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Entrevista

Wilson Gomes, professor de Comunicação e Política

Por Francis Juliano

Wilson Gomes, professor de Comunicação e Política
Foto: Reprodução / Pós-Com Ufba
Nem bem terminou a eleição para prefeito, já se especula sobre o próximo pleito, em 2018, para governador. A vitória de ACM Neto na capital e o triunfo de aliados de Rui Costa no interior já preveem uma batalha anunciada. No entanto, há outras forças que correm por fora e podem surpreender por dentro. Segundo o doutor em filosofia e professor de comunicação e política da Ufba, Wilson Gomes, Geddel Vieira Lima e Otto Alencar podem representar a terceira e a quarta força, o que embaralha mais ainda o xadrez da política baiana. “Não está claro que Geddel vai aceitar sentar no banco de trás, enquanto ACM Neto vai na janela [...] Será que o PT vai assimilar o grupo de Otto como uma força política nova para tentar se recompor?”, diz ao Bahia Notícias. Na entrevista, o pesquisador comenta ainda sobre a “derrota do PT”, avalia fatores que levaram Neto a vencer na capital, e analisa o discurso “avesso” à política, que se apresenta como salvador da pátria. Leia abaixo a entrevista na íntegra.
 
Assim que foi declarado reeleito, com quase 74% dos votos válidos, o prefeito de Salvador, ACM Neto, disse que o grande perdedor destas eleições foi Rui Costa. Tem validade essa afirmação?
Eu acho que essa posição de ACM Neto serve mais para marcar posição. É muito mais uma tentativa de dizer que ele foi o vencedor, do que uma capacidade de analisar a eleição. Em primeiro lugar, Alice não era a candidata do PT. Segundo, Rui Costa realmente não teria chance de impor candidatura em Salvador. A grande força eleitoral dele vem do nosso interior. Não acredito que faça sentido essa frase de Neto.

O senhor acredita que foi acertada a tática da campanha de Alice, em focar no discurso do golpe e nas obras do governo do estado na capital?
Não deu certo. Em alguns lugares, candidatos conseguiram sobreviver bem, nacionalizando a eleição municipal. Foi o caso específico do Rio de Janeiro, na campanha de Marcelo Freixo (Psol). A questão era derrotar o candidato do PMDB. Aliás, lá, o primeiro colocado, Marcelo Crivella, também enfrentou o candidato do PMDB e dizia: “eu não sou do PMDB”. No Rio de Janeiro teve muito sucesso a tática de que “vamos fazer agora o PMDB pagar pelo golpe que foi cometido”. Isso deu certo. Provavelmente deve ter dado certo também em São Paulo, razão pela qual Marta Suplicy foi tão mal. Mas aqui. Em primeiro lugar, ACM Neto não é do PMDB. Segundo, durante todo esse período do impeachment, ele não se meteu em grandes tretas políticas, não comprou camisa de coxinha, não saiu por aí gritando. Ele ficou meio que low profile [baixa visibilidade, em tradução livre]. Não foi uma espécie de Imbassahy [deputado federal], que estava em todas as fotos, gritando por impeachment.

Nesta eleição nós tivemos um número expressivo de abstenções, (21,2% em Salvador; 20,7% em Vitória da Conquista; 17,1% em Feira de Santana), além de votos nulos e brancos. O que esses dados representam?
Isso representa uma parte dos baianos. Mas em Salvador e na Bahia, é normal. Pelo que tenho acompanhado, um terço dos baianos não votam. Isso é histórico. É o padrão nosso. 

Estamos a dois anos da eleição para governador. Entre as maiores cidades do estado, houve um certo equilíbrio. Enquanto que o campo do governo do estado conseguiu as prefeituras de Lauro de Freitas e Juazeiro, a oposição teve os municípios de Feira de Santana e Camaçari. Como essas duas lideranças, Rui Costa e ACM Neto, irão pescar votos?
Olha, além dos dois, tem Geddel Vieira Lima. ACM Neto cresce até tocar em Geddel. Será que os dois vão ser uma força única? Eles não foram aliados em outras eleições. Então, não está claro que Geddel vai aceitar sentar no banco de trás, enquanto ACM Neto vai na janela. 
 

