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Salvador precisa de mais verde?

Por Georges Humbert

Salvador precisa de mais verde?
Foto: André Carvalho / Bahia Notícias

Atualmente, artistas, influencers, autoproclamados especialistas em sustentabilidade, políticos, juristas e diversos formadores de opinião tem pautado que Salvador é uma cidade cinza e precisa priorizar o verde. Segundo a ciência, os dados, a realidade e o direito, isto é uma verdade, ou um misto de negacionismo e fake-news?

 

O ápice da louvável campanha por mais verde na primeira capital do Brasil foi a declaração do IBGE, de que faltam árvores por cá, bem como a venda de terrenos públicos. Contudo, são premissas falsas para falar em crise ambiental e ecológica na terra de Daniela Mercury, Gil, Caetano e Milton Santos – cientista e professor sério, que tanta falta faz nos dias atuais. É que, o dado do IBGE se limita a contar árvores em calçadas, excluindo o verdes de áreas privadas, morros, canteiros e unidades de conservação, estas últimas, com verdadeira função ecológica, bem como chama de área verde terrenos antropizados, sem função ecológica (talvez apenas estética ou de impacto social de vizinhança).

 

Ao contrário do que difunde o senso comum, cientificamente Salvador desponta como uma das capitais mais verdes do Brasil. De acordo com levantamento da rede MapBiomas, 26,2% do território da cidade é coberto por vegetação — o equivalente a mais de 5,5 mil hectares. Esse índice coloca a capital baiana à frente de metrópoles densamente urbanizadas como São Paulo e Rio de Janeiro e demonstra um patrimônio ambiental que precisa ser compreendido, valorizado e ampliado. Em números absolutos, Salvador se consolida como a segunda capital brasileira com maior proporção de vegetação urbana, atrás apenas de Brasília, segundo a classificação de 2024 do MapBiomas. Isso reforça o papel da capital baiana como um dos poucos grandes centros do país que ainda conseguem equilibrar densidade urbana e biodiversidade tropical.

 

Quando comparada às grandes cidades brasileiras, Salvador está entre as líderes em cobertura vegetal. São Paulo, por exemplo, possui cerca de 16% de cobertura verde, apesar de concentrar o maior parque urbano da América Latina — o Parque Estadual da Cantareira. O Rio de Janeiro apresenta 23% de vegetação urbana, fortemente influenciada pela Floresta da Tijuca e áreas de conservação como o Parque Estadual da Pedra Branca. Brasília, projetada com amplos eixos arborizados, chega a 28% de áreas verdes, enquanto Curitiba, referência em planejamento urbano, mantém 22% de cobertura vegetal. Belo Horizonte registra cerca de 18%, e cidades nordestinas como Recife e Fortaleza ficam abaixo dos 20%.

 

E Salvador, de alta densidade demográfica, deve, numa análise séria sobre o tema, se comparar a outras metrópoles mundiais com mais de três milhões de habitantes — como Nova York, Londres, Tóquio, Xangai e Cidade do México. A resposta revela um panorama interessante. Nova York registra cerca de 23% de cobertura arbórea, Tóquio possui apenas 7% de copa vegetal em seus bairros centrais e Londres chega a 47% de áreas verdes, embora boa parte seja de acesso restrito. Xangai, por sua vez, oscila entre 11% e 40%, dependendo dos critérios de medição, e a Cidade do México mantém 20% a 28%. Nesse contexto, Salvador se destaca positivamente: o índice de 26,2% coloca a capital baiana à frente de Tóquio, Nova York e Cidade do México, e em patamar semelhante ao de metrópoles europeias de alta densidade. A diferença é que, em Salvador, boa parte dessa vegetação está em áreas naturais preservadas — como a APA do Abaeté, o Parque Metropolitano de Pituaçu e a APA Bacia do Cobre / São Bartolomeu —, enquanto nas cidades estrangeiras o verde urbano é predominantemente planejado e distribuído em parques e bulevares.

 

O maior desafio de Salvador, entretanto, não está no meio ambiente, mas nas urgências sociais que comprometem a qualidade de vida da população. Desemprego elevado, moradias em áreas de risco, déficit habitacional, saneamento precário e altos índices de violência urbana são obstáculos que limitam o potencial da capital baiana e dificultam a construção de uma cidade verdadeiramente sustentável. A sustentabilidade, afinal, não se mede apenas pela quantidade de árvores, mas pela capacidade de oferecer dignidade, segurança e oportunidades a todos os seus habitantes.

 

Salvador, que combina Mata Atlântica, áreas costeiras, manguezais e parques urbanos de grande relevância, tem potencial para se tornar referência latino-americana em sustentabilidade urbana. Para isso, é preciso que o planejamento ambiental caminhe junto com políticas públicas voltadas para emprego, habitação, infraestrutura e segurança. Somente assim será possível traduzir seu patrimônio natural em desenvolvimento humano e prosperidade compartilhada.

 

Mais do que um número, o verde de Salvador precisa ser visto como um ativo estratégico — um indicador de qualidade de vida, saúde pública e resiliência climática. Em um mundo cada vez mais urbano e quente, as cidades que preservam e distribuem bem suas áreas verdes não apenas respiram melhor — elas garantem o futuro. Contudo, para ser mais sustentável, de acordo com a verdade cientifica, jurídica, de dados e estatísticas, o que a terra do axé clama, com urgência, é por mais investimentos econômicos e sociais. O resto é ideologia, proselitismo, negacionismo fakenews ou desconhecimento.

 

*Georges Humbert é advogado, professor e autor de mais de quarenta livros, é presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Sustentabilidade, da Comissão de Direito, Desenvolvimento Econômico e Sustentabilidade da OAB/BA, Vice-presidente de Sustentabilidade da Associação Comercial da Bahia e membro do Conselho de Meio Ambiente do Município de Salvador

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias