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Marca Bahia Notícias Justiça

Entrevista

Rogério Mattos - Advogado de casal baiano acusado de tráfico de pessoas

Por Claudia Cardozo

Rogério Mattos - Advogado de casal baiano acusado de tráfico de pessoas
Representante do casal baiano acusado de traficar mulheres para a Espanha, o advogado Rogério Mattos, em entrevista ao Bahia Notícias, expôs o caso sob a ótica da defesa e sustentou, do início ao fim, que Denílson Costa Pereira Reis e Elizânia dos Santos Evangelista Reis não têm envolvimento com o crime. Segundo Mattos, Denílson era apenas o motorista do espanhol Angel Bermudez Motos, conhecido como “Cigano”, responsável por enviar as meninas ao território europeu. Questionado sobre a tentativa do baiano em convencer mulheres a irem trabalhar no exterior, o defensor diz que Denílson apenas "procurou, em uma academia, pessoas que quisessem trabalhar na Europa com carteira assinada" e desconhecia a possibilidade de elas serem traficadas. "Para você ver a inocência dele, ele procurou em uma academia e não em uma casa de prostituição. (...) Você já viu prostituta assinar carteira?", perguntou. Rogério Mattos também reclama que, durante o período de carnaval, encontrou dificuldades em advogar e de ter acesso ao inquérito da Polícia Federal e ao presídio. Ele precisou acionar a seccional baiana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-BA) para fazer a defesa do casal. Mattos também falou sobre a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Tráfico de Pessoas e porque interrompeu a fala de sua cliente durante a audiência. Ele ainda pretende mover um processo milionário contra a Rede Globo pela exposição do casal no programa Fantástico.


Fotos: Tiago Melo / Bahia Notícias

Bahia Notícias - O senhor defende um casal que é acusado de tráfico de pessoas, o Denílson Pereira Rei e a Elizânia Evangelista, que teriam levado mulheres de Salvador para a Espanha...
 
Rogério Mattos - Na verdade eles são inocentes. Eles não participaram do crime em si. Existe uma senhora que é esposa de um cigano espanhol [Angél Bermudez] e eles é que realmente traficam mulheres para Espanha. Essa esposa dele é prima do Denílson. Eles ficaram de vir para a Bahia e o Denílson foi contratado por ela, por ser primo, para ser motorista dela no período em que ele ficou aqui. O Denílson e a Elizânia só tiveram contato com o seu Bermudez uma única vez, que foi essa. Por isso que eles foram envolvidos. O seu Denílson levou as vítimas que ficaram em cárcere privado na Espanha até o aeroporto, porque ele era motorista. O Cigano realmente tentou fazer com que o Denílson arranjasse algumas pessoas, sob a argumentação de que iriam trabalhar fora do país, na Espanha, mas contratados, com tudo direitinho, e não falou a atividade que elas iam exercer. Mas ele não conseguiu. O que deflagrou a operação e fez com que a Polícia Federal pedisse a prisão preventiva deles foi o fato de ele ter levado ao aeroporto. Deve ter tido algum zumzumzum acerca da tentativa do seu Bermudas de fazer com que ele cooptasse pessoas, o que não ocorreu. Eles são pessoas humildes, isso é incompatível com a realidade deles.
 
BN - Mas em nenhum momento o Denílson chegou a indicar algumas pessoas?
 
RM - Ele tentou, em uma academia. Para você ver a inocência dele, ele procurou em uma academia e não em uma casa de prostituição. Procurou na academia pessoas que quisessem trabalhar na Europa com carteira assinada. Você já viu prostituta assinar carteira? 
 
BN - O que causa estranhamento é o fato de se buscar esse perfil de pessoas em uma academia...
 
RM - Porque tem uma parente dele que tem ligação com a academia, agora não me lembro quem ao certo. E como ele e a esposa frequentavam muito a academia, resolveram procurar lá. Na verdade, ele não sabia que o cara lidava com prostituta e a prima não falou. Ele apenas conduziu eles para o aeroporto, assim como levou para outros lugares enquanto esteve aqui, como por exemplo para a sorveteria, para o shopping, para uma boate de strip-tease...
 
BN - E qual o envolvimento de Elizânia nesse caso?
 
RM - A esposa dele o acompanhava para todos os lugares. Ela é professora. Ele trabalhou na campanha de ACM Neto como motorista também e foi nesse período que esse casal esteve aqui. Eles fizeram uma proposta para ele de pagar R$ 2 mil para poder ficar de motorista nesses 22 dias e ele conseguiu conciliar os dois empregos. Foi um contrato informal. Ele pagou R$ 1 mil e o restante foi embora e não pagou. Eles são realmente inocentes.
 

