Usamos cookies para personalizar e melhorar sua experiência em nosso site e aprimorar a oferta de anúncios para você. Visite nossa Política de Cookies para saber mais. Ao clicar em "aceitar" você concorda com o uso que fazemos dos cookies

Marca Bahia Notícias Justiça
Você está em:
/
/

Artigo

Liberem o edital da licitação!

Por Roberto Soledade

Liberem o edital da licitação!
Foto: Divulgação

O Tribunal de Contas da União (TCU) editou recentemente o Acórdão nº 3192/2016, cujo teor encontra-se sintetizado no seu Informativo de Licitações e Contratos nº 314: “É irregular exigência de que o edital e seus elementos constitutivos sejam retirados apenas na sede do município. A exigência da presença física do interessado na prefeitura para a obtenção de cópia do edital afeta o interesse de empresas localizadas a distâncias maiores do município de participarem do certame, reduzindo a competitividade da licitação”.
 
Apesar de aparentemente se revelar uma conduta absurda, infelizmente são frequentes as vezes em que os licitantes são obrigados a se submeter a uma verdadeira gincana para obter um mero edital de licitação, seja pela cobrança desproporcional pelo fornecimento da cópia, seja pela obrigatoriedade de dirigir-se pessoalmente à sede do órgão para obtenção do documento. Assim, o objetivo do presente artigo é ressaltar a necessidade de se garantir a facilidade de acesso ao edital da licitação, à luz do que dispõem as Leis Federais nº 8.666/93 e 12.527/11, essa última mais conhecida como Lei de Acesso à Informação (LAI).
 
Quando se trata da disponibilização dos editais, a Lei Geral de Licitações se limita a determinar que o prazo mínimo para apresentação das propostas, respeitadas as exigências de publicação do respectivo aviso, somente será contado a partir da "efetiva disponibilidade do edital ou do convite e respectivos anexos" (art. 21, § 3º). Mais adiante, estipula que para fornecimento do edital a Administração somente poderá cobrar taxa limitada ao valor do custo efetivo de reprodução gráfica da documentação fornecida, desde que solicitado pelo interessado (art. 32, § 5º).
 
A disponibilização do edital é importante para dar oportunidade ao interessado de formular a sua proposta, bem como a cobrança pelo fornecimento da documentação não poderá exceder o seu custo reprográfico. Todavia, na prática, é comum que o edital não esteja disponível concomitantemente com a publicação do aviso da licitação, acarretando subtração de prazo para formulação da proposta, além da estipulação de taxas de fornecimento arbitradas de forma excessiva, vez que superam em muito o custo da reprodução gráfica do material.
 
Ainda que sejam condutas desprovidas de dolo, a sua ilegalidade é patente e merecem ser combatidas pelas empresas que participam de licitações, que poderão recorrer tanto à via da impugnação administrativa, quanto à representação ao Tribunal de Contas competente (art. 113, § 1º, da Lei Federal nº 8.666/93). No caso específico do Acórdão TCU nº 3192/2016, o proprietário de uma empresa que se sentiu prejudicada formulou representação ao TCU, noticiando, dentre tantas outras, a irregularidade quanto à exigência da retirada do edital apenas na sede do órgão (Prefeitura Municipal de Jurema - PI).
 
Em plena era da informação, na qual os meios de comunicação encurtam distâncias, é realmente inconcebível que uma empresa para apenas tomar conhecimento de uma licitação tenha de se dirigir presencialmente à sede do órgão responsável pelo certame, que poderá estar situada a centenas de quilômetros do seu próprio estabelecimento. Não bastasse ser algo que visivelmente compromete a ampliação da competitividade, a exigência é flagrantemente ilegal, pois contraria a Lei de Acesso à Informação, que determina a divulgação do edital na internet (art. 8º, §§ 1º e 2º).
 
Assim, a disponibilização do edital na internet é hoje uma regra obrigatória para os órgãos da Administração Pública, o que apenas reforça a tese da impossibilidade legal de exigir dos licitantes o comparecimento ao órgão para ter acesso ao instrumento convocatório. Ainda que a Prefeitura Municipal de Jurema, cuja sede dista cerca de seiscentos quilômetros da capital do Estado do Piauí (Teresina), tivesse dificuldades em manter uma página na internet que disponibilizasse o conhecimento das regras do edital, caberia, nessa hipótese, a remessa do documento por e-mail, fax ou via postal.
 
Quem tem o hábito de participar de licitações sabe que, em essência, o acesso ao instrumento convocatório é condição básica para avaliar a conveniência ou não de compor a disputa pela contratação. Muitas vezes a análise dos termos do edital leva à conclusão de que o futuro contrato não atende aos interesses comerciais da empresa, levando-a a não apresentar proposta. Quando se exige o comparecimento à sede do órgão, situada em local de difícil acesso, a Administração está forçando o particular a despender tempo e dinheiro, para que ela simplesmente possa avaliar se o edital permite a sua participação no certame.
 
Em que pese a Lei de Acesso à Informação já estar em vigência há quase cinco anos, a sua repercussão no campo das licitações ainda não alcançou plenamente as finalidades almejadas pelo legislador. Até o próprio TCU contribui para tal descompasso, quando não traz nos seus julgados o embasamento da referida legislação, como é o caso do Acórdão nº 3192/2016, no qual inexiste menção acerca da obrigatoriedade de disponibilização do edital na internet. Sem que haja uma cobrança mais enérgica por parte dos órgãos de controle, as licitações poderão permanecer sem atender ao princípio da transparência, possibilitando a adoção de práticas que restringem a competitividade e militam contra o interesse público.
 

Roberto Soledade, advogado e especialista em controladoria governamental (FECAP).