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Mesmo ‘bem intencionada’, PLC que altera Lei Maria da Penha é ‘inconstitucional’

Por Júlia Vigné

Mesmo ‘bem intencionada’, PLC que altera Lei Maria da Penha é ‘inconstitucional’
Vice-presidente da OAB-BA, Ana Patrícia Leão | Foto: Angelino de Jesus/ OAB-BA
A Ordem dos Advogados do Brasil Seção Bahia (OAB-BA) declarou ser contrária a dispositivos do Projeto de Lei Complementar (PLC 07/2016) que altera a Lei Maria da Penha (11.340/06), aprovado na última quarta-feira (29) na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. A Lei Maria da Penha entrou em vigor em agosto de 2006, tendo como base o caso da Sra. Maria da Penha que foi vítima de duas tentativas de homicídio, culminando em uma decisão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos que recomendou ao Estado Brasileiro adotar uma lei que protegesse as mulheres em situação de violência. O PLC 07/2016 suscitou opiniões contrárias de diversos órgãos, como Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Instituto Maria da Penha (IMP) e Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP), manifestadas através de notas técnicas. A vice-presidente da OAB-BA, Ana Patrícia Dantas Leão, em entrevista para o Bahia Notícias, afirmou que o projeto é muito bem intencionado mas que, mesmo buscando melhorar o atendimento da vitima nas unidades policiais, o artigo 12-B é inconstitucional, uma vez que transfere para o Poder Executivo –  a autoridade policial - funções típicas do Judiciário, que possui legitimidade para aplicar pena de cerceamento, limitação na liberdade de ir e vir do cidadão, ofendendo o princípio da inafastabilidade da jurisdição e o princípio da separação dos poderes.

“A gente precisa que o PLC reflita mudanças que venham trazer melhorias e que evite a revitimização institucional da vítima, por conta da falta de estrutura, tanto física quanto organizacional, que existe nas delegacias da mulher. A precariedade de atendimento atual acaba desestimulando as vítimas, e aquelas que persistem, acabam vendo a violência doméstica produzida na instituição, seja pela falta de acolhimento, demora nas medidas administrativas, até a eventual violência psicológica”, afirmou Ana Patrícia. O PLC traz inovações consideradas positivas pelos órgãos, como trazer o direito de atendimento policial especializado e ininterrupto, sendo realizado preferencialmente por profissionais do sexo feminino, e reforçar a necessidade de que os estados priorizem a criação de delegacias especializadas no atendimento à mulher e de núcleos de investigação voltados ao crime de feminicídio, previstas nos projetados artigos 10-A e 12-A. Entretanto, o artigo 12-B, que permite à autoridade policial a aplicação provisória, até deliberação judicial, de medidas protetivas de urgência, fere a Constituição Federal, de acordo com os órgãos.

Andrea Marques, presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB-BA e membro consultor da Comissão Nacional da Mulher Advogada da OAB (CNMA) reforçou o entendimento de que o artigo 12-B é inconstitucional e acredita na importância de uma audiência pública para a discussão desse artigo. “O que a gente realmente quer é que fosse suprida, ao menos, a eficiência, com melhor estrutura de recursos humanos das delegacias instaladas e com aumento na quantidade de delegacias especializadas na mulher, além de policiais militares especializados no atendimento. Não temos corpo humano - mesmo após 10 anos da criação da lei -preparado para atender essa mulher vítima de violência”, afirmou Andrea. A OAB Nacional emitiu nota técnica sobre o assunto, afirmando que "preliminarmente, externamos nosso apoio à parte do projeto que propõe a inclusão do artigo 10-A e do artigo 12-A. Entretanto, no que tange à parte do projeto que permite que medidas protetivas sejam aplicadas por delegados de polícia (inclusão do art. 12-B à Lei Maria da Penha), gostaríamos de expressar preocupação tal qual já o fizeram vários órgãos institucionais”. A própria Maria da Penha, através de uma nota técnica do IMP, afirmou que, mesmo propondo mudanças significativas na lei, “sem dúvidas, algumas alterações precisam ser feitas”. E chamou atenção para a importância da discussão do projeto pelo conjunto da sociedade. “A Lei Maria da Penha precisa de um esforço conjunto de governantes, instituições públicas e sociedade civil. Assim, poderemos todas e todos garantir o direito das mulheres de viverem sem violência”, afirmou Maria.

A Conamp, em sua nota, afirmou que “é de se lamentar que a primeira alteração da Lei ocorra sem o diálogo com os atores do sistema de justiça, o que tem sido sempre a marca na luta contra a violência contra a mulher”. Outros órgãos como Consórcio Nacional das Organizações, que trouxe assinaturas de diversas organizações feministas e de direitos humanos, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e o Fórum Nacional dos Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, dentre outros, também manifestaram posicionamento contrário ao artigo 12-b da lei.