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Entrevista

Ricardo Alban fala sobre os desafios do setor na Bahia e do impacto direto e indireto da Operação Lava Jato - 28/03/2016

Por Rebeca Menezes

Ricardo Alban fala sobre os desafios do setor na Bahia e do impacto direto e indireto da Operação Lava Jato - 28/03/2016
O setor industrial é um dos mais afetados pela crise econômica e política brasileira. Em entrevista ao Bahia Notícias, o presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), Ricardo Alban, fala sobre os desafios do setor na Bahia e do impacto direto e indireto da Operação Lava Jato, e diz que a retomada do crescimento depende da "credibilidade e confiança" do país. "Com o cenário político, isso é impossível. Se nós brasileiros temos receio de tomar decisões, quiçá os investidores. Isso é uma coisa natural, perfeitamente compreensível. Não podemos achar que seria diferente", avaliou. Alban avalia que, neste momento, instituições não devem possuir posições político-partidárias, "porque senão ela corre o risco de efetivamente não ser legítima em defesa dos interesses do seu setor". E é exatamente para atender a essa demanda que a Fieb tem buscado alternativas para a cobrança dos Distritos Industriais  e a instalação de uma frente parlamentar voltada aos interesses do grupo. Para Alban, contudo, o mais importante neste momento é fortalecer a indústria nacional. "Precisamos corrigir equívocos que acontecem na relação público-privada, mas jamais podemos abrir mão desse patrimônio que pertence à sociedade. As empresas, o know-how, a expertise, essa capacidade de trabalho, isso é um patrimônio do estado. Precisamos preservá-lo acima de tudo", defendeu.
 
Você defende o setor da indústria. Porém, a Fiesp, por exemplo, se posicionou a favor do impeachment e tem sido muito ligada a esse movimento em São Paulo. Você acredita que esse posicionamento é válido ou que as federações não deviam se posicionar tanto neste momento?
As instituições não podem nem devem ter posições politico-partidárias. Elas devem se posicionar com relação a tudo aquilo que aflige o seu setor. Mas existe, obviamente, uma linha muito tênue entre o que é politicamente institucional e o que é politicamente partidário. Com relação à Fiesp, eu prefiro não emitir opinião. Mas nós e todas as demais 26 federações dos estados do Brasil claramente não adotamos uma postura partidária. E nós seguimos o alinhamento da Confederação Nacional da Indústria, a qual buscamos sempre estar alinhados, porque juntos sempre seremos muito mais representativos. Nós temos tipo uma preocupação muito grande com a indústria brasileira. É pública e notória a perda do espaço e competitividade, quer seja analisando o PIB, quer seja analisando produtividade, ou o nível de emprego. Nós tivemos o convite para participar do Conselhão de Dilma Rousseff, dentro de um núcleo de trabalho bastante eclético, onde se tinha desde representantes sindicais, de empresários e até mesmo da parte religiosa. Dentro desse grupo de trabalho, uma coisa que foi unanimidade foi mostrar que o Brasil precisa de política industrial. Ou seja, isso parece como uma esperança para nós, mas ao mesmo tempo é um consolo triste. Porque a constatação de todos os setores de que a indústria brasileira está tão ruim mostra o quanto nós estamos atrasados. É um lado bom, que tem que ser aproveitado, que isso já é uma consciência geral. É como dizemos sempre: não existe uma economia forte sem uma indústria forte. Então nós precisamos, efetivamente, de política industrial para garantir o desenvolvimento socioeconômico do nosso país. É fácil entender isso. A indústria é o elo de valor agregado mais importante de uma cadeia produtiva. É ela quem detém o maior nível de salário médio.
 
 
O senhor acredita que o fato das maiores empresas do país estarem envolvidas em escândalos de corrupção afetou o setor?
Óbvio que a crise política tem potencializado enormemente a crise econômica. A economia no mundo inteiro, na história da humanidade - e no Brasil não é exceção - é feita de ciclos econômicos. Nós tivemos o ciclo da China, obviamente em patamares diferenciados; nós vivemos o ciclo dos EUA recentemente, que veio quase como uma depressão e contou com forte apoio do governo americano; nós chegamos no ciclo europeu... A nossa crise foi potencializada, de fato. Não há como negar a realidade. Potencializou e continua potencializando. E o que você precisa pra vencer uma crise econômica? É melhorar as expectativas. É voltar a ter confiança e credibilidade. Com o cenário político, isso é impossível. Se nós brasileiros temos receio de tomar decisões, quiçá os investidores. Isso é uma coisa natural, perfeitamente compreensível. Não podemos achar que seria diferente. O que nós precisamos é encontrar a equação política adequada para o país. Agora nós precisamos encarar nossos problemas de frente. Precisamos ter coragem de arcar com o ônus político e econômico das decisões. Evidente que existem decisões amargas, que podem exigir mais sacrifícios do setor produtivo, mas tem que ter a contrapartida de decisões políticas corretas. Nós não podemos conviver com uma legislação trabalhista da época de Getúlio Vargas. O mundo inteiro evolui, o Brasil precisa evoluir. Nós não somos uma ilha isolada do mundo, muito pelo contrário. Não é por diletantismo que o presidente dos EUA estava visitando Cuba, depois de tantos anos. É uma evolução do sistema político-social mundial. Nós não podemos viver com uma estrutura trabalhista de 70 anos atrás, nem com um sitema previdenciário que já se provou que está explodindo. Nós precisamos ser responsáveis com o futuro dessa nação. E não é de hoje. Desde que eu era jovem nós ouvíamos essa frustração, de que o Brasil é o país do futuro. E esse futuro nunca chega. Nós precisamos que esse futuro chegue. Mas pra isso nós precisamos tirar emoções, convicções, pra passar a ter realismo. Precisamos ter um Estado do tamanho que o Brasil comporta. Precisamos fazer alterações cabíveis para que tenhamos competitividade. O comércio vive daquele mercado local, mas a indústria vive de um mercado mundial. E o comércio, indiretamente, vive dele. Não adianta pensar só em exportação.
 
A indústria baiana tem sofrido diretamente com a crise econômica. A Petrobras suspendeu a operação das sondas terrestres do estado, a Ford demitiu funcionários, a OAS e a Odebrecht envolvidas na Lava Jato... Qual é a atual situação do setor na Bahia?
Não é diferente do Brasil. Nós temos alguns vetores novos se desenvolvendo na Bahia. Se comparados os últimos doze meses, fechados em janeiro, nós tivemos um decréscimo da indústria de cerca de 5%. Mas se olharmos de forma pontual, e essa não é uma análise correta porque gera uma série de distorções, nós tivemos um incremento de 11% em janeiro, na Bahia. Mas existem explicações pra isso. Nós precisamos de um horizonte maior. A Bahia talvez sofra menos que a média nacional, mas não por ter condições de trabalhar de forma independente. É que nós temos uma estrutura não tão debilitada quanto o Rio de Janeiro ou Rio Grande do Sul, mas estamos na média da debilidade econômica e fiscal que vive o Brasil. Por dois motivos. Um é o tamanho do Estado, que precisa ser ajustado. A Bahia até caminhou nisso, mas precisa caminhar mais. Obviamente que a situação política tem que ajudar. Ao mesmo tempo, não tivemos grandes danos, porque o agronegócio ajudou bastante. Outros setores também ajudaram. A Bahia tem uma participação razoável com a celulose, que é um dos poucos setores que cresceram. No caso das demissões da Ford, a decisão de outras indústrias automobilísticas no país vieram até antes. Então analisar as questões econômicas pontualmente pode gerar distorções. Mas estamos no mesmo contexto que o país e isso é preocupante. Pra se ter uma ideia, um ano atrás, o Brasil só falava de precisar de energia. Já está começando a sobrar energia. E olha que as chuvas não repuseram os níveis de reservatórios como era esperado. Isso não aconteceu porque aumentamos a capacidade de produzir energia. É porque o consumo caiu, principalmente o consumo industrial.
 
 
As federações da indústria criaram a Nordeste Forte, para buscar mais representatividade para indústria da região. O Nordeste tem ganhado mais espaço no setor?
É justamente o contrário. Nós tivemos um crescimento econômico e um aumento do poder aquisitivo, pelo menos até o segundo governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Obviamente isso não significou um crescimento do setor industrial, porque houve crescimento da importação, que gerou uma queda de competitividade do mercado nacional. Porém, como estávamos em um momento favorável economicamente, como tínhamos o Nordeste com uma carência de demanda, esse foi o mercado que mais cresceu. Agora, a recíproca é verdadeira. No momento em que nós temos essa curva invertida, o mercado nordestino tende a sofrer mais, porque nós temos muito menos capacidade de poupança, muito menos capacidade de geração de emprego e menos elasticidade nessa curva da economia. E essa é a motivação para nós tentarmos, juntos, buscar políticas desiguais para tratar situações diferentes. Essa é a forma de mitigar essas diferenças. Precisamos trabalhar em cima de políticas regionais mais adequadas para que possamos minimizar essa tendência que acontecesse no revés do processo econômico.
 
