A garotinha, a parede riscada e a desculpa perfeita para as eleições de 2018
Por Fernando Duarte
Neste segundo turno das eleições de 2018, uma história contada por um amigo resume bem o espírito da corrida eleitoral. Peço desculpas por fugir ao padrão das colunas, mas esse é o tipo de conteúdo que vale ser escrito de maneira diferente. É sobre a pequena Bel, ainda criança, que ainda não sabia o que era certo e errado e, na inocência da infância, tentava justificar-se de um malfeito.
Bel ganhou uma caixa de lápis de cera e adorou pintar e desenhar formas – disformes na maioria das vezes. Ali, ela representava o que era o mundo para ela. Muito colorido e cheio de formas de vida que dificilmente seriam inteligíveis para os adultos. Para nós, que acompanhávamos a evolução da pequena, era bem mágico. A descoberta do mundo e das cores através dos desenhos.
Porém, com crianças, não se pode facilitar muito. Deixada momentaneamente sem a supervisão de um adulto, Bel achou o mural perfeito para deixar aflorar toda a criatividade: uma parede recém pintada e inteiramente branca. O papel ideal onde ela poderia riscar de pé, sentada ou em qualquer posição possível. Vocês têm alguma dúvida do que ela fez? Pintou de cores a parede até então branquinha...
O pai, paciente como nunca fora na vida, foi imediatamente reprimir a pequena. Como uma criança tão educada poderia pegar o giz de cera e sair riscando a parede da casa em que eles moravam? Não era possível. O diálogo abaixo é mais ou menos a reprodução fiel do relato, anos depois do episódio.
“Bel, por que você fez isso, minha filha?”
“Papai...”
“Não pode riscar a parede, Bel. A gente te deu papel para isso.”
“Papai, não fui eu.”
“Como assim, Isabel? Como não foi você? Eu vi você riscando.”
“Foi a minha mão, papai. Eu não queria ter riscado, mas minha mão riscou.”
O episódio aconteceu na família do meu amigo. Mas poderia ter acontecido na casa de qualquer um com filhos abaixo dos três anos e que, provavelmente, opta por uma educação pedagógica ao invés da repressão imediata. E é, de certa forma, uma metáfora de como a maioria das pessoas tem reagido às diversas situações criadas durante a campanha eleitoral de 2018.
O país terá que escolher entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT). Porém, assim como a pequena Bel, quando as urnas forem finalizadas e houver um candidato eleito, ambos os grupos políticos terão uma desculpa perfeita para lidar com as adversidades que aparecerão, independente de quem for escolhido.
A racionalidade não parece ser algo muito presente na escolha dos brasileiros para governar o país no próximo ano. Tal qual a garotinha da história, ninguém se responsabilizará eventualmente pelos malfeitos do seu candidato. Infelizmente. No máximo vão usar a mesma desculpa: não fui eu, foi a minha mão que apertou os números nas urnas...