Foto: Reprodução / Facebook

Outra força que tem crescido é o PSD, capitaneado na Bahia pelo senador Otto Alencar. Nesta eleição, o partido fez o maior número de prefeituras, 83 ao todo. Como essa legenda vai se comportar daqui para frente?
Aí vêm as questões. Será que o PT vai assimilar o grupo de Otto como uma força política nova para tentar se recompor? Vai dividir poder? Porque o PT saiu pior do que o grupo de Otto. Por isso, não são só três forças políticas, são quatro forças no estado. E essa base de Otto tem força, sobretudo no interior. Por isso, não é tão simples. Se fosse linear, todo mundo estava esperando que ACM Neto fosse o grande fiel da balança da eleição passada, por exemplo, em 2014. Porque se o PT perdesse aqui para governador, ele apareceria como vencedor. Mas foi derrotado de forma surpreendente. O PT manteve sua força e ganhou de forma inesperada [no primeiro turno].

A base do PSD, por ter diversos quadros oriundos do DEM, antigo PFL, pode ter uma mobilidade maior, ou seja, assumir diversos caminhos? 
O PT puxa voto, o DEM puxa voto, mas tem esses dois grupos, o de Geddel e o de Otto. E Geddel não é de ficar na dependência de ninguém, inclusive nesses dois anos de Temer. Agora, ele é um figurão da República, um cardeal nacional. Ele não está sentado, como se fosse aposentado, na segunda vice-presidência da Caixa Econômica Federal. Ele tem verbas e apoio da Presidência da República também, e no interior isso é muito expressivo.

Várias análises falam que o fato de o PT ter perdido metade dos postos nesta eleição, o partido foi o grande perdedor. É por aí?
Isso aí vai depender do tipo de avaliação, das expectativas sobre o partido. Ele pode ter perdido em relação ao tamanho que tinha há dois, quatro anos. Mas eu mesmo esperava que ele fosse perder mais. Muita gente esperava que o PT fosse aniquilado. Parecido com que o PT fez ao DEM, praticamente o extinguindo em todo país, em determinado momento, com Lula. Não foi assim, não é?   
 

Foto: Reprodução / Twitter

O senhor acredita que essa baixa do PT nas eleições pode representar uma volta à base do partido? Ou não tem como fazer mais esse retorno?
Mas qual é a base do PT hoje? É complicado. Se fosse pensar há coisa de 10, 15 anos, a base poderia ser sindical, ou na Igreja Católica, mas isso não está mais disponível.  E tem muita gente disputando a base sindical, inclusive, partidos de direita. Depois, as circunstâncias mudaram. O voto do PT agora é de classe média urbana, mais educada, ou voto de trabalhador de periferia, e tal. É complicado esse negócio de base hoje. Agora, o PT precisa ser refundado. Preciso de um novo discurso. Precisa se repensar. Deveria fazer isso. Se vai fazer ou não, é outra coisa. Se tem alguém no PT que for capaz de dar um freio de arrumação e dizer: “vamos repensar tudo aqui”, como aconteceram com os partidos socialistas e comunistas da Europa, depois da queda do Muro de Berlim, eu não sei. 

Esse momento que a gente vive consagra o político que não gosta de política, aquele avesso a discussões e debates públicos?
Toda vez que há uma crise política, aparece esse discurso aí. Isso aconteceu com Collor de Melo [atual senador por Alagoas. Na época, se elegeu presidente em 1989]. Na época, Collor apareceu dizendo que não era político. Era um empresário bem-sucedido. Deu certo por dois anos, não foi? Na Itália, a mesma coisa. Crise dos partidos de esquerda, crise da política em geral, aparece Berlusconi. “Sou empresário, não sou político”, dizia. Agora, nós temos o modelo bem-sucedido de [João] Dória Júnior (PSDB) [eleito prefeito de São Paulo]. “Eu sou empresário, tenho nojo de política”. Como se o Estado ou o Município pudesse ser gerido por administradores públicos e não por políticos. Em geral, esse modelo não tem dado certo. Tem fracassado. Porque no dia seguinte, você tem que fazer política. Porque a política existe, é importante, faz sentido, e o cargo é político. Não há espaço para pessoas que façam aventurais eleitorais. Até agora, não deu certo. Se redundou aqui no Brasil em escândalos. Mas vamos ver.