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Copperfield e a desafetação: tudo a ver

Por José Trindade

Copperfield e a desafetação: tudo a ver
Foto: Tiago Dias/ Bahia Notícias

O Prefeito de Salvador enviou à Câmara de Vereadores Projeto de Lei para desafetação de algumas dezenas de terrenos integrantes do patrimônio público, grande parte deles doados ao município para que este conservasse tais bens na função urbanística que motivou esta doação. Sem qualquer estudo adequado, eis que surge mais uma nova mágica para arrecadar dinheiro a qualquer custo: vender imóveis invendáveis. Nesse ponto, a ilusão é um desastre para a cidade; e o prefeito, o mágico dessa façanha.

 

Se perguntássemos a qualquer dos leitores, se já tinha ouvido falar em David Seth Kotkin, certamente, todos iriam pronunciar-se de forma negativa. Entretanto, se indagássemos pelo seu nome artístico, David Copperfield, a grande maioria diria que se trata do mais conhecido mágico e ilusionista do planeta, senão o maior. Copperfield concebeu proezas em seus truques, como fazer desaparecer a Estátua da Liberdade. Levitou sobre o Grand Canyon,  atravessou as paredes da Muralha da China, deixando o público extasiado e sem a mínima pista, de como teria conseguido produzir tais ilusões.

 

A figura de Copperfield veio à minha mente, recentemente, em face de mais um dos truques produzidos pela administração municipal de Salvador. Explico: encaminhado à nossa Câmara Municipal o Projeto de Lei que trata da desafetação, retira da destinação pública, imóveis pertencentes ao patrimônio do Município do Salvador. Esse é um passo necessário, de modo a permitir a alienação pelo executivo municipal daqueles imóveis que têm uma destinação pública na sua origem.

 

Em sua maioria, trata-se de terrenos que ingressaram no patrimônio do município em função de doações obrigatórias quando da aprovação de loteamentos, por força de lei federal, que exige a designação de áreas verdes e institucionais na incorporação imobiliária, de modo a garantir a qualidade e função sócio/ambiental do empreendimento.

 

A Lei é muito clara: a desafetação de área verde ou de lazer, como queira, só pode ocorrer em situações excepcionais. Mais, segundo a lei, o município é o guardião desse patrimônio que recebeu por doação e tem como encargo manter o bem na função em que foi originado.

 

A desafetação de tais áreas só pode ocorrer após estudo urbanístico sério, assinado por profissionais e órgãos competentes e mediante consulta prévia às comunidades afetadas. Curiosamente, na Mensagem encaminhada pelo executivo municipal quando do envio do projeto à Câmara para aprovação, a Prefeitura de Salvador informa apenas dados cadastrais de cada imóvel, não anexando qualquer estudo de base técnica de fundo urbanístico, ou prova de consulta e diálogo com as comunidades afetadas. Curioso é que não houve qualquer manifestação da área de Urbanismo da Prefeitura, setor competente no assunto.

 

Fica a clara impressão que a compulsão arrecadatória do poder municipal é a causa principal, e talvez a única, desse mal que parece não ter fim. Os aumentos abusivos de IPTU, a indústria de multas de trânsito criada, a antecipação absurda da cobrança do ITIV, enfim, essa série interminável de truques visando aumentar a arrecadação do erário municipal parecia, em função da crise, ter esgotado sua capacidade de abduzir o dinheiro do contribuinte. Ledo engano! A desafetação dos espaços planejados e integrantes dos loteamentos é o novo truque. Os espaços públicos criados em face da aprovação de projetos imobiliários, ainda que figurem como patrimônio da Prefeitura, em essência, pertencem ao cidadão. São necessários à comunidade e cabe ao município zelar pela sua destinação pública e pela sua manutenção. O que está em jogo é o futuro da nossa cidade.

 

Por fim, abstrairia que diferentemente do mágico Mister M, conhecido no Brasil através de um quadro em programa de TV, no qual ele revelava os segredos do ilusionismo, a Prefeitura de Salvador não conseguiu revelar os truques que viabilizariam a mágica da desafetação. A mágica permaneceu imutável: o dinheiro desaparece do seu bolso e ressurge no cofre municipal. Pior, considerando a extensão do atual mandato, tão cedo as cortinas não irão cerrar, afinal, respeitável público, o espetáculo não pode parar!

 

*José G. Trindade é vereador e líder da oposição na Câmara de Salvador, engenheiro civil, administrador de empresas e pós-graduado em administração pública (FGV/BSB)

 

* Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias