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Marca Bahia Notícias Justiça

Entrevista

Presidente da Ampeb aponta crise na gestão do MP-BA: ‘Não ter um gabinete é incoerência’

Por Cláudia Cardozo

Presidente da Ampeb aponta crise na gestão do MP-BA: ‘Não ter um gabinete é incoerência’
Foto: Divulgação
O presidente da Associação do Ministério Público da Bahia (Ampeb), Alexandre Soares Cruz, está há dois anos à frente do órgão. Em entrevista ao Bahia Notícias, ele avaliou o seu mandato e esclareceu questões acerca da recomposição salarial dos membros do MP e do pagamento da Parcela Autônoma de Equivalência. "Nós temos mais de 200 promotorias vagas no interior e, na nossa visão, houve um problema de gestão do Ministério Público. Sempre houve vagas no interior, mas esse problema foi aprofundado com a criação de vagas na capital, a criação de vagas na segunda instância - portanto vagas de procurador - sem o adequado planejamento", afirmou Cruz, que não se esquivou de temas espinhosos, como a controversa PEC 37, que tentou retirar o poder de investigação do Ministério Público. "Há um trabalho corporativo, de entidades ligadas aos delegados de polícia que tentam retirar o Ministério Público da investigação criminal, e claro, a gente resiste a isso e sempre que a gente detecta alguma tentativa ali, às vezes escamoteada, contra o Ministério Público", disse o dirigente. Além disso, comentou sobre os problemas enfrentados pelo MP-BA, como carência de promotores e sedes e estrutura de trabalho. "Você precisa sair de casa e ir para o trabalho gostando do que está indo fazer, sentindo que você está realizando alguma coisa que justifique o seu papel social. Um membro do MP que exerce a função de investigar, às vezes, inclusive, figurões do meio político e econômico, não ter um gabinete para trabalho é uma incoerência", declarou.
 
O senhor deixa a direção da Associação do Ministério Público em breve, após dois anos de gestão. Como o senhor avalia seu mandato?
 
Esses dois anos foram para reafirmar o papel independente da Ampeb, que legitimamente representa os promotores e procuradores de Justiça ativos e aposentados e seus pensionistas aqui na Bahia. Portanto, foi firmar essa trincheira da Ampeb, que é independente, é de luta, de defesa de prerrogativa de direitos de todos esses colegas, que são mais de 700. Nossa pauta de atuação é bastante extensa, e a gente procurou nesses dois anos atuar em variados temas, como a ampliação do número de promotores, a realização de um concurso - que só agora está em andamento, e que é um concurso, que lamentavelmente, não vai resolver, não vai impactar significativamente na solução do problema. Nós temos mais de 200 promotorias vagas no interior, e na nossa visão houve um problema de gestão do Ministério Público. Sempre houve vagas no interior, mas esse problema foi aprofundado com a criação de vagas na capital, a criação de vagas na segunda instância - portanto vagas de procurador - sem o adequado planejamento. Não é que a gente seja contra a criação de vagas, - evidentemente não é - mas essa criação deve ser feita com planejamento. Por que o que ocorre: quando você cria vaga na capital e cria vaga no topo da carreira, que é procurador - que trabalha com o desembargador em segundo grau-, obviamente vai haver uma movimentação na carreira. Há movimentação na carreira e, portanto, o interior se esvazia. Então hoje nós temos situações como, a do extremo sul da Bahia, por exemplo. Eu me recordo de ter atuado em Teixeira de Freitas até 2008, e todas as promotorias estavam preenchidas. Eram mais de 15 preenchidas. Hoje só a promotoria de Teixeira de Freitas tem promotor. Não há promotor em Nova Viçosa, não há promotor em Mucuri, não há promotor em Alcobaça, em Caravelas, em Prado, em Medeiros Neto, Ibirapuã, etc. Em Itamaraju, uma cidade representativa do extremo sul, não tem promotor titular. Isso, na nossa opinião, é falta de planejamento. Então esse é um ponto de reivindicação nosso. Claro, a luta pela recomposição das perdas de subsídio, que é uma pauta que a gente reconhece que um pouco impopular, mas precisa ser feita. A gente não pode permitir que a carreira seja desvalorizada. É preciso ter a consciência, a noção de que a função de um promotor de Justiça, a função de um juiz, é uma função de agente político. É um exercício de poder estatal. Evidente, se a gente fosse comparar o quadro de promotores, de juízes dentro da carreira pública, com cargos da iniciativa privada, nós vemos que são cargos do alto escalão do Estado, e que, portanto, exercem função de agente político e devem ser valorizados. Portanto nossa luta é sim, incessante, pela valorização do nosso subsídio. Nossas perdas inflacionárias chegavam a cerca de 35%, e o reajuste que tivemos, o último, foi em torno de 14%, portanto não compõe nem metade. É claro que a gente sabe que todas as carreiras têm perdas também, mas o nosso papel como entidade de classe é lutar pela recomposição das nossas perdas, e temos feito isso incessantemente, tanto em plano estadual como em plano nacional. Esse eu considero, sob o ponto de vista classista, um passo que foi dado na recomposição de uma parte dessas perdas, mas que como muitas outras estão sendo recompostas.
 
Como está a discussão sobre a recomposição salarial dos membros do MP e o que pode ser feito aqui na Bahia para pressionar que projetos que tramitam no âmbito nacional corram com mais celeridade? 
No âmbito estadual, a gente não tem nenhum projeto de lei tramitando. Em âmbito federal a gente tem o ATS [Adicional por Tempo de Serviço], que é a PEC 63, que a gente espera que seja, que venha a ser votada pelo Senado. Estava para ser votada, porém o cenário político se alterou, e a gente considera isso fundamental. Por quê? Quando um membro do Ministério Público se aposenta, ele tem perdas significativas. Ele continua pagando a previdência, mesmo aposentado, e você não têm acesso a verbas de natureza indenizatória, não tem auxílio-moradia, não tem alimentação, etc. Então tem perdas. Então, os aposentados ganham menos que o pessoal da ativa. E quem ingressa na carreira hoje, ingressa com salário que vai sofrer alguns pequenos reajustes, quando for progredindo na carreira. E a situação que se tem: você não tem uma valorização pelo tempo de serviço. Então, um procurador de Justiça com 30 anos de serviço público ganha quase a mesma coisa de quem ingressa na carreira hoje, com pequenas diferenças, e isso a gente entende como uma injustiça. A experiência precisa ser valorizada, a experiência, o acúmulo de conhecimentos precisa ser valorizado. E na aposentadoria o sujeito precisa ter a tranquilidade de quem já exerceu 30 anos de serviço público. O ATS seria o retorno do Adicional por Tempo de Serviço, seria muito importante para isso. É uma luta nacional, tanto do Ministério Público quanto da magistratura.
 
Também tem a batalha pelo pagamento da Parcela Autônoma de Equivalência (PAE) ...
O pagamento da PAE é administrativo, de acordo com a disponibilidade orçamentária, e a nossa luta é para que os aposentados recebam a PAE também. É uma pauta histórica nossa, a de alcançar efetivamente a paridade entre ativos e aposentados. Lamentavelmente o serviço público em geral não tem valorizado os aposentados como merecem. As pessoas prestam 35, 40 anos de serviço público, e depois se veem desvalorizados. É uma incoerência. Nossa luta é pela paridade, inclusive nessa pauta que diz respeito à PAE.
 
O senhor também estava à frente da Associação quando houveram investidas tentando retirar o poder de investigação do Ministério Público, toda a manifestação das ruas em junho de 2013. De lá para cá, tem ocorrido outras tentativas de retirar poder de investigação do Ministério Público?
Igual a PEC 37, não. Não houve nenhuma nova tentativa igual, do ponto de vista de relevância, de abrangência, e de estrago que causaria a PEC 37. A PEC 37 visava tornar exclusiva da polícia a investigação criminal, o que é um despautério. Tentativas semelhantes aquela, de potencial relevante, sobretudo via emenda constitucional, não teremos, pelo menos por agora. Mas aqui e acolá aparecem novas investidas contra o Ministério Público, às vezes via projeto de lei. Houve há pouco tempo a aprovação de projeto de lei em que se tenta, por via transversa, valorizar a figura do delegado de polícia à frente da investigação, em detrimento do Ministério Público, e estamos totalmente atentos a isso. Há um trabalho corporativo, de entidades ligadas aos delegados de polícia que tentam retirar o Ministério Público da investigação criminal, e claro, a gente resiste a isso e sempre que a gente detecta alguma tentativa ali, às vezes escamoteada, contra o Ministério Público. A gente vai à campo também, no Congresso Nacional, inclusive. No âmbito administrativo, o que houve recente, que repercutiu bastante, foi a tentativa da Procuradoria Geral de Justiça da Bahia de retirar alguns colegas, que estão atuando no combate à improbidade administrativa. O que houve naquela situação? Existem promotores que ocupam promotorias de assistência na capital. Essas promotorias de assistência foram criadas para cobrir lacunas, ou seja, necessidades eventuais, uma substituição eventual. Nós inclusive somos contra isso. Mas o fato é que elas, quando surgiram, surgiram para isso. Mas foram se multiplicando ao longo da história, tendo novas promotorias de assistência, essas novas promotorias foram sendo ocupadas e começou-se a distribuir, ou melhor, os colegas começaram a ficar em atribuições durante algum tempo, sendo que os promotores de assistência começaram a assumir durante dois, três, quatro, cinco anos. Isso gera uma certa estabilização, você está tendo uma atribuição durante quatro, cinco anos, por exemplo, a frente de uma ação contra improbidade administrativa. Então é preciso que, no mínimo, quando forem lhe tirar dessa atribuição, lhe comuniquem porque estão fazendo isso, de qual é a razão e qual o interesse público que se justifique.  Por cinco anos, você foi necessário naquela atuação, e de repente, lhe dizem: olhe, segunda-feira se apresente ao Juizado Criminal de Itapuã. Foi assim que aconteceu. Nós fomos contra, defendendo a prerrogativa da instituição e da sociedade, da inamovibilidade. Isso significa dizer: promotor de Justiça, para ter retirada alguma atribuição, é preciso que haja justificativa de interesse público. Isso precisa ser objeto de deliberação de um órgão colegiado, que é o conselho superior, dentro da justificativa de interesse público, o que não houve, assim como não houve até agora. Tanto que o ato foi revogado. Houve uma suspensão de efeitos para não se chamar de revogação. Tanto que eles estão na mesma promotoria, com as mesmas atribuições que estavam exercendo, graças a atuação da Ampeb e a compreensão da classe como um todo, que aderiu a causa. Então pelo que a gente luta? Para que as atribuições sejam respeitadas. A Procuradoria Geral disse que vai fazer uma mudança nas promotorias de assistência, ou seja, vai fixar mesmo a atribuição. Mas nós queremos que a classe seja ouvida. Inclusive já solicitei ao procurador-geral que reúna todos, cerca de 50 promotores de assistência, e dialogue com eles, para dizer: ‘olha, nós queremos fazer a mudança, queremos estabilizar a atribuição de cada um, agora a definição de critério de quem é que vai para vaga tal, nós queremos discutir e definir em conjunto’. Nossa luta, portanto, é pela escuta da classe nessa perspectiva de definir o critério de distribuição das vagas, e das atribuições.
 
Uma especulação que surgiu na época em que os promotores foram retirados de seus postos é de que eles estariam investigando algumas ações contra o governo do Estado. Essa, de fato, seria a motivação para remoção dos promotores, por mexerem em ‘casa de vespeiro’?
A especulação realmente surgiu na ocasião, mas não tem nenhum dado concreto que me permita confirmar isso. Seria leviano da minha parte confirmar isso. Eu prefiro interpretar o fato exatamente como aconteceu. Foi um ato de inabilidade na condução da gestão da instituição e expôs desnecessariamente a própria Procuradoria Geral e o próprio Governo do Estado por esse tipo de especulação. Ou seja, gerou uma especulação desnecessária e que não está baseada em nenhum fato concreto, mas gera. Na hora que você mexe exatamente em uma área sensível, de investigação de improbidade administrativa, que todo mundo sabe que vez ou outra contraria o poder político, e na hora que você mexe nisso, sem dialogar com as pessoas que estão atuando, é temerário, porque se houvesse diálogo, se houvesse um planejamento prévio, se isso tivesse sido feito não teria gerado essa especulação. Os órgãos de imprensa todos que estiveram lá, todos queriam saber de mim isso aí, o que está por trás disso. Eu não sei nada que está por trás. Então, na minha opinião, como disse, foi um ato inábil, na condução do Ministério Público, que ficará marcado na história e que certamente não se repetirá. Porque ficou claríssimo que foi a forma pior que poderia ter para se fazer qualquer mudança de atribuição. O promotor de Justiça tem prerrogativas, por mexer com poder político, com poder econômico e essas prerrogativas existem para que ele se fortaleça no exercício da função.


 
Foto: Divulgação

E depois desse ato, como tem sido a conversa com o procurador geral sobre remoção de promotores? Tem havido estudos, já tem algum dado?
Aquela situação que mencionei das promotorias de assistência, cerca de 50 promotorias de assistência. O Procurador geral comunicou que pretende fixar mesmo as promotorias de assistência, portanto, acolhe a nossa tese de que não pode ter promotor de Justiça sem inamovibilidade. Não existe a figura de promotoria itinerante. Vai ser promotor de assistência. Pelo que eu conversei com ele, a intenção dele seria manter a nomenclatura de promotor de assistência, mas com a atribuição, por exemplo, de combate a improbidade administrativa, com atribuição, por exemplo, de atuação na vara de tóxicos, e aí, aquela atribuição não vai ser alterada por decisão unilateral do procurador geral. Agora, qual o critério para dizer que a 7ª Promotoria de Assistência vai ser de tóxicos, que a 10ª vai ser de improbidade administrativa, que a 15ª vai ser de meio-ambiente? Qual vai ser o critério? Quantas são de meio-ambiente, quantas são de improbidade, quantas serão de crime? E qual vai ser o critério para saber se quem vai para lá é o Alexandre, é Cláudia, é Manoel, é Joaquim. O que a gente quer saber do procurador, que ele não disse ainda, é qual vai ser esse critério. Por isso que eu sugeri que ele reunisse os 50 diretamente afetados para trocar ideias e definir democraticamente isso, evitando um novo ato que gere especulações, repercussões ruins para o MP.
 
Uma inspeção do Conselho Nacional do Ministério Públicos (CNMP) apontou diversos problemas aqui no MP da Bahia, carência de promotores, estrutura de trabalho, carência de sedes, apatia entre os promotores. Como a Ampeb encara esse prognóstico de apatia? Já há alguma resposta do MP sobre as estruturas de trabalho? Já tem algumas melhorias nas estruturas de trabalho, principalmente no Interior?
Eu preciso ser justo com a administração da minha instituição, com o esforço dos meus colegas à frente da administração da instituição, e reconhecer que há alguma melhora, ainda que pontual, não com a velocidade e a dimensão que a Ampeb luta para que tenha. Agora, uma melhoria pontual tem, se eu dissesse que não está havendo, de 2009, quando houve o relatório do CNMP saiu, não houve nenhuma melhoria, eu estaria sendo injusto. Houve construção de sede em Vitoria da Conquista, uma reforma, melhoria na estrutura das promotorias criminais, considerada plenamente inadequada, porque por exemplo. Um promotor de justiça na capital, salvo raras exceções, não tem um gabinete para trabalhar. Os promotores criminais trabalham em espaço coletivo. Hoje, esse espaço é melhor do que antes, em 2009 quando o CNMP esteve aqui. O espaço eram uma salinha com seis ou sete estações de trabalho, são trinta e tantos promotores criminais. Hoje o espaço é maior, foi feito no subsolo, na garagem, mas é um espaço melhor. Mas é um espaço coletivo. Se você quiser falar com um promotor criminal na capital, você não vai ter, por exemplo, um assistente dele para se dirigir. Não há um gabinete para ligar e marcar, não há estrutura de trabalho. Eu acho, por exemplo, que uma parte dessa apatia identificada pelo CNMP decorre da falta de estrutura de trabalho. Você precisa sair de casa e ir para o trabalho gostando do que está indo fazer, sentindo que você está realizando alguma coisa que justifique o seu papel social. Um membro do MP que exerce a função de investigar, às vezes inclusive, figurões do meio político e econômico, não ter um gabinete para trabalho é uma incoerência. Muitas pessoas sequer imaginam, acham que os membros do MP, promotores, juiz, tem assistentes, estrutura de gabinete, mas não temos nada. Eu não estou reivindicando pompas e circunstâncias, estou reivindicando estrutura básica, que qualquer executivo de qualquer empresa da esfera privada, tem que comparar executivos da esfera privada com membros do MP na esfera pública. Qualquer um teria, minimamente, um assistente, uma secretária, uma mesa de trabalho, um computador, um espaço que possa chamar de seu local de trabalho, que não é o que acontece hoje. Hoje, todos os promotores de Família da capital, nenhum deles tem gabinete. Nenhum promotor de justiça criminal da capital tem gabinete, espaço próprio para trabalho. Promotores da Fazenda Pública não tem gabinete, espaço próprio para trabalho, não tem. Todos deveriam ter um local para se dirigir, para guardar seus livros, por exemplo, ter seu espaço, seus documentos, arquivar, etc., uma secretária, um assistente, um assessor. Inclusive porque, o seguinte: a lógica de criar cada vez mais cargos de promotor e de juiz para dar conta da demanda, sob ponto de vista de gestão, é equivocado. Você precisa aumentar a produtividade de cada promotoria, de cada unidade judiciária em que você tenha um grande líder daquela unidade, no caso do MP, e que ele possa coordenar uma equipe que produza. Isso parece o óbvio. Ao invés de você sair criando vários cargos de promotor e não ter nem onde colocá-los para trabalhar, você estruturar as promotorias, dotando os promotores de assistentes, do staff de trabalho que ele possa produzir mais. Me parece é que aí que está a grande questão. Você precisa ter unidade administrativa que produza mais, mas não às custas do sacrifício pessoal do promotor. Quer dizer, como dizia um colega meu, você olha um promotor passando e fala: ‘lá vai a promotoria’. Porque tudo que é a Promotoria é só o promotor.
 
E isso impacta no serviço, não é? Imagino que o promotor mesmo que tem que atender seu telefone, o promotor mesmo que tem...
É isso. Eu vou sair daqui da Ampeb. Aqui, eu tenho uma estrutura de trabalho adequada e razoável. É a estrutura mínima que qualquer colega meu, e que eu, promotor que sou, quando me juntar as minhas funções, deveria ter. Você não vê aqui luxo, pompas e circunstancias. Talvez aqui a sala não devesse ser desse tamanho, porque aqui tem um componente de representação política, e às vezes tem que receber uma quantidade de pessoas maior. Mas ter um gabinete, uma mesa de trabalho, um computador, um telefone, uma pessoa para fazer uma ligação, uma outra para ajudar nos processos, né? Não é que você vá entregar um processo para um assessor fazer, mas é o seguinte: demandas que são repetitivas, situações repetitivas, que você já tem uma estrutura de manifestação, etc., você pode ter alguém para lhe auxiliar no trabalho material, para lhe auxiliar no trabalho de pesquisa, por exemplo, de consulta de jurisprudência. Ou seja, você produzir mais e melhor. Ser promotor, chegar a promotor de Justiça é algo que todo mundo sabe, não é fácil. É um concurso bastante desgastante, são alguns e alguns anos de estudo. Mas você chega e a sensação que você tem é de ‘será que eu cheguei ao lugar que eu imaginava? ’. No interior você ainda tem gabinetes de trabalho, por incrível que pareça, alguns, é verdade, que a maior parte nos fóruns, mas ainda tem. Na capital, nem isso.
 
Isso faria que as investigações fossem melhores produzidas? Há uma crítica de que muitas vezes o MP investiga mal, muito disso em decorrência dessa falta de estrutura, dessa falta de treinamento, de capacitação. Há um investimento nisso também, para que os promotores sejam constantemente reciclados?
Eu não diria que a investigação não vai bem. Eu acho que, com ganho de estrutura, é claro que ela melhorará. Não que ela esteja ruim, que ela esteja mal, que essa grande tese que tentam emplacar para tolher o poder de investigação do MP. Refuto completamente essa tese. Até porque se não fossem as investigações do MP, a gente não teria alcançado determinadas figuras políticas da república, não é verdade? Se fosse deixar à custa de estruturas investigativas arcaicas. Mas o ganho de estrutura é claro que representará um salto qualitativo na atividade investigatória, aliás, não só na atividade investigatória, mas na atividade do MP como um todo. Como qualquer profissional, se você melhora a estrutura de trabalho você melhora a qualidade do trabalho.


 
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O que falta? Vontade política, recurso, para que esses promotores tenham estrutura melhor de trabalho?
Eu acho que gerir é, sobretudo, identificar prioridades. E acho que isso não tem sido bem feito na instituição. Talvez com a melhoria do diálogo, da percepção das necessidades da base mesmo da instituição, isso pudesse ser corrigido. Como eu disse, estou fazendo justiça. Houve melhorias pontuais, mas numa velocidade muito, muito aquém da necessária para você fazer uma mudança na instituição. Eu acho que isso passa sim pelo rol de prioridades da gestão. A gente sabe que os recursos são finitos, mas eu tenho a impressão de que se eles forem mais bem administrados, sobretudo se o diálogo, se a interlocução com o governo do estado for melhor, a ponto de gerar um incremento significativo no orçamento do MP... Eu me lembro que você estava comigo naquele evento da OAB no Tribunal de Justiça, que a representante do Tribunal de Contas do Estado projetou algumas laminas, e eu me lembro de ter comentado com você: observe aquele quadro ali, que de todas as instituições, o MP foi a que teve menor evolução orçamentária. Perdeu do Judiciário, perdeu da Defensoria, perdeu do Legislativo, perdeu do Tribunal de Contas, a menor evolução. Isso precisa ser visto. Porque veja, é uma instituição relativamente recente, no papel que ela tem, a dimensão que o MP ganhou é de 1988 para cá. Portanto, é uma instituição que deveria estar em um ritmo de crescimento mais acelerado do que o Judiciário. Deveria. O orçamento do MP deveria, proporcionalmente é claro - não digo que deveria ser maior que o do Judiciário. A gente precisa do incremento orçamentário mais significativo. Nós precisamos estruturar as promotorias, é um trabalho que precisa ser feito. Agora, como eu disse, acho que por um equívoco administrativo, além de nós termos pouco incremento orçamentário, aquém do que nós precisamos ter, em minha opinião tem sido mal-empregado. Não é que a gente não queira que crie vagas. A gente quer que crie vagas de promotor, a sociedade precisa, mas eu preciso saber onde eu vou colocar esse promotor para trabalhar e qual a estrutura de trabalho que vou dar a ele. Olha só, para você ter uma ideia, um terço de membros do quadro do MP hoje está na capital, outro terço está vago e outro terço está no interior todo. São 560 membros ativos mais ou menos. Agora eu lhe digo, se fosse na esfera privada, o senhor estava demitido. Se fosse uma empresa privada, que você fosse acionista, faz uma reunião e diria: ‘olha, usamos os recursos e chegamos a seguinte conclusão, está faltando 200 promotores no interior’, e tem um terço na Capital? Como aconteceu esse processo? Qual foi a lógica gerencial usada para se chegar nesse caso? Qual estratégia, qual objetivo que se quis alcançar? Vender o almoço para comprar o jantar!
 
A associação terá uma eleição nos próximos dias, o senhor sai da presidência, gostaria de saber qual o seu futuro, se ainda continua na vida política associativa, de classe, se volta para sua promotoria de origem...
Volto com muito orgulho. Sou 100% promotor de Justiça. Sou, inclusive, promotor de assistência da capital, portanto, não sei lhe dizer, lamentavelmente, quais são as funções que vou exercer, mas qualquer das atribuições que estão no plexo das atribuições do MP eu vou exercer com muita honra, absoluta honra. É isso que e usou, promotor de Justiça, voltar a base, e é isso aí.
 
E como o senhor enxerga o futuro da associação neste cenário nos próximos anos. Tem o final de uma gestão já do procurador de justiça Marcio Fahel, e no ano que vem já tem aí uma nova eleição para procurador geral. Como o senhor vê a associação nos próximos anos?
Eu tenho assim, a maior esperança, de que Janina Schuenck vai conduzir com a maior sabedoria a Ampeb, porque ela tem, cumpre os pré-requisitos que é, que são na minha opinião, no meu modo de ver, coragem, equilíbrio e independência. Eu tenho certeza de que com esses três atributos, que ela tem de sobra, ela vai conduzir brilhantemente a Ampeb, mantendo a instituição na sua trincheira de luta associativa, que às vezes, é claro, gera alguns atritos com a administração da procuradoria geral, mas são atritos necessários, para melhorar a gestão da instituição. Eu pelo menos interpreto assim, quando eu recebo uma crítica, exceto quando é aquela crítica mal-intencionada, sem qualquer tipo de embasamento. Mas quando é uma crítica com embasamento, uma crítica que se pauta em fatos, em dados objetivos, acho que isso contribui para a minha melhoria. Quem crítica me faz crescer, e eu tenho a impressão de que a procuradoria geral, colega que está lá circunstancialmente exercendo a função, também deve receber as críticas que por vezes a Ampeb tem que fazer. Não é Alexandre fazendo a crítica, é a Ampeb, entidade que está aí para desenvolver esse papel dialético dentro do MP, e fazer mesmo a confrontação de ideias, que visa fortalecer o MP. Tenha certeza de uma coisa: na hora em eu qualquer pessoa ou instituição se colocar contra o MP, Procuradoria Geral e Ampeb estarão, pode ter certeza, ombreadas, na defesa do MP. Ninguém alimente a falsa ilusão de haverá algum dia Ampeb e Procuradoria Geral em polos opostos quando a pauta for a defesa do MP. Para defender o MP nós estamos os dois do mesmo lado. Agora, no que diz respeito a equívocos administrativos, em nome da própria defesa do MP, às vezes, nos colocamos em lados opostos, e, a Procuradoria entendendo que está defendendo o MP do jeito deles, e a gente aqui, às vezes, divergindo e mostrando nossos pontos de vista.
 
Uma última pergunta: Especula-se que há ações contra o Estado na Procuradoria Geral de Justiça sem encaminhamentos. O senhor acredita que há realmente ações paradas na Procuradoria? O senhor acha que é preciso dar mais transparências aos atos do procurador-geral de Justiça?
Sugerimos ao procurador Geral de Justiça que fosse dada absoluta transparência aos seus atos como: Quais são as investigações em andamento? Estão em andamento desde quando? Quais foram arquivadas? Porque foram arquivadas? Inclusive, sugeri que publicasse no Diário Oficial os arquivamentos, como forma de até preservá-lo de delações de que tem alguma coisa engavetada - e eu não tenho dados objetivos que me levem a acreditar nisso. Qual a melhor forma de afastar a desconfiança? Eu disse isso num discurso na Procuradoria: Não tem nada melhor que a luz do sol para combater a infecção. Abre a janela, abre a cortina. Para combater especulação, a delação, a desconfiança, é fazer a coisa às claras, por exemplo, permitir acesso, consulta pública ao sistema de tramitação dos procedimentos do MP, assim como você consulta um processo no sistema Judiciário, você permita que haja essa consulta pública a tramitação. Não digo do conteúdo, que porventura pode ser sigiloso, mas você saber a tramitação, para saber, por exemplo, quantas representações foram feitas contra o Estado, o governo, com quem estão, há quanto tempo estão, porque estão, e se for arquivado, por que foi arquivado. A sociedade não tem controle sobre os processos arquivados. A Procuradoria não tem. Mas o MP tem. A promotoria arquivou, aparece lá que está arquivado, até porque esse arquivamento é submetido ao Conselho Superior do MP, que se reúne uma vez por mês em reunião aberta, mas o mesmo não ocorre nos procedimentos de atribuição originária do Procurador Geral. Por exemplo, fazendo justiça, crimes atribuídos a prefeitos quando arquiva sai no Diário. Hoje mesmo têm vários, tem o nome da prefeitura, o número do procedimento que foi arquivado. Se você quiser saber, invoca a Lei de Acesso a Informação, pede e eles dão a informação. Agora aquilo que está no âmbito restrito da Procuradoria Geral, o procurador geral que tem atribuição para instaurar inquérito civil para investigar improbidade administrativa atribuída ao governador. Investigar por exemplo danos ao meio ambiente decorrente de decisões do governador, é o procurador. Para a sociedade não existe controle. Pode não existir nenhum, não se sabe, estamos aqui especulando. Então a melhor forma de afastar é dar transparência, é a melhor forma. Quando for arquivado eu publico no Diário Oficial e permito a consulta pública. E quando for sigiloso eu coloco que é sigiloso e explico o motivo. Mas a regra é que a publicidade pode acontecer.
 
Deixamos aqui o espaço aberto para suas considerações finais.
Eu agradeço ao Bahia Notícias, nesses dois anos que estive a frente da Ampeb. Agradeço a cobertura que vocês têm dado não só discussões do MP, mas a Justiça como um todo. Acho interessante essa pauta específica, especializada. Nossos associados são leitores assíduos, eu recebo sempre posts do Bahia Notícias, qualquer notícia nossa, de interesse nosso, seja relacionada a Ampeb ou não, eu recebo. Eu como membro associado da Ampeb agradeço essa visibilidade que vocês dão, e que eu acho que é muito importante para a valorização das entidades classistas, que perde para as entidades de interesses privados, que são de interesses privados, mas de carreiras que pela dimensão do papel que tem, até a defesa de interesse privado em alguma dimensão atende o interesse público. Quando eu defendo o interesse de um promotor ou juiz, eu atendo a sociedade que tem seus interesses defendidos por esse promotor, esse juiz.