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Eleição não é panaceia e má gestão agride direitos

Por Antonio Ribeiro

Eleição não é panaceia e má gestão agride direitos
Foto: Acervo pessoal

Os ventos democratizantes decorrentes da constituição de 1988 possibilitaram, dentre outros avanços, eleições para provimento de diversos cargos da administração pública. A dinâmica deste processo se alimentou, principalmente, da convicção de que esta mudança contribuiria para assegurar gestões democráticas e efetivas, capazes de elevar a qualidade dos serviços oferecidos à sociedade, particularmente através de novos métodos de gestão e do aperfeiçoamento das políticas públicas.

 

Nessa esteira, eleições para dirigentes de vários níveis hierárquicos, inclusive nas universidades, foram regulamentadas, o que não resultou, necessariamente, em gestões consentâneas com tais expectativas, resultando em um distanciamento entre a intenção registrada na lei maior e práticas ora vigentes. Ou, como nos lembra Chico Buarque e Ruy Guerra: “Se trago as mãos distantes do meu peito/ É que há distância entre intenção e gesto”. E eu acrescentaria a distância entre a intenção dos constituintes e as más intenções impregnadas nos gestos.

 

Em meio à empolgação cívica das conquistas democráticas, pouca importância foi conferida aos requisitos técnicos fundamentais para o exercício dos cargos eletivos, não obstante seus ocupantes terem atribuições de gerir recursos humanos, financeiros, processos, etc. Esse descuido, aliado ao desconhecimento da legislação pertinente, tem resultado em gestões ineficientes e em desacordo com normas elementares da administração pública, fruto do despreparo (ou má fé?) de certos ocupantes de cargos dirigentes, em seus vários níveis. Despreparo que se apresenta de modo inequívoco, inclusive nas interpretações de manifestações de cunho institucionais, oportunisticamente entendidas como de caráter pessoal, situação propícia à profusão de sentimentalismos, pieguices e compadrios que em nada se aproximam do indispensável profissionalismo que deve guiar a administração pública, sem prejuízo de outros princípios que certas conveniências pessoais e de grupos insistem em ignorar.

 

Em alguns casos, a negação do princípio da impessoalidade, os casuísmos na tramitação de processos e outros desvios deliberadamente cometidos, modelam um ambiente de disseminação da Síndrome do Pequeno Poder, comportamento autoritário próprio de indivíduos que, aliando incompetência e insatisfação com sua minúscula parcela de poder, se comportam como superiores e atentam contra direitos de outras pessoas, extrapolando limites legais. Estudioso do tema, Everton Gubert assegura que, não obstante os prejuízos que tais práticas impõem às organizações, elas têm crescido nos últimos tempos e parecem mais associadas a um desvio de caráter. E que são comuns em profissionais com pequeno poder que “tomam decisões alinhadas com seu desejo de provar que são eles que mandam, já que, no fundo, eles sabem que não mandam nada”.

 

Eleições são valiosas porque democratizam o acesso a postos de direção. Mas é forçoso reconhecer que votos não revertem o despreparo dos agentes eleitos, não resolvem ineficiências de gestão, não corrigem eventuais desvios de comportamento nem, tampouco, impedem que o desrespeito às normas constituídas agrida direitos individuais e fragilize pressupostos do Estado Democrático de Direito.

 

O respeito aos interesses da sociedade, que financia o serviço público, impõe a adoção de gestões profissionais, em detrimento de práticas que põem a gestão pública a serviço dos interesses de grupos, desprezando o cumprimento das normas que, em última instância, são os instrumentos capazes de guiar as organizações rumo aos seus objetivos legais, em conformidade com os princípios previstos no artigo 37 da constituição brasileira.

 

*Antonio S. Magalhães Ribeiro é doutor em Sociologia Econômica/Universidade de Lisboa, mestre em administração/UFBA e professor da UEFS

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias