O que fazer com os endividados?
Os bancos existem para ajudar as pessoas, levando o crédito de onde há abundância para onde há escassez. Passados mais de dois séculos desde que Adam Smith, o pai do liberalismo, cunhou esse conceito, os bancos estão na berlinda e são vistos como responsáveis pela exploração das pessoas. Uma espécie de novos escravagista, devido ao elevado custo do dinheiro. E, como desdobramento, o endividamento da população que desafia a gravidade.
O Brasil é um exemplo real e corrigir as atuais distorções será um dos grandes desafios do presidente da república a ser eleito em outubro. Os números demonstram: são cerca de 60 milhões de endividados, mais de 5 milhões do que em 2017. O pior é que isso atinge diretamente o consumo das pessoas e inibe a retomada do crescimento econômico. Ou seja, eterniza a crise.
Bancos públicos cobram taxas tão elevadas quanto os bancos privados e, em consequência, não cumprem seu papel. Servem exclusivamente ao lucro, não à sociedade. A saída, ao que tudo indica, é reduzir as taxas de juros. Mas se isso ocorrer unilateralmente - quer dizer , apenas da parte dos bancos públicos - os bancos privados quebram. Portanto, é preciso uma solução cuidadosa e muito bem negociada. Mais do que um mudança econômica, é uma mudança cultural.
Aparentemente, não há dificuldades: a imagem dos bancos é péssima e , por parte, da população não haveria qualquer dificuldade em apoiar medidas contrária aos interesses do capital. A situação, porém, é complexa pois os bancos, privados ou não, têm presença em toda economia. E qualquer mudança pode ser fatal para o sistema, se não for feita com cautela e sensibilidade.
Como está, contudo, não pode continuar. Milhões de brasileiros não podem mais pagar suas dívidas, estão com o nome no Serviço de Proteção ao Crédito e estão impossibilitados de consumir. É um quadro radicalmente diverso daquele analisado pelo filósofo e economista britânico, nascido na Escócia, autor do clássico A riqueza das nações, que viveu 67 anos no século XVIII, o Século das Luzes. Adam Smith era liberal porque, assim, servia ao desenvolvimento. Hoje, o ambiente brasileiro, por exemplo, caminha muito rapidamente para as trevas. Os problemas explodem por todos os lados e simultaneamente. Testemunhas disso são o desemprego, a violência no campo e nas cidades e o agudo endividamento dos estados. Não questão ideológicas entre direita e esquerda, mas de falência do neoliberalismo que se torna ineficaz a cada dia, a começar pela iniciativa privada. Adiar soluções para os endividados é ignorar uma crise de grandes proporções, que atinge principalmente o trabalho, mas que muito cedo, será danosa também ao capital. Adam Smith, certamente, aconselharia a se antecipar à crise e pensar mais no coletivo do que no livre mercado. Mudam os tempos, mudam as vontades.
*Francisco Viana é jornalista e doutor em filosofia política ( PUC-SP)
* Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias