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Entrevista

Filho de João Goulart resgata ideias do pai para concorrer à Presidência em 2018 - 05/03/2018

Por Ana Cely Lopes / Bruno Luiz / Guilherme Ferreira

Filho de João Goulart resgata ideias do pai para concorrer à Presidência em 2018 - 05/03/2018
Fotos: Tiago Dias / Bahia Notícias

No início da década de 60, as reformas de base estavam na pauta da política brasileira por conta do governo do então presidente João Goulart, conhecido como Jango, que defendia transformações estruturais nas questões agrária, fiscal, por exemplo. Mais de 50 anos depois, o debate pode voltar à tona por meio do seu filho, João Vicente Goulart. Pré-candidato à presidência da República pelo PPL, ele propõe que as reformas que não puderam ser colocadas em prática pelo seu pai saiam finalmente do papel. Em entrevista ao Bahia Notícias, ele falou em criar um “Estado musculoso, mas não gordo, repleto de sobras”, caso ele ocupe o cargo máximo do governo federal e lembrou sempre com saudosismo do governo de Jango. “Me sinto muito honrado como brasileiro de poder, através do Pátria Livre, trazer novamente para o debate nacional o programa das reformas de base. E quais são? Reforma agrária, reforma urbana, reforma tributária, reforma educacional, lei de remessas de lucros... todo um arcabouço de reformas que trariam ao país um novo pilar de desenvolvimento, principalmente do mercado interno, para que o povo brasileiro seja dono do seu destino”, declarou. Ciente das dificuldades impostas pelo curto tempo de televisão para o PPL e pela pequena fatia do fundo de financiamento partidário, ele ainda demonstra confiança em um crescimento nas pesquisas de intenção de voto. "Política não se faz somente eleitoral. Se faz com o coração, com a alma e com a história", disse Goulart, quando questionado sobre sua condição de se tornar um candidato competitivo ao longo da campanha. Ele ressaltou ainda que a sua pré-candidatura ao Palácio do Planalto é também uma questão de sobrevivência para o PPL, que, assim como outros partidos de menor porte, precisam superar a cláusula de barreira para continuar tendo acesso aos recursos do fundo partidário e ao tempo de TV e rádio. "Evidentemente que no pouco espaço que nós temos, nós vamos pedir voto de deputado federal para a legenda. Nossa prioridade é de fazer votos da legenda", comentou.


Muita gente não o conhece, principalmente aqui na Bahia, mas a história conhece o seu pai. Quais são os aspectos positivos e negativos de ser filho de Jango, quando se trata da construção de uma campanha presidencial?
Antes de mais nada, quero dizer que o PPL em minha vida é uma opção muito bem-vinda politicamente. Ser filho de Jango, evidentemente, traz uma bagagem histórica, política, uma história muitas vezes não muito de boas lembranças, mas outras vezes de muita responsabilidade e de orgulho de ser filho de Jango. Eu tenho um orgulho muito grande de ser filho de Jango porque a sua luta pelo Brasil se tornou referência. Referência no sentido de que Jango traz, 56 anos depois, um debate que ainda não foi realizado no país, que é o debate das reformas de base. O país vive hoje nessa crise institucional, política e econômica, no meu entendimento, é claro, por ainda não ter feito as reformas que a população brasileira necessita para o desenvolvimento do nosso país, da nossa cultura, nossa brasilidade, e principalmente de nossa soberania nacional. E essa história carrega um simbolismo muito grande porque o golpe de 64 não foi dado contra o presidente João Goulart. O golpe de 64 foi dado contra um projeto de nação brasileira que estava em andamento e isso instaurou no país 21 anos de ditatura. Esses 21 anos trouxeram não somente sofrimento, perseguições, mortes, torturas, fechamento do Congresso Nacional, controle da mídia, censura, assassinatos... inclusive desaparecimento de pessoas que lutavam contra um sistema ditatorial e que estavam presas sob a tutela do estado e desapareceram. Isso é uma parte. Outra parte é o que não foi feito e o que nós viemos propor ao Brasil. Nós já temos um serviço prestado ao Brasil, que é essa luta constante no caminho da redemocratização brasileira. E nós vemos hoje que aquele golpe não foi contra o presidente, foi contra um projeto de nação do governo João Goulart. Então é uma responsabilidade muito grande carregar o nome de Jango, mas é muito orgulho. Nós trazemos dentro de um partido pequeno, limpo e puro a proposta de reformar as estruturas brasileiras e atualizar as reformas de base de 1964.

