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Economia baiana, um processo de decadência, nexo de causa e efeito

Por Josemar Souza Santos

Economia baiana, um processo de decadência, nexo de causa e efeito
Foto: Divulgação

Escrevo este artigo com felicidade indomável e resiliência, pelo dever cumprido em outros escritos, relatando a importância para a economia baiana, em se ampliar o terminal de contêineres do Porto de Salvador, a "Ponta Norte".  Mais de 15 anos se passaram, uma delonga injustificável que deixa sequelas de atraso para a competitividade de nossas trocas comerciais. Mas como traduz o ditado popular - "antes tarde do que nunca".

 

Sem pretensões acadêmicas, relatarei uma sequência cronológica de fatos que fizeram parte da vida econômica da Bahia do início do século XIX até o presente, para tentarmos elucidar o apagão de atitudes e ações de política econômica que tanto atrasam o avanço da competitividade da economia baiana e sua projeção a nível global, junto a um funesto processo de desindustrialização que também avança perversamente sobre nosso futuro estratégico.

 

No século XIX iniciou-se o esvaziamento da economia baiana, com o dinamismo se direcionando para o sudeste por diversas razões históricas.

 

Os portugueses chegaram, no primeiro momento, em terras baianas e durante mais de 04 séculos  tudo aconteceu por aqui,  em virtude dos  recursos naturais e localização estratégica.

 

Nos idos de 1500 o poderio geopolítico e militar pertencia aos povos que dominavam os oceanos, pela quantidade e qualidade dos navios associado a prontidão de suas tripulações.

 

Portugal visualizou logo no início o quanto era estratégico ter o domínio de um acidente geográfico do porte e localização com as características da Baía de Todos os Santos. Os mesmos a denominaram de golfo, pela sua grandiosa dimensão.

 

Aqui encontraram águas abrigadas, com profundidades adequadas, permitindo a navegação por diversos rios que contribuíram para a exploração de suas entranhas, pela navegabilidade de seus cursos e terras agricultáveis, fechavam este leque.

 

Agrega a estes fatos anteriores, a riqueza da floresta tropical, pela sua diversidade de madeiras apropriadas a construção naval e reformas  de embarcações.

 

A Bahia foi se destacando no cenário global pelas facilidades portuárias e exportação de especiarias.  As embarcações que demandavam ao sul da África, Cabo da Boa Esperança, ou ao Pacífico via Cabo Horn, escalavam no Porto de Salvador em virtude dos regimes de ventos, que favoreciam a navegação.

 

Em nosso Porto, as tripulações descansavam, realizavam reformas nas embarcações, o Porto da Bahia, como era denominado à época, estava sempre coalhado de navios, sendo o mais importante ancoradouro no hemisfério sul durante grande parte do século XIX.

 

Exemplificando a projeção da cidade de São Salvador e seu Recôncavo, podemos citar o primeiro uso do vapor para propulsão de embarcações no Brasil pela Companhia de Navegação Bahiana, o arsenal de marinha da Bahia era o maior estaleiro abaixo da linha do equador, até a primeira metade do século XIX, inclusive sendo aqui construídos navios de guerra para países europeus,  primeira obra de engenharia hidráulica do país foi edificada pelos jesuítas na Ilha de Itaparica, a pesca da baleia, iniciada nos idos de 1602, para extração de óleo, desde a segunda metade do século XIX ao início do século XX foi a principal atividade econômica da Bahia, nossos engenhos povoaram o Recôncavo Baiano, fornecendo açúcar para o mercado internacional.

 

A Bahia era uma referência para Colônia Portuguesa. Cenário que foi se alterando em consequência da mudança da capital colonial de Salvador para o Rio de Janeiro em 1763, junto ao Ciclo de Ouro.  Assim, inicia-se o esvaziamento econômico da Bahia.

 

É importante frisar que, o cacau se apresentava em praticamente todo o século XX como uma atividade econômica relevante no sul do Estado, gerando riquezas, além do complexo fumageiro no Recôncavo, lastreado com capital alemão. O auge e declínio dessas "commodities", será tratado em outro artigo.

 

A descoberta de petróleo no ano de 1939, na localidade do Lobato, configurou-se um novo ciclo para economia baiana, que teve continuidade com a construção da refinaria Landulpho Alves em setembro de 1950 no Recôncavo Baiano. Uma refinaria de petróleo representa uma indústria de base, sendo multiplicadora de investimentos e fornecedora de insumos primários para toda cadeia produtiva de produtos químicos e petroquímicos.

 

Na esteira da refinaria de Mataripe, como é conhecida, surgiu o TEMADRE - Terminal Marítimo de Madre de Deus, o que potencializou um novo nicho para exploração logística na Baía de Todos os Santos.

 

No final da década de 1960 deve-se ressaltar a primeira iniciativa de instalação de um centro industrial com raízes no planejamento, o CIA - Centro Industrial de Aratu, mas com vida curta, pois não se pensou na integração de suas empresas. Em meados de 60 para 70 do século XX, novos ventos se iniciam com instalação de empresas do setor  siderúrgico, a FERBASA e SIBRA, processadoras de ferro ligas e USIBA- Usina Siderúrgica da Bahia, marco para  Estado, por ser a única siderúrgica do Nordeste, a primeira a utilizar gás de petróleo em sua operação, no processo de redução direta. ALCAN - alumínio e Caraíbas Metais - concentrado de cobre.

 

Com as vantagens competitivas e comparativas advindas da exploração de petróleo e da presença da refinaria de Mataripe, a Bahia obteve uma vitória política junto ao Governo Federal, onde conseguiu atrair a instalação de um polo petroquímico. O primeiro centro petroquímico integrado do Hemisfério Sul, superando as pretensões do Estado de São Paulo que almejava expandir o mesmo em detrimento da criação de um novo. A visão estratégica de descentralização industrial do Sudeste para outras regiões do país, também foi fator decisivo.

 

O COPEC – Complexo Petroquímico de Camaçari foi a segunda e mais importante onda do processo de consolidação do setor secundário do nosso Estado, como produtor de bens intermediários.

 

Por fim, na década de 90, depois de outra intensa luta política o governador da época conseguiu trazer a fábrica da FORD para ser instalada em Camaçari. A Bahia ingressava no restrito clube de produtor de bens finais, cuja indústria automobilística simboliza a expressão máxima.

 

A partir de 2007, o Governo do Estado pertencia ao mesmo grupo politico do Presidente do País, na perspectiva do nosso discernimento, começa nesse momento a perda de posições relativas no espectro do PIB Nordestino e Nacional, ou seja, uma situação política que aparentava ser favorável a Bahia, se mostrou um caminho inverso.

 

Este cenário se materializa com a disputa pela fábrica de polímero verde do grupo BRASKEM. Dentre as opções, encontrava-se a Bahia com seu Polo Petroquímico de Camaçari e os gaúchos com o Polo de Triunfo.  As apostas do mercado eram favoráveis para o nosso Complexo Petroquímico, não só pela diversidade e complementariedade de suas unidades produtivas, em relação a Triunfo, como também a Bahia era possuidora de lavouras de cana de açúcar, o Rio Grande do Sul, não. A conquista ficou com os gaúchos.

 

Nesse mesmo pretérito o nosso Estado necessitava de investimentos públicos para ampliação dos Portos de Salvador - a "Ponta Norte" e de Aratu que tinha congestionamentos crônicos, mas, por outro lado as verbas federais foram direcionadas para o Porto de Suape, Pecém e Rio Grande, este último parecia uma vingança pela perda da FORD, que culminou com a não reeleição  do governo protagonista do fato.

 

Salvador era o único Porto a movimentar contêineres no Nordeste, depois do boom de investimentos em Suape, esse porto nos ultrapassou neste tipo  de carga, principalmente em virtude dos transbordos,  navios de longo curso trazem mercadorias de importação, descarregam, e esses contêineres são carregados em navios com menor deslocamento e consequentemente com menor calado, que podem ser operados em portos com profundidade restrita, a exemplo   de Manaus e outros da região Norte.

 

Pernambuco, mais uma vez ganhando espaço no planejamento estratégico em relação à Bahia, buscou o CD - conceito de centro de distribuição, as mercadorias chegam dos centros produtores do Sudeste e Sul do país, sendo concentradas no Porto de Suape, em seguida são distribuídas nos Estados da Região, ganham com receitas logísticas, postos de trabalho e impostos. Isto explica por que muitos navios de contêineres vindo do exterior tem Suape como primeiro terminal a ser tocado e não o TECON Salvador. É justo afirmar que, na navegação de longo curso, sentido exportação o TECON Salvador é líder absoluto, o que reflete ainda a magnitude e diversificação da nossa economia.

 

Enquanto Ceará e Pernambuco avançaram a partir de 2003, a Bahia retroage. Nesse interregno ao invés da ampliação da refinaria Landulpho Alves, os investimentos foram destinados para a implantação da Abreu de Lima, enquanto a USIBA cerra suas portas, o Ceará cria seu parque siderúrgico.

 

Em mais uma contenda na busca por investimentos, tentamos atrair a montadora JEEP, mas a mesma foi instalada em Pernambuco. O estaleiro Enseada do Paraguaçu foi erigido na Baía de Todos os Santos, após Pernambuco já contar com 3 estaleiros, inclusive construiu diversos navios SUEZMAX para TRANSPETRO, hoje doca navios e o nosso continua fechado.

 

A NOVELIS antiga ALCAN encerrou suas atividades, a NITROFERTIL, a SIBRA, a FORD idem, o parque químico da DOW reduziu suas unidades produtivas. Apenas citando as empresas estruturantes e mais significativas.

 

Pasmem que, Salvador tendo o turismo como atividade da mais importante na geração de empregos em hotéis, transportes, alimentação, receptivos, ficou sem Centro de Convenções durante um longo período, é inaceitável.

 

A atividade náutica de lazer com diversas vantagens competitivas, a exemplo de clima propício a navegação a vela, associada a Primeira e Terceira Baías do Brasil, maior extensão  litorânea, tudo representando o terceiro mercado náutico de embarcações de recreio do país.

 

Mesmo possuidor dessas vantagens, não temos estaleiros organizados com economia de escala para atender nossas demandas náuticas, o que constitui mais uma sangria para economia baiana. Quando adquirimos embarcações e equipamentos náuticos em outras unidades da Federação, transferimos rendas, empregos e impostos para estes locais.

 

A ação a ser viabilizada neste contexto pela Secretaria do Planejamento do Estado seria a elaboração de um plano estratégico e a Secretaria da Fazenda através de instrumentos financeiros, implementaria política fiscal e locacional para execução desse projeto. Convocando os empresários da área náutica de lazer de outras regiões, além dos produtores de rochas ornamentais, produtores de café e outras atividades, ofertando aos mesmos esses benefícios para realizarem seus investimentos em nosso território, condicionando o embarque desses produtos em Portos Baianos.

 

Um fato à parte e emblemático é a posição que a Bahia assume como segundo produtor nacional de algodão, mais uma vez o Estado não imprimi ações efetivas no sentido que a riqueza aqui gerada, reverta em benefício da Economia Baiana. Quase toda exportação deste produto é realizada pelo Porto de Santos que fica a mais de 900 km das regiões produtoras, em relação ao Porto de Salvador. Associada a esta realidade, há os constantes congestionamentos do Porto Paulista, o que eleva o frete cobrado, pois são incorporadas as taxas de "demurrage"- sobreestadia. Enquanto isto o Porto de Salvador ganhou mais um berço de atracação, uma vantagem para atrair essa carga. São situações inadmissíveis diante daqueles que tem o dever governamental de desenvolver o futuro econômico da Bahia.

 

A inercia da FIEB – Federação das Indústrias do Estado da Bahia, como  órgão representativo de classe, perante esse processo de desindustrialização que gravita sobre nosso parque  produtivo, é notório. Cabe também a FIEB realizar estudo sobre as vocações produtivas de cada região do Estado e construir pontes para efetivação dos resultados com as respectivas esferas governamentais.

 

Aquisição da RLAM pelo fundo Mubadala Investment Company de Abu Dhabi dos Emirados Árabes proporcionará a ampliação, modernização e desgargalamento das plantas dessa unidade industrial, além desse grupo ser controlador da DETEN situada no Complexo Industrial de Camaçari, cuja RLAM é fornecedora de  insumos, verticalizando a atuação do Mubadala no ambiente econômico do Estado.  A venda dos ativos da BRASKEM na Bahia também está na tela do radar do grupo.

 

Nem tudo está perdido, ações importantes no cenário logístico portuário da Bahia, como citados anteriormente, em 2020, temos a ampliação do TECON Salvador, em mais um berço para navios porta contêineres de última geração e autorização concedida ao Estaleiro Enseada do Paraguaçu para operar como TUP - terminal de uso privado, com embarques iniciais de minérios de ferro.

 

*Josemar Souza Santos é economista pela Ucsal, com especialização em gestão organizacional pública e em gestão em órgão de infraestrutura de transportes

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias