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Marca Bahia Notícias Justiça

Entrevista

Marcos Vinicius Coêlho, presidente da OAB - Reforma política

Por Claudia Cardozo / José Marques

Marcos Vinicius Coêlho, presidente da OAB - Reforma política
Fotos: Bahia Notícias
Em busca de assinaturas para apresentar um projeto de lei de reforma política ao Congresso Nacional, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) promove, em Salvador, nesta segunda (25) e terça-feira (26), sessões do Conselho Federal da instituição. O objetivo, segundo o presidente da entidade, Marcos Vinicius Furtado Coêlho, é coletar dois milhões de assinaturas para expor a “pressão da opinião pública” ao Legislativo e levar a medida à frente. “Temos que modificar a forma com que a representação popular é eleita. O atual sistema político-eleitoral é o principal responsável pelo desvio de conduta do homem público. Eles já começam a campanha eleitoral tendo que submeter e praticar atos indevidos de financiamento de campanha pelo caixa dois, praticando atos de corrupção eleitoral, abuso de poder político e econômico. O que esperar de um político eleito nessas bases?”, questionou o mandatário em entrevista ao Bahia Notícias. As principais mudanças desejadas pela Ordem são o “financiamento democrático” das campanhas, em que “as empresas não participarão, mas as pessoas físicas poderão contribuir em até R$ 700” e o estabelecimnento de dois turnos nas eleições proporcionais. “No primeiro turno, a população votaria em uma lista de candidatos e propostas, definindo quantas vagas cada partido teria direito, e no segundo turno o povo votaria no nome do candidato”, explicou. Confira a entrevista na íntegra:


Fotos: Angelino de Jesus

Bahia Notícias – O que trouxe o Conselho Federal da OAB à Bahia?
 
Marcos Vinicius Furtado Coêlho – Em primeiro lugar, para destacar a seccional da OAB na Bahia, a atual gestão, liderada pelo presidente Luiz Viana para o conjunto do movimento da advocacia brasileira. O presidente vem colocando a Bahia como protagonista em diversas causas, sendo o porta-voz da sociedade civil baiana e cuidando das prerrogativas dos advogados, comprovando que essas causas não são excludentes, mas são complementares. Em segundo lugar, para homenagear um estado que sempre foi pioneiro na evolução cultural, política e jurídica de nosso país. Em terceiro, para homenagear, dentre as personalidades da Bahia, uma em especial que merece toda a atenção da OAB, que se trata da figura de Ruy Barbosa, o patrono da advocacia do Brasil. Uma pessoa que foi além do seu tempo, não só no Direito. Homenagear Ruy significa destacar suas ideias republicanas. Ruy era alguém que defendia que a república fosse algo coerente com a sua denominação – república quer dizer res pública, ou coisa pública. Assim deve ser tratada nossa nação, como algo que pertence a todo, e não que pertence a poucos. Devemos lutar contra o patrimonialismo.
 
BN – A OAB-BA tem puxado uma discussão muito grande sobre a Justiça baiana. Como a OAB nacional enxerga essa atuação e como pode ajudar a trazer proposta para a melhoria do Judiciário, principalmente da primeira instância?
 
MVFC – É importante que o Judiciário cumpra com sua função de distribuir a Justiça a todos os brasileiros com agilidade e eficiência. Para isso, é necessário que o Judiciário se planeje, seja mais transparente, se organize e seja mais profissional na estrutura. Principalmente nos recursos do Judiciário, que devem deixar de ficar encastelados nos tribunais e devem ser espalhados na primeira instância. A OAB entende que a conduta ética dos magistrados é importante para a prevalência da imparcialidade necessária aos julgados dos juízes. Um juiz parcial já é sinônimo de injustiça. 
 
BN – Como tem sido a campanha nacional pelas prerrogativas dos advogados?
 