 

O Partido Pátria Livre foi fundado em 2009. Então muitas pessoas não conhecem a ideologia do partido. Quais são as principais bandeiras defendidas por ele?
Sou fundador do PDT e inclusive sou signatário da Carta de Lisboa, que foi um encontro do trabalhismo, feito ainda no exílio, antes da volta com meu tio, o governador Leonel Brizola. E nós construímos uma opção do trabalhismo brasileiro. Por questões locais no Distrito Federal, o meu partido ficou na base do governador [Rodrigo] Rollemberg, que cassou um terreno onde iríamos construir o 'Memorial da Liberdade e da Democracia Presidente João Goulart'. Então saí, falei com o presidente nacional do PDT, [Carlos] Lupi: 'Se vocês vão ficar na base de quem cassou Jango pela segunda vez, enquanto a nação brasileira devolve a Jango o seu diploma de presidente da República cassado pelo arbítrio em 1964, enquanto a nação brasileira presta homenagens de honras de chefe de estado que ele não teve na sua morte, enquanto a nação brasileira, através do Congresso Nacional, anula a fatídica sessão da madrugada do dia 2 de abril de 1964 em que a presidência da República é declarada vaga, justificando o golpe militar, com o presidente dentro do território nacional, enquanto tudo isso acontece meu partido permanece na base de quem cassa Jango pela segunda vez ao anular a cessão de uso do terreno. Tive convite de vários partidos e o PPL me surpreendeu pelo seu posicionamento, pela sua lealdade, pela sua história também de resistência à ditadura através do MR8, que é o movimento que cria o Partido Pátria Livre, e principalmente pelo seu programa, que é o programa do nacional-desenvolvimentismo: trazer ao povo brasileiro novamente aquilo que lhe pertence. Ou seja, criar um Estado forte, que possa investir. Veja, bem estou falando em Estado musculoso, não gordo, repleto de sobras. Esse programa do Pátria Livre prega a retomada do desenvolvimento através do mercado interno, através da restituição das empresas estatais essenciais para o desenvolvimento econômico e político do país. Eu me alinhei ao Pátria Livre como um militante, como um soldado. Essa pré-candidatura à presidência da República é uma consequência disso. Não era nossa intenção essa indicação que o Pátria Livre fez ao meu nome. Me sinto muito honrado como brasileiro de poder, através do Pátria Livre, trazer novamente para o debate nacional o programa das reformas de base. E quais são? Reforma agrária, reforma urbana, reforma tributária, reforma educacional, lei de remessas de lucros... todo um arcabouço de reformas que trariam ao país um novo pilar de desenvolvimento, principalmente do mercado interno, para que o povo brasileiro seja dono do seu destino.

 

Falando em reforma, como você vê as reformas trabalhista e da Previdência?
Acho um crime. Em nenhuma civilização do mundo se retrocede direitos. E o que foi feito com a reforma trabalhista, é importante que se diga, que nós vamos ter um grande debate neste ano eleitoral. Todos esses direitos que os trabalhadores brasileiros vêm perdendo na reforma trabalhista são do trabalhismo, não do PT, nem de qualquer outro partido. Durante muito tempo se chamou o trabalhismo de pelego, de populismo, mas e a carteira de trabalho, a lei de 8 horas, o 13º salário são do trabalhismo. Aqueles que ganham 13º salário neste país devem ao governo João Goulart. A mesma grande mídia que hoje está ao lado da Fiesp, desses grandes grupos monopolistas do Brasil, são os mesmos de 64. Os atores são os mesmos, o modus operandi do golpe é que é diferente. Nós do PPL temos absoluta convicção que o próximo presidente terá que consultar o povo brasileiro para revogar as reformas.

 

Seu pai sofreu o golpe militar em 1964. Como você viu o impeachment de Dilma Rousseff, considerado por muitos também como um golpe?
Eu vejo como um golpe, um novo golpe. É o golpe do cavalo paraguaio. E o que nós estamos vendo aí com a intervenção no Rio de Janeiro, por exemplo, é mais um passo da estabilização desse golpe. Ou seja, essas mudanças que nós estamos vendo no Brasil, esse entreguismo que estamos vendo tão rapidamente, é apenas um processo de consolidação desse golpe através do parlamento, que é também um golpe dado pelo grande capital, pela grande mídia, que não aceita mais o avanço social do povo brasileiro. Nós vemos essa situação política que vive o Brasil como um indicador que temos que mudar o país. Mudar o país como? Nós não queremos mudar o Congresso Nacional. O PPL propõe uma mudança nas estruturas, nos pilares estruturais e institucionais do país. Nós temos aí um Congresso altamente duvidoso. Nós temos que fazer uma reforma política que dê realmente legitimidade aos congressistas. Temos que fazer uma reforma no Judiciário. Nós não podemos mais ter um Judiciário como o que nós temos, em que se instala um juiz na mais alta Corte aos 40 anos, com indicações políticas muitas vezes duvidosas, e que só vai sair com 75 anos. Nós temos que ver a reforma política das instituições, inclusive das instituições do Executivo. As decisões ministeriais, as decisões do planejamento têm que ter participação popular, têm que ter os movimentos indicando onde deve se fazer o investimento público. O PPL é um partido pequeno. Nós não temos nenhum deputado, nenhum senador, o que por um lado também nos desvincula da podridão do Congresso Nacional e por isso nós podemos propor uma reforma estrutural dos pilares nacionais e de nossas instituições.

 

Você ainda não aparece nas pesquisas de intenção de voto. Como você pretende construir força política para ser um candidato competitivo este ano?
Política não se faz somente eleitoral. Se faz com o coração, com a alma e com a história. Nós não temos espaço político não vamos ter espaço político para debater, nós quase não vamos ter acesso ao fundo partidário. E nós temos muita consciência disso, temos consciência que o fundo partidário e o fundo eleitoral foram divididos pelos grandes partidos que querem continuar no poder e ter sua sucessão. Eles que têm mais de 300 parlamentares processados e indiciados em falcatruas públicas é que vão dividir R$ 1,7 bilhão para aparecer na TV e vender sua imagem à população para, de forma indireta, ter mais facilidade de ganhar votos. Mas eu digo sempre o seguinte: missão partidária não se discute, se cumpre. E nós vamos cumprir.

 

Como você o cenário político na Bahia, que é representado por duas forças opostas, com Rui Costa no governo e ACM Neto na prefeitura?
Eu já vi esse cenário político inclusive nacionalmente quando se coloca que não existe opção além de um ou outro. E existe sim. Acho que nós vamos ter uma eleição com vários candidatos, aqui na Bahia o PPL vai ter candidato a governador e no Brasil vamos ter também candidato a presidente da República. A questão não é mais entre direita e esquerda. A questão é entre o lucro dos grandes monopólios multinacionais e oligopólios nacionais, e uma sociedade humanista. Quando se fala em economia, você só vê falar de mercado financeiro. Os números para nós não são o tripé da economia, esses índices que a bolsa de valores gosta de dizer que é economia. Nossa preocupação com a economia são os índices de desenvolvimento humano. Um povo mais rico não é necessariamente aquele que tem sua balança comercial mais alta ou seu PIB positivo. Um povo é mais rico onde ele vive melhor, as oportunidades são idênticas e a felicidade e a união cultural prosperam.

 

Você chegou a concorrer  ao Prêmio Jabuti com o livro 'Jango e Eu - Memórias de Um Exílio Sem Volta'. Como foi produzir essa obra?
Foi não só uma realização pessoal muito grande, porque o livro 'Jango e Eu' conta as peripécias e as dificuldades do exílio. Meu pai dizia que o exílio é uma invenção do demônio, porque te deixa vivo fora do seu país. Tu respiras, mas tu ficas imóvel. Imóvel não só no deslocamento pessoal, mas também na propositura das suas ações. Quis o destino que Jango se tornasse, com sua morte no exílio - ainda sob investigação -, no único presidente constitucional deste país a morrer no exílio lutando, pela liberdade pela democracia e pela igualdade social. O que os historiadores contam - e existem vários livros sobre o governo João Goulart - não pegava esse lado familiar, esse lado do dia a dia, esse lado humano do presidente João Goulart, esse lado do pai, do amigo. E isso eu conto no livro. O livro tem um recorte temporal muito específico, que é o dia 1º de abril, no golpe de Estado, e termina na morte de Jango. Eu escrevi esse livro para a civilização brasileira e minha surpresa é que foi um livro altamente bem recebido pela crítica, para minha surpresa ele foi classificado entre os 10 melhores livros do país no ano passado, no Prêmio Jabuti. É uma história bonita e se a gente pode contribuir um pouco mais para o conhecimento da figura humana do presidente João Goulart, já teremos feito uma grande proeza.

 

A gente falou no início sobre como a história conhece seu pai. Como você espera que a história te conheça?
Veja só, 53 anos depois nós continuamos a falar em Jango, porque são as propostas de reformas de base que não foram feitas. Como eu comecei a te dizer no início, eu tenho orgulho de ser filho de Jango. Não teria orgulho jamais de ser filho de algum ditador desses que governou nosso país e que nos trouxe tantos anos de obscurantismo, perseguições e escuridão para o povo brasileira. Nós temos muitas propostas dentro do programa do PPL. Nós estamos refazendo um programa nacional desenvolvimentista e tem muitas metas a serem atingidas no Brasil, inclusive baseadas nas reformas de base. A reforma agrária nós estamos imaginando transformar em uma reforma fundiária, porque a reforma fundiária abarca não somente o campo, como também a cidade. Tem um livro sobre a reforma urbana de um peruano chamado Hernandez Soto que trata esse problema da violência com muita propriedade. O grande problema da violência - e você vê na intervenção do Rio de Janeiro - é que a comunidade vive do lado do traficante e ela não tem autonomia para permanecer em casa, porque ela mora ali, mas não tem o título de propriedade, que vem através da reforma urbana. Uma das conquistas do governo João Goulart foi a Embratel, que foi vendida a preço de banana no governo Fernando Henrique Cardoso para a Claro. Hoje nós temos aí quatro operadoras, todas elas estrangeiras: uma espanhola, uma italiana, outra mexicana e outra francesa. Em quatro anos elas remeteram R$ 32 bilhões para suas matrizes. O [Gilberto] Kassab quer entregar de graça agora todo o sistema, que vale R$ 120 bilhões, quando elas devem R$ 20 bilhões em multas do povo brasileiro por maus serviços prestados. Esse controle de remessa de lucros que Jango assinou em 1964 nós temos que ver, assim como a reforma agrária, a reforma tributária nós temos que debater com a sociedade brasileira. Ela não passa pelo aumento de impostas e também não passa pela tributação do salário do trabalhador. Em outros países mais desenvolvidos a reforma tributária passa por onde? Passa pelo imposto ao patrimônio. Por que as grandes empresas multinacionais não pagam imposto ao patrimônio como nas suas matrizes? Por que quando se fala em aumento de impostos ou aumento da carga tributária é sempre em cima do holerite do trabalhador? Tem uma série de coisas no Brasil que a gente tem que rever. E nada melhor que o programa do Pátria Livre, que é um programa nacionalista de devolução dos ativos para a sociedade brasileira.

 

A ex-vice-prefeita de Salvador, Célia Sacramento, é do seu partido e já tinha sinalizado a possibilidade de se candidatar a deputada federal aqui. Como está essa discussão? Você realmente já definiu se ela sai como candidata a deputada federal?
A companheira Célia tem todo o direito de permanecer ou sair. Essa é uma decisão pessoal dela e nós estamos esperando que ela permaneça e seja candidata a deputada federal.

 

Mas há essa possibilidade dela sair do partido? Ela sinalizou isso?
É uma vontade... as intenções pessoais de cada um, e as conveniências eleitorais de cada um é uma coisa que passa pela individualidade do candidato, não pela direção nacional. Mas ela é uma grande companheira e nós estamos de braços abertos se ela quiser permanecer e ser candidata a deputada federal.

 

Se ela permanecer então vocês endossam essa possibilidade?
Sem dúvida.

 

Há uma preocupação de partidos menores com a questão da cláusula de barreira. Inclusive alguns partidos já estão se mobilizando no sentido conseguir candidatos que possam dar esse coeficiente necessário para a eleição. A Célia, por ser um nome conhecido por aqui, por já ter sido vice-prefeita, ela cai bem nesse sentido?
Sem dúvida. Toda a contribuição que a companheira Célia é muito bem-vinda. Inclusive a candidatura presidencial do PPL é, em parte, pela necessidade do cumprimento da cláusula de barreira. Evidentemente que no pouco espaço que nós temos, nós vamos pedir voto de deputado federal para a legenda. Nossa prioridade é de fazer votos da legenda.