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Emendas parlamentares: uma iniciativa (anti)democrática?

Por Fred Wegelin

Emendas parlamentares: uma iniciativa (anti)democrática?
Foto: Acervo pessoal

Em abril do ano passado falamos nesse mesmo espaço sobre a necessidade da revisão do pacto federativo brasileiro e sobre os problemas que decorrem da forma como é realizada a divisão de recursos entre os entes federados: União, estados e municípios (lembre aqui). Hoje vamos falar sobre as emendas parlamentares e como elas, em conjunto com essa conjuntura, montam uma armadilha antidemocrática.

 

Todos os anos o Poder Executivo Federal deve enviar ao Congresso Nacional uma proposta de orçamento a ser executado no ano seguinte. Seria algo como um planejamento de despesas que deve passar pelo crivo dos parlamentares.

 

As emendas parlamentares são justamente as alterações que os membros do parlamento realizam nesse planejamento. Ou seja, os parlamentares podem realizar emendas na lei orçamentária para destinar recursos para seu estado ou município no qual tenha base eleitoral. Em princípio, parece ser um excelente instrumento de melhoria na alocação de recursos, tendo em vista que deputados e senadores devem conhecer melhor a realidade dos seus estados e regiões. Mas se a preocupação é realmente melhorar a alocação dos recursos para atender melhor o cidadão, não seria mais plausível revisarmos o pacto federativo para que os recursos fossem então descentralizados para as prefeituras? Afinal de contas, é nas cidades que os indivíduos vivem e nada melhor do que a gestão municipal para entender as demandas cotidianas dos seus cidadãos.

 

E como é que essas emendas são manejadas politicamente? Os parlamentares direcionam os recursos do orçamento federal para os seus redutos políticos, especialmente para prefeituras comandadas por seus aliados, o que permite ao prefeito realizar mais serviços para o cidadão e auferir ganhos políticos. O prefeito, por sua vez, compromete-se a apoiar esse parlamentar em seu processo de reeleição e divulgar que o serviço entregue à população é graças à emenda dele. Esse procedimento gera um ciclo que se retroalimenta, facilitando a perpetuação dos políticos atuais no poder e minimizando as chances de renovação política.

 

Recentemente, o Congresso Nacional aprovou e o presidente da República sancionou a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) mantendo as emendas do relator sobre o orçamento do Governo Federal. O relator é aquele parlamentar que redige o relatório final sobre o Projeto de Lei encaminhado pelo Poder Executivo para o Congresso e que, diante dessa autorização, passa a ter o poder sobre uma grande fatia do orçamento federal. Trocando em miúdos, significa dizer que um parlamentar será agraciado com o poder de definir como será a distribuição de uma grande quantidade de recursos reservada por ele para indicações políticas, negociadas entre os partidos e o governo. E mais do que isso, as emendas do relator são definidas de maneira informal entre os parlamentares e o governo federal. Isso faz com que a destinação desses recursos não seja realizada de forma transparente. Somente em 2020, o valor total das chamadas emendas do relator foi de R$ 20 bilhões.

 

Esse tipo de manejo do orçamento público não é justo, pois faz com que os recursos federais sejam destinados às prefeituras “apadrinhadas”, enquanto as demais ficam órfãs desse recurso, prejudicando seus cidadãos por uma opção política. Além disso, dificulta um processo de renovação do parlamento, tendo em vista que aqueles que lá estão possuem verba pública para manejar em seu favor, o que gera claramente um desequilíbrio frente àqueles que não possuem mandato eletivo.

 

Além de gerar um grande desequilíbrio no jogo político-democrático, as emendas parlamentares são alvo de desvio de recursos. Elas já tomaram as manchetes de jornais e revistas no país ao longo dos anos. O caso mais emblemático foi o escândalo dos Anões do Orçamento, no qual um grupo de deputados atuava remetendo dinheiro para entidades filantrópicas ligadas a parentes ou fantasmas e também recebendo propina de grandes empreiteiras para liberação de verbas para grandes obras.

 

Não obstante, ao realizarmos uma breve pesquisa no site do Senado Federal define-se a emenda parlamentar como sendo “propostas por meio das quais os parlamentares podem opinar ou influir na alocação de recursos públicos em função de compromissos políticos que assumiram durante seu mandato, tanto junto aos estados e municípios quanto a instituições”. Em resumo, as emendas parlamentares servem para que aqueles que possuem mandato legislativo possam direcionar recursos públicos para instituições ou prefeituras que os apoiem na continuidade de seu mandato e seu processo de reeleição.

 

Importante ressaltar que a revisão do orçamento e suas emendas por parte do legislativo deve continuar ocorrendo, afinal, o Poder Legislativo é quem deve autorizar e fiscalizar as ações do Poder Executivo. Mas aqui trazemos a demonstração de que o desequilíbrio na distribuição de receitas entre os entes federados, além de não permitir uma alocação eficiente de recursos, gera uma série de externalidades negativas dentro da própria democracia.

 

*Fred Wegelin é assessor da Secretaria Municipal da Educação de Salvador

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias