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As relações de trabalho e o COVID-19

Por Rodrigo do Valle Oliveira

As relações de trabalho e o COVID-19
Foto: Divulgação

Nos últimos dias, o mundo inteiro vem experimentando a maior crise sanitária do mundo moderno. Com a rápida propagação do coronavírus (covid-19), o poder executivo vem tomando medidas para contenção da pandemia, como o fechamento do comércio, shoppings, academias, restaurantes, bares, etc. Muitas empresas têm demonstrado preocupações com relação à manutenção das mesmas, uma vez que o seu faturamento será fortemente impactado. Neste cenário, como ficam as relações de trabalho existentes durante o período de isolamento?

 

Diante de diversas incertezas que ocorreram por conta desse questionamento, o governo federal sancionou em 22.03.2020 a Medida Provisória nº 927, conhecida como a MP Coronavírus, estabelecendo algumas alternativas que podem ser utilizadas pelo empregador, com o objetivo de garantir a manutenção das relações de trabalho existentes. É importante lembrar que o cenário atual não só do Brasil, como de todo o mundo permite adequar a situação como força maior, ou seja, um evento externo, alheio à vontade das partes, imprevisível e inevitável.

 

A mais polêmica das novidades foi a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho do empregado por até quatro meses, para que esse seja submetido a cursos de capacitação online (Art. 18). Segundo esta previsão, o empregador não necessitava da concordância do empregado para adesão deste tipo de suspensão, podendo ainda deixar de efetuar pagamento de salários, que poderia (ou não) ser substituído pelo pagamento de uma “ajuda compensatória mensal”, sem natureza salarial.

 

Após forte pressão, o governo recuou, sancionando a Medida Provisória nº 928, publicada em 23.03.2020, revogando a possibilidade de suspensão contratual contida no art. 18 da MP nº 927 para cursos de capacitação, excluindo a possibilidade de suspensão de pagamento dos salários através desta medida. Seja como for, a referida Medida Provisória ainda continua prevendo algumas alternativas para que os contratos de trabalho sejam mantidos, de modo que as partes não se prejudiquem de sobremaneira. São as principais delas:

 

  • Possibilidade de empregado e empregador ajustarem entre si um aditivo contratual a fim de regulamentar como se dará a relação de trabalho durante esse período de afastamento necessário do trabalho (art. 1º), que terão validade jurídica;
  • Possibilitou expressamente que o empregador adote algumas das seguintes medidas já existentes na CLT;
    • Teletrabalho – Trabalho executado fora do ambiente coletivo, em casa, remotamente, p.e.., seja utilizando-se de equipamento próprio ou da empresa;
    • Antecipação de férias – Férias serem concedidas mesmo sem ter completado o período aquisitivo, com preferência de gozo para trabalhadores que pertençam ao grupo de risco do Covid-19. Possibilitou também a suspensão das férias de trabalhadores da área de saúde ou que desempenhem funções essenciais. Possibilitou ainda que o terço de férias seja pago após a cessada a calamidade pública;
    • Férias coletivas – Todos empregados da empresa ou de determinado setor desta usufruam de férias sem necessidade de comunicação prévia dos sindicatos;
    • Aproveitamento e antecipação de feriados – Os feriados (não religiosos) podem ser compensados com a folga neste período de isolamento/fechamento temporário da empresa;
    • Banco de horas – A possibilidade de que as horas não trabalhadas durante o período de suspensão temporária do contrato de trabalho sejam computadas em um banco a ser compensado posteriormente com trabalho em fins de semana, feriados e/ou horas extras (até duas horas por dia). Essa compensação deve ocorrer em até dezoito meses após cessada a calamidade pública;
    • Suspensão de exigências de saúde e segurança do trabalho – Ficam dispensadas formalidades como exames demissionais, treinamentos (reciclagem) de empregados, suspensão de eleições para CIPA, durante o período de calamidade pública;
    • Suspensão de exigência de recolhimento do FGTS – O empregador fica desobrigado a recolher o FGTS dos meses de março a maio de 2020. O valor deverá ser recolhido posteriormente, sem acréscimo de juros ou correção, de maneira parcelada em até seis vezes.

 

O disposto nessa Medida Provisória possui aplicação para todo tipo de trabalho com CTPS assinada, inclusive as relações de trabalho doméstico, no que couberem.

 

Todas as possibilidades trazidas na MP 927 prescindem de ajuste prévio entre empregado e empregador, podendo ser feitas através de acordo individual, mas que devem atender a determinados requisitos, quais sejam: Razoabilidade; boa-fé; real necessidade da medida; compensação; provisoriedade.

 

Além das medidas acima, é válido citar que a CLT prevê, em seu art. 503 a possibilidade de redução salarial geral dos empregados da empresa em até 25% (vinte e cinco por cento), respeitado, em qualquer caso, o salário mínimo. Cessados os motivos de força maior, é assegurado o restabelecimento dos salários reduzidos com essa medida.

 

A situação excepcional experimentada por todo o mundo exige a adoção de algumas medidas flexibilizadoras. Porém, é importante lembrar que o trabalho digno – em todas as suas formas e acepções – é garantia constitucional, sendo instrumento de realização social do ser humano. E, portanto, deve ser igualmente protegido, de modo a assegurar a dignidade do trabalhador e a manutenção do seu bem-estar.

 

*Rodrigo do Valle Oliveira é advogado, especialista em Direito e Processo do Trabalho e em Direito e prática Previdenciária, mestrando em Direito pela Universidade Federal da Bahia (Aluno Especial) e sócio do escritório de advocacia Gesteira Fialho Oliveira

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias