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Marca Bahia Notícias

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'Narrar não é só coisa de homem, muito menos futebol', declara narradora baiana

Por Clara Gibson

'Narrar não é só coisa de homem, muito menos futebol', declara narradora baiana
Foto: Reprodução / Instagram

Ao pesquisar "narradoras futebol" no Google, a plataforma de busca tenta corrigir as palavras-chave e pergunta se, na verdade, você não quis dizer "narradores". Parece simples, mas uma sugestão como essa mostra o quanto há poucas representantes femininas entre a categoria, principalmente de futebol. Diante dessa realidade, dois canais de TV estão buscando mulheres para integrar a sua equipe de narração. A Fox Sports iniciou o projeto “Narra Quem Sabe”, para encontrar mulheres que integrem a equipe durante a Copa do Mundo, enquanto o Esporte Interativo busca, através de um reality show chamado “A Narradora Lays”, uma mulher para acompanhar um dos jogos da Liga dos Campeões, diretamente da Europa.

 

Os dois processos seletivos possuíram representantes soteropolitanas entre os candidatos. Entre elas, Camilla Garcia, que fez parte do programa do Esporte Interativo, mas foi eliminada no sábado (21), ficando entre as cinco finalistas, e Manuela Avena, que ainda está participando da seleção da Fox Sports. Para as duas, a paixão pelo futebol começou desde cedo. “Gosto de futebol desde muito pequena, as primeiras lembranças da minha vida sempre foram de estar chutando as coisas pela casa, pela rua ou por qualquer lugar que eu passava. Eu não escolhi ser apaixonada por futebol em algum momento, simplesmente aconteceu”, lembrou Camilla. Já Manuela conta que pertencia ao grupo de meninas que jogava no intervalo das aulas. “O futebol entrou na minha vida desde muito cedo e depois, mais velha, sempre gostei, sempre acompanhei, sempre foi uma coisa muito natural para mim”, diz ela.

 

Apesar de amarem futebol desde cedo, nenhuma das duas pensou em seguir uma carreira relacionada ao esporte. Camilla é formada em música e dá aula para crianças de 9 a 12 anos, e Manuela se formou em publicidade para depois se descobrir como radialista. Não fazia parte dos planos delas seguir carreira como narradora. Manuela, por exemplo, quando soube da seleção, gravou um vídeo sem compromisso para ver como se saia. Achando que não estava bom o suficiente, acabou guardando. Minutos depois, recebeu mensagens do seu vizinho, que ouviu a gravação e deu muito incentivo para que ela a mandasse para o canal. Faltando poucas horas para o prazo acabar, Manuela mandou o material, editado pelo celular, e dentro de quatro dias ficou sabendo que havia sido selecionada. Camilla, que nunca havia feito nada parecido, diz ter se encontrado na narração durante o reality show. “O sonho é recente, mas a vontade é imensa. Cada vez que entro pra narrar, me sinto completamente plena e feliz. A vontade que tenho é de fazer isso para o resto da vida”, diz ela.

 

As duas seleções promoverão acontecimentos históricos para as mulheres brasileiras. A narradora selecionada pelo Esporte Interativo será a primeira brasileira a narrar uma partida da Liga dos Campões. Já a Fox Sports pretende promover a primeira partida de Copa do Mundo com a narração de uma mulher na TV brasileira. Camilla diz ter aprendido muito durante a sua trajetória no programa. “Aprendi a confiar em mim, a usar melhor a minha voz, venho aprendendo também sobre outros esportes além do futebol”, comenta a baiana. “Gosto de como eu me sinto, como me emociono, é uma felicidade que nunca imaginei sentir. Parece que preciso estar ali, só não sei como demorei tanto pra estar. Me sinto privilegiada pela oportunidade no programa”, completa. Manuela também realça que está aprendendo muito com o processo. Ela e mais cinco mulheres estão passando por treinamentos específicos para narração desde o dia 26 de março. “Foi pra mim uma grande alegria fazer parte desse treinamento, que eu sei que é importantíssimo para a carreira, eu tô aprendendo muito, muito mesmo”, diz Manuela.

 

As baianas, apesar de novas na cena de narração, sabem das dificuldades que devem enfrentar na carreira, já que o meio que escolheram é majoritariamente formado por homens. “Eu sei que a resistência vai acontecer, porque eu sei que é difícil para as pessoas aceitar uma mulher no esporte. E não existe uma referência de voz feminina para narrar, então é muito difícil para as pessoas entender que chegou o momento e que isso é real, e a gente que está tentando quebrar essa barreira tem que ter muita força”, reflete Manuela. “Agora que as pessoas têm acesso a várias mulheres narrando, isso vai ser cada vez mais natural. Eu particularmente ignoro mensagens de ódio e preconceito e troco muita ideia com quem acompanha o programa, que curte e faz críticas positivas. Todos que me mandam mensagens de carinho recebem o mesmo carinho de volta”, completa Camilla. Manuela conta que o seu maior desafio até agora foi tentar encontrar o seu próprio jeito de narrar, justamente por causa da falta de referências femininas entre os narradores. “As referências na história são muito poucas, então eu estou tentando me transformar ao máximo, construir uma ‘Manuela narradora’ que seja agradável tanto pra mim quanto pra quem vai me assistir, até pra diminuir um pouco essa resistência”, diz ela.

 

Elas acreditam que projetos inclusivos contribuem para que a participação das mulheres na narração se torne algo cada vez mais natural e aceito pelo público. “Essas iniciativas são um marco na história da mulher no futebol, um divisor de águas, que vai abrir caminho para tantas outras mulheres e mostrar que nós podemos estar onde quisermos, quando quisermos, porque nossa capacidade e talento não dependem de gênero”, diz Camilla. “É um absurdo em pleno 2018 não termos uma mulher referência na narração, é como se a mulher não pudesse estar no futebol, e isso já passou. Está na hora de acabar com a intolerância e com essa distância entre a mulher e o futebol. Mulher pode estar onde ela quiser, inclusive no futebol narrando e a partir dessas iniciativas a coisa começa a acontecer para que no futuro uma narradora mulher seja algo normal para a nossa sociedade”, completa Manuela. “Narrar não é só coisa de homem, muito menos futebol. Alguns ainda não entenderam, mas não me abala saber que tenho que lutar contra isso. Vai ter mulher narrando sim!”, finaliza Camilla.