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Um programa de compliance é realmente necessário? Quais são os passos para a implementação de um programa de compliance?

Por Wilson De Faria / Alessandra Gonsales

Um programa de compliance é realmente necessário? Quais são os passos para a implementação de um programa de compliance?
Foto: Divulgação
Atualmente, o termo Compliance tem sido utilizado com bastante frequência. Mas o que é Compliance? Em linhas gerais, Compliance é fazer a coisa certa. Dentro de uma perspectiva empresarial, isso parece óbvio, mas na realidade, a prática é um pouco mais complicada que a teoria.

O termo Compliance tem aparecido muito na mídia atualmente em função dos recentes escândalos da Operação Lava Jato, Zelotes e outras. Empresas envolvidas nestas investigações estão sendo acusadas de praticarem atos de corrupção. Acordos estão sendo firmados e até pedidos de desculpas formulados na promessa de que uma efetiva política de Compliance seja implementada.

 De acordo com a Lei n. 12.846/2013 (“Lei anticorrupção) e o decreto que a regulamenta (Decreto n. 8.420/2015), se uma empresa praticar, diretamente ou por terceiros, qualquer dos atos ilícitos, inclusive corrupção nela previstos, poderá ter sua pena reduzida caso comprove que possui um efetivo programa de Compliance. A existência de um programa de compliance efetivo é, na verdade, a maior  atenuante das penalidades administrativas previstas na Lei.

Mas as empresas devem ter um programa de Compliance apenas para ser utilizado como atenuante de penalidades caso pratiquem atos ilícitos? Obviamente que não.

O grande objetivo de um programa de Compliance é proteger e orientar os gestores e seus colaboradores, para que todos ajam de forma correta. O programa de Compliance serve ainda para identificar colaboradores que não estejam agindo conforme determina a lei ou as condutas internas da empresa. Serve também para identificar precisamente seus atos e fornecer os subsídios para a aplicação de penas adequadas. Finalmente, auxilia às empresas a formar o corpo probatório que poderá ser utilizado em sua defesa em processos judiciais ou administrativos causados por atos inadequados de seus colaboradores.
 
A principal missão das empresas é o lucro e sua perpetuidade. Para que a empresa possa continuar existindo por tempo indeterminado, é imprescindível que seus gestores, colaboradores e até terceiros ajam corretamente. As novas regras do jogo estão postas. Fazer negócios de forma ética e lícita é imprescindível, é pré-requisito, não é vantagem competitiva. Está cada vez mais evidente que as empresas que não entenderam isso não estarão mais enquadradas no ambiente de negócios.

Essa realidade está chegando cada vez mais próxima dos fornecedores das grandes multinacionais. Estas últimas possuem programas rigorosos de Compliance. Adicione-se a elas grandes empresas nacionais que saíram na dianteira e possuem programas robustos. Finalmente, existem ainda algumas grandes  empresas que foram ou estão sendo investigadas pelas recentes operações da Polícia Federal.  Essas empresas exigem ou irão exigir em curto espaço de tempo que seus terceiros, principalmente fornecedores, representantes comerciais e distribuidores também tenham programas sérios de Compliance. Aqueles que não conseguirem demonstrá-lo estão sendo descadastrados ou obrigados a implementa-los em curto espaço de tempo.

Nenhum programa de Compliance será efetivo se os terceiros da empresa não possuírem também mecanismos de prevenção, mitigação e controles que evitem as práticas de atos ilícitos, sobretudo corrupção.

Além disso, empresas que buscam investimentos, principalmente estrangeiros, também estão se deparando com a necessidade de comprovar que possuem programas de Compliance, para que a sua empresa seja bem avaliada e consiga o almejado investimento.
Esses fatos demonstram que as empresas que já possuem programas de Compliance ainda estão no jogo. As que não possuem sairão em breve ou ficarão para trás.

E o que aquelas empresas que ainda não possuam programa de Compliance precisam, então, fazer? O Decreto da Lei Anticorrupção detalha, de forma objetiva, os pilares de um programa de Compliance, que são:

•       Comprometimento da alta direção;
•       Padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos integridade aplicáveis aos colaboradores e estendidos a terceiros;
•       Treinamentos periódicos; 
•       Análise periódica de riscos;
•       Registros contábeis que reflitam de forma precisa as transações financeiras;
•       Controles internos;
•       Procedimentos específicos para prevenir fraudes e ilícitos em qualquer interação com o poder público, ainda que intermediada por terceiros; 
•       Independência e autoridade do compliance officer;
•       Canais de denúncia amplamente divulgados;
•       Medidas disciplinares e procedimentos que assegurem a pronta interrupção de irregularidades ou infrações;
•       Diligências apropriadas para contratação e supervisão de terceiros (ex. Política de Contratação de Terceiros); 
•       Due Diligence em processos de fusões, aquisições e reestruturações societárias;
•       Monitoramento contínuo; e
•       Transparência quanto a doações para candidatos e partidos políticos.
 
Este último item não é mais aplicável em decorrência de recente decisão do Supremo Tribunal Federal que passou a proibir doações de empresas para candidatos e partidos políticos. É recomendável, no entanto, que as empresas possuam transparência quanto a doações filantrópicas e patrocínios.
 
Diante destes pilares previstos no Decreto, a primeira pergunta que surge é: por onde começar? Não é à toa que o primeiro pilar de um programa de Compliance é o apoio da alta administração. A alta administração tem que entender a importância de um programa de Compliance e realmente estar disposta a implementá-lo. Caso contrário, a empresa pode até possuir políticas,  treinamentos, etc., mas, na prática, não terá um programa efetivo e, portanto, não conseguirá atingir os objetivos aqui descritos, inclusive de proteção/ orientação de que os gestores estão agindo de forma correta.
 
Tendo a alta administração se convencido da necessidade do programa de Compliance e estando disposta a disponibilizar os recursos financeiros e de pessoal necessários à sua execução, o próximo passo é a nomeação de um profissional que será responsável pela área de Compliance e o seu primeiro trabalho deverá ser a realização ou a contratação, se não conseguir efetuar diretamente, de uma avaliação de risco para entender a riscos inerentes aos negócios da empresa e quais são os principais desafios  quando da implementação de um programa de Compliance. É muito importante que as empresas entendam que não existe um formato de programa de Compliance aplicável a todas as empresas. Cada empresa é única e únicos são os seus problemas e riscos.
 
Após essa avaliação de riscos, o Compliance officer poderá iniciar efetivamente o seu trabalho, atuando, com base no resultado da referida avaliação, nas prioridades da empresa. Por exemplo, quais políticas devem ser inicialmente elaboradas ou revisadas? Se o grande risco envolver terceiros, pois as vendas podem ocorrer por atuação de terceiros, certamente a política de contratação de terceiros e comunicação/ treinamento para os principais terceiros, será uma prioridade. Se, no entanto, a força de vendas está dentro da empresa e está tem atuação constante com o Poder Pública, além do código de ética, é importante a empresa elaborar ou revistar a sua política anticorrupção que precisará ser divulgada para todos os colaboradores, mas, principalmente, para a força de vendas.
 
O objetivo final de um Compliance officer é implementar e conseguir comprovar para terceiros, se necessário, que todos os pilares aqui citados foram implementados. Depois de realizar este trabalho, sua missão foi cumprida? Sim, parcialmente. Assim como a empresa é dinâmica, o programa de Compliance também deve ser. Periodicamente, a análise de riscos deve ser realizada justamente para que sejam revistos os riscos anteriormente apurados e levantados os novos existentes. É um trabalho continuo de aprimoramento.
 
Portanto, um programa de Compliance é hoje imprescindível para que as empresas se mantenham no atual ambiente de negócios. Como visto acima, o Brasil adotou parâmetros claros do que deve ser um programa de Compliance, parâmetros estes explicitados no Decreto Presidencial que regulou a Lei Anticorrupção. As regras estão postas. Fazer a coisa certa é o nome do jogo e Compliance é uma imposição do nosso novo mercado.
 
 

Wilson De Faria
Sócio fundador da WFaria Advocacia, é advogado e administrador de empresas, pós-graduado em Direito Tributário, mestre em Administração pelo INSEAD/França, membro do STEP- Trust and Estate Practicioner. Wilson é atuante no Direito Corporativo com 25 anos de experiência na área de direito tributário e compliance. Professor de Direito no curso de LLM em Direito Empresarial do CEU-IICS.
 
Alessandra Gonsales
Sócia do WFaria Advogados, responsável pela área de Governança, Risco e Compliance e da LEC (Legal, Ethics and Compliance), mestre em Direito Comercial, tendo realizado as pesquisas acadêmicas na Universidade de Harvard.