezes isso mexe também com recursos de outros municípios. Uma parte de um valor maior, para serviços de oncologia, já está pactuada entre nós e o governo do Estado e já foi levada ao Ministério da Saúde, e a outra parte, de valor menor, estamos procurando uma solução e estamos procurando a causa para esse sub-financiamento para fazer a solicitação da adição de novos recursos. Tenho a impressão de que, até o final do mês de abril, a proposta definitiva do governo estadual e do consenso entre os diversos municípios da Bahia estará pronta para o julgamento do ministro.
 
BN - Havia uma expectativa muito grande para esta gestão. Havia muita reclamação da gestão anterior por conta do não cumprimento de convênios com as entidades filantrópicas, e o senhor veio desse seguimento. Como foi encontrar uma realidade em que os pagamentos para as filantrópicas acumulam uma dívida de R$ 50 milhões?
 
JAR - Esse é um valor muito significativo. O valor total de folha de pagamento é de menos de R$ 400 milhões da prefeitura por ano, o nosso orçamento é de R$ 920 milhões. Então, estamos falando em algo superior a 5% do orçamento total da Saúde do Município.

 
BN - As clínicas que prestam serviço estão quitadas. Houve um erro de prioridade? É verdade que há clínicas controladas por vereadores ou ex-vereadores?
 
JAR - Essas coisas não são verdades absolutas, elas fazem parte de uma verdade. Nem todas as filantrópicas estão atrasadas desde agosto. Santa Izabel, São Rafael e Sagrada Família têm valores atrasados referentes a agosto, setembro e outubro. O Aristides Maltez e o Martagão Gesteira tinham atrasos de novembro e dezembro, que não eram considerados atrasos pela gestão passada porque eles entendiam que o pagamento era feito após 60 dias da entrega da fatura. As clínicas estavam na situação dessas duas últimas filantrópicas, mas não deixavam de ter uma prioridade. Elas recebiam o pagamento de forma antecipada pela seguinte situação – é uma situação esdrúxula, mas é verdadeira: quem tinha contrato, precisava que ele fosse avaliado. Então, as filantrópicas e uma parte das clínicas privadas, as clínicas de imagem, tinham contrato. Elas precisavam de um tempo para a administração avaliar e fazer a execução do pagamento desses contratos. As outras, que não tinham nenhum tipo de contrato, simplesmente apresentavam um CD com o faturamento, recebiam o valor global dessa apresentação sem uma prévia avaliação do sistema. Ou seja: quem era controlado, tinha um serviço de regulação e tinha um contrato formalmente estabelecido no Ministério da Saúde ficava por último na fila do pagamento. Por que isso acontecia? As clínicas privadas, no início de 2012, fizeram um movimento de greve e conseguiram um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Nele, de uma forma distorcida, se entendia que elas tinham prioridade na remuneração. Então, isso foi estabelecido. Junto a essas clínicas, existiam outras instituições associadas que acabavam recebendo de forma antecipada. Não é bem a associação diretamente com os vereadores, em algum momento isso foi conseguido por uma negociação entre a prefeitura, as clínicas e o Ministério Público. O que me parece é que esse TAC foi distorcido de forma que se passou a ter esse entendimento e isso se acabou se transformando, dentro do caos que lá existia, em uma prioridade. A partir de janeiro, eu procurei acabar com isso e fazer com que todas as pessoas que fossem atendidas tivessem autorização prévia. Nós temos um sistema chamado Sistema Vida, que não é o ideal, funciona muito lentamente, mas é o único sistema de controle que a gente pode ter das pessoas encaminhadas. Eu acho que isso foi positivo, porque nós estamos pagando. Pagamos o referente a janeiro em fevereiro, o referente a fevereiro em março... Nós estamos amarrados ao Sistema Vida. Ninguém pode simplesmente se apresentar em uma clínica para fazer uma série de exames sem estar autorizado por alguém que tenha fé pública ou que reconheça que aquele serviço foi efetivamente realizado e corretamente executado. São controles que nos permitem manter uma transparência de forma responsável, para que a gente não tenha uma industrialização desse processo de marcação, que fique na mão de A, B ou C. Temos hoje 132 pontos de marcação de exames e consulta e ela pode ser realizada ao longo do mês. Ainda há uma cultura das pessoas procurarem sempre marcar nos primeiros dias do mês e sempre no horário da manhã, geralmente quando recebem dinheiro e vão ao banco, se programam para o resto do mês e vão marcar os exames. Mas a ideia é de expansão da rede pra oferecer mais pontos de marcação e facilitar o acesso. Estamos conseguindo fazer muito mais exames especializados e consultas especializadas, agora, com esse sistema. Antigamente eram feitos em torno de 320 mil e agora chegamos a 700 mil exames e consultas especializados, com este sistema, que funciona lentamente. A região suburbana não tem uma boa interatividade da internet, as pessoas às vezes têm que voltar no dia seguinte, ou é necessário anotar o nome do paciente, para quando conseguir... Apesar de ter um funcionamento um pouco tosco, nós estamos trabalhando para que isso seja melhorado. Agora, no mês de abril, isso já melhorou em relação ao que tivemos no mês de janeiro. Nossa ideia é que o Sistema Vida seja valorizado, conquiste credibilidade com a população e a gente possa expandir esse serviço. É ter o paciente na área certa, no lugar certo, mas sob o controle da saúde pública.
 
BN - Houve o rompimento de algum convênio com clínicas de vereadores ou ex-vereadores? Gilberto José (PDT), Sandoval Guimarães (PMDB) e Carlos Muniz (PTN), por exemplo, que teriam clínicas ou indicado clínicas conveniadas à prefeitura...
 
JAR - Em fevereiro, fizemos um forte descredenciamento publicado no Diário Oficial de várias clínicas inabilitadas no nosso processo licitatório. Agora, no mês de abril, teremos outras clínicas desligadas. Eu sou apenas secretário municipal de Saúde, não perguntei quem eram os donos das clínicas, não associo isso a nenhum movimento político. Procurei trabalhar tecnicamente e o prefeito tem me apoiado nesse sentido. Existem algumas clínicas que tinham identidade com a população, mas não apresentaram documentos pertinentes para licitação e foram afastadas do serviço público. Há outras clínicas que estão sendo convocadas em chamamento público e temos que respeitar isso e cumprir o decreto do prefeito de que, até o dia 30 de abril, teremos 100% da rede contratada. Talvez alguns serviços especiais sejam conveniados ou tenham algum tipo de especificidade, mas a ideia é que daqui pra frente não exista mais esse processo de credenciamento, com a possibilidade de credenciar ou mexer nos valores por motivação política. Até para que a gente consiga credibilidade do Ministério da Saúde e dos órgãos de controle para ampliar o teto, chegou a hora de fazer. Não temos tido problemas políticos, pelo menos até agora, na contratação desses serviços. Tivemos um movimento, que foi a redução do número de serviços de laboratórios de análises clínicas, porque temos um laboratório central que tem condição, com recursos humanos e equipamentos, de produzir três vezes mais do que produzimos hoje. Então, reduzimos da iniciativa privada esse quantitativo que me parecia abusivo, demasiado, de serviços de análises clínicas e passamos a realizá-los, em 35 pontos de coleta, inclusive com motoboys ao longo da manhã. Nosso laboratório central já está funcionando 24h e distribuindo os exames. Estamos chegando, aos poucos, ao dobro dos serviços que prestávamos até dezembro do ano passado. A principal missão do nosso primeiro ano na secretaria é recuperar a capacidade instalada. Até junto quero reequipar e ter 70% dos postos de saúde em obras de recuperação física, para que até o final do ano a gente possa ter outra oferta de serviços públicos de saúde na capital.
 
BN - Coordenadoras dos cursos de medicina das faculdades Baiana e FTC disseram, em entrevista ao Bahia Notícias, que o mercado em Salvador está saturado.
 
JAR - Acho que faltam médicos, sim. Uma prova disso é o Provab. Em um primeiro momento, nossa ideia era abrir apenas 30 vagas. Eu, já imaginando o que poderia acontecer, solicitei que abríssemos o maior número de vagas possível. Negociamos com o Ministério da Saúde e abrimos 112 vagas. O profissional médico recém-formado ganharia R$ 8 mil para trabalhar de segunda a quinta-feira, permitindo ainda, caso não conflite com o horário de trabalho dele, outra contratação. No nosso caso, dois plantões de 12h de urgência e emergência, a cada 15 dias, que daria um valor médio de remuneração de R$ 10 mil a R$ 12 mil de remuneração para um recém-formado. Tivemos uma adesão de 112 profissionais, 96 compareceram ao primeiro chamamento, 75 tomaram posse e hoje só temos 71 trabalhando. Não me parece que a gente tenha mercado saturado, em hipótese alguma. Em algumas especialidades a gente pode ter um excesso de profissionais, mas acho que ainda temos uma oferta de serviços muito maior que a quantidade de médicos para atender nessas unidades. Eu temo, inclusive, a acreditar que nessa expansão dos serviços básicos a gente não encontre o número de profissionais ideal para trabalhar conosco. Existe também outra situação, que envolve uma série de características muito próprias da remuneração médica, é o fato do médico ter múltiplos vínculos. Por exemplo, os profissionais que passaram no concurso do Samu e foram lotados em alguma região do subúrbio e também trabalham em um hospital no centro da cidade não conseguem compatibilizar as jornadas de trabalho. Não é só uma questão salarial. Os médicos que lograram êxito no concurso do Programa Saúde da Família que recebem como salário inicial um valor de R$ 10 mil e de R$ 12 mil no final da carreira, assegurados para sempre, é um plano de cargos e salários muito razoável. Cerca de 50% dos aprovados pediu demissão logo nos primeiros dias de trabalho. Quando a gente vai para o mundo real, efetivo, acho que não sobra médico e falta vaga. Mas se você faz aquela continha da Organização Mundial da Saúde, de tantos médicos para mil habitantes, aí a conta bate.

 
BN - Como o senhor enxerga o mercado da capital e de que forma os novos cursos de medicina que estão surgindo devem influenciá-lo?
 
JAR - O país como um todo tem um déficit de profissionais médicos. É muito bem vinda a criação de mais faculdades de medicina. O Ministério da Educação conseguiu estabelecer regras não só para a instalação de novas faculdades de medicina, estipulando um número máximo de alunos por sala de aula, como o processo de validação de hospitais de ensino, isso criou um escopo maior. Antes de ser secretário, fui vice-presidente da Associação Brasileira dos Hospitais Universitários de Ensino e acompanhei a dificuldade que muitos hospitais tinham para conseguir a classificação exigida. Eu vejo isso de forma positiva, desde que haja rigor dessas universidades.
 
BN - Salvador é a única capital do país que não tem um hospital próprio. Há um planejamento de quando a cidade terá condições de abrigar um hospital?
 
JAR - Precisamos ter mais serviços voltados à área de obstetrícia e na área norte da cidade, como Cajazeiras, Pau da Lima, Itapuã, que são áreas rarefeitas em oferta de serviços hospitalares. Seria precipitado de minha parte dizer que já tem solução. Se eu estou discutindo aqui recursos para poder honrar os pagamentos do ano de 2013, seria falacioso discutir a possibilidade de instalar um hospital em curto prazo. Mas a médio e longo prazos, cabe. Estou colocando isso no nosso planejamento estratégico, ter um hospital público municipal. Brevemente, a atual gestão vai dobrar o número de pontos de urgência e emergência associados ao Samu. Nós vamos ter efetivamente uma rede acomodada, com referência também para a rede estadual, que tem um papel preponderante na capital. Não tenho dúvida que ficaremos com um número de pessoas em observação, nessas unidades, aguardando leito em uma unidade hospitalar. Até pra gente poder desenhar essa rede de uma forma mais resolutiva, devemos, sim, ter um hospital geral municipal com atividades clínicas e de trauma.
 
BN - O senhor acredita que, de alguma forma, a política ainda influencia na relação entre o governo federal e o municipal no repasse de verbas ou aumento de teto?
 
JAR - Essa suposição de que os partidos, ao divergirem, de que os partidos ao divergirem, a coisa chegue a esse nível de subfinanciamento, eu discordo um pouco. Mas não existem, na administração pública, soluções apenas técnicas. Às vezes as soluções também são políticas, independente de ser do mesmo partido. Como secretário, vivi uma situação assim com o governo federal do PT. Eu era secretário ligado a um governo do PFL e tivemos muito boas soluções em determinados momentos para as nossas demandas técnicas. Foi até bom lembrar que foi o governo estadual de uma gestão do PFL que viabilizou a gestão plena de Salvador quando eu era secretário e o secretário municipal era do PT, e não deixou de haver consenso. A gente conseguiu trazer essa solução que era importante para a cidade naquele momento.
 
BN - Um dos itens que fizeram o ex-prefeito João Henrique ter as contas rejeitadas em 2009 e 2010 foi não ter atingido índice constitucional de 15% do orçamento para a Saúde. Como está a situação? Foi atingida a média em 2012? Como está a previsão para 2013?
 
JAR - Não sei o que vai ser divulgado sobre 2012, não tive acesso. As contas foram apresentadas ao Tribunal de Contas. O indicador apresentado me parece que era um percentual de 15,6% ou 15,9%, acima da emenda constitucional, o que eu critico da gestão passada. Será que o que dá qualidade é atingir 15,9% ou 14,5%? Eu acho que não. É a qualidade do gasto. De 2010 para 2011, talvez até por conta do controle externo ter batido tanto do não cumprimento do percentual mínimo, houve um volume substancial de recursos a mais disponível para a secretaria de saúde. Esse volume, talvez por falta de planejamento, foi todo concentrado na folha de pagamento. Apesar do recurso significativo, não foi colocado recurso quase nenhum em reforma das unidades de saúde, que estão sem manutenção há quase cinco anos. Mas quero dizer que em 2013 já estamos gastando muito acima dos 15% preconizados. Não tem nos faltado recursos da fonte do tesouro municipal para nossas ações e das nossas atividades de saúde.