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18 anos, e aí?

Por Pedro Henrique Duarte

18 anos, e aí?
Foto: Arquivo Pessoal

Desde 2003 a maioridade civil passou a ser, assim como no âmbito penal, aos 18 anos. Ambas trazem uma série de responsabilidades, sobretudo, no que diz respeito à sujeição às regras e aos julgamentos pelos próprios atos. A advocacia, assim como um bom vinho, evolui com um tempo e a experiência, aliada ao conhecimento técnico, proporcionam uma maturidade ao defensor.

 

Ao longo desses 18 anos, pude perceber uma significativa mudança no modelo da advocacia criminal baiana, antes capitaneada por alguns renomados criminalistas, a exemplo de João de Melo Cruz, Genaro de Oliveira, Tilson Santana, Fernando Santana e Edson O’dwyer, agora, liderada por grandes e muito organizados escritórios, notadamente na área empresarial penal.

 

A árdua ida à Rua do Tingui, no bairro de Nazaré – sede antiga do Fórum Criminal desta Capital –, para despachar e acessar os autos, ainda físicos, trazia um contato diário com os colegas, com o cidadão e, o mais importante, com os serventuários e Magistrados.

 

A evolução do processo digital – que foi catapultada sobremaneira com a pandemia COVID-19 – afastou o advogado dessa lida diária e profícua, além de trazer, na minha modesta opinião, um retrocesso na atuação profissional.

 

O ato de conhecer o processo fisicamente, sem as facilidades que a leitura dos autos digitais determina, proporcionava a compreensão clara e objetiva do iter processual, algo hoje mais distante para os advogados.

 

Falar em processo físico para os que formaram há pouco tempo, é algo muito distante, talvez comparado à antiga fita cassete.

 

Sob outro enfoque, falar sobre os benefícios do processo judicial eletrônico é lugar comum. No entanto, como tudo na vida, a transformação e o fim dos processos físicos têm, sim, alguns pontos negativos e, é sobre isso, que o presente artigo versa.

 

Sem pretender radicalizar, ou mesmo criticar o modelo eletrônico atualmente em pleno funcionamento no Judiciário Brasileiro, é imprescindível que olhemos para os malefícios que tal formatação trouxe para os jovens advogados, que se afastaram do iter processual e tal postura tem impulsionado um distanciamento do roteiro que o causídico deve percorrer no curso de um processo. Ou seja, há uma grande lacuna que nada mais é do que conhecer os procedimentos e sua sequência logico-processual.

 

Coincidência, ou não, a informatização processual passou a ser regulamentada desde 2006 – primeiro ano de funcionamento do escritório Pedro Henrique Duarte –, com o advento da Lei nº 11.419/2006 e, a partir de então, o processo físico passou a sucumbir, afastando, como dito reiteradas vezes, o advogado do seu principal instrumento de trabalho e, o pior, do contato com os serventuários e julgadores, que tem grande significado na defesa processual, quando se afasta, obviamente, o popularmente conhecido lobby, que deve ser combatido veementemente.

 

Não bastasse essa consequência nefasta, a falta de leitura (digo leitura geral) pelos jovens das duas últimas gerações também tem causado um distanciamento do aprendizado.

 

Aqui, abra-se um parêntese, para registrar que não se busca contrapor, ou mesmo diminuir, o jovem advogado – muitos deles, assim como em todas as gerações, preparadíssimos e brilhantes – ao defensor mais experimentado, mas sim, indicar pontos que se perderam ao longo dos anos e que merecem especial atenção, na busca incessante da valorização do advogado criminalista, profissão que escolhi e que vivo diariamente com muito orgulho.

