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Novo Código de Processo Civil: avanço ou retrocesso?

Por Giovani Duarte Oliveira

Novo Código de Processo Civil: avanço ou retrocesso?

Avança na Câmara dos Deputados a votação do novo Código de Processo Civil (CPC). O projeto que busca reduzir recursos, padronizar e acelerar decisões em sua área do Direito, entretanto, traz pontos que caminham na contramão do que se objetiva e do que o nosso país realmente necessita.

Um dos artigos destoantes no projeto que tramita na Câmara refere-se à inadimplência sobre os alimentos. O novo texto sugere abrandamento da pena para quem falta com o pagamento de pensão alimentícia, prevendo o regime de prisão semiaberto em substituição ao regime fechado.

A alteração caracterizaria um enorme equívoco, uma vez que o alimentado depende desses valores para sua sobrevivência. O ato de amenizar a pena favoreceria somente ao devedor, que poderia se sentir mais tranquilo e encorajado para deixar de cumprir com a sua obrigação. Traria a muitos deles um sorriso de satisfação, crédulos de terem, assim, a vida facilitada. Seria esse o objetivo do novo CPC?

Ao longo dos anos, temos vivido essas “facilitações”. Todos os dias, assistimos, ouvimos e lemos casos de corrupção e de falta de compromisso com a ética e com os valores morais. Imaginemos que o próximo passo da legislação será o da eliminação da pena de prisão para devedor de alimentos, seguindo a sorte do que ocorreu no passado com o depositário infiel, que antes era penalizado com a prisão e agora, se vender o bem penhorado, não vai mais preso. Um verdadeiro prêmio ao devedor.

É certo que o sistema prisional nacional não é educativo. No entanto, se queremos que o preso por débito de pensão trabalhe para pagar sua dívida, mudemos o sistema prisional, mas não pioremos a norma jurídica, abrindo margens para benefício do inadimplente.

Uma alternativa seria criar um modelo de trabalho dentro do presídio, possibilitando ao preso uma renda que fosse imediatamente utilizada para pagamento do seu débito. Já existem diversas ações similares postas em prática. Poderia haver algo parecido com essa sistemática.

A única medida a ser evitada é o abrandamento da pena. Vale ressaltar que para ser preso, o devedor de alimentos já passou por várias cobranças por parte do alimentado, foi devidamente notificado pela Justiça e ainda assim não foi capaz de fazer qualquer tipo de acerto. Quem suporta deixar o alimentado à própria sorte, sem cumprir o compromisso da pensão, certamente não tem o entendimento de que a mudança proposta no novo CPC vem para ele ter tempo para trabalhar e pagar o que deve. E por essa razão, a certeza de que a alteração proposta não representa solução eficaz.

Infelizmente, ao invés de reprimida, a impunidade no Brasil é, muitas vezes, premiada. Tivéssemos um sistema mais rígido, não teríamos tantos devedores, pois esses deixariam de lado outros compromissos financeiros, por vezes supérfluos, para honrar com um dever tão importante como é a pensão alimentícia. O aumento da pena e a criação de medidas mais restritivas ao devedor diminuiria a incidência do problema e o número de processos judiciais, culminando no desafogamento do Judiciário.

Outro ponto em desacordo no texto do novo CPC trata da alteração para penhora de contas bancárias somente em segunda instância, salvo em caso de recurso sem efeito suspensivo. Mais uma vez, um ordenamento jurídico que pode premiar o devedor. O tempo lhe beneficia, já que enquanto a ação tramita, ele usa os recursos e investe a seu modo, pagando o credor apenas quando se encerra o processo.

Como exemplo, em uma ação contra um devedor que dure cinco anos, o inadimplente processado poderá usar recurso, investir em um imóvel de alta valorização, enquanto o juro legal é de 1% ao mês. Ao final do processo, quando tiver que pagar o credor, poderá usar o montante que ganhou com o imóvel valorizado, lhe sobrando ainda importante percentual. O credor, assim, fica com os créditos nas mãos daquele que não tem intenção de lhe pagar, que usa seu dinheiro, sem poder ter penhora de conta bancária ou outra garantia.

Um terceiro tema controverso existente no projeto é a previsão de que advogados públicos recebam honorários de sucumbência pagos pela parte que foi vencida no processo judicial, o que é deferido ao advogado da parte vencedora. Mais um item contraditório. Afinal, como pode o Estado receber honorários advocatícios? É uma situação incoerente, já que somente o advogado – e não o governo – pode recebê-los.

Enquanto o projeto para o novo CPC ainda tramita, ficam os votos esperançosos para que nossos parlamentares avaliem bem esses e outros pontos controversos. Se essas alterações forem aprovadas, mais uma vez andaremos na mão oposta do que aparentemente se deseja. Aparentemente, pois se o anseio realmente é diminuir as demandas judiciais nos fóruns, é preciso começar pelos fatores que as originam.

Alterar a legislação, inclusive por uma questão da evolução do homem, dos costumes, da tecnologia, é necessário. Mas, sempre com vistas a ser justo e premiar quem cumpre seus compromissos, jamais ao benefício de quem deve.

Giovani Duarte Oliveira
Consultor jurídico, especialista em processo civil e em gestão estratégica de empresas
Fundador do escritório Giovani Duarte Oliveira Advogados Associados

[email protected].br