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Superação e persistência: paratleta campeã mundial da canoagem conta sua história

Por Leandro Aragão

Superação e persistência: paratleta campeã mundial da canoagem conta sua história
Foto: Paulo Victor Nadal / Bahia Notícias

A paratleta baiana Nayara Falcão, de 33 anos, sagrou-se campeã mundial de canoagem maratona na cidade de Pietermartizburg, na África do Sul, nos últimos dias 4 e 10 de setembro. "Foi uma grande façanha. Foi um grande resultado de persistência, resiliência e de muita determinação, porque muitos foram os obstáculos e que se eu realmente não tivesse fé e não tivesse firmeza, eu tombaria. Não tombei porque estava sendo estimulada e incentivada com essa energia e isso foi o diferencial, de você receber das pessoas", vibrou ela.

Foto: Arquivo Pessoal

 

Os muitos obstáculos de Nayara começaram em 2013, com um câncer de tireóide que depois evoluiu para uma leucemia. Recuperada das doenças, mas devastada psicologicamente e emocionalmente, ela foi retomar a sua felicidade através do esporte, pois como ela mesma diz, é a sua válvula de escape. Ela disse que sempre foi atleta desde muito nova e praticou natação, karatê e futebol. À procura da felicidade, Nayara colocou na cabeça que disputaria uma prova de Ironman. Sem ter o apoio dos mesmos profissionais de antes do câncer, por motivos pessoais deles, ela recebeu a ajuda de um amigo para treiná-la. Em 2014 começou a preparação, mas também um novo pesadelo. "Ele não teve a responsabilidade e competência de me acompanhar. Ele não tinha a preocupação de saber que (esporte de) alto rendimento, que todos nós sabemos que não é saudável, mas não atenta contra a vida. É uma escolha. Eu fui acompanhada por um pseudo profissional que era do fisiculturismo. Então, ele me passou uma dieta extremamente restritiva que era incompatível com os meus treinos", contou. O excesso de treinos e precária alimentação levaram o corpo de Nayara à um colapso. "O corpo é uma máquina e era como se você andasse num carro sem gasolina, então uma hora o motor vai bater e foi o que aconteceu. O músculo responsável por fazer a gente andar, ficar em pé morreu. O overtraining causou uma síndrome de rabdomiólise, que é caracterizada pela destruição total ou parcial das fibras musculares. Então a tíbia anterior, por ser um músculo pequeno e muito essencial para o nosso caminhar e para quem quer fazer uma atividade física de correr, morreu dentro de mim. Então, com algo morto dentro de um organismo vivo, ele libera muitas toxinas e isso cai diretamente no sangue", explicou. Segundo Nayara, o quadro evoluiu para um falência dos órgãos. E o primeiro a ser sobrecarregado foram os rins, depois os pulmões. Ela contou que os médicos demoraram de dar o diagnóstico, já que o problema dela só tinha sido visto na literatura médica. A esta altura, os doutores já não sabiam mais como lidar. "Mas aí do nada o rim voltou a funcionar. Alguns que não creem e não tem fé, vão dizer que foi sorte, mas para mim foi o momento de uma intervenção maior, porque não era o meu momento. Era um momento de reação, superação e de força. Eu encontrei muito isso através de minha mãe. Ela disse: 'Você não vai desistir. Você não ouse desistir!'. Foram dores inimagináveis, mas através do amor de minha mãe. Foi aí que eu fui encontrando forças nela, porque em mim já não encontrava mais", lembrou. Com a melhora do chamado filtro do corpo humano, os médicos decidiram amputar do joelho para baixo. No entanto, mãe e filha não permitiram que isto fosse feito e assinaram um termo de responsabilidade permitindo que fosse feito de tudo antes de optar pela amputação. Os médicos então fizeram uma fasciotomia nas pernas dela, que são microcortes para vizualizar o que estava morto, o que estava morrendo e o que poderia sobreviver. Foram 60 dias retirando músculo tibial e sem anestesia, já que poderia afetar na recuperação do fígado e do pâncreas. Mas foi o que a salvou e ela foi terminar o tratamento em casa. Sem poder andar, Nayara contou que algo à forçou a se levantar. Durante as madrugadas, sozinha, ela lutava para ficar em pé, o que machucavam as feridas das cirurgias. "Mas foi isso que fez com que eu andasse, porque não deixei morrer o que estava morrendo", afirmou. O próximo passo do tratamento foi a fisioterapia. Lá Nayara voltou a andar. De sequelas, ela sente dores intermitentes. "O meu sistema nervoso central gravou a dor e então ele manda a mensagem de dor o tempo todo. Minha dor não é local, ela está aqui na região da cabeça, é algo que fica latejando", disse. Além dos pés dela que ficaram rígidos e as garras aumentando e ficando tortas. "Os médicos também dizem que eu posso voltar a não andar, mas eles também não tem certeza disso", afirmou. Para levantar sua auto-estima novamente, mas dessa vez com uma deficiência, Nayara foi procurar na internet um esporte que ela pudesse praticar, mas que ao mesmo tempo não mostrasse a que ela tinha um problema. Foi aí que ela encontrou a canoagem em 2015. "Dentro do barco você está normal como todo mundo. E sempre amei a água e o mar", disse. Ao procurar uma referência no esporte, ela encontrou Fernando Fernandes, o ex-BBB que se tornou paratleta após um acidente deixá-lo paraplégico. Ela entrou em contato com ele pelo Instagram e foi respondida. Fernando estava indo para Salvador para um evento e os dois se encontraram no Porto da Barra. "Ele já foi logo me dando uma cacetada. Ele disse: 'Olha, não quero saber o que foi que teve com você, não quero saber dos seus problemas, eu quero saber como posso ajudar você'. Isso para mim foi muito importante, porque eu ainda estava naquela fase de coitada, de vítima", contou. Fernando a chamou para disputar uma prova em São Paulo e na sua estreia, Nayara conseguiu um segundo lugar.

Nayara Falcão e Fernando Fernandes | Foto: Arquivo Pessoal

 

Porém, sem ter equipamento para treinar e nem local em Salvador, ela chegou a desistir. Mas em 2017 Nayara retomou as competições. Na primeira prova disputada em Curitiba, em março, ela ficou na primeira colocação. O triunfo também lhe rendeu um convite para treinar na capital paranaense. Ela se mudou para o Paraná e foi morar de favor na casa de um amigo do amigo dela. Já em maio, ela venceu o Campeonato Brasileiro de Canoagem de Maratona, em Brasília e conseguiu a classificação para o Mundial na África do Sul. A história para por aqui? Não, já que ela não tinha dinheiro para bancar a viagem internacional. Foi então que ela foi abraçada pelo Projeto Oxente e organizaram uma vaquinha virtual que lhe rendeu R$ 12 mil e possibilitou a viagem. Atualmente Nayara voltou a morar em Salvador por causa da estrutura que tem com fisioterapeuta, nutricionista, preparador físico, academia. Além disso, Fernando Fernandes está vindo morar na capital baiana e os dois estão em processo para obter uma licença ambiental para poder treinar no Parque de Pituaçu. Ela também ganhou um barco de presente do paratleta.