Inspirada em Elke e oráculos, Paula Lice conduz entrevistas ‘performágicas’ no Gamboa Nova
Por Jamile Amine
Inspirada no universo de Elke Maravilha e na futurologia, a atriz baiana Paula Lice encarna uma “persona” complexa em sua nova montagem, “Santa Maravilha Recebe”, uma mistura de programa de auditório e espetáculo teatral, que estreia nesta sexta-feira (4) e segue em cartaz até o dia 26 de maio, no Teatro Gamboa Nova. “A dramaturgia do espetáculo está calcada em um oráculo que eu criei. Eu passei muito tempo estudando tipos diferentes de oráculos e tarot, e decidi criar um pequeno oráculo de crianças imaginadas a partir de figuras literárias”, conta a artista, elencando nomes como Emília, de Monteiro Lobato, e Poliana, de Eleanor H. Porter. “São figuras que eu criei e representam ideias que estão ligadas a personagens literários da minha infância. Elke encabeça o oráculo como sendo a figura do Louco, que no tarot de Marselha, o mais tradicional, é uma figura que flutua entre as cartas, entre as temporalidades. E Elke eu considero a criança mor nesse caso”, explica Paula Lice. É a partir do cruzamento dos arquétipos da futurologia com as figuras dos livros que a atriz conduz o espetáculo. A cada sessão ela recebe um convidado diferente, para quem joga as cartas e faz suas entrevistas “performágicas”, como ela classifica. “Eu vou receber um convidado e a primeira coisa que a gente faz é abrir o jogo. A partir de quatro cartas que são tiradas, eu conduzo quatro blocos de perguntas sobre a pessoa, profissional, pessoal, só que a partir desse oráculo. E no final eu faço uma leitura do que saiu”, conta.

Paula Lice criou uma espécie de oráculo relacionando figuras literárias relacionadas a arquétipos da futurologia | Foto: Paulo Victor Nadal / Bahia Notícias
O formato é inusitado, mas a personagem já existia. Originalmente ela foi criada em 2017, para integrar o projeto “ENTRE: Objetos para vestir, diálogos sensíveis”, no qual os artistas participantes deveriam criar uma dramaturgia a partir de um figurino apresentado pelo designer de moda Alexandre Guimarães. Logo de cara, ao receber seu vestido, Paula Lice sabia que deveria encarnar uma figura inspirada em Elke Maravilha. “Revisitei um texto que escrevi quando da morte de Elke, que me levou diretamente para 'Alice no País das Maravilhas'. Reli o livro, revi entrevistas com Elke e fui pensando em como tornar meu corpo presente através dos recursos possíveis para a instalação. Na minha leitura, Alice se amplia do livro ao meu nome, passando por minha avó paterna, alinhavando memória, auto-ficção, documento, humor, poesia e muita água maravilha”, conta Paula Lice, para quem Elke é uma grande referência. “Quando eu era pequena, eu achava Elke uma mulher super impressionante. Ela já era uma mulher montada antes de isso ser assunto. A gente sabia que existia já a arte do transformismo e tudo mais, mas ela se identificava, e isso ainda não era uma questão, um debate, uma polêmica. Então, pra mim, ver que podia existir uma mulher tão iluminada, tão imensa e tranquila com isso foi uma coisa muito impressionante, eu era muito fã”, lembra a atriz, que depois de adulta, quando se aprofundou no universo de Elke, passou a admirá-la ainda mais. “Vendo entrevistas, conhecendo mais um pouquinho sobre ela, vi que ela realmente tem uma visão de mundo muito impressionante, para além da montação. Ela era uma figura muito simples, muito humilde, e ao mesmo tempo inteligentíssima, articulada, ligada às pessoas”, avalia Paula Lice.
A atriz lembrou ainda que Elke Maravilha teve um programa de entrevistas, na década de 1980, que serviu de inspiração para a peça. “Então [Elke] é uma persona que realiza o meu sonho de ser apresentadora de programa de auditório, digamos assim (risos)”, brinca. "Eu trago alguns recadinhos de Elke durante o espetáculo, trago referências diretas ao programa, músicas... O tempo inteiro, como simula um programa de auditório, tem muita referência de programa da década de 1980, mas com um tratamento dado por Heitor Dantas, que é o diretor musical. Tudo cita, mas ao mesmo tempo não é exatamente a coisa em si”, explica. E apesar da estrutura da montagem ter como base a sorte lançada nas cartas e a improvisação, o fato de ser uma simulação de programa de TV auxilia na estruturação. “Está tudo cronometrado como um programa. A gente está pensando em 1h de duração, então a gente tem quatro blocos, tem intervalos programados, tem tudo bem esquematizado por trilha, inclusive. Para eu não me perder no tempo, a gente vai ter uma buzina do Chacrinha (risos)”, revela Paula Lice, que pensando em todas as nuances da diversidade, escalou um time eclético de entrevistados, como o cineasta Henrique Dantas; o palhaço Alê Casali; a drag queen Valérie O’hara; a apresentadora Renata Menezes; a cantora Manuela Rodrigues; a diretora teatral Onisajé; a poetisa Kátia Borges e o dançarino Edu Oliveira.
O programa de Elke Maravilha inspirou o formato da peça:
Além das surpresas já implícitas pelo fato de cada sessão “performágica” ter cartas e convidados diferentes, o público poderá conferir ainda mais uma proposta inusitada. “Eu pedi que cada entrevistado pesasse num presente que pudesse oferecer ao vivo para a plateia. Então, quem é palhaço, provavelmente vai pensar em um número, quem é musico deve pensar em alguma canção. Tem Valérie O'hara, que é uma drag, e provavelmente vai fazer um número. E aí oscila, o que cada um vai trazer eu não sei”, conta a atriz.
SERVIÇO
O QUÊ: Santa Maravilha Recebe
QUANDO: Sextas e sábados de maio
- Dia 04/05 - Henrique Dantas
- Dia 05/05 - Alê Casali
- Dia 11/05 - Valérie O'hara
- Dia 12/05 - Renata Menezes
- Dia 18/05 - Manuela Rodrigues
- Dia 19/05 - Onisajé
- Dia 25/05 - Kátia Borges
- Dia 26/05 - Edu Oliveira
ONDE: Teatro Gamboa Nova – Salvador (BA)
VALOR: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia)
