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'Assumo posições pouco comuns na magistratura', diz juiz de Coité sobre polêmicas

Por Bruna Castelo Branco

'Assumo posições pouco comuns na magistratura', diz juiz de Coité sobre polêmicas
Juiz Gerivaldo Neiva durante palestra / Foto: Reprodução / Facebook
Gerivaldo Neiva, juiz na comarca de Conceição de Coité, cidade do semiárido baiano localizada a 178 km de Salvador, tem ganhado destaque na imprensa local e nacional por defender ideias e ter atitudes normalmente pouco compartilhadas por outros magistrados. Entre alguns exemplos estão o seu texto "Ontem foi domingo e me droguei muito", que questiona a proibição do uso de drogas e criminalização de usuários, e a publicação de uma foto sem camisa na praia em suas redes sociais, em defesa a uma juíza da Moldálvia que foi criticada por postar uma foto de biquíni em sua rede social.  Nascido em 1962 em Irecê, sertão da Bahia, Gerivaldo vem de uma família de lavradores e viveu uma infância que considera ideal. “Catando umbu, ‘badogando’ passarinhos, quebrando a unha em babas, joelho sempre ralado. Enfim, a infância ideal”, considerou Neiva. De acordo com o juiz, a sua infância só não foi tão tranquila porque toda a cidade vivia assombrada com a figura de uns “terroristas” que vagavam pelo sertão. Só mais tarde que Gerivaldo foi descobrir que o tal terrorista era Lamarca, um dos líderes da oposição armada à ditadura militar brasileira, morto em Pintada, em 1971. Por não haver universidade em Irecê, a única saída para continuar estudando era se mudar para Salvador. Foi no ano de 1977, momento em que o Brasil lutava pela anistia dos presos políticos da ditadura, que Gerivaldo chegou à capital baiana e entrou no movimento: “Participei do movimento estudantil e de muitas passeatas”. O juiz ainda relatou que participou do congresso de refundação da União Nacional dos Estudantes (UNE), e esteve presente no comício na sede do MDB, onde presenciou uma cena que considera inesquecível. “Ulisses Guimarães enfrentou a polícia gritando ‘Me respeitem! Eu sou o líder da oposição deste país! ’. Me arrepio até hoje” contou Neiva.
 

“Participei do movimento estudantil e de muitas passeatas”, disse Gerivaldo Neiva / Foto: Reprodução / Facebook
 
Antes de cursar direito, Gerivaldo Neiva decidiu cursar sociologia, e ingressou no curso na Universidade Federal da Bahia (UFBA) em 1980. Mas, por questões financeiras, Gerivaldo acabou deixando o curso pela metade e começou a cursar direito. “Tenho a certeza de ter feito a melhor opção. Hoje, estudar o Direito e exercer a judicatura me faz um homem completo, realizado e feliz”, comentou o juiz. Neiva concluiu o curso em 1984 e trabalhou como advogado até o ano de 1990, quando ingressou na magistratura da Bahia. Sua primeira comarca foi em Urandi, cidade no extremo sudoeste da Bahia. Em 1997, Neiva foi promovido para Coité, onde está até hoje, e, segundo ele, “permanecer no interior foi por opção”. “A vida no interior tem mais qualidade e aqui posso desenvolver projetos sociais e ter uma relação mais próxima com a comunidade”, contou. Sobre os seus posicionamentos, como a legalização da maconha, Gerivaldo Neiva disse que muitos deles são compartilhados por veículos de comunicação e personalidades brasileiras: “Atualmente, defender a legalização da maconha não é mais novidade. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o médico Drauzio Varella e tantas outras celebridades também defendem”, comentou. Mas, em relação aos seus colegas magistrados, a situação já é um pouco diferente. “Na magistratura, por conta de uma cultura legalista e conservadora, são poucos os que assumem esta posição, mas quase todos sabem que a política de ‘guerra às drogas’ é um grande fiasco”, opinou o juiz.
 
 “Defender a legalização da maconha não é mais novidade. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o médico Drauzio Varella também defendem", disse o juiz / Foto: Reprodução

Segundo Neiva, na Bahia poucos juízes defendem a legalização do uso da erva, mas em nível nacional são muitos que já entraram na campanha, articulados na entidade Agentes da Lei Contra a Proibição, grupo que integra juízes, delegados e oficiais da Polícia Militar. Em relação aos seus colegas de trabalho, o juiz disse que nunca teve nenhum problema com aqueles que defendem posições contrárias. “Aprendi a defender minhas ideias e respeitar quem pensa diferente de mim. Aqui na Comarca, a Promotora de Justiça, Dra. Grace Inaura, muitas vezes recorre de minhas decisões, mas a diferença fica apenas no campo do Direito”. Além de nunca ter tido problema com nenhum magistrado, Neiva ainda disse que, em todas as comarcas por qual passou, deixou amigos. “Todos conhecem minhas posições e sabem que sou um magistrado que respeita a toga e não admito qualquer tipo de mal feito. Tenho quase 24 anos de magistratura e nunca respondi uma sindicância”, explicou. O Juiz difunde as suas ideias para o público geral em um blog e em suas redes sociais, Twitter e Facebook. O seu blog já tem mais de 700 mil visitas, e, segundo Gerivaldo, grande parte dos visitantes são estudantes de direito e profissionais da área. “Sei que assumo posições pouco comuns na magistratura e é isso que causa a curiosidade. Enfim, não basta ter um blog, é preciso que tenha conteúdo polêmico e que seja diferente”, concluiu Neiva. 
 

“A repercussão foi intensa, pois as pessoas não estão acostumadas com a imagem de um magistrado na praia, sem camisa, como uma pessoa normal", diz Neiva sobre caso da magistrada Maria Cozma / Foto: Reprodução
 
Recentemente, houve o caso da juíza Maria Cozma, que foi duramente criticada por postar uma foto de biquíni em sua rede social. Neiva, em solidariedade a magistrada, publicou uma foto de sunga na praia, e, sobre o caso, comentou: “A repercussão foi intensa, pois as pessoas não estão acostumadas com a imagem de um magistrado na praia, sem camisa, como uma pessoa normal. Na verdade, os juízes criaram esta cultura de que são inacessíveis, de que já acordam de paletó e gravata, de que sua linguagem é diferenciada e isto é muito ruim para a imagem do próprio poder judiciário”. Para Gerivaldo, um juiz é mais justo e eficiente se conhece bem a comunidade em que trabalha. “A distância da vida das pessoas apenas atrapalha e torna o julgamento frio e desconectado da realidade que gerou aquele conflito”, concluiu Neiva.