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Saída da Ford remonta dilema do mercado automotivo brasileiro que pôs fim a Gurgel

Por Bruno Leite

Saída da Ford remonta dilema do mercado automotivo brasileiro que pôs fim a Gurgel
Foto: Divulgação

Vinte e quatro anos marcam o espaço de tempo entre o fim de duas montadoras importantes para a história da indústria automotiva brasileira, a Ford e a Gurgel. A primeira por ter sido a precursora das fábricas de carro por aqui, quando na década de 1920, instalou sua primeira planta no país. Já a segunda foi quem deu corpo ao primeiro e único carro 100% nacional.

 

Em seus devidos contextos, a trajetória do fechamento das duas mostram semelhanças quanto ao dilema do mercado nacional - que é voltado em grande parte para o público consumidor interno. Se para a Ford não houve rentabilidade nos veículos que mais tinham saída aqui, os carros de passeio, para a Gurgel a concorrência com marcas já estabelecidas não foi tão benéfica - apesar dos seus veículos já apresentarem, naquela época, inovações tecnológicas vistas nos carros de hoje. 

 

Segundo o doutorando em Economia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), Rafael Sales Rios, o mercado automobilístico brasileiro está passando por algumas mudanças nos dias atuais. E as mudanças, inevitavelmente, estão fazendo com que as decisões estratégicas também mudem, independente dos incentivos fiscais ofertados.

 

"Em 2019, a Ford já tinha anunciado que iria fazer um redesenho da empresa, tanto para o setor de transportes quanto para o setor de mobilidade", aponta o economista, comentando que o novo direcionamento da empresa, que agora se volta para segmentos de alto desempenho, inclui a fabricação de produtos destinados para um público que não sofra tantas dificuldades por conta da crise econômica nos EUA e fez com que ela diminuísse o quadro de funcionários administrativos na América do Sul.

 


Fábrica da Ford em Camaçari | Foto: Divulgação / Ford

 

De acordo com Rios, na mesma época em que anunciou as mudanças, a companhia relatou que haviam riscos quanto a sua atuação global, dentre eles a instabilidade financeira e a baixa demanda em relação aos parques fabris. Além disso, havia ainda a aceitação do mercado. E nesse campo, os carros maiores estavam ganhando.

 

A perda de espaço do principal produto da Ford no Brasil, o modelo Ka, foi uma das questões crucais para a decisão da montadora. O veículo, apesar de ser o mais vendido no mercado, não apresentava uma boa margem de lucro por conta da desvalorização do real em relação ao dólar. 

 

Todo esse cenário de instabilidade traria dificuldades, por exemplo, para o surgimento de uma nova montadora nacional como a Gurgel, que na época em que foi fundada, nos anos 1960, apresentou como diferencial um veículo mais leve, barato e apto a trafegar com facilidade por diversos tipos de terreno. 

 

"A ideia dele era fazer um carro 100% nacional, tendo um país com dimensões continentais e entrando em um nicho de mercado que tinha uma tecnologia muito atrasada", revela Lélis Caldeira, biógrafo de João Gurgel, criador da montadora Gurgel, que produziu mais de 40 mil unidades quando esteve em atividade. "A questão é que você precisa de um apoio, de uma energia para rivalizar com uma indústria gigantesca aí", disse o escritor, dando conta das dificuldades enfrentadas.

 


João Gurgel ao lado de um Gurgel Supermini | Foto: Reprodução / Autoesporte

 

INOVAÇÕES QUE TRAEM
"Eles [a Gurgel] eram muito ágeis em descobrir mercado antes de todo mundo. Ele [o fundador] enxergava o mercado automobilístico muito à frente", destaca o biógrafo de João Gurgel, que via no empresário um dom visionário e uma sensibilidade capaz de entender o comportamento do consumidor de automóvel.

 

Estas mesmas inovações - já vistas por Gurgel, que projetou o primeiro veículo elétrico brasileiro, em 1970 - tornam a própria cadeia de montagem de um veículo menor, sem a necessidade de tantos fornecedores. "A corrida agora dessas montadoras é pelos modelos elétricos, conectados, autônomos", afirma o economista Rafael Sales Rios, elencando que as montadoras orientais estão sujeitas a dominar o mercado de veículos de passeio.

 

Para ele, há ainda um descompasso entre a política industrial praticada no Brasil está olhando para o ramo de fabricação de automóveis de maneira ultrapassada. "O setor automobilístico não produz mais carros como nos anos 1970. O carro elétrico já é uma realidade", conclui Rios.