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Entrevista

Na tentativa de prevenir suicídios, CVV atende 1,7 mil mensalmente na Bahia

Por Renata Farias

Na tentativa de prevenir suicídios, CVV atende 1,7 mil mensalmente na Bahia
Foto: Divulgação
A cada 40 segundos, uma pessoa comete suicídio no mundo, de acordo com estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, 30 pessoas se suicidam diariamente, segundo a Associação Psiquiátrica da Bahia (APB), enquanto no estado há uma média de três a quatro suicídios por dia. Há 54 anos, o Centro de Valorização da Vida (CVV) vem contribuindo na tentativa de reduzir esses números e, principalmente, apoiar emocionalmente pessoas que pensam em acabar com as próprias vidas. Segundo a voluntária e porta-voz nacional da organização, Adriana Rizzo, nos últimos seis anos, foram atendidas 1 milhão de pessoas via telefone ou internet em todo o Brasil. Na Bahia, a média chega a 1,7 mil atendimentos por mês. "Somos todos voluntários. Mais ou menos2 mil voluntários no Brasil todo. Existem 72 postos de atendimento, com locais físicos, que as pessoas vão até lá para atendimento", informou ao Bahia Notícias. "Além do atendimento por telefone, que hoje ainda é o carro chefe, tem também os atendimentos pela internet, tem site, e-mail e chat". Com o objetivo de acolher ainda mais pessoas, o CVV iniciou uma parceria com o Facebook para criação de uma ferramenta de "denúncia" de possíveis casos de suicídios, além da criação de um aplicativo para celulares, que está em desenvolvimento.

Qual a melhor forma de prevenir o suicídio, seja de uma pessoa próxima ou até mesmo de um desconhecido?

A gente acredita que a melhor é dar atenção. Se aproximar dessa pessoa, entender por que ela está passando por alguma dificuldade. A gente acredita que, se a pessoa tiver alguma atenção, alguém que a ouça de verdade, ela vai conseguir organizar suas ideias e talvez enxergar uma luz que no momento ela não tem. Acho que a ideia é partir desse princípio que a pessoa precisa de atenção. O mais importante é fazer com que a pessoa se sinta acolhida e compreendida.
 
O CVV tem investido recentemente em ferramentas que atingem principalmente os jovens. No entanto, as redes sociais são apontadas muitas vezes como “incentivos” para que a pessoa recorra ao suicídio. No geral é possível analisar as redes sociais como algo positivo ou negativo com relação a essa questão?
Eu acho que têm dados muito mais positivos do que negativos. A possibilidade de a pessoa conversar com alguém, de ter atenção, acaba sendo positivo. Até por conta disso, que as pessoas acabam desabafando mais nas redes sociais, que o Facebook desenvolveu essa parceria com a gente. Quando eles percebem alguma palavra de suicídio, de automutilação, eles recomendam que a pessoa procure ajuda. Isso já existe em outros países e agora no Brasil está funcionando faz uma semana mais ou menos. Isso ajudou a gente também, é mais um aliado na prevenção do suicídio. Eu acho que isso [redes sociais] serve como uma ferramenta para a gente se aproximar, principalmente com quem tem dificuldade de fazer amizades pessoalmente. No contato com o CVV por telefone, a gente não pede nada de informação pessoal da pessoa e nem identifica o telefone. Elas se sentem um pouco mais à vontade. Isso extrapola para a internet também. A pessoa consegue falar melhor quando não está “olho no olho” com alguém.
 
E como vai funcionar essa ferramenta com o Facebook? Vai ter uma equipe deles para analisar as postagens ou é só a partir de denúncias?
Vai ser a partir de denúncias. Você pode denunciar o perfil de um amigo que você ache que precisa de ajuda. É no mesmo mecanismo de denúncias que já existe no Facebook, como já tem pra outras coisas, como conteúdos indevidos.
 
O CVV agora estão tentando criar um aplicativo, o “Como Vai Você”, certo? Estava até concorrendo em um projeto do Google. Como vai funcionar isso?
A premiação já aconteceu, nós fomos um dos dez projetos selecionados. Por conta disso, a gente ganhou R$ 650mil do Google. Houve uma votação, e os quatro primeiros colocados ganharam R$ 1,5 milhão. Agora nós já temos o suficiente para desenvolver o aplicativo. Como aconteceu a premiação na semana passada, a gente já vai começar a desenvolver. A ideia do aplicativo é que, a qualquer momento, quem precise possa acionar alguém para conversar. A ideia do aplicativo é que a pessoa vai possa tanto conversar por voz quanto por texto. A gente está desenvolvendo isso e vai ter um prazo de um ano mais ou menos para o Google ver. A ideia é mesmo aumentar a acessibilidade das pessoas, para que elas tenham um contato mais direto, mais fácil, para não depender de um computador ou de um telefone.
 
O CVV surgiu com a característica de ser um canal telefônico. Como funciona quando as pessoas ligam, como é realizado o atendimento, como é a equipe?
Somos todos voluntários. Mais ou menos2 mil voluntários no Brasil todo. Existem 72 postos de atendimento, com locais físicos, que as pessoas vão até lá para atendimento. Para ser voluntário é preciso fazer um curso que dura mais ou menos dois meses e depois disso você começa a atender. Além do atendimento por telefone, que hoje ainda é o carro chefe, tem também os atendimentos pela internet, tem site, e-mail e chat. O CVV começou mesmo disponibilizando atendimento pelo telefone e pessoalmente. Há uns cinco anos não era todo mundo que tinha telefone, então as pessoas iam aos locais de atendimento. Elas ainda podem ir, mas hoje vão bem menos, já que preferem o telefone pela facilidade e até para não se expor. Elas falam sobre tudo, sobre aquilo que elas precisam dividir com alguém e muitas vezes não têm pra quem contar. A gente acredita que se ela não fizer isso, depois de um tempo ela pode pensar em ficar desesperançosa mesmo, ter motivos para desistir de viver do jeito que ela vive e pode pensar em morrer. Então a gente tenta prevenir isso.
 
Como funciona no caso de pessoas que ligam sempre, já que elas não se identificam?
Às vezes a gente faz assim, se eu já atendi a pessoa algumas vezes, eu reconheço o tom de voz, a história dela, ou ela mesma fala que já conversou comigo, porque a gente pode falar o nosso nome. A gente não pergunta o nome das pessoas, mas ela pode perguntar o nosso nome e dizer “eu te liguei e queria conversar com você porque você já conhece a minha história e tal”. Ainda assim, nós fazemos plantões semanais de 4h, então não estamos lá o tempo todo, mas a gente disponibiliza o trabalho do CVV pra que ela volte a procurar quando precise.
 
E o atendimento é local, certo? Se alguém de Salvador ligar, será atendido por alguém daqui.
A gente tem um projeto que está funcionando no Rio Grande do Sul, por enquanto. É um telefone novo que o Ministério da Saúde cedeu para o CVV como um telefone de proteção ao suicídio. É o 188, que é gratuito, mas por enquanto só funciona no Rio Grande do Sul. A ideia é implantar agora para todos os estados do Brasil. A gente precisa ainda de condições técnicas, para que a pessoa possa ser atendida mesmo não tendo um posto de atendimento. Hoje a gente acaba atendendo em lugares que não têm postos do CVV via internet.
 
Com relação a números, qual a média de ligações vocês recebem no Brasil e especificamente na Bahia?
No Brasil a gente teve 1 milhão de contatos por ano nos últimos seis anos. Contando telefone, e-mail, site etc. Já na Bahia, a média chega a 1.700 atendimentos por mês.
 
Vocês recebem alguma forma de retorno sobre os atendimentos prestados? Sabem se teve um resultado positivo?
Não temos certeza. O que a gente sabe é que às vezes a pessoa liga, conversa com a gente, estava muito nervosa e melhora. Eventualmente ela liga depois falando que ficou melhor e ela agradece, mas não é o padrão. A gente nem espera que isso aconteça mesmo. O que a gente quer é que a pessoa volte a se sentir bem. A gente não tem muito controle disso, não.
 
Atualmente a gente tem um número muito alto de suicídios, principalmente de jovens. A que vocês atribuem isso? Por que os jovens são quem mais cometem suicídios? Há alguma resposta?
Acho que temos que parar para pensar sobre isso. São vários fatores que colaboram. A própria mudança social, a forma como as famílias mudaram, a forma como a gente acaba sendo levado a valorizar mais o trabalho, a correria e tudo, como você acaba se relacionando com as pessoas de forma muito mais imediatista. Acho que tem a ver com o contexto social todo e a cobrança em cima dos jovens para seguir determinado padrão.
 
Se alguém quiser ser voluntário do CVV o que é que pode fazer?
Pode se inscrever pelo site para participar do curso, em uma aba “voluntários”. Na Bahia a gente só tem o posto de Salvador, mas você pode ser voluntário online, tem essa possibilidade também. Se você não tiver em Salvador, pode se inscrever e fazer o curso online.