 

Anote-se, nesse sentido, que inúmeros criminalistas das novas gerações – integrantes do século XXI – despontam como profissionais éticos, sérios, dedicados, compromissados e, sobretudo, muito preparados tecnicamente, a exemplo do Dr. Joel Mendes, atual Presidente da AACB, do Dr. David Daltro e do Dr. Matheus Biset, estes dois últimos, além de brilhantes advogados, tal como Dr. Joel Mendes, lecionam para inúmeros alunos que pretendem um dia se tornar bacharéis em Direito. Sim, bacharéis, pois a formação em direito, que traz amplas possibilidades, e a constante desvalorização do advogado tem afastado os formandos dessa magnifica profissão, que vivo, que aprendo e que sofro - aqui, interpretando Antonio Manuel de Carvalho Neto.

 

O distanciamento referido não para por ai. Ele trouxe, repita-se, outro grave problema, que diz respeito à falta de contato com os serventuários e julgadores. É muito mais cômodo o assessor atender virtualmente o advogado, do que o próprio julgador despachar pessoalmente com o representante da parte. Ocorre, entretanto, que isso, além de violar prerrogativas do advogado, bem como a ampla defesa e o contraditório, garantias inegociáveis do defendido, afasta o jurisdicionado ainda mais do julgador, pois seu único e legitimo representante não consegue, na maioria das vezes, obter uma audiência com o Juiz da causa e, então, deixa, de alguma forma, de exercer seu múnus público de defender os seus constituintes

 

Enfim, tempos sombrios.

 

Ao largo disso e, mesmo não sendo o intuito desse artigo tratar das mazelas da advocacia criminal, é importante lembrar que o processo penal midiático tem prejudicado – de maneira extremamente danosa – a defesa do réu no processo penal. No entanto, tal como asseverado pelo festejado TÉCIO LINS E SILVA, ao contrário do que deveria ocorrer, alguns advogados ainda insistem em que seus “seus clientes alimentem as páginas policiais...”, maculando ainda mais a advocacia criminal.

 

Parafraseado a brilhante advogada criminalista baiana, Dra. Milena Pinheiro, em seu discurso recente no evento comemorativo dos 08 anos da AACB – Associação dos Advogados Criminalistas da Bahia, instituição presidida por ela na gestão anterior, é notório que o: “...crescimento tecnológico avassalador, que exige do advogado não apenas lutar pela defesa técnica propriamente dita, mas também se adaptar as audiências virtuais e aos diversos sistemas eletrônicos processuais, que muitas das vezes, indiretamente, impulsionam graves violações de prerrogativas, as quais devem ser atenta e precisamente combatidas...”, tem-se que o avanço tecnológico é inquestionável e irremediável, mas, de forma paralela, é fato que o enfrentamento às mazelas sofridas pelo advogado criminalista não se cingem ao constante e absurdo crescimento na violação de prerrogativas.

 

É necessário, pois, que os jovens advogados – muito mais preparados do que nós, “antigos advogados”, na questão digital – possam voltar um pouco no tempo e passem a adotar medidas necessárias à boa e fiel aproximação do processo, tal como ocorria na era física dos autos, o que gerou, inclusive, a figura do rábula...

 

Esse é um pouco do legado que trago ao longos os 18 anos de atuação na advocacia criminal baiana, atuando sempre de forma ética, leal e enfrentando as mazelas inerentes à profissão. Mas, como o espaço aqui reservado traz uma certa limitação, proponho retornar com maiores e mais aprofundadas análises acerca do tema em outra oportunidade.

 

*Pedro Henrique Duarte é advogado criminalista, formado pela UCSAL em 2005, sócio do escritório Pedro Henrique Duarte Advocacia, membro do IAB – Instituto dos Advogados Nacional, membro da AACB – Associação dos Advogados Criminalistas da Bahia, pós-graduado em Direito Público, ex chefe de Gabinete da FMLF – Fundação Mário Leal Ferreira (2000/2004), ex-assessor parlamentar na ALBA – Assembleia Legislativa da Bahia (2006), ex-assessor da Presidência da EBDA – Empresa Baiana de Desenvolvimento Agrário (2007/2011), ex-assessor de gabinete no TCE – Tribunal de Contas do Estado da Bahia (2020/2023), especialista em Direito Penal e Responsabilidade Médica, escritor e palestrante

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias