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A banalização da sustentabilidade

Por Georges Louis Hage Humbert, Enio Fonseca e Decio Michellis Jr. 

A banalização da sustentabilidade
Foto: André Carvalho / Bahia Notícias

A banalização da sustentabilidade refere-se à prática de empresas e indivíduos usarem o termo "sustentável" de forma ostensiva, inadequada e superficial, com o objetivo de melhorar a imagem pública sem implementar mudanças reais que considerem os aspectos sociais, ambientais e econômicos. A falta de informações concretas, a escolha de um aspecto isolado de uma atividade (como a reciclagem), ou o marketing verde, que disfarça práticas que afetam negativamente as questões socioambientais sob a “defesa” da sustentabilidade.

 

A sustentabilidade não rara é apresentada como algo restrito a ações pontuais, como reciclagem, sem abordar suas dimensões mais complexas e globais. De quebra, muitas Empresas utilizam a palavra "sustentável" ostensivamente para atrair consumidores, mas as iniciativas são superficiais e não representam necessariamente uma condição duradoura e multidimensional de sustentabilidade (Greenwashing – uma demão de verde).

 

A ausência de dados ou métricas (falta de transparência), que comprovem de forma mensurável, reportável e verificável a sustentabilidade de produtos ou serviços, induz à percepção de que a iniciativa é suficiente. Isto raramente se deve ao desconhecimento sobre o que realmente significa sustentabilidade, mas uma intenção deliberada de enganar o consumidor. Estão cada vez mais desconfiados das iniciativas “sustentáveis”.

 

O termo perdeu seu significado original e a importância de sua legitimação como um valor fundamental para o futuro. 

 

A “pizza saver”, aquela mesinha de plástico dentro da caixa com pizza, é uma das novas vítimas da banalização da sustentabilidade. Quando a pizza sai do forno, o queijo está derretido e suscetível a deslocamentos. Movimentos no manejo e transporte, bem como empilhamentos podem fazer que a tampa encoste na cobertura da pizza. Este pequeno acessório cria uma folga vertical, impede a aderência da tampa da caixa com a cobertura da pizza, reduzindo perdas, reclamações e até mesmo retrabalho nas operações de entrega. Porém esta solução simples e “sensacional” não é considerada sustentável, por ser feita de plástico. Ela é barata, leve, impermeável e resistente ao calor, mas não é biodegradável. Seu descarte pode ampliar a poluição por plásticos nas cidades, nos aterros sanitários e no meio ambiente.

 

Como resposta a este desafio estão surgindo versões comestíveis, de fibras vegetais de bambu ou cana-de-açúcar e papelão com papel reciclado ou reciclável.

 

Mas fica a questão: e a cadeia produtiva da pizza é sustentável? Ela abrange todas as etapas, desde a obtenção das matérias-primas (como trigo, tomates, queijo, carnes e vegetais) até a distribuição e venda do produto final. Inclui a agricultura e o agronegócio para ingredientes, a fabricação de insumos, o preparo da massa, a montagem com recheios, o cozimento, o congelamento (para versões industrializadas), a embalagem e a logística de entrega ao consumidor final, seja em uma pizzaria ou no varejo. E o óbice à sustentabilidade é o “pizza saver”?

 

Há iniciativas como puro marketing: são exemplos como a campanha “Segunda sem carne”, entre outras, sem resultados, sem sustentabilidade e que podem prejudicar marcas sem equilíbrio entre os pilares social, econômico e ambiental. 

 

Da mesma forma, a “guerra contra plásticos, canudos e produtos testados em animais” gera imagem positiva e lucros, mas pouco resultado concreto, pois plásticos são recicláveis se descartados corretamente, e produtos testados em animais (como medicamentos e vacinas) são essenciais para salvar vidas.

 

A banalização pode levar à conclusão de que as práticas atuais são suficientes, desencorajando a busca por melhorias e inovações mais profundas, complexas, relevantes como a perda de biodiversidade e os desafios sociais. A tendência humana é aceitar reflexivamente qualquer coisa que esteja de acordo com suas crenças preexistentes e ignorar ou distorcer tudo o que as desafia.

 

Para evitar a banalização da sustentabilidade, é fundamental um esforço conjunto para promover a transparência, a educação sobre os princípios da sustentabilidade e o desenvolvimento de políticas de governança e fiscalização. Precisamos avançar na sustentabilidade com ações prudentes e estratégias que sejam tecnicamente viáveis, economicamente acessíveis e socialmente aprimoradas (especialmente no mundo em desenvolvimento em que nos encontramos).

 

Considere o falso paradigma da sustentabilidade: “Se é bom, barato e funciona não é sustentável. A coisa não pode ser tão simples assim. Enquanto alguém não estiver sofrendo, se sacrificando ou perdendo não estará fazendo um bem para o meio ambiente.” (Cecilia M. Michellis)

 

O que nós somos nos controla, e ecoa tão alto, que as partes interessadas (stakeholders) não conseguem ouvir o que nós dizemos ao contrário. Para o aprimoramento das práticas empresariais e das políticas públicas, o silêncio dos benefícios irrelevantes e inoportunos de nossas práticas de “greenwashing” – uma demão de verde, e de “socialwashing” – a tradicional filantropia empresarial travestida de responsabilidade social é, às vezes, mais eloquente que os discursos.

 

O ESG, antes destas letrinhas mágicas (sigla em inglês para Ambiental, Social e Governança - Environmental, Social and Governance, um conjunto de critérios usados para avaliar o desempenho de uma empresa ou investimento em relação à sua responsabilidade e sustentabilidade), tem raízes históricas desde a década de 1970, é uma prática séria e relevante, mas não pode ser manipulada por “oportunismo, especialistas de ocasião, mero marketing, pela tal lacração ou temor do nefasto cancelamento”. Isso leva a uma banalização que desvirtua o conceito, transformando-o em ferramenta superficial em vez de estratégia integrada.

 

A sustentabilidade e o ESG precisam de profundidade para evitar a trivialização, alinhando-se a debates maiores sobre greenwashing e responsabilidade corporativa.

 

O que verdadeiramente importa para a sustentabilidade são os benefícios SMART (specific, measurable, achievable, relevant and time-bound) - específico, mensurável, atingível, relevante e oportuno). Os resultados devem ser MRV – Mensuráveis, Reportáveis e Verificáveis!


*Georges Louis Hage Humbert é advogado e professor, com Pós-doutorado em direito pela Universidade de Coimbra, Doutorado e Mestrado em direito pela PUC-SP, e certificado de Conselheiro pelo ICSS, habilitado pela PREVIC. É presidente do Instituto Brasileiro de Direito e Sustentabilidade – IBRADES e Membro da Comissão de Defesa do Meio Ambiente da OAB-BA, do Instituto dos Advogados Brasileiros e do Núcleo de Sustentabilidade da Associação Comercial da Bahia. Exerceu os cargos de Superintendente de Patrimônio da União - SPU, Superintendente de Meio Ambiente do Estado de Goiás, Gerente de Projetos do Ministério do Meio Ambiente e de Assessor Especial na Secretaria Geral da Presidência da República e na Presidência dos Correios. 

 

*Enio Fonseca é engenheiro florestal, Senior Advisor em questões socioambientais, Especialização em Proteção Florestal pelo NARTC e CONAF-Chile, em Engenharia Ambiental pelo IETEC-MG, em Liderança em Gestão pela FDC, em Educação Ambiental pela UNB, MBA em Gestão de Florestas pelo IBAPE, em Gestão Empresarial pela FGV, Conselheiro do Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico, FMASE, foi Superintendente do IBAMA em MG, Superintendente de Gestão Ambiental do Grupo Cemig, Chefe do Departamento de Fiscalização e Controle Florestal do IEF, Conselheiro no Conselho de Política Ambiental do Estado de MG, Ex Presidente FMASE, founder da PACK OF WOLVES Assessoria Ambiental, foi Gestor Sustentabilidade Associação Mineradores de Ferro do Brasil e atual Diretor Meio Ambiente e Relações Institucionais da SAM Metais. Membro do Ibrades, Abdem, Adimin, Alagro, Sucesu, CEMA e CEP&G/ FIEMG e articulista do Canal direitoambiental.com. 

 

*Decio Michellis Jr.  é Licenciado em Eletrotécnica, com MBA em Gestão Estratégica Socioambiental em Infraestrutura, extensão em Gestão de Recursos de Defesa e extensão em Direito da Energia Elétrica, é Coordenador do Comitê de Inovação e Competitividade da Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica – ABCE, assessor técnico do Fórum do Meio Ambiente do Setor Elétrico – FMASE e especialista na gestão de riscos em projetos de financiamento na modalidade Project Finance.

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias