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Entrevista

Luciana Genro reitera oposição ao pai e fala sobre projetos para campanha 2014 - 07/07/2014

Por Marcos Russo / Evilásio Júnior / Francis Juliano / Juliana Almirante

Luciana Genro reitera oposição ao pai e fala sobre projetos para campanha 2014 - 07/07/2014
Fotos: Jamile Amine/ Bahia Notícias
A entrevistada do Bahia Notícias desta semana é a candidata do PSOL à Presidência da República, Luciana Genro. Filha do ex-ministro do governo Lula e atual governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, ela reitera a oposição ao pai, comenta as acusações sobre possível beneficiamento de campanha e garante ser oposição ao PT, PSDB e PSB. Gaúcha, Luciana torce para o Internacional e, em tempos de Copa, critica abertamente os beneficiamentos de empreiteiras que trabalharam em campanhas políticas e nas obras de mobilidade para o Mundial. Um dos motivos apontados pela socialista para saída do Partido dos Trabalhadores é "não querer participar desse toma lá, dá cá".  
 

Fotos: Jamile Amine/ Bahia Notícias
 
Bahia Notícias - É a sua primeira vez na Bahia?
 
Luciana Genro - Não. Já tive aqui em 2006, com Heloísa Helena [ex-senadora por Alagoas e ex-candidata a presidente da República], também em um Dois de Julho. A minha primeira agenda como candidata a presidente foi o Dois de Julho, na Bahia. Eu quis vir nessa festa porque é um momento de reflexão sobre a nossa verdadeira independência. Agora, não mais frente aos portugueses, mas frente ao capital financeiro que segue dominando a nossa economia, fazendo com que toda a riqueza do país esteja voltada para atender aos interesses dos mercados e não a do povo. E o protagonismo do povo no Dois de Julho demonstra como é importante essa luta pela soberania nacional. 
 
BN - Inicialmente o pré-candidato do PSOL era Randolfe Rodrigues. Ele desistiu e a indicação foi Marcelo Freixo (PSOL-RJ). Ainda assim, o PSOL lançou sua candidatura. Como o partido está reunido em torno do seu nome?
 
LG - O partido está muito unido. O Randolfe estava um pouco traumatizado pela falta de unidade que houve do partido em torno do nome dele, por isso ele achou que talvez esse fenômeno pudesse se repetir comigo, e lançou o nome do Freixo. Mas, não ocorreu isso que ele temia. Ao contrário, o partido se unificou 100%. O meu nome foi aprovado por unanimidade na convenção. Inclusive, os setores que questionavam o nome do Randolfe resolveram me apoiar. Agora, estamos todos muito unidos. As diretrizes programáticas, escritas por mim, também foram aprovadas à unanimidade.
 
BN – As pesquisas comprovam que há um desgaste do atual governo e, com isso, houve um crescimento no eixo Sul, Sudeste e Centro-oeste do principal candidato da oposição, Aécio Neves. Mas, também, há um sentimento que foi mostrado nas ruas com as manifestações de junho de 2013 da expectativa de surgimento de um terceiro caminho. É nisso que o PSOL vai apostar? Ou a candidatura é apenas para marcar posição?
 
LG – Não. Não é apenas para marcar posição. A gente quer ser uma terceira via de verdade porque o Eduardo Campos, que se propõe a ser essa terceira via, na verdade não é. Ele é uma posição intermediária entre o retrocesso que significa o Aécio e o PSDB, que significa uma volta ao passado, e o continuísmo do PT e da Dilma, que também traz elementos de retrocesso. Na sombra de uma esquerda que traiu as suas bandeiras, cresce a direita. As demandas de junho [das manifestações] não foram atendidas. Elas seguem pendentes. O que nós queremos na campanha é mostrar que é possível uma alternativa diante do retrocesso e desse continuísmo nefasto, que acaba levando ao retrocesso, que é o PSOL. Essas bandeiras de junho são possíveis de serem atendidas a partir de mudanças estruturais na economia e na estrutura tributária do país, que nós vamos propor.
 

 
BN – As redes sociais foram canais importantes para as manifestações em junho do ano passado, mas, na internet, também a gente percebe certo dualismo. Como o PSOL vai aproveitar as redes sociais e sair do binarismo esquerda e direita?
 
LG – A gente vê com muita atenção as redes sociais. Inclusive, os novos fenômenos de mídia que surgiram nesse processo, ou que se fortaleceram em junho, as mídias independentes, sites independentes, grupos de jornalistas que têm buscado romper essa hegemonia da mídia tradicional. E esse dualismo é real. De fato, há uma polarização entre o PSDB e o PT. Mas, ao mesmo tempo, assim como eles são diferentes, ao mesmo tempo eles têm uma grande unidade, entre o PT e o PSDB, que inclui o PSB. Inclusive, a Marina está em contradição com ela mesma quando ela se propôs a ser o novo. Esses três candidatos têm em comum a defesa desse sistema político, que foi duramente questionado nas ruas, em junho, e seguiu sendo questionado depois pelas manifestações, greves e protestos. O próprio questionamento da Copa, enquanto um grande negócio para a Fifa e para as grandes empreiteiras, que não coincidentemente são as mesmas que fizeram as obras superfaturadas da Copa, as que financiam PT, PSDB, PMDB, PDT, os grandes partidos. Vamos mostrar que eles estão unidos na defesa desse sistema e que em 2015 é preciso fazer ajustes. Cortar gastos sociais, investimentos para o interesse do povo, para manter a economia funcionando de acordo com o interesse do grande capital. Se eles têm diferenças entre eles é o grau dos ajustes. 
 
BN – Existem duas formas de fazer política hoje. Uma no campo político, outra no campo midiático. Você tem um exemplo dentro de casa. Eu vou começar pela relação com o seu pai, que é o Tarso Genro, que foi ministro do governo Lula. É do PT, é do governo, e hoje é governador do Rio Grande do Sul. Como é que você vai se defender se fizerem qualquer tipo de ilação – mesmo que você, na época em que foi do PT, tenha trafegado por uma corrente diferente do seu pai. Como você pretende utilizar em forma de discurso qualquer ilação para desconstruir a tese contra o PT?
 
LG – Geralmente me perguntam como a gente administra isso na família. Eu sempre respondo que ele me ensinou a pensar com a própria cabeça. Nós não repetimos esse fenômeno do carlismo, que tem pai, filho, neto, seguindo a mesma política de se transformar em uma oligarquia familiar. A gente tem ideias diferentes, em algumas coisas até temos pensamentos parecidos, mas, em essência, divergimos sobre qual é a necessidade para o país nesse momento. É necessário construir uma alternativa de esquerda ao PT, porque o PT sucumbiu a uma lógica política de se acomodar a essas instituições que estão capturadas pelo poder econômico e interesses privados e deixou de representar, de fato, os interesses da população. Lido com muita tranquilidade. Quem me conhece sabe que isso nunca interferiu na minha atuação política. Eu fui expulsa do PT no momento em que ele era ministro. Ministro prestigiado do governo Lula. Ele nem compareceu no evento do PT que votou a minha expulsão. Ele não iria me defender e não queria dar o voto dele para me expulsar. Eu também nunca pedi nenhum tipo de ajuda nesse processo político até porque eu carrego até hoje um orgulho de ter sido expulsa do PT por essas mesmas figuras que depois foram desmascaradas no processo do mensalão. Foi justamente por não querer entrar nesse esquema: de transformar política em um balcão de negócios; de uma relação parlamento-executivo totalmente capturada por essa lógica da negociata, que eles nos expulsaram do PT. A mim, Heloísa Helena, João Fontes, que não aceitamos votar a favor da reforma da Previdência, quando se instituiu a cobrança de contribuição dos aposentados...
 
BN – Mantiveram o Fator Previdenciário de Fernando Henrique...
 
LG – A desvinculação do reajuste das aposentadorias ao salário mínimo. O cidadão se aposenta ganhando quatro salários e em pouco tempo está ganhando um. Foi o Fernando Henrique quem fez, mas o Lula manteve. Então, a gente não aceitou se render para essa lógica. Seria mais fácil ficar nas asas do poder e do meu pai e em uma legenda mais forte e com mais capacidade para oferecer benesses... Mas a gente preferiu esse caminho mais difícil porque viu que era necessário seguir erguendo essas bandeiras que o PT abandonou.
 

 
BN – Seu marido, Sérgio Bueno, é jornalista. Houve, na sua trajetória de deputada federal, algumas denúncias contra você. Uma delas, sobre o Banrisul, que você teria feito um cursinho com investimento do Banrisul. Além disso, houve a cessão de cotas aéreas para Protógenes, em 2009; o caso da Gerdau, que acusaram você de receber R$ 100 mil. Há um preparo dentro de casa para essa guerra, ou há um discurso pronto? Porque, com certeza, os episódios vão ser retomados pelos adversários na campanha...
 
LG – Não é um discurso pronto. Temos a verdade sobre cada um desses casos. O primeiro que você mencionou foi o do cursinho. Primeiro o Banrisul está fora disso. Quando eu deixei de ser deputada eu busquei financiamento para fazer um cursinho popular para jovens carentes. Para remunerar os professores e oferecer o curso gratuito para os jovens se prepararem para o Enem. Consegui várias empresas que contribuem até hoje. Eu não estou mais na presidência da ONG que criamos para administrar o cursinho. Me afastei por conta das minhas atividades políticas, mas o cursinho segue com excelentes aprovações em universidades estaduais e federais. Essas acusações são injustas no sentido de fazer ilações de que essa empresa de seguros teria dado dinheiro ao cursinho porque tem uma relação com o Banrisul...
 
BN – Que é administrado pelo governo do Estado do Rio Grande do Sul...
 
LG – Uma coisa totalmente desconectada da realidade. Porque essa é uma das empresas que prestam serviços ao Banrisul e porque eu não tenho nenhuma ligação política com o meu pai. Se eu fosse uma Roseana Sarney, e meu pai fosse o Sarney, e ela estivesse buscando financiamento de empresas que se relacionam com o governo do pai dela, de alguma maneira, seria até legítimo esse questionamento sobre tráfico de influência. Mas, sendo o meu partido oposição ao governo do meu pai, tendo inclusive disputado com candidato próprio às eleições... Eu votei no Pedro Ruas para governador. Isso foi público e notório no Rio Grande do Sul. Era o nosso candidato do PSOL ao governo do Estado. Há uma clareza cristalina da minha independência em relação ao governo. Portanto, qualquer ilação de tráfico de influência se desmoraliza pela própria realidade da relação que eu e o PSOL temos com o governo do meu pai.
 
BN – Segundo aspecto é o caso da Gerdau...
 
LG – E eu estou processando a Veja, justamente por conta disso: de não ter me ouvido, não ter me dado oportunidade de ter contado a verdade. Eu recebi uma doação de R$ 100 mil. Foi tão excepcional esse fato que se transformou em uma notícia. A empresa ofereceu R$ 100 mil para todas as candidaturas que tinham alguma competitividade no processo eleitoral e eu enfrentei aquela eleição para prefeita com R$ 200 mil. Cem mil da Gerdau e outros R$ 100 mil de outras fontes. Tive 10% dos votos. Candidaturas, como a da deputada federal Manuela [Manuela D´Ávila (PCdoB)], teve R$ 2 milhões e ninguém pergunta para ela de onde saiu esse dinheiro, quais as relações que ela estabeleceu para ter esse dinheiro e ela fez apenas 3% a mais que eu. Acho saudável que haja uma cobrança sobre esse tema da Gerdau, porque foi uma exceção. O PSOL nunca se comprometeu com nenhuma empresa na relação de financiamento. O caso da Gerdau foi porque ofereceu para todos o mesmo valor. O PSOL tem uma regra estatutária que é de não aceitar recursos de empreiteiras, bancos e empresas multinacionais. Essa regra é cumprida por nossa campanha, até porque nós não queremos nos vincular com essas empresas, como empreiteiras que realizam obras para o governo depois de terem financiado as campanhas. No caso do PT, por exemplo, é comprovada essa relação espúria entre financiamento de campanha e os benefícios posteriores. Porque as empresas fazem as obras, as obras são superfaturadas, como é o caso dos estádios, e essas empreiteiras realizaram as obras e financiaram a campanha da Dilma. No meu caso é o oposto. Recebi esse dinheiro da Gerdau, nunca tive relação com eles e, ao contrário, inclusive me manifestei em apoio aos trabalhadores da Gerdau quando eles fizeram uma greve há pouco tempo. 
 

 
BN – Pelo que se encaminha das pesquisas pré-eleitorais vai haver a polarização entre o PT e o PSDB, que devem evitar temas espinhosos, como o aborto e as drogas. Como o PSOL deve proceder? 
 
LG – Nós temos um conjunto de propostas. Isso faz parte do nosso programa. Temos proposta de tributar as grandes fortunas para poder ter recursos de atender a essas demandas, essas bandeiras de direitos civis. Entra aí a legalidade do casamento entre pessoas do mesmo sexo e a possibilidade de esses casais poderem adotar criança. O combate à homofobia. Temos o Jean Willys, que é o único homossexual assumido do Congresso Nacional, onde deve ter vários deputados homossexuais e que não se assumem. Inclusive alguns com posturas homofóbicas. Quanto mais homofóbico maior a probabilidade de ser um homossexual frustrado, com raiva daqueles que se assumem. Esse tema do direito: amar a quem quer que seja, é um direito básico do ser humano. Tem também temas polêmicos como a maconha e o aborto. A maconha eu vejo como um tema muito relevante, porque não envolve só a maconha e o direito de usar recreativamente, mas o problema de guerra às drogas, que é uma guerra perdida. Essa postura de combate com polícia, só aumenta o consumo. A demanda por droga é uma característica da humanidade. Tem de ser tratada como saúde pública e não como uma questão policial. A maconha deveria ser trada como o álcool e o cigarro. A nossa defesa não é uma apologia e nem liberação geral. A gente precisa discutir esse problema da droga sobre esse ângulo da necessidade de fazer uma discussão sem preconceito e de se combater o tráfico não com a repressão policial, mas sim com o debate franco com o usuário para que ele esteja prevenido. O usuário da maconha acaba chegando a outras drogas pelo contato com o traficante. A maconha pode ser uma porta de saída. Tem um estudo da Unifesp que mostra que usuários de crack conseguiram se liberar do crack usando maconha, que é menos danosa, embora traga consequências para a saúde. A nossa postura é de muita cautela, mas muita convicção que a criminalização não trás nenhum resultado positivo.
 
BN – O PSTU também lançou candidato. Por que a aliança com o PSOL não aconteceu? E, caso ocorra segundo turno, qual a possibilidade de apoio a qual candidato?
 
LG – Eu, quando estava vice do Randolfe, abri mão de minha vice para o PSTU, para viabilizar a aliança. Naquele momento eles disseram que não estavam dispostos porque não aceitavam o Randolfe e o perfil que ele tinha. Quando veio eu, que tinha uma relação com o PSTU que tornaria mais viável essa aliança, eles já tinham feito convenção e lançado o Zé Maria. Então, infelizmente, estamos separados em nível nacional, mas temos alianças em governos estaduais. Aqui também não conseguimos viabilizar: o Marcos Mendes é o nosso candidato a governador. Mas vamos buscar ter uma relação de parceria com o PSTU e com próprio PCB, no sentido de nos unirmos para denunciar os três principais candidatos do sistema: o PT, PSDB e PSB, mostrando essa unidade que eles têm. Vamos nos colocar como alternativa. Em um segundo turno, nós achamos que ‘nada deve parecer impossível de mudar’, como foi o slogan da campanha do Freixo, que teve 30% dos votos e quase chegou ao segundo turno. Nós queremos estar no segundo turno e não temos nenhuma discussão sobre a possibilidade de não estarmos lá. 
 
BN – A gente ainda está em um período de Copa do Mundo. Você mesma declarou que não é para ter as manifestações agressivas que houve ano passado em alguns locais, embora você tenha sido acusada de incitar a violência em algumas delas. Uma curiosidade: celeste ou rubro?
 
LG – Rubro. Sempre rubro (risos). Eu gosto do vermelho. É uma cor forte, uma cor vibrante. Eu só preciso fazer um reparo à tua premissa. Primeiro, eu não fui acusada de incitar a violência. O PSOL foi injustamente acusado de estimular essas manifestações isoladas e individuais de violência gratuita. Acusado de forma muito injusta... Isso atrapalha as nossas estratégias. Grande parte da diminuição do número de pessoas que participam das mobilizações é devido a essa violência que, por parte de alguns ativistas que acabam levando a violência policial que inibe as pessoas de participarem das mobilizações. E também faço um reparo sobre o que você disse sobre as manifestações durante a Copa. O que eu disse é que o PSOL não vai ficar inventando manifestações no dia de jogo, quando as pessoas querem assistir ao jogo. Nós apoiamos todas as manifestações ao tempo em que compreendemos que as pessoas querem assistir aos jogos. Mas a paixão do brasileiro pelo futebol foi manipulada nesse processo todo, em benefício de grandes negócios para empreiteiras e a Fifa. Foi criado um estado de exceção no país para oferecer vantagens tributárias, empréstimos do BNDES... O PSOL foi o único partido que votou contra essa negociata, da Lei Geral da Copa. 
 

 
BN – Como boa gaúcha, você apoia o trabalho de Felipão à frente da Seleção Brasileira?
 
LG – Eu acho que todo brasileiro deve apoiar. Independentemente de ele estar errando mais ou menos, tenho certeza de que ele está fazendo o melhor possível. Eu achei o desempenho do Brasil um tanto sofrível. Mas, enfim, faz parte do jogo do futebol esse ‘ganha e perde’. O importante é que estamos disputando e lutando. Assim como na política também, a gente luta, disputa, mesmo enfrentando dificuldades: as diferenças no tempo de TV, nos recursos... Aqui mesmo na Bahia temos Marcos, Ronaldo e Hamilton... Assim como a seleção enfrenta as suas dificuldades, nós também as temos. Mas contamos com uma militância que vai à rua por ideal. E a seleção brasileira, idem. 
 
BN – Quem é pior, Felipão ou Dilma?
 
LG – Toda vida Dilma. Os políticos são sempre piores que os esportistas (risos).