No final de abril, será lançada a Frente Parlamentar da Indústria, na Assembleia Legislativa da Bahia. Qual é a principal demanda do setor para os deputados?
Instituição não pode ter uma posição político-partidária. Não pode e não deve, porque senão ela corre o risco de efetivamente não ser legítima em defesa dos interesses do seu setor. Mas, de fato, todos nós sabemos que a política faz parte de tudo. E nós temos visto, principalmente durante essa crise política, que tudo passa pelo Congresso Nacional. Então nós temos que buscar equilíbrio de forças e sensibilizar a classe política que é necessário o equilíbrio entre despesas e receitas para que a conta se feche. Um grande exemplo que nós temos é a bancada rural, na Câmara federal. Existe alguma ilegitimidade em se ter uma bancada ruralista? Não. Quando isso é explicitamente exposto, de forma totalmente transparente, é legítima. Então estamos buscando essa frente parlamentar para que localmente possamos demonstrar a real situação da indústria e como, juntos, os setores industrial, legislativo e executivo, podemos construir o melhor caminho para o desenvolvimento econômico. Precisamos corrigir equívocos que acontecem na relação público-privada, mas jamais podemos abrir mão desse patrimônio que pertence à sociedade. As empresas, o know-how, a expertise, essa capacidade de trabalho, isso é um patrimônio do estado. Precisamos preservá-lo acima de tudo. A construção civil neste país é reconhecida mundialmente. Por exemplo, quando os EUA enfrentaram a crise, o governo comprou ações da Ford pra salvar a empresa, comprou ações do Citibank pra salvar o banco. Então nós precisamos salvar o patrimônio brasileiro. Precisamos parar de não dar valor ao nosso patrimônio de trabalho, tecnologia, de expertise.
 
 
A cobrança dos Distritos Industriais foi adiada. O que é exatamente essa cobrança e qual será o impacto dela para o setor?
Essa é uma discussão que já existe há algum tempo. Existem demandas de organizações desses distritos para se dar uma solução, porque de fato eles não vinham sendo atendidos como se esperava. Havia uma carência de recursos para a manutenção e operacionalização dos distritos de uma forma satisfatória. Obviamente essa demanda foi pressionando. O Estado, por pressões orçamentárias, tentou encontrar essa alternativa como uma solução que pudesse transferir esse ônus para o setor industrial. Só que o momento é muito inapropriado. É verdade que há a dificuldade de se encontrar o equilíbrio fiscal, mas também de extrema dificuldade do setor produtivo. Não é momento de se criar fatos novos. Como existia essa vontade dos setores industriais, o governo entendeu que o nível da taxa estava fora da realidade. Mas, mais do que isso, nossos distritos são muito distintos uns dos outros. Você não pode discutir uma formatação como solução pra um distrito como Camaçari, em que você tem um capital intensivo grande, grandes empresas, que seja a mesma para um distrito como o Centro Industrial de Aratu, onde você tem uma área territorial enorme, abrange três municípios, com peculiaridades muito distintas. Lá tem empresas de logística, de armazenagem, industrial, até comércio. Tem aquelas que ocupam extensões territoriais grandes, outras pequenas. Tem algumas em vias principais, outras em estradas vicinais. Então não é possível uma legislação única abarcar todas essas características. É uma verdadeira miscigenação de situações que não dá pra abarcar de forma única. Então desde o início nós mantivemos o diálogo com o governo do Estado e o governador entendeu essa situação. Então chegamos ao entendimento de prorrogar até agosto e abrir uma discussão. Foram montados grupos de trabalho com representantes de cada distrito industrial, já foram feitas reuniões, para que a Secretaria de Desenvolvimento Econômico verificasse se é possível encontrar soluções para cada distrito. O governo está tentando não ter ônus sobre isso, assim como as industrias estão tentando não ter ônus também. É óbvio que tem que ter uma convergência. Não dá pra cada um ter uma posição antagônica e esperar que se chegue a um consenso.