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Entrevista

Eduardo Jorge pretende levar o PV para debates bem mais polêmicos na campanha do que em 2010 - 20/05/2014

Por Marcos Russo / Evilásio Júnior / Francis Juliano

Eduardo Jorge pretende levar o PV para debates bem mais polêmicos na campanha do que em 2010 - 20/05/2014
Fotos: Francis Juliano/ Bahia Notícias
Pré-candidato do PV à Presidência da República, o médico e ex-deputado federal Eduardo Jorge pretende levar o PV para debates bem mais polêmicos na campanha deste ano do que em 2010, quando a então postulante do partido, Marina Silva, se esquivou do debate por "questão religiosa". Entre os temas defendidos pelo verde estão o retorno da discussão do parlamentarismo, reforma política – com direito a extinção do Senado e votos facultativo e distrital misto –, "descriminalização" do aborto e "regulação" das drogas. Autor da Lei de Planejamento Familiar, quando esteve no Congresso, o aspirante ao Palácio do Planalto, atribui a uma "falha" na aplicação da política a quantidade de interrupções de gravidez no país. "São centenas de milhares de mulheres, por ano, que fazem aborto clandestinamente. O ministério estima que possa chegar a 800 mil mulheres que fazem o aborto clandestino, por ano. O PV é laico, mas é espiritualista. Por causa desse dogma eu vou entrar como Pilatos nesse assunto? Eu, como médico, não posso deixar de estender a mão para uma mulher que tomou essa posição. Se a sociedade está preparada ou não, eu não sei", pondera. Em relação à expansão da violência no Brasil, ele diz que a guerra contra o narcotráfico está "perdida" e propõe usar a "massa cinzenta cerebral" para mudar o quadro. "Não é liberação [das drogas]. Hoje a avaliação nossa é a regulação. De todas. A liberação pode dar o tom de que estamos incentivando. Hoje já é possível comprar, mas quem regula é o criminoso. É a economia do crime. O que é que eu quero: eu, Estado, vou regular. Hoje ninguém sabe o que está misturado a essas drogas... Eu vou regular, vou te orientar... Você vai saber o que significa usar isso", opina. 
 

 
Bahia Notícias - A partir de junho, com seu nome confirmado candidato a presidente, a expectativa é fazer uma campanha semelhante à que Marina Silva fez em 2010?
 
Eduardo Jorge - Nós estamos respeitando a Lei. Nesse período estamos discutindo as diretrizes para o Brasil, que divulgamos em março. É uma habilidade de formação política aberta a todos os cidadãos que se interessam pelas ideias do PV. Por isso estamos percorrendo capital, por capital, para discutir as dez diretrizes.
 
BN - Mas qual é a diferença em relação à candidatura de Marina em 2010?
 
EJ - Naquela ocasião tinha PT ou PSDB e o PV fez uma espécie de coligação: PV-Marina. Tivemos que fazer uma discussão programática e algumas questões que eram mais tradicionais do PV não eram compatíveis com a ideologia religiosa fundamentalista da Marina, que nunca entrou mesmo no PV. Felizmente foi uma campanha muito boa, porque teve 20 milhões de votos. É uma votação muito complexa porque ia desde o ecologista mais severo até o pastor mais reacionário.
 
BN - Eduardo então não pretende ter 20 milhões de votos?
 
EJ - Essa campanha 2014 é diferente. Infelizmente o nosso noivado em 2010 não deu certo, o que não foi bom, porque há uma simpatia grande pelas ideias ambientalistas, que ainda são frágeis. Mas o grupo em torno dela achou melhor ter um partido à sua imagem e semelhança. Foi uma pena que ela não conseguiu organizar o partido. Aliás é um questionamento a se fazer: como é que um grupo que tem vinte milhões de votos, tem três anos para organizar um partido e não consegue? Eu achei um absurdo porque, quanto mais candidatos programáticos se tem, é melhor. O Serra, por exemplo, com sua obsessão de ser presidente, deveria ir para o  PPS. Não sei qual foi a revelação que ela recebeu e resolveu se alinhar com o  PSB. Eu desejo boa sorte para o Eduardo Campos.
 

 
BN - Mas o senhor pretende ou não ter 20 milhões de votos?
 
EJ - Isso a gente só vai saber quando as urnas forem abertas. Eleição é uma coisa que ninguém sabe. Mas é verdade que desta vez o PV vem com sua tradição. Com suas propostas mais claras. Vamos, praticamente, sozinhos para essa eleição.

BN - Sozinhos, você fala, também financeiramente? Porque Marina contou com um vice, em 2010, que era o presidente da Natura. Vocês não têm esse apoio financeiro em 2014?
 
EJ - O PV vai para a campanha com as suas forças. Aquelas forças estavam pela Marina. A nossa força é a ideia da
sustentabilidade. A nossa força é a das ideias. O patrimônio do PV é que essas ideias da sustentabilidade sejam acolhidas.
Antes de ter candidato ajuntamos as ideias. Temos dez pontos que já estão sendo discutidos.
 
BN - Quando você fala em ideias, qual é a principal bandeira do PV este ano?
 
EJ - Nós divulgamos dez diretrizes. Porque uma coisa muito estereotipada é achar que o Partido Verde é o campeão da floresta, da selva, dos mangues... E nós somos mesmo. O PV foi o primeiro partido no mundo... Isso vem de 1960, naqueles tempos gloriosos que se começou a se falar em desenvolvimento sustentável. Falamos de várias coisas. Continuamos sendo o porto seguro dessas ideias, do desenvolvimento sustentável. Esse estereótipo que querem colocar a gente em um gueto verde, a gente não aceita. As nossas diretrizes falam do nosso conceito filosófico, que é o desenvolvimento sustentável; de que tipo de Estado e Federação defendemos; falamos da reforma tributária; da questão da agricultura; da reforma presidenciária; educação, saúde, cultura de paz, drogas, pobreza e política internacional. O PV é um partido que tem propostas para todas as políticas públicas. O primeiro eixo é o da questão do desenvolvimento sustentável, como orientador para o desenvolvimento do país e a reforma política. E o segundo eixo é a questão da reforma política, como essencial para aprofundar a democracia no Brasil. Essas duas já servem de pista para desvendar o que a gente pensa. A gente faz o reconhecimento da democracia, dos governos democráticos, mas a gente precisa de mais. A gente faz o necessário reconhecimento aos governos democráticos, mas a gente precisa de mais. Tem uma área que o Brasil não avançou, que é na qualidade da democracia representativa. Mesmo na área da saúde, da educação? Mesmo nessas áreas. A gente melhorou, mas o povo quer mais. Por isso queremos uma reforma política profunda, baseada no retorno da discussão do parlamentarismo, no voto distrital misto, voto facultativo e profissionalização do Estado.
 

 
BN - A reforma política é bem diferente do que está no Congresso hoje?
 
EJ - Completamente. Queremos uma reforma política que resgate o papel do político. O presidencialismo imperial é uma forma
tosca de democracia. É uma fase primitiva. Todos os países com democracia mais consolidada são parlamentaristas, com exceção do EUA. Hoje o político é escravo do lobby que lhe elegeu. O político hoje é um despachante de um lobby. Quando eu fala do voto facultativo, é o voto de mobilização. Arrastar o rebanho... Votar pensando. Pode ser que a gente não ganhe a Copa, mas, no quesito ministério, já ganhamos e ninguém tira da gente. Está cheio de gente indicada pelos amigos. Você pega a Petrobras é o PT e o PMDB disputando palmo a palmo cada cargo... Esse modelo de estado de apadrinhamento... A nossa proposta é diferente. É a profissionalização do trabalho do servidor público. Tem de ser revisto.
 
BN - Essa proposta de parlamentarismo, no momento em que a gente vive uma crise parlamentar tão grave, dar mais poder aos parlamentares não é um contrassenso? A qualificação de deputados e senadores vai levar um tempo para se constituir. E você mudar de imediato para outro sistema não é botar poder demais na mão de pessoas que já têm sido acusada de tantos desmandos?
 
EJ - Mas ninguém no Brasil tem esse poder ditatorial de mudar.
 
BN - Tem que ser via plebiscito.
 
EJ - No nosso caso, a gente está propondo... Eu quando era deputado federal deixei uma emenda constitucional discutindo o parlamentarismo para depois submeter a um referendo. A minha ideia é primeiro discutir no Congresso e depois submeter ao povo. Hoje os deputados vivem de migalhas. Pedindo pelo amor de Deus que a presidenta dê um pouco de dinheiro para alimentar a base paroquial dele. Eu preciso reformar o Congresso, para que esse Congresso seja fonte do poder que vai gerar o Executivo. À medida em que eu liberto o parlamento, ele vai mudar de qualidade. A nossa proposta é descentralizadora: "menos Brasília e mais Brasil". Capacitar melhor os municípios para que não fiquem dependendo do governador e da presidenta. Então, vai fortalecer a base dos municípios. Isso significa também que a política municipal mude completamente. Você tem municípios que foram criados para manter carreiras políticas.
 
BN - Aqui a gente tem um exemplo: Itaparica e Vera Cruz são dois municípios na Ilha de Itaparica, o primeiro com 18% do território...
 
EJ - Que ponto da praia vira um e vira outro (risos)?
 
BN - É uma ponta onde era o Grande Hotel de Itaparica...
 
EJ - Por isso que o PV na sua reforma política chega nesse ponto. Os vereadores, por exemplo... Você pode ampliar o número de vereadores, mais conselhos de moradores eleitos. Isso ajuda a prefeitura a administrar. Vereador continua trabalhando como médico ou qualquer outra coisa e não ganha salário. Dá uma contribuição à administração da cidade. Cria-se um novo espaço de democracia. Não tem essa história de ser político profissional.
 

 
BN - Nesse projeto também haveria uma diminuição do Congresso Nacional, que hoje tem 513 deputados e 81 senadores?
 
EJ - Está lá escrito. A gente está propondo extinguir o Senado. Aquele lugar que é só para aposentar político profissional e suplente de senador que financia a campanha deles. Então a gente está cortando o Senado. E quanto à votação federativa, Roraima, por exemplo, não pode ter a mesma representação de Minas Gerais... As bancadas têm direito a dois ou três votos. Você pode ter a estabilidade garantida de uma forma muito mais eficiente. A posição nossa é essa. Para que uma quantidade tão grande de deputados? Pode diminuir. É muito melhor ter uma qualidade parlamentar do que ter uma quantidade que não presta.

BN - Na última entrevista que nós tivemos, o vice-governador do Estado, Otto Alencar, que é candidato ao Senado. falou que precisa ser feita uma reforma do Código Penal. Ele defende um programa de financiamento federal para ampliação do sistema penitenciário no país e quer que haja prisão perpétua e redução na maioridade penal para crimes hediondos e reincidentes...
 
EJ - Ele não defende a pena de morte também não?
 
BN - Não. Ele disse que não.
 
EJ - Por enquanto, né? Essa é a pauta mais tradicional da direita mais raivosa e tradicional. Não tem novidade nenhuma... O que eu fico mais admirado é que às vezes há alguns setores de esquerda que ficam seduzidos por isso...
 
BN - Ele é candidato a senador na chapa do PT, seu ex-partido.
 
EJ - Mas ele é do PT?
 
BN - Não. PSD.
 
EJ - Antes só do que mal acompanhado (risos). A visão nossa sobre a cultura da violência, temos várias ideias. Nenhuma delas igual a deste candidato. Hoje o Brasil já é o quarto lugar do mundo em pessoas presas. Primeiro lugar, Estados Unidos. Impressionante que o país da liberdade está virando o país dos encarcerados. Depois, China, Rússia e Brasil, com 500 mil presos. Há dez anos eram 250 mil. Destes, 170 mil vão dormir no chão. O estado de São Paulo, nos últimos dez anos, foi o que mais construiu presídios, nos últimos anos, no mundo. Nós precisamos repensar a sociedade como um todo. Hoje a economia do crime é uma das mais poderosas do mundo. O narcotráfico é a coluna vertebral. É preciso uma política diferente, mais inteligente. A gente acha que um dos elementos importantes é a valorização do servidor público. Voltamos a dizer. Temos de usar a massa cinzenta cerebral para isso. Isso vai tirar uma fonte econômica, de sustentação do narcotráfico, muito grande. Eu vou explicar: "Amigos, de preferência não use a maconha. Mas, se usar, use pouco".
 

 
BN - Isso é para qualquer entorpecente?
 
EJ - Qualquer. No caso da maconha é a força principal. É estratégica. Dos cerca de 300 milhões de dependentes a maconha é porta de 200 milhões. Como o caso do álcool e do tabaco. A gente fica incentivando: "Não use, não use". E, se você apresentar algum sintoma de dependência, dar assistência à saúde. Como é uma coisa clandestina, se demora a chegar, se pega o dependente no fim da linha. Quando a família consegue levar o jovem, ou velho, porque tem velho também que usa maconha...

BN - Gabeira... (risos)
 
EJ - (Risos) E é um dos melhores jornalistas do Brasil. Para você ver que não tem nada a ver. É um dos melhores jornalistas do Brasil e um dos melhores quadros ambientalistas do mundo. Quero discutir com nosso querido pré-candidato ao Senado (Otto Alencar) que existem alternativas. Por mais humanistas em relação a essa política de mais prisão e redução da maioridade, prisão perpétua, quem começa nesse raciocínio, vai terminar na pena de morte. Nós, do PV, agora, não enfrentamos esse debate, porque como tivemos que montar uma coligação e tivemos que respeitar a postura dela (Marina Silva), por uma questão religiosa dela não tratávamos desse assunto. Mas, agora, vamos falar.
 
BN - Em um bom resumo seria: liberação da maconha e legalização das outras...
 
EJ - Não é liberação. Hoje a avaliação nossa é a regulação. De todas. A liberação pode dar o tom de que estamos incentivando. Hoje já é possível comprar, mas quem regula é o criminoso. É a economia do crime. O que é que eu quero: eu, Estado, vou regular. Hoje ninguém sabe o que está misturado a essas drogas... Eu vou regular, vou te orientar... Você vai saber o que significa usar isso... Tive contato com uma médica do Uruguai, em um congresso, e ela falava sobre o uso medicinal da maconha, que é outra vertente. Nós queremos diminuir os prejuízos. Eu quero falar, por exemplo, da comparação da droga lícita álcool, que é uma das financiadoras da Copa do Mundo. Em uma escala de 0 a 100, o álcool está no número 76 de risco à vida e à saúde. O PV então não é incentivador de nenhuma droga. O que a gente quer é uma política mais inteligente para reduzir os danos desse desejo secular e irreprimível de experimentar drogas... Eu nunca precisei porque sempre estive envolvido com livros, cantos de pássaros...
 
BN - E com relação ao tema aborto? Na eleição passada nenhum dos três principais candidatos, nem Dilma, nem Serra e muito menos Marina, falou disso. Foi um tema espinhoso. Na sua avaliação, esse tema vai ser rechaçado tanto pelo PT quanto pelo PSDB? E a sociedade brasileira está preparada para discuti-lo?
 
EJ - A minha família é muito católica, por exemplo. Em relação a essa questão, a nossa posição é que a chave para diminuir a quantidade (de abortos) é um planejamento familiar e educação sexual nas escolas, para a gravidez precoce. Eu sou autor da Lei de Planejamento Familiar. Para nós, o aborto é uma falha nesse planejamento familiar. O que é que eu faço nessas falhas? São centenas de milhares de mulheres, por ano, que fazem aborto clandestinamente. O ministério estima que possa chegar a 800 mil mulheres que fazem o aborto clandestino, por ano. O PV é laico, mas é espiritualista. Por causa desse dogma eu vou entrar como Pilatos nesse assunto? Eu, como médico, não posso deixar de estender a mão para uma mulher que tomou essa posição. Se a sociedade está preparada ou não, eu não sei.
 

 
BN - Então o senhor é a favor da legalização do aborto?
 
EJ - Eu sou a favor de que haja uma descriminalização, para reduzir o maior percentual possível. Tem que haver planejamento familiar. Significa dizer que essas mulheres que fazem não devem ser consideradas criminosas. Serve apenas para criar um estigma na mulher. Marcar ela com ferro quente e dizer que é criminosa. O fato de você descriminalizar não significa que você vá bater de frente com as autoridades religiosas. Essa é uma das questões mais difíceis do nosso programa. Querem transferir esse trabalho de castigo para o Estado. Não é certo isso. Os outros fugiram deste debate como diabo da cruz. Fizeram isso por pura hipocrisia. Para buscar o voto eles mentem. Mentem ou se omitem. Não sei o que é pior.
 
BN - Há uma defesa para Célia Sacramento, atual vice-prefeita de Salvador, ocupar uma posição nessa chapa? Há um desgaste por ela ter sido eleita com o DEM?
 
EJ - Não sei qual o desgaste que poderia ter. Ela não precisa renunciar...
 
BN - Então o que há de verdade nesse enlace?
 
EJ - Do PV no Brasil inteiro a Célia é o quadro mais importante, no Brasil. Ela é uma amostra de como o povo brasileiro pode se firmar. Os pais dela foram para São Paulo, moraram lá, voltaram e venceram. Ela própria já seria um nome. Se ela quiser, eu abro para ela ser (candidata a presidente). Serei assessor dela.
 
BN - Mas ela é a vice na chapa?
 
EJ - Essa decisão deve sair na nossa convenção nacional, em 14 de junho. Para mim, é um nome excelente.