MVFC – Temos dito que o advogado valorizado significa o cidadão respeitado. As prerrogativas são exercidas pelos advogados, mas pertencem ao cidadão. Temos lutado no Congresso Nacional para que o inquérito policial em todas as investigações contem com a presença do advogado. Também temos lutado pela criminalização da violação das prerrogativas dos advogados. Por outro lado, [também lutamos pela] a valorização de algo importantíssimo e essencial para a sobrevivência da profissão que são os honorários advocatícios. Lançamos uma campanha com o seguinte lema: “Honorários dignos, questão de justiça” contra o aviltamento dos honorários advocatícios. Conseguimos, no novo Código de Processo Civil, um importante avanço nessa matéria. 
 
BN – A OAB tem sido proativa em diversas proposições, como o lançamento de um projeto de reforma política. O que a Ordem tem defendido nessa matéria? Como é possível esse projeto sair do papel?
 
MVFC – A OAB entende que a reforma das reformas é a política. Temos que modificar a forma com que a representação popular é eleita. O atual sistema político-eleitoral é o principal responsável pelo desvio de conduta do homem público. Eles já começam a campanha eleitoral tendo que submeter e praticar atos indevidos de financiamento de campanha pelo caixa dois, praticando atos de corrupção eleitoral, abuso de poder político e econômico. O que esperar de um político eleito nessas bases? O mandato será algo não a serviço do povo que o elegeu, mas um mandato que prestará contas aos investidores da campanha. É preciso dar um basta nesse estado de coisas, sem qualquer tipo de generalização. Nossa proposta não é contra os políticos, mas a favor da política feita com ética. Temos que chamar atenção que é preciso alterar a forma de financiamento das campanhas e a forma de fazer campanha, que não pode ser pautada em personalismos e gastos milionários, mas em defesa de ideias e propostas dos candidatos. Quem pensa de forma sincera no atual sistema eleitoral, quem refletir sobre o assunto despido de interesses pessoais, chegará à mesma conclusão. Hoje uma reforma política em nosso país que aprofunde a democracia, assegure o voto livre do eleitor e diminua a compra de votos, criminalizando o caixa dois de campanha, limitando o máximo de gastos da campanha pelo Tribunal Superior Eleitoral.
 
 
BN – Como esse projeto se tornaria realidade?
 
MVFC – Somente com a pressão da opinião pública e com um projeto de lei de iniciativa popular. Estamos colhendo assinaturas e o estado da Bahia certamente será recordista nesta coleta para que a população diga que queremos eleições limpas neste país. Queremos apresentar ao Congresso dois milhões de assinaturas para o projeto de reforma política. 
 
BN – E como seria o financiamento de campanha? Público?
 
MVFC – Não chamamos de financiamento público, mas de financiamento democrático de campanha. Nele, as empresas não participarão, mas as pessoas físicas contribuirão em até R$ 700, porque o cidadão é que bancará as campanhas. Além da aplicação do fundo partidário, hoje já existente, que será incrementado no ano das eleições. Mas a nossa proposta parte de outro princípio, que é o barateamento das campanhas eleitorais. Jamais se poderia imaginar uma forma de financiamento público para bancar essas campanhas milionárias. É um financiamento democrático, em que todos tenham igual acesso aos recursos, mas em uma campanha modesta. Uma campanha simples. Uma campanha de discussão de ideias e projetos. Não esta campanha hollywoodiana que tem em nosso país. Se continuar nesse sistema atual, toda eleição você terá sucessão dos escândalos. 
 
BN – Já tem algum precedente desse no mundo que deu certo?
 
MVFC – Tem. Esse modelo que propomos já é aplicado em quase metade dos países da América e em nações como a França, a Bélgica e a Grécia. 
 
BN – Como seria o controle público dos recursos?
 
MVFC – Essa nossa proposta prevê a criação de um comitê formado por entidades da sociedade civil para o controle. Além disso, queremos mais transparência nas prestações de contas, inclusive online, para que todo eleitor possa acompanhar. Além da diminuição das estruturas de campanha. As campanhas eleitorais que são individuais hoje, devem passar a ser coletivas, para que haja um menor número de prestações de contas, logo a possibilidade do tribunal eleitoral apreciar as contas. No sistema atual, é um faz-de-conta o sistema de prestação de contas.
 
BN – Um dos pontos do projeto apresentado pela OAB é a eleição em dois turnos para o Congresso Nacional. Como isso aconteceria?
 
MVFC – No primeiro turno, a população votaria em uma lista de candidatos e propostas, definindo quantas vagas cada partido teria direito, e no segundo turno o povo votaria no nome do candidato para que ele pudesse flexibilizar a lista se assim entendesse por bem. Então você teria um primeiro turno para a campanha partidária, uma estrutura coletiva de candidatos, estimulando a aglutinação dos eleitos em torno de ideias e propostas. 
 
BN – Qual o posicionamento da OAB sobre a reeleição? A Ordem deve ser mantida? 
 
MVFC – A Ordem é contra a reeleição. Entendemos que a reeleição não é uma experiência positiva para o nosso país. O uso da máquina administrativa tem sido muito frequente e o ideal é que não haja reeleição ou, caso ela permaneça, que pelo menos haja a obrigação da desincompatibilização daquele que for se candidatar à reeleição seis meses antes das eleições.
 
 

 
BN – Qual o entendimento da OAB sobre o posicionamento do STF à frente do julgamento do mensalão?
 
MVFC – A OAB não tem posição sobre o mérito do julgamento do mensalão. Tenho dito que não é papel da Ordem fazer julgamento de casos. Até porque os casos têm advogados de ambos os lados. Temos apenas nos manifestado sobre causas da república. Não temos um posicionamento específico para esse caso. Entendemos apenas que a lei deve ser aplicada para todos, não deve haver qualquer tipo de perseguição ou proteção pelo fato de o acusado ser ou deixar de ser autoridade. 
 
BN – Não é uma atribuição única e específica da OAB, mas a gente tem visto a Ordem propondo diversas ações diretas de inconstitucionalidade (Adin). O que tem levado a Ordem a provocar esse tipo de discussão?
 
MVFC – A Constituição dá expressamente à OAB a legitimidade para propor ações de inconstitucionalidade sempre que um ato normativo for considerado afrontoso à constituição. A Ordem é a voz constitucional da sociedade brasileira para tratar, em tese, de forma genérica de causas que interfiram na sociedade brasileira. Não podemos opinar sobre casos individuais, mas em causas coletivas, como esta que aprovamos hoje [segunda, 25]: uma Adin contra a discriminação em concurso público para mulheres, outra ação para que as biografias não dependam de autorização prévia do biografado e outra Adin para assegurar que os honorários de advogados privados sejam tratados com igualdade com os honorários da fazenda. 
 
 
BN – Qual a possibilidade da gente ter aprovado o projeto? É possível que a gente tenha algo encaminhado já nas próximas eleições?
 
MVFC – O Congresso aprovou recentemente uma minirreforma eleitoral que cuida apenas de perfumaria, de meros detalhes, que não terá qualquer consequência profunda no processo eleitoral. Para aprovar qualquer reforma profunda, somente com pressão da opinião pública, assinatura do projeto de lei. Esperamos apresenta-lo no próximo ano e, pelo princípio da anterioridade, já não valerá para as eleições do próximo ano. Contudo, nós ingressamos com uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal que objetiva fazer com que o Supremo declare inconstitucional o financiamento de eleições por empresas. Estamos solicitando ao relator Luiz Fux e ao presidente Joaquim Barbosa que possam pautar essa matéria o quanto antes. Se o Supremo declarar inconstitucional o financiamento de empresas, já valeria para as eleições do ano que vem, porque não se trataria de uma nova lei, mas apenas uma interpretação da norma em vigor.
 
BN – Qual a possibilidade do Conselho Federal fazer sessões em outras capitais do Brasil, como aqui em Salvador?
 
MVFC – Estamos começando essa sessão do Conselho Federal da Ordem itinerante aqui em Salvador, que é uma experiência bastante exitosa e tende a inspirar a realização de audiências semelhantes nos anos seguintes em outras capitais. Contudo, queria celebrar o fato de estarmos na Bahia, em um estado inspirador.