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Entrevista

Francisco de Souza Andrade Netto, presidente do TCM

Por Francis Juliano

Francisco de Souza Andrade Netto, presidente do TCM
Fotos: Francis Juliano / Bahia Notícias

Mesmo com um cenário de aperto nas contas das prefeituras, o presidente do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), Francisco Souza de Andrade Netto, promete cumprir à risca o que manda a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Empossado nesta segunda-feira (13) para mais um mandato à frente do tribunal, Francisco Netto disse que os gestores precisam ter mais “responsabilidade”. Em entrevista ao Bahia Notícias, o presidente do TCM contestou que o órgão de contas tenha perdido importância após o Supremo Tribunal Federal (STF) dar às Câmaras de Vereadores a palavra final no julgamento das contas dos gestores. Francisco Netto ainda comentou a polêmica em torno da proposta de extinção do órgão. “Eu acho que em um momento como esse, de escalada da corrupção, quando você vê contratos superfaturados, falar em extinguir ou diminuir a capacidade dos tribunais de controle é um negócio chato, não é? Mas, infelizmente, tem pessoas com coragem de argumentar que tem que extinguir o TCM”, diz. Leia abaixo a entrevista na íntegra.
 

 
Pra começo de conversar, quais são os desafios dessa nova gestão à frente do TCM?
Esse é um mandato novo, mas isso não significa que a gente não vá fazer nenhuma modificação, como o investimento em tecnologia, para procurar melhorar a gestão. Isso já avançou muito. Antes, a gente tinha um tribunal que funcionava com muito papel. Hoje, nós estamos com um processo eletrônico que foi um avanço muito grande. Lá atrás, veio o Siga [Sistema Integrado de Gestão e Auditoria], que é um banco de dados importantíssimo para o controle dos gastos públicos. A gente tem no Siga uma fonte de informação para outros órgãos, em que os grandes demandantes são os ministérios públicos federal e estadual e, principalmente, a Justiça Federal. Através dela é gerada a inegibilidade de políticos. 

Além disso, tem outras ações que o Tribunal vai fazer? 
Além destes, a gente colabora também com a Polícia Federal. Tem também a Escola de Contas [espécie de consultoria pública do TCM]. Para isso, já fizemos o contato com o presidente eleito da UPB [Eures Ribeiro, prefeito de Bom Jesus da Lapa]. Já fazíamos antes com a ex-presidente Maria Quitéria, que sempre foi uma parceira muito importante. Essa escola vai servir para fazer bons treinamentos com os gestores. Porque a gente quer orientar e evitar aquela história de dizer que, “ah, o tribunal está punindo muito”. Não é isso que nós queremos. 

O TCM sofreu um certo rebaixamento de importância depois que o STF [Supremo Tribunal Federal] tirou da competência dos tribunais de contas a última palavra nos casos de cassação de políticos?
Não acredito. Até porque essa questão não está definitivamente resolvida. Sempre, a palavra final foi das Câmaras de Vereadores. Ocorre muito a seguinte situação: o tribunal encontra irregularidades e rejeita as contas, o que provocaria a inegibilidade. Aí, muitos vão à Justiça e às vezes alegam que a Câmara reverteu a decisão do tribunal. Você vê muito isso. “Ah, o tribunal rejeitou e a Câmara aprovou”. Mas isso é lógico, porque o tribunal dá o parecer prévio e a Câmara municipal é quem vai decidir. 

A questão é que ficou parecendo que com essa decisão do STF, mesmo que o TCM reprove determinada conta, a Câmara de Vereadores pode passar por cima da decisão do Tribunal de Contas?
Agora, existe o contrário também. Você tem uma conta aprovada e a Câmara muda o parecer nosso. Mas o importante é que a gente vai tentar nesta nova gestão orientar e fiscalizar com ferramentas importantes para cruzar dados e pegar mais informações sobre os gestores. 

Mas o senhor acredita que pode aumentar a tendência de as Câmaras ignorarem o TCM?
Eu acredito que não, até porque nestas últimas decisões sobre contas, tivemos poucos casos. A maioria dos casos ocorre quando tem aquela coisa da política local. O político tem a rejeição de contas, mas tem a maioria de vereadores na Câmara. Isso é muito ruim. Mas o mais importante hoje é que o tribunal tem se reafirmado como órgão importante no controle de contas.

 

E a questão da proposta de extinguir o TCM ainda ameaça o futuro da instituição?
O caso do Tribunal de Contas do Ceará, que é o mais antigo do Brasil, mostra a importância dessas instituições. Por uma questão política, pela disputa pela presidência da Assembleia Legislativa do Ceará, um candidato prometeu acabar com o Tribunal de Contas cearense. E a coisa foi levada a sério. Só que a ministra presidente do Supremo Tribunal Federal [STF], Carmem Lúcia, anulou a PEC [Proposta de Emenda à Constituição] desse candidato. Eu acho que em um momento como esse, de escalada da corrupção, quando você vê contratos superfaturados, falar em extinguir ou diminuir a capacidade dos tribunais de controle é um negócio chato, não é? Mas, infelizmente, tem pessoas com coragem de argumentar que tem que extinguir o TCM. Mas o pior é que os argumentos são frágeis. Aí, falam: “ah, é para diminuir custos”. Não é nada disso. O custo é o mesmo. Por exemplo, no Ceará, tem dois tribunais [do Estado e dos Municípios]. Se extinguir um – os quadros são os mesmos – o outro iria absorver os quadros técnicos do que foi extinto. Os conselheiros iriam ficar à disposição do tribunal que sobrar.

Diante do agravamento da crise econômica do país [há um cenário de congelamento de investimentos públicos em até 20 anos], o senhor acredita que os prefeitos terão mais dificuldade de respeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal [LRF]?
A questão da Lei de Responsabilidade foi um avanço. Foi muito importante. Agora você pergunta, como gerir diante desse cenário? Só se modificar a lei, o que sou contra. A lei está aí e tem de ser cumprida.

Há uma interpretação em que os gestores podem ter mais gastos. O fato de cortar empregos comissionados e outras despesas, não, necessariamente, barateia a gestão. Porque o cidadão pode sair do plano de saúde e ir para o SUS [Serviço Único de Saúde], ou tirar a criança da escola privada para matriculá-la na pública. A LRF poderia ser flexibilizada?
Olha, existem vários argumentos. No limite de pessoal [até 54% da folha de pagamento de funcionários], eles dizem: “os programas federais vêm e quem tem que bancar somos nós, como os de saúde e educação”. Aí, eles extrapolam o limite, e o tribunal sugere a rejeição de contas, mas o cara diz: “Eu não posso fazer nada porque aumentou as despesas com esses programas”. Isso é uma realidade, mas o tribunal não pode simplesmente aceitar. É a Lei de Responsabilidade Fiscal. Quando os índices não são cumpridos, o tribunal tem que tomar decisão. 

O que falta aos prefeitos para realizarem uma gestão mais enxuta e equilibrada?
Eu acho que eles têm de ter um pouco de responsabilidade. Claro que a gente lamenta o cenário econômico atual que não é favorável. Mas o tribunal está aí orientando. E quando for necessário, se dá toda a oportunidade para que os gestores apresentem recursos, pedidos de reconsideração, e se tem toda boa vontade com eles. Mas eu costumo citar o prefeito de Lajedinho, que sofreu aquela tragédia [a pequena cidade foi vítima de um temporal em dezembro de 2013, quando 11 pessoas morreram e várias ficaram desabrigadas]. As contas dele foram quase perfeitas. Sem nenhum problema.