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Entrevista

Maria Quitéria, presidente da UPB

Por Francis Juliano / Fernando Duarte / Alexandre Galvão

Maria Quitéria, presidente da UPB
Foto: Bruna Castelo Branco / Bahia Notícias
Próximo do fim de um biênio à frente da União dos Municípios da Bahia (UPB), Maria Quitéria, prefeita de Cardeal da Silva, no nordeste do estado, mantem a defesa de algumas bandeiras do municipalismo. Primeiro, mudar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que, segundo ela, trava as finanças e a gestão, principalmente de municípios de pequeno porte. “Muitas vezes os prefeitos têm que fazer demissões em massa para seguir a LFR, [...] isso é muito doloroso”, disse em entrevista ao Bahia Notícias. A outra questão crucial para a gestora é o aumento de recursos para os cofres municipais através de uma melhor distribuição do chamado bolo tributário, concentrado ainda no andar de cima, no plano federal. Para a demanda, Quitéria, que tem nome de heroína baiana, promete encampar uma cruzada sob os parlamentares baianos no Congresso Nacional. “Precisamos de gente comprometida lá dentro do Congresso para trancar a pauta, discutir o pacto federativo, procurar os líderes dos partidos e atuar diariamente em Brasília”, declarou. Confira abaixo a entrevista na íntegra.
 
 
Uma das queixas e um dos principais pontos que o encontro nordestino de prefeitos tirou foi a flexibilização da Lei de Responsabilidade Fiscal, que segundo os gestores, trava a economia e os projetos locais? Como é que isso está sendo encaminhado?
Esse é um problema que dificulta a gestão municipal, principalmente quando é preciso viabilizar mais rápido as compras e é necessário fazer uma dispensa de licitação. Isso trava as coisas. Para citar um exemplo. Um incêndio em uma escola. Você tem de comprar no dia seguinte carteiras e outros objetos. Você vai decretar estado de emergência? Muitos conselheiros do TCM têm rejeitado contas por decreto de emergência, como foi o caso de Bosco [João Bosco, prefeito de Teixeira de Freitas]. Isso é prejudicial. Tem vários pontos da LRF que foram diagnosticados pelo grupo de estudo do curso de Direito da Ufba sob o comando do dr. Celso Castro. 
 
O que esse estudo aborda de especial?
Mostra que a lei interfere na saúde financeira dos municípios, e muitas vezes os prefeitos têm que fazer demissões em massa para seguir a LRF. Um dos quesitos da lei é que você tem que diminuir 30% da folha, com um decreto de emergência, admitindo que está ultrapassando o limite. Mas no dia-a-dia, é muito doloroso para um gestor fazer isso. Porque você tem que fechar alguns programas, encerras aulas mais cedo, tem que se comprometer com pessoas que fazem um bom trabalho, e a lei não leva em consideração a necessidade e a importância desses profissionais para a continuidade da gestão. 
 
Mas será que um relaxamento da lei não poderia beneficiar prefeitos irresponsáveis, até picaretas?
A questão é que a lei é incompatível porque nós temos cidades distintas, regiões distintas, de tamanhos distintos. Não é questão de alterar a lei, é de acrescentar alguns pontos. Por exemplo: eu tenho uma população de 20 mil habitantes. Se minha população cai, o FPM é baseado na arrecadação, eu vou ter diminuição do recurso. E aí? Eu já tenho um cálculo mensal de folha, já fiz concurso. Tem município que tem 70% da folha comprometida com concursados. E o prefeito demite, e o Ministério Público manda entrar de volta. E essa lei não dá essa condição de os municípios se adequarem nesses casos.
 
 
O senador Otto Alencar (PSD) se elegeu com a promessa de mudar a Lei de Responsabilidade Fiscal. A UPB vai ficar em cima de Otto?
Não só de Otto, mas em cima de Caetano [Luiz Caetano, do PT], que virou deputado federal, como de todos deputados que a gente sempre procurou. A própria senadora Lídice da Mata (PSB) deu uma entrevista e falou sobre a consulta que nós fizemos em fevereiro deste ano e que está no Tribunal de Contas. Nesse estudo, é informado que os estados de Minas Gerais e Paraná já deliberaram a favor da retirada do cálculo de índice de pessoal de programas federais. Isso não resolveria, mas o prefeito não seria penalizado por algo que não estava no seu planejamento.
 
Pelo fato de o Nordeste ter sido importante na reeleição da presidente Dilma Rousseff, você acha que a região tem mais força agora para conseguir as demandas que precisa?
Eu acho que a gente tem que aproveitar esse momento para tirar essa diferença que o Nordeste levou durante anos. Essa fama de ignorantes, de não ter condições iguais. As cabeças pensantes daqui são iguais às de lá. O que a gente precisa é de condições iguais. Tirar essa diferença conseguindo um recurso maior para educação, um recurso maior para mobilidade urbana, e assim por diante. 
 
Uma questão muito importante na pauta do municipalismo é a inversão do bolo, a repartição dos recursos públicos. O Brasil arrecada muitos impostos, mas eles ficam concentrados no plano federal, com os estado e municípios tendo que ficar com a menor fatia. Como a UPB e os prefeitos estão se articulando para que aconteça uma reforma tributária que funcione para os municípios?
Na verdade, existe um jogo de interesse muito grande. Hoje, o bolo tributário, a repartição desse bolo, não existe mais. Porque o que vinha pelo FPM não vem mais. Quando se criou o FPM, só havia dois impostos: o IPI e o Imposto de Renda. Depois criaram inúmeros impostos, e a gente só ficou recebendo IPI e Imposto de Renda. Mas mesmo assim nós somos obrigados a botar desse recurso que a gente recebe, que é pouco, 25% dele na educação e 15% na Saúde. Hoje, para a gente conseguir nossas demandas é preciso que haja uma força nacional. Porque o pacto federativo é de interesse de todo mundo, inclusive do Sul que recebe a maior parte do ICMS. Precisamos de gente comprometida lá dentro do Congresso para trancar a pauta, discutir o pacto federativo, procurar os líderes dos partidos e atuar diariamente em Brasília.  
 

 
 
A política de redução de IPI [Imposto sobre Produtos Industrializados] do governo Dilma acabou com o dinheiro dos Municípios?
Eu acredito que a política do IPI foi importante. Até porque senão muitos municípios quebrariam.  Mas não é justo tirar de onde não tem. 
 
Foi isso que o governo fez? Tirar de onde não tinha?
Na verdade, o único setor que eles incentivaram foram o das grandes montadoras. Eu não acho que eles escolheram para tirar imposto dos municípios. Eles escolheram um setor para ajudar e acho que foi benéfico. Na época do presidente Lula, ele compensou com o aumento do FPM. Já a presidente Dilma compensou uma parte, dividindo a parcela do FPM em duas. A questão é que o FPM não cresce proporcionalmente às nossas necessidades, como despesa com salário mínimo, inflação, e a prefeitura é como uma casa, tudo aumenta e você tem que aumentar o recurso para poder se manter.  
 
O que Rui Costa, como governador, pode fazer pelos Municípios que Jaques Wagner não fez?
A gente precisa de uma política de integração. Fazer uma melhor gestão fiscal para otimizar recursos, melhorar a arrecadação, porque a Bahia não arrecada bem. Eu acho que Rui deve dar uma guinada nisso porque ele é bem técnico. Precisamos também levar mais indústrias para o interior, porque elas estão concentradas ainda em poucas cidades, além de projetos para alavancar emprego e renda nessas cidades menores. Uma questão prioritária em praticamente todos os municípios é a segurança pública. Rui tem que sentar, diagnosticar com calma, com apoio até do governo federal, para tirar algumas soluções para esses problemas de segurança. Outro ponto é a saúde. Alguns exemplos que a gente vê em outros estados, como UPAs 24 horas, com atendimentos variados, devem ser adotados para evitar que as pessoas venham para Salvador. O que Rui deve fazer é avançar nas políticas públicas, que começaram estruturais, e agora precisam se pulverizar fazendo o diferencial, porque emergência a gente já tem, mas a pediatria, a cardiologia regionalizada, essas especialidades é que vão dar um alívio às pessoas que moram no interior.