 
BN - Você comentou que você estava tendo dificuldade de exercer a prerrogativa de advogado nesse caso. Quais seriam essas dificuldades? 
 
RM - Acesso ao presídio. É sabido que a o estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil garante o nosso acesso ao local 24 horas em qualquer dia da semana. Entretanto, os agentes penitenciários enxergam que o carnaval é um recesso e se eu não tivesse envolvido a OAB no caso, eu ficaria sete dias sem poder falar com ele. É um cerceamento de defesa. Inclusive, eu movi um mandado de segurança contra o secretário Nestor Duarte, que é o responsável pela segurança - não que ele tenha ciência diretamente do fato , mas como ele é autoridade ele é responsável. Quando eu não consegui entrar no presídio, solicitei a comissão de prerrogativa da OAB. O presidente da Ordem entrou em contato comigo e estabeleceu um contrato entre mim e ele diariamente. A ordem foi muito atuante...
 
BN - A seccional ou a nacional?
 
RM - Eu não cheguei nem a mobilizar a nacional para não passar por cima do presidente. Luiz Viana mobilizou a procuradoria e o que foi possível fazer foi feito pela Ordem. Além do presídio, teve problema também da Polícia Federal para ter acesso ao inquérito. Com a mesma argumentação, só se pode pegar o inquérito quinta-feira [depois do carnaval], nem quarta-feira de Cinzas é, por causa do recesso. Não existe isso. Como eu só consegui pegar o inquérito bem depois, quando eu fui falar com o delegado na quarta-feira, ele me disse que remeteu o inquérito à Justiça. O inquérito policial depois de concluso tem que ir para o Ministério Público e o Ministério Público escolhe se vai ofertar a denúncia, se vai arquivar ou se vai requerer diligência. Ele mandou realmente para a Justiça Federal - não me pergunte o porquê de um delegado federal se ocupar de uma coisa tão simples que qualquer estudante de primeiro semestre sabe.
 
BN - E o que você tem feito para conseguir o seu direito de advogar nesse caso?
 
RM - Agora está normal. O obstáculo não foi para não deixar eu advogar, a questão é que acham que tem que ter recesso para advogado. Não é que criaram um empecilho para que eu advogue no caso, não é isso.
 

 
BN - Os seus clientes, durante a CPI do Tráfico de Pessoas, afirmaram que não sabiam das intenções do espanhol. No depoimento de Elizânia, ela disse que as meninas que foram de livre e espontânea vontade...
 
RM - Mas ela não falou que foram eles que levaram e é aí que está a contradição. Por isso que eu interrompi a fala dela. Ela não disse que foi ela que levou, ela disse que foram. Ela viu isso na TV e emitiu uma opinião: de que elas foram de livre e espontânea vontade, mas não fui eu que levei.
 
BN - Durante a fala dela o senhor pediu para que ela interrompesse...
 
RM - Mas na verdade não foi isso não, foi uma confusão entre mim e os deputados. Porque em uma CPI, o advogado não pode falar. Ela tem característica de inquérito policial. Só que mesmo sem poder falar, eu falo.  Se não gostar, me prenda. Diversas vezes eu adverti o deputado para não colocar palavras na boca de minha cliente e para não fazer perguntas que dessem margem a dupla interpretação. Porque o primeiro interrogatório foi perfeito, eles se sensibilizaram, ficaram tristes, perceberam que era laranja... Depois dessa declaração, eles mudaram totalmente. Chegaram ao ponto de intimidar minha cliente.
 
BN - Como foi essa intimidação?
 
RM - O Denílson falou anteriormente que o espanhol pediu para ele trabalhar. Tanto para ele quando a segunda depoente, eles [os deputados] advertiram: "Mas você mandava as mulheres para a Espanha?", dando a entender que era para se prostituir. O processo estava em sigilo na Justiça e foi permitido à imprensa entrar. Se eu quisesse, eu não permitia porque corria em sigilo. Por que eu permiti? Porque eu sei que eles são inocentes. Por saber disso, eu pensei: vou publicizar isso para limpar a imagem deles. A intenção foi essa.
 

 
BN - O senhor mesmo que pediu?
 
RM - Eu mesmo disse para o juiz: não, pode liberar porque vai ser bom para a imagem deles. Tanto que eles [os deputados] se sensibilizaram muito no começo. Inclusive, como ele se sentiu fragilizado, impotente, por eu não permitir que ela falasse mais, isso esvazia a função deles. Então, eles começaram a intimidar ela: isso vai te prejudicar no seu processo judicial, não sei se essa menina é correta... Eles meio que me desrespeitaram para poder gerar conflito entre eu e ela. Aí eu me exaltei pedi que ele me respeitasse... tanto que ele ficou calado não falou nada. Não pode falar e eu falei isso.  Falei que ele estava tentando me colocar contra a cliente etc. Aí ela [Elizânia] falou: eu me reservo o direito de ficar calada e só respondo em juízo e sob instrução do meu advogado. E saiu revoltado. 
 
BN - A partir de agora quais serão os próximos passos?
 
RM - O juiz decretou a prisão preventiva dos dois e eu entrei agora com o pedido de revogação da prisão preventiva. Eles vão sair, inevitavelmente, até porque o delegado me deu uma força. Deu uma força porque ele cometeu um erro e não porque me ajudou. Ele moveu um pedido de prisão preventiva para uma outra pessoa envolvida no caso que eu não sei quem é. A partir do momento que você nega, eu posso pedir acompanhamento da decisão. É uma questão de dias eles estarem na rua. A denúncia foi ofertada e não sei porque a promotora denunciou, já que não tem lastro mínimo para oferecer denúncia e durante o processo eu não tenho dúvida que eles serão absolvidos. 
 
BN -Eles podem ser condenados por tráfico internacional de mulheres e formação de quadrilha. Qual é então a estratégia da defesa?
 
RM - Negativa de autoria. Eles nem se falam. Eu não estou sendo pago nem pelo espanhol nem pela loira. A prova disso vai ser que durante todo o processo eu vou bater nos dois. 
 
BN - Então na sua concepção...
 
RM - Eles não participaram. Agora, eu não tenho dúvida da participação do espanhol e dela. Você já imaginou esse rapaz humilde em uma estrutura daquelas? Esse cara aí [Bermudez] tem três, quatro boates, é milionário, eu acho. Não tem nada a ver. Tentaram induzir ele ao erro. Tanto que ela não mora nem aqui, mora em São Paulo. Você já viu rico se misturar com pobre? Que amizade é essa que apareceu do nada? O que aconteceu foi: vamos procurar pessoas humildes. Porque eles procuram pessoas humildes? Porque é mais difícil de se buscar Justiça né? A família não vai ter dinheiro para pagar advogado. Então, porque foi pedida a prisão preventiva? Porque uma das mães identificou ele e ligou para o Disque-Denúncia. Agora, por que não prenderam a loira? Ela está em São Paulo... ela nem foi presa. Ela poderia ter sido presa em prisão preventiva, tranquilamente.  
 

 
BN - Para você, o espanhol é o traficante?
 
RM - Não tenho dúvidas. 
 
BN - Enquanto advogado, você acredita que ele deve ser condenado por tráfico?
 
RM - Eu não vou emitir juízo de valor porque pode ter um colega meu defendendo. Mas eu acho que, alí, a mídia é clara com relação a isso, entendeu? Durante a prisão, foram apreendidos computadores e celulares dos meus clientes e não encontraram nada. Solicitei à CPI a quebra do sigilo bancário e telefônico de todos não sei se eles vão fazer, mas que façam. Para mim, esse processo é muito tranquilo em relação ao processo em si. O problema é a exposição na mídia e a novela da Rede Globo. Isso atrapalha. Eu estou com uma ação pronta contra a Rede Globo acerca da veiculação [do caso] no Fantástico. Eles fizeram uma exposição de 11 minutos e eu estou cobrando R$ 2 milhões por cada minuto de exposição. Com o pedido de liminar pedindo a antecipação de 10% desse valor porque eles não vão arranjar emprego agora. Não vão, já era. Estão queimadíssimos. Inclusive confundiram a dona Elizânia com aquela senhora do tráfico de bebês e ela estava correndo risco de morte. O pessoal estava querendo bater nela. 
 
BN - E nessa ação contra a Rede Globo você vai sustentar o quê?

RM - A exposição.
 
BN - Para você, então, os dois serão absolvidos.
 
RM - Sem dúvida. Não tem nada contra ele. A única coisa que tem é o fato de ele estar participando de todos os atos como motorista.  Levou as mulheres, pegou passaporte... coisa que motorista faz... Ele só o viu [Bermudez] uma vez, no momento em que ele passou 22 dias na Bahia. 
 
BN - Mas digo contato indireto com a mãe da menina que denunciou o caso, já que ela fez a denúncia...
 
RM - Eu acho que tinha contato por causa do bairro. Como ele rodou tudo ali...