Qual o custo a se pagar pela desburocratização?
por Marta Gomes e Irena Martins

A proposta de decreto que pretende revisar a legislação trabalhista lançada pelo governo federal, cujo texto está disponível para consulta pública na Plataforma Participa Mais Brasil (https://www.gov.br/participamaisbrasil/decreto-legislacao-trabalhista), até 6 de março de 2021, tem sofrido críticas severas por parte de diversas entidades.
O Fórum Interinstitucional de Defesa do Direito do Trabalho e da Previdência Social (FIDS), integrado por Associações, Federações, Sindicatos, Grupos de Pesquisa, nacionais e internacionais e que representam inúmeras categorias do meio jurídico, divulgou Nota Técnica repudiando tanto a Consulta Pública quanto o conteúdo da minuta de Decreto, o que – por si – já recomenda atenção ao tema.
A proposta do decreto se põe a regulamentar disposições relativas à legislação trabalhista e instituir um Programa Permanente de Consolidação, Simplificação e Desburocratização de Normas (Trabalhistas), revisando, alterando e consolidando outros 31 decretos preexistentes, tratando de temas sensíveis, muitos já absorvidos pela recente Reforma Trabalhista ou tratados em normas editadas desde a pandemia.
Um dos aspectos que recebeu severas críticas está no maior enfraquecimento da representação sindical, ampliando a exclusão das entidades na regulação das relações de trabalho, enfatizando as negociações individuais e modificando a mediação de conflitos, o que contraria a Convenção nº 154 da OIT. O projeto do decreto também suprime multas, a exemplo da prevista para o não preenchimento da RAIS e dispensa da posse do Livro de Inspeção do Trabalho as pequenas empresas e as empresas de pequeno porte, contrariando disposição da CLT.
Apesar da proposta trazer a criação de um canal eletrônico para recebimento de denúncias sobre irregularidades trabalhistas e pedidos de fiscalização, nem todas as informações recebidas no canal poderão ser consideradas em eventuais inspeções trabalhistas, o que ocorre, por exemplo, no caso de denúncias que envolvam falta de pagamento ou atraso de salários.
Sem entrar no mérito das propostas, a desburocratização – em si – é algo desejado, mas é preciso estarmos alertas: há normas que não podem ser contornadas por decreto e, mesmo que haja a edição do decreto, é muito provável que entidades que militam por direitos previdenciários e trabalhistas ou mesmo o Ministério Público do Trabalho se mobilizem para que o Supremo Tribunal Federal declare a inconstitucionalidade do decreto ora em fase de consulta pública.
Dito isso, fica o alerta: as empresas devem ser extremamente cautelosas ao embarcar nas promessas do decreto. Pode ser que o custo da desburocratização seja, como no dito popular, “um barato que sai caro”, caso o STF se manifeste pela inconstitucionalidade do mesmo, motivo pelo qual deverão contar com cuidadosa análise técnica antes da tomada de decisão por deixar de adotar certas práticas.
*Marta Gomes é advogada especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBET) e aluna especial no mestrado em administração de empresas da Universidade Salvador
*Irena Martins é advogada especialista em Direito Empresarial, mestre em Direito Privado pela Universidade Federal da Bahia (Ufba) e doutoranda em Direito Comercial na Universidade de São Paulo (USP)
*Luciana Marques é consultora, advogada diplomada pela UFBA em 1996, pós-graduada em Direito Empresarial pela Fundação Faculdade de Direito da UFBA.
*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias
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