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As irregularidades acerca da cobrança do foro pelo município de Salvador

Por Marília Andrade

As irregularidades acerca da cobrança do foro pelo município de Salvador
Foto: Divulgação
Conforme vem sendo noticiado através dos veículos de comunicação, muitos cidadãos foram surpreendidos ao longo do mês de julho do ano corrente, pelo recebimento de notificação expedida pela Prefeitura de Salvador, sobre a obrigatoriedade do pagamento do chamado “foro” ao Município.
 
Este fato fez com que surgissem dúvidas por parte daqueles notificados, a respeito da obrigatoriedade da realização deste pagamento e o motivo pelo qual a cobrança estava sendo realizada, ou seja, o seu embasamento legal.
 
Para efetivar a cobrança, a Prefeitura de Salvador expediu carnês aos cidadãos que possivelmente adquiriram bens imóveis originados de terras pertencentes ao Município, conforme pode ser constatado em escritura pública, discriminando histórico com o fim de tentar convencê-los da obrigatoriedade de quitar a quantia descrita.
 
Isto porque, no intuito de reorganizar o cadastro imobiliário e ampliar a receita da Capital Baiana, a Secretaria Municipal da Fazenda, publicou a Instrução Normativa nº 4, de 23 de janeiro de 2014, que estabelece os procedimentos adotados, relativos ao lançamento e recolhimento do foro, laudêmio, resgate de enfiteuse e multa pela falta de averbação, entre outras providências.
 
Desta forma, de acordo com a legislação municipal, no momento em que o cidadão recebe a cobrança do foro, tendo como base para pagamento o valor mínimo 0,6% (seis décimos por cento) do valor atualizado do domínio pleno do terreno, ficará, também, sujeito ao pagamento do laudêmio, no valor de 2,5% (dois e meio por cento) sobre o preço da alienação.
 
Além disso, caso haja interesse do foreiro em adquirir o domínio direto do bem imóvel, este deverá recolher o valor do laudêmio, somado a 10 (dez) valores de foro para que a transferência se perfaça, além de outras regras procedimentais, como, por exemplo, a instauração de processo administrativo.
 
Neste passo, é importante destacar, de pronto, que o foro se trata de receita patrimonial, haja vista que valor cobrado pela Prefeitura é resultante de uso de bens públicos por terceiros. Esta receita tem como finalidade custear as despesas do Município e as necessidades de investimentos públicos.
 
Portanto, de maneira mais específica, o foro se define como o pagamento anual realizado pelo foreiro ou enfiteuta, sendo este o adquirente do imóvel, em favor do senhorio da propriedade, neste caso o Município do Salvador, originado do uso das terras foreiras.
 
Quanto à obrigatoriedade do recolhimento do laudêmio em favor do Município, este será devido sempre que o domínio útil do imóvel for repassado a outrem. Assim, o referido recolhimento será devido toda vez que o imóvel for vendido.
 
Frente à comoção social gerada por tal cobrança, como primeira reflexão crítica acerca do tema, não se pode deixar de mencionar os casos de irregularidades nas notificações expedidas indevidamente, como, por exemplo, nos casos das cobranças enviadas aos proprietários de bens imóveis situados no bairro de Patamares, que não possuem em sua escritura pública qualquer registro de enfiteuse ou terreno de propriedade do Município.
 
Conforme noticiado, na década de 70, a área conhecida como bairro de Patamares, à época nomeada de Fazenda Jaguaribe, foi adquirida pelo Sr. Waldemar Gantois, que passou a ter o domínio direto do terreno, antes pertencente ao Município, deixando de ser considerado como terreno de enfiteuse.
 
Posto isto, não há dúvida que a obrigatoriedade do pagamento do foro deveria ser precedida de processo administrativo, capaz de verificar se aquele imóvel se trata, de fato, de terreno foreiro do Município, a fim de possibilitar a apuração da legitimidade real da cobrança.
 
Além disso, apesar de existir a necessidade de reorganização da Prefeitura do Município do Salvador, quanto aos referidos cadastros, dentre outros aspectos de competência municipal, a fixação de novas obrigações impostas aos cidadãos soteropolitanos, deve cumprir os preceitos legais e o princípio da ampla defesa e do contraditório, o que não ocorreu na espécie.
 
Em verdade, restou ao cidadão notificado, buscar, em curto período, documentos comprobatórios que demonstrassem as irregularidades da cobrança, questionando, por meio de impugnação administrativa, os equívocos cometidos pela Prefeitura Municipal de Salvador.
 
Deste modo, restou flagrante a violação à ampla defesa, haja vista que foi dado ao contribuinte um curto prazo para apresentação de defesa perante a Prefeitura, além de exigir do contribuinte uma robusta documentação para que seja analisada a possível descaracterização da cobrança.
 
De mais a mais, de acordo com a legislação municipal, a base de cálculo para o pagamento do foro, tem como valor mínimo o percentual de 0,6% (seis décimos por cento) do valor venal atualizado do imóvel. Contudo, embora o Código Civil vigente proíba a constituição de enfiteuses e subenfiteuses, ele subordina as existentes, até a sua extinção, ao Código Civil de 1916 que, em seu artigo 678, estabelece o pagamento do foro como sendo de valor certo, anual e invariável.
 
Destarte, o foro deve ter valor módico, ou seja, simbólico, não sendo compatível a sua atualização com base no valor venal do imóvel, conforme força a supramencionada legislação municipal. Nesta mesma linha, torna-se importante ressaltar, que o cálculo do foro deve ser realizado com base no terreno, desconsiderando as edificações realizadas no local.
 
Frente às irregularidades cometidas pela Prefeitura Municipal de Salvador, faz-se necessário esclarecer ao cidadão soteropolitano que, caso não sejam sanadas as irregularidades na cobrança do foro, através da via administrativa, ainda existirá a alternativa de socorre-se da via judicial para preservar o seu direito.
 
Desta mesma forma, aqueles cidadãos notificados que, por algum motivo, não puderam apresentar defesa na esfera administrativa para impugnar tal cobrança, poderão levar as irregularidades do caso ao Poder Judiciário, a fim de que sejam sanados os equívocos cometidos pela Prefeitura Municipal de Salvador.