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Pensando alto: o que aprendi (ou deveria ter aprendido) com Norberto Odebrecht

Por Marta Castro

Pensando alto: o que aprendi (ou deveria ter aprendido) com Norberto Odebrecht
Foto: Acervo pessoal

Em 2005, eu estava acompanhando a edição de um vídeo na produtora Malagueta e quando olho para trás, Dr. Norberto Odebrecht estava lá. Queria ver como o vídeo estava ficando. No dia seguinte pedi uma reunião e fui questioná-lo. Jovem, ousada, não contei conversa: “o Sr. fala tanto em delegação, mas rabisca tudo que eu escrevo e agora foi fiscalizar a edição do vídeo? O Sr. não gosta do meu trabalho não? Não confia em mim?”. E ele riu e respondeu: “Dona Marta” (mesmo eu sendo nova, ele era sempre formal e educado), eu estou contribuindo para a sua formação. Enquanto eu rabiscar seus escritos, é porque estou acreditando na senhora, lapidando. Tenha medo no dia que eu te ignorar”.

 

Essa foi uma das várias lições da minha convivência de 11 anos com Dr. Norberto, a quem sou grata pela líder que me tornei e pela mãe que sou. Como ele nos educava contando histórias, vou contar algumas...

 

Certa feita levei minha filha, na época com 4 anos, para que meus colegas de trabalho a vissem. Entro no edifício sede com ela no colo e me deparo com quem? Ele mesmo! Dr. Norberto, que foi logo dizendo: “bota essa menina no chão, ela já está grandinha. Precisa cair para aprender a levantar”. Disse que ela deveria ter a idade de seus bisnetos e que ele se preocupava com essa geração que crescia com as mães ausentes pelo trabalho, “delegando às babás a tarefa indelegável de educar”. E que as babás, subservientes, contribuíam para formar “pequenos tiranos”. Contou que receava que seus bisnetos crescessem com o “espírito de serem servidos e não de servir”. Eu vi a cena na minha própria casa e, a partir daquele diálogo, passei a ficar muito mais atenta e consciente na educação de Letícia, que hoje é uma jovem admirável.

 

Outra passagem que muito mexe comigo foi numa visita aos projetos da sua Fazenda Vale do Juliana. Subíamos em direção ao mirante, ele tranquilo na minha frente e eu ofegante atrás. Dr. Norberto devia estar nos seus oitenta e poucos anos e eu nos meus trinta e poucos. Foram só duas perguntas e, mais uma vez, uma risada: “está cansada, Dona Marta? Está se cuidando?” Eu estava acima do peso e decidi ali que queria me cuidar para envelhecer bem, como ele.

 

Dr. Norberto comia uma maçã 10h da manhã, outra 16h. Oferecia a quem estivesse na sala. Eu não gosto de maçã e por várias vezes me chamou a atenção por não aceitar a oferta. E, regularmente, encerrava as reuniões no final da tarde anunciando que tinha que ir fazer exercício “para não enferrujar”. Mas não era perfeito, adorava uma Coca-cola.

 

As maiores lições de Dr. Norberto, no entanto, eram as não ditas, as não verbalizadas. O exemplo. Antes de irmos para a sede da Paralela, passamos uns dois anos no 33º andar de um edifício comercial. Ele entrava no elevador cumprimentando a todos e perguntando para onde iam. Marcava o andar e segurava a porta. Era o ascensorista de todos que por lá circulavam. Na fazenda, tinha um Fiat Uno, enquanto seu administrador tinha uma pick-up top de linha. No escritório, recebia cada visitante na porta e, ao final da reunião, acompanhava até o elevador, certificando-se de que a pessoa sabia o caminho e tinha transporte disponível. Fosse quem fosse.

 

A disciplina com o horário era outra marca sua, mas essa eu confesso que não assimilei muito não, assim como a delegação, algo que ensino, mas que muitas vezes falho, na ilusão de dar conta de tudo.

 

E eu tive a honra, a sorte e a felicidade de beber desta fonte de sabedoria, que me fazia pensar e me educava pelo trabalho. Norberto Odebrecht me ensinou a não levar problema sem solução, me ensinou o quanto é bom ter líderes e clientes exigentes, me ensinou o amor pelo trabalho e, acima de tudo, me ensinou a identificar talentos e a desenvolver pessoas, “ofício” ao qual hoje eu me dedico e que me realiza plenamente.

 

Esteja onde estiver, obrigada, mestre! Você segue vivo em nós.

 

Norberto Odebrecht 1920-2020

 

*Marta Castro é sócia-diretora do Instituto Planos, Consultora Empresarial, Coach Executiva e Facilitadora de Grupos

 

*Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias