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A LC 178 e as despesas com pessoal: mais um enterro da Lei de Responsabilidade Fiscal

A LC 178 e as despesas com pessoal: mais um enterro da Lei de Responsabilidade Fiscal
Foto: Acervo pessoal

Como bom baiano, e em pleno dia do Senhor do Bonfim, dia 13 de janeiro de 2021, data que renovamos a esperança de dias melhores, sobretudo, neste difíceis meses de pandemia, somos literalmente chamados há mais um enterro, agora da nossa Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF, que já tinha sido mutilada pela Lei Complementar nº 173, que flexibilizou regras daquela norma, dando in tese, um cheque em branco aos gestores para descumprir travas importantes da LRF que tentavam a tão sonhada “gestão fiscal responsável”, jamais atingida por força dos gestores públicos, que sempre utilizaram a máquina pública para o clientelismo, o fisiologismo e o nepotismo, características do modelo patrimonialista ainda presente no Estado brasileiro.

 

Se a Lei Complementar nº 173 permitiu que os gestores deixassem despesas/obrigações para a próxima gestão, desde que estas obrigações estejam relacionadas ao combate da pandemia, dando estofo ao descumprimento do art. 42 da LRF, que evita que gestores deixem restos a pagar sem cobertura suficiente para a próxima gestão, com o objetivo de evitar solução de continuidade da gestão, imaginemos agora as flexibilizações anunciadas pela Lei Complementar nº 178, e em especial o tenebroso CAPÍTULO IV - DAS MEDIDAS DE REFORÇO À RESPONSABILIDADE FISCAL, que estabelece:

 

 

Art. 15. O Poder ou órgão cuja despesa total com pessoal ao término do exercício financeiro da publicação desta Lei Complementar estiver acima de seu respectivo limite estabelecido no art. 20 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, deverá eliminar o excesso à razão de, pelo menos, 10% (dez por cento) a cada exercício a partir de 2023, por meio da adoção, entre outras, das medidas previstas nos arts. 22 e 23 daquela Lei Complementar, de forma a se enquadrar no respectivo limite até o término do exercício de 2032.

§ 1º A inobservância do disposto no caput no prazo fixado sujeita o ente às restrições previstas no § 3º do art. 23 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000.

§ 2º A comprovação acerca do cumprimento da regra de eliminação do excesso de despesas com pessoal prevista no caput deverá ser feita no último quadrimestre de cada exercício, observado o art. 18 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000.

§ 3º Ficam suspensas as contagens de prazo e as disposições do art. 23 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, no exercício financeiro de publicação desta Lei Complementar.

§ 4º Até o encerramento do prazo a que se refere o caput, será considerado cumprido o disposto no art. 23 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, pelo Poder ou órgão referido no art. 20 daquela Lei Complementar que atender ao estabelecido neste artigo.

 

O terrível art. 15 da LC 178, no capítulo DAS MEDIDAS DE REFORÇO À RESPONSABILIDADE FISCAL (observar a nomenclatura: “reforço”) define que para recondução do limite de gastos com pessoal (que a sofrida LRF tentou conter, diante do empreguismo presente no aparelho estatal), o ente deverá eliminar o excesso à razão de, pelo menos, 10% (dez por cento) a cada exercício a partir de 2023, quando no distante ano de 2032, o limite definido na LRF (como no caso dos municípios, cujo limite é de 54%) deverá ser atingido.

 

A situação se agrava, quando a LC 178 define que apenas a partir de 2023 a recondução do limite de gastos com pessoal deve ser realizada, ou seja, quem estourar no exercício financeiro de 2021 o limite previsto na LRF, terá um período sabático, de dois anos para se preparar para o início da “recondução às tiras” de 10% por ano, até o longíquo ano de  2032. Até lá, portanto, o inchaço da máquina pública, que foi marca desde o início da vigência da LRF (ano de 2000), terá seu lugar reservado.

 

O que é mais intrigante é que depois da LC 173 ter proibido, por exemplo, o aumento, até dezembro de 2021, das despesas com pessoal nos entes, como forma da União repassar recursos a estados e municípios para combate da pandemia, buscando o controle das contas públicas, vem a LC 178, em janeiro de 2021, e abre a possibilidade de inobservância à extrapolação dos limites de pessoal; postura legislativa esta contraditória, e que nos parece mais uma das facetas do “Municipalismo Patrimonialista”, aquele que foi criado para defender gestores irresponsáveis que utilizam o dinheiro público para abocanhar apoio da população através do empreguismo, fisiologismo, nepotismo, presentes no nefasto, porém ainda presente, modelo de gestão “Patrimonialista”.

 

Portanto, nada a comemorar neste dia de homenagem ao Senhor do Bonfim, que para os baianos, representa a consagração da fé, diante de mais uma norma que flexibiliza o controle dos gastos públicos, e a enterra, não com a velocidade que a COVID19 impõe a sofrida sociedade brasileira, mas retalhando aos poucos, a única esperança de uma gestão fiscal responsável no Brasil, preterida pela LR; e neste caso não há outra saída, que pedir ao nosso bondoso Senhor do Bonfim, que não apenas ilumine nossos caminhos no combate à pandemia a aprovação célere da vacina contra à COVID, mas que também ilumine os nossos gestores, para tenham responsabilidade com o erário, e achem a vacina da responsabilidade fiscal, evitando que o inchaço decorrente do excesso das despesas com pessoal, flexibilizado/retalhado e “parcelado” pela LC 178, impacte na manutenção dos serviços essenciais à população.

 

*Alessandro Macedo é professor de Direito Público

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias