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Entrevista

Vitor Bonfim, secretário Estadual de Agricultura

Por Francis Juliano / Marcos Maia

Vitor Bonfim, secretário Estadual de Agricultura
Fotos: Jamile Amine/ Bahia Notícias
O secretário estadual da Agricultura Vitor Bonfim afirma que a questão da crise hídrica no estado é o maior problema enfrentado pela Secretaria de Agricultura, Pecuária, Irrigação, Pesca e Aquicultura do Estado da Bahia (Seagri) atualmente. “O maior problema que a pasta enfrenta na agricultura da Bahia é a questão da estiagem, que afeta o estado como um todo, em todas as regiões”, assume. Em entrevista ao Bahia Notícias, Bonfim também abordou a atual situação da pesca no estado e o auxílio à criação de animais de pequeno e médio porte no período de escassez de água, entre outros assuntos.

Primeiro eu queria que o senhor falasse sobre os desafios encontrados logo quando assumiu a pasta. O que foi mais difícil e o que está sendo feito para tratar dessas questões?

Inicialmente, foi minha primeira experiência em um cargo executivo. Então, eu tive que me ambientar. Como membro do legislativo eu fui vereador por dois mandatos no município de Guanambi, e estava como deputado estadual há pouco mais de dez meses. Minha dificuldade inicial foi me ambientar com o ambiente do executivo. Essa é uma secretaria tradicional, com mais de 120 anos de existência e com um corpo técnico capacitado e preparado. Esse pessoal está me dando o suporte necessário para que possamos levar a agricultura da Bahia adiante.

E quais são os desafios que o senhor está enfrentando no momento, seja na agricultura ou na pecuária, o que tem pedido uma atenção especial da secretaria?
O maior problema que a pasta enfrenta na agricultura da Bahia é a questão da estiagem, que afeta o estado como um todo, em todas as regiões. Se você vai para a região oeste do estado, onde você tem uma produção de soja, de algodão, de milho expressivo, essa lavoura foi fortemente afetada com perdas que podem chegar a 40%. Do mesmo modo, na região sul do estado, que é onde a gente tem uma produção de cacau como carro chefe, também registrou perdas significativas de 30 a 35 por cento. A safra desse período do ano foi fortemente comprometida, inclusive com mortes de pés de cacau por conta da seca.

Os pescadores são uma das categorias mais prejudicadas com isso. Recentemente vocês lançaram uma espécie de centro vocacional e tecnológico. Gostaria que o senhor falasse um pouco sobre isso, e explicasse como os pescadores baianos podem acessar esse local.
O estado da Bahia possui uma empresa, que é a Bahia Pesca, vinculada a Secretaria de Agricultura, e a pesca é um segmento expressivo do mercado baiano. A gente estima 130.000 pescadores no nosso estado. Eu estive com o presidente diretor da Bahia Pesca, Dernival Oliveira, e Eliana Boaventura, diretora-geral da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia, para que possamos fazer um novo senso da pesca no estado. Os dados mais recentes são do ano de 2006, então a gente precisa rever isso. Nós temos uma costa extensa, temos o rio são Francisco que corta o estado de ponta a ponta. Inauguramos o CVTT, que é o Centro Vocacional Tecnológico do Pescado, que oferece ao pescador cursos de capacitação. Nós temos oficinas para encubar; uma fábrica de beneficiamento, que inibe a ação do atravessador, e entrega ao pescador, um produto certificado e com selo de inspeção. Ou seja, ele pode pegar esse produto beneficiando em nossa fábrica, e fornecer para prefeituras da região através da merenda escolar, por exemplo.

Como o pescador pobre, lá do sudoeste, por exemplo, longe do recôncavo, faz para chegar lá? Existe também um auxílio para que esse pescador se desloque do local de origem até lá?
Sim. O CVTT oferece uma bolsa durante o período de capacitação para que o pescador que está afastado da sua atividade, durante a realização do curso, e tem a sua renda obviamente afetada, já que não estará trabalhando.
 
Mas como ele tem inicialmente acesso a isso? Na cidade dele mesmo isso pode ser verificado?
A Bahia Pesca tem feito atividades. Recentemente nós estivemos no município de Carinhanha, próximo a Malhada, na divisa de Minas Gerais, fazendo um trabalho juntamente com a Bahia Pesca, identificando a quantidade de pescadores e mostrando para eles os cursos que nós temos para oferecer no CVTT para tentar formar uma turma e trazer esse pessoal para se qualificar.

Nós sabemos que dois terços do estado ficam no semiárido. Então, a estiagem que é uma das mais difíceis já registradas tem impactado bastante. Sabemos que nesses locais existe a criação de animais de pequeno e médio porte. Como é que a Seagri está ajudando esses produtores nesse quesito?
Nós lançamos recentemente durante a EXPOVALE, de Juazeiro, o programa "Cabra Produtiva, Rota do Leite" porque lá é onde nós temos o maior rebanho de caprinos e ovinos do nosso estado, naqueles três municípios (Juazeiro, Uauá e Senhor do Bonfim). Naquela região a gente concentra mais de 50% do rebanho de caprinos e ovinos . No que consiste o programa? A secretaria uniu os elos da cadeia produtiva, ou seja, o produtor, a indústria e os compradores. Nós organizamos essa cadeia produtiva, criamos um selo com registro na ADAB (Agência de Defesa Agropecuária da Bahia). Em um laticínio da região, realizamos o beneficiamento, que resultou em um produto acabado, rotulado e inspecionado, pronto para ir para o mercado, com qualidade comprovada. Levamos até Juazeiro compradores daqui de Salvador, dos grandes mercados e delicatessens, e levamos lá para Juazeiro para provar e verificar a qualidade desses produtos. Na noite de degustação que nós promovemos, já foi fechada a compra de alguns queijos.

Hoje nós temos o problema do preço do feijão que até virou meme na internet. Nós sabemos que o forte da região de Irecê é o feijão. Existe a possibilidade da Seagri intervir no sentido de investir mais no produtor no sentido de interferir no valor final?
Quem atua mais nessa parte de regulação de mercado é o governo federal através da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento). A Conab possui armazéns no estado, inclusive em Irecê e Santa Maria da Vitória, e deveria praticar um subsídio nesse momento para o feijão, que é um produto bastante consumido no Brasil, e está com o preço elevado. Tinha que haver uma ação mais forte do governo nesse sentido, como ocorreu recentemente no ano de 2013/2014 com o milho. Na ocasião houve uma ação da Conab e o preço do milho praticado foi subsidiado. 

Mas e o investimento ao pequeno produtor da agricultura familiar?
O governo do estado continua com um programa de distribuição de sementes através da SDR (Secretaria de Desenvolvimento Rural), que ficou com a política pública voltada para a agricultura familiar, que entre outras ações, efetua a distribuição de sementes. 

Os produtores do oeste até emitiram uma nota há pouco tempo pedindo que se economizasse mais água. O senhor chegou a ver essa nota?
A região oeste do estado está enfrentando dificuldades, sobretudo no fornecimento de energia elétrica. Nós tínhamos uma obra que estava sendo tocada pela empresa espanhola Acciona, queentrou em recuperação judicial. A empresa estava promovendo obras para reforçar a rede elétrica entre Bom Jesus da Lapa e Barreiras, mas por conta de dificuldades, a obra está paralisada e isso tem comprometido o fornecimento de energia na região oeste do estado. Recentemente a ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) determinou que a Coelba fizesse o desligamento programado do fornecimento de dez megas para poder manter a rede estável, evitando picos. Então nós esperamos que a ONS encontre uma solução rápida para que possamos ter essa obra retomada e proporcionar um fornecimento de energia mais estável na região oeste do estado. Porque nós temos rios caudalosos, temos o aquífero do Urucuia, que tem um potencial muito grande e pega a região oeste do estado como um todo. Nós acreditamos muito no potencial desse aquífero. Estamos desenvolvendo junto com o Inema (Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos),a SEMA (Secretaria do Meio Ambiente), e a AIBA (Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia), através do Fundeagro, um estudo das bacias hidrográficas daquela região para definir o potencial do aquífero, saber o que a gente tem outorgado para agricultura, para a indústria, e a água destinada ao consumo humano. Dando condições para que empresas possam se instalar na região, a exemplo da Agri Brasil, um grupo Holandês que irá se instalar no município de Jaborandi, voltado à produção de leite, destinado à exportação.

Isso deve acontecer quando?
Já foram assinados protocolos de intenção, e eles já tem a carta de incentivo da Sucen (Superintendência de Controle de Endemias) e uma carta da Caixa Econômica Federal para financiamento. Agora nós estamos na última etapa.

A instalação ocorre ainda esse ano?
Como é um empreendimento muito grande, com um volume de recursos na ordem de mais de um bilhão e duzentos mil dólares, com a intenção de ter 50 mil vacas em produção na primeira etapa, nós acreditamos que deva ser coisa para o próximo ano, para 2017. Até porque os estudos que a empresa está finalizando indicam a necessidade de implantar uma zona portuária de exportação.

Uma das críticas que se faz também a essa questão da produção é a falta de matadouros nas cidades do interior. A criação de determinada cidade tem que se deslocar até outro município de maior porte para poder atender as condições sanitárias. Esse é um problema das prefeituras em si ou do estado?
A capacidade instalada de abate hoje no estado da Bahia é suficiente para atender a demanda existente. Ou seja, o número de matadouros frigoríficos no estado atende plenamente o consumo atual da população baiana. O que ainda existe é a necessidade de mudar a cultura do consumidor, sobretudo no interior do estado, de consumir a chamada carne verde ou carne fresca, como acontecia com o leite. Antigamente, todo mundo no interior do estado consumia o chamado “leite cru”, e isso diminuiu muito. Hoje todo mundo faz consumo do leite pasteurizado, do leite de caixinha, do leite em pó. O consumidor passou a entender a importância de consumir esse produto nas condições sanitárias mínimas permitidas pela legislação. Na questão da carne é a mesma coisa. O custo do açougueiro em pegar um animal e levar até um frigorífico e retornar com essa carne refrigerada para a origem não impacta significativamente no preço final para o consumidor. Para você ter uma ideia, os matadouros frigoríficos estão cobrando R$ 80 por animal, em média. Se você imaginar que normalmente um animal desses abatido tem por volta de 20 arrobas, nós estamos falando de 300 kg, será cobrado pouco mais de 26 centavos por quilo. Mesmo assim, o estado da Bahia tem investido e buscado que mais matadouros sejam construídos no nosso estado. Nós estamos com um matadouro da iniciativa privada em fase final de construção no município de Luís Eduardo Magalhães que deve ser inaugurado até o mês de outubro. No município de Ipirá estamos concluindo outro, trabalhando junto com a prefeitura. Acreditamos que esse ano ainda o matadouro será inaugurado, formatando um modelo de gestão com a prefeitura para montar um edital a ser explorado.

Existem outros além de Ipirá?
Irecê também. Deve ser inaugurado ainda em 2016. Está na fase final, com mais de 80% da obra pronta, e o estado vem trabalhando para que o matadouro frigorífico seja instalado. Hoje nós temos um número de matadouros suficientes para atender a demanda do nosso estado.

O senhor falou anteriormente na criação de um selo. Como ele dará condições ao produtor de vender melhor o produto, como é esse processo?
Estamos fazendo os preparativos finais para o lançamento do selo "Produto da Bahia" que é fruto de uma parceria entre a Secretaria de Agricultura, o Ibametro (que será o órgão certificador) e a ADAB (Agência de Defesa Agropecuária da Bahia) que é a nossa agência de vigilância e defesa no ambiente sanitário. O consumidor está cada dia mais exigente, não só na qualidade do produto como também nas boas práticas e na forma como aquele produto foi produzido. Ou seja, ele se preocupa se a empresa é sustentável (economicamente e ecologicamente) e se ela tem responsabilidade jurídica (se usa mão de obra infantil, análoga a escravidão), por exemplo. Então, o mercado tem essa exigência. Percebendo isso, e o selo irá garantir ao consumidor que o produto respeita tudo isso e é genuinamente baiano.
 
Para finalizar, gostaria de saber como é ser gestor e ter que lidar com o agronegócio e com o pequeno produtor?
Nessa realidade que a gente vive, de dificuldade econômica, é um desafio muito grande. O governo federal estima que no ano que vem nós tenhamos um déficit de R$ 170 bilhões. Estados muito mais ricos da nossa federação, como o estado do Rio de Janeiro, que possuem um PIB duas vezes maior que o PIB baiano, está em estado de calamidade, em colapso total. Mesmo assim com toda essa dificuldade a gestão do governador Rui Costa vem mantendo a conta do governo em dia. Nós estamos fazendo esse esforço de melhorar e tornar a máquina pública mais eficiente para poder atender com a destreza necessária aqueles que mais precisam.