Usamos cookies para personalizar e melhorar sua experiência em nosso site e aprimorar a oferta de anúncios para você. Visite nossa Política de Cookies para saber mais. Ao clicar em "aceitar" você concorda com o uso que fazemos dos cookies

Marca Bahia Notícias Municípios

Entrevista

Flávio Góis, coordenador da 2ª Coorpin de Alagoinhas

Por Francis Juliano

Flávio Góis, coordenador da 2ª Coorpin de Alagoinhas
Foto: Divulgação
O Atlas da Violência 2016 divulgado recentemente apontou a microrregião de Catu na sétima posição nacional em números de assassinatos. Segundo o estudo, Catu e municípios vizinhos apresentaram taxa de 71,8 homicídios/100 mil habitantes em uma população estimada de 230.951 pessoas, em 2014. Para se aproximar mais da realidade da microrregião, o Bahia Notícias conversou com o coordenador regional da 2ª Coorpin [Coordenadoria Regional da Polícia Civil], Flávio Góis, responsável pela microrregião. De início, o delegado contesta o ponto de partida da pesquisa.  “Alagoinhas é a referência da microrregião, que tem 22 municípios, e Catu é um deles”, declarou. Para Góis, o gatilho para escalada dos homicídios é disparado pelo tráfico de drogas, que se movimenta mesmo com as prisões de líderes e gerentes. “O tráfico de drogas é muito multifacetado. Não tem hora para começar nem terminar, e o grande entrave é na distribuição”, avaliou. Confira a entrevista abaixo:
 
 
Segundo o Atlas da Violência 2016, a microrregião de Catu, na qual Alagoinhas é o polo, é a sétima mais violenta do país, e a primeira da Bahia. Como o senhor avaliou os dados desse estudo? 
Na verdade, esse estudo direcionou a referência equivocada. Porque Alagoinhas é que é a referência da microrregião, que tem 22 municípios e Catu é um deles. Em Catu, o índice anual de homicídios foi de 20 a 22 por ano, entre os anos de 2010 e 2015, com uma população de 55 mil habitantes. 
 
Quais os municípios da microrregião com maior índice de violência?
Os com maior índice de violência são Catu, Alagoinhas, Inhambupe, Esplanada, Entre Rios e Rio Real.
 
Qual o município mais problemático da microrregião?
A cidade mais problemática da região em termos de violência é Alagoinhas.
 
O que tem sido feito para combater e diminuir essa violência?
Nós estamos desenvolvendo operações desde 2013. Já identificamos e tiramos de circulação três grandes quadrilhas que estão se espalhando na nossa microrregião por conta do crescimento da Região Metropolitana de Salvador [RMS] e da proximidade também da microrregião de Feira de Santana. Nossa microrregião está sofrendo as consequências disso.
 

Catu | Foto: Reprodução/Wilkipédia
 
Quais os nomes dessas três grandes quadrilhas que o senhor citou?
Tem a quadrilha do Colorido [Antônio Dias de Jesus, preso ano passado em São Paulo], que nós tiramos de circulação, em um trabalho em parceria com o Draco [Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas] e a Polícia Civil de São Paulo. Tem a quadrilha de Huk [Miguel Avelino da Silva Filho]; e a de Marcelo Marreno [Marcelo Batista], junto com Moab e o Ni. Moab e Marreno estão presos na cadeia pública de Salvador. Só que eles têm gerente e distribuidores de drogas. O principal fator da violência é o tráfico de drogas. Já tiramos 18 traficantes de circulação, cumprimos 30 mandados de prisão e de busca e apreensão e vamos realizar uma grande operação ainda neste ano.   
 
O que a microrregião de Catu e Alagoinhas tem de atrativo para que esses grupos criminosos passem a dominar a área?
O principal objetivo das quadrilhas é expandir o tráfico de drogas. Eles estavam instalados em Salvador e RMS. Com o crescimento da área urbana e da área do interior do estado, o espaço de influência desses grupos passou a interferir na região de Catu. Eles estão tentando aumentar o domínio de distribuição e venda de drogas, e Catu é cidade mais próxima.
 
Então, há um mercado consumidor forte de drogas na microrregião de Catu?
Tem um mercado consumidor, mas existe a intenção deles de criar um polo de distribuição de drogas. Os polos principais são Salvador, Mata de São João e Lauro de Freitas. Saindo de Salvador e RMS, tem Feira de Santana, e subindo para o norte do estado, aparecem Catu, Alagoinhas e Inhambupe. 
 
Além do tráfico, quais outros crimes influenciam na mortalidade nesta microrregião?
Os crimes que resultam em morte são roubo e assalto à mão armada. Muitos criminosos roubam veículos e motocicletas para angariar fundo para comprar drogas. Além disso, tem casos motivados por embriaguez. Ainda não há uma tônica na mídia, mas muitos homicídios que ocorrem são resultado de discussões por motivo fútil, que vem da embriaguez, de uma briga no bar, de uma discussão no trânsito, que resulta em morte.
 

Alagoinhas | Foto: Reprodução/Wiikipédia
 
Para o senhor qual a melhor forma de combater o tráfico de drogas? É descriminalizando, reforçando o contingente policial, criando mais presídios, ou outras ações? Como o senhor vê isso?
Olha, não tem outra alternativa a não ser o combate repressivo. É identificar os líderes e os gerentes de quadrilhas e tirar de circulação também os integrantes intermediários. Quanto à questão da descriminalização, já existem estudos, como também observações práticas, sobre países e localidades, como Uruguai e Holanda. Eles querem descriminalizar a droga como forma de combate ao tráfico, mas as pesquisas mostraram que na prática os esforços não deram certo. A questão é também de Saúde Pública. Por isso, são importantes políticas públicas para retirar o usuário e oferecer tratamento de saúde e fazer com que ele abandone a droga e o vício, ao passo que a gente prenda e reprima os traficantes.
 
Essa briga com o tráfico não é de hoje, vem de muito tempo. Na parte da repressão, o que falta ainda à polícia para ser mais eficiente nesse combate?
A polícia sempre esteve empenhada. Agora, o tráfico de drogas é muito multifacetado. Não tem hora para começar nem terminar, e o grande entrave é na distribuição da droga. Nós temos um país continental, e só a Bahia é quase do tamanho da França. Então, quando a gente faz uma repressão em determinada localidade, eles mudam dinamicamente para outro lugar e coagem as populações desses locais – que têm medo, e aí impera a lei do silêncio – para que eles se reinstalem nesses locais. 
 
Existem ações educativas com essas populações para que elas possam contribuir com o trabalho policial?
Nós temos um sistema de divulgação e conscientização através do número 181, o Disque Denúncia, que mantém o anonimato. E nesse caso não fica apenas na denúncia. Os dados são passados para um sistema de equipe de campo, e as vítimas e testemunhas são acompanhadas após a identificação dos focos de distribuição de drogas.
 
Uma das cidades que fazem parte dessa região de Alagoinhas é Rio Real. Já noticiamos sobre crimes que ocorreram na cidade. [Em 2013, a prefeitura, a Câmara de Vereadores e um juiz da cidade acionaram o Ministério Público e a Polícia Civil para apurar crimes cometidos pela Polícia Militar local]. Como está a realidade da cidade atualmente?
Em Rio Real nós conseguimos diminuir em mais de 35% a criminalidade. Em que pese o tráfico de drogas, Rio Real tem um privilégio, assim dizendo, de passar a BR 101. Só que lá as quadrilhas dos estados da Bahia, Sergipe e São Paulo se instalam para roubar cargas, que são revendidas para supermercados e abastecem o tráfico de drogas. Nós já fizemos 40 prisões e cumprimos 70 mandados de busca e apreensão em Rio Real, principalmente na região de Loreto [povoado], que é o ponto mais crítico. Ali, além do tráfico de drogas, tem o tráfico de armas e roubo de cargas. Hoje, mais de 25 suspeitos estão presos à disposição da Justiça.
 
Ainda na região de Rio Real, o prefeito da cidade de Jandaíra, Roberto Carlos Leite, denunciou em janeiro passado um descaso na segurança da cidade. Segundo o gestor, a cidade vive sem policiamento 24h há quatro anos. O problema ainda persiste?
A dificuldade que temos lá é a seguinte: a BR 101 é uma rodovia federal. Nós não temos competência nem atribuição para agir na BR, salvo em flagrante delito. O que ocorre é que um dos maiores bairros de Rio Real se encontra às margens da BR. Ali, o posto mais próximo da Polícia Rodoviária Federal (PRF) fica em Cristinápolis, no estado de Sergipe. Até a PRF chegar ao local para dar combate no início de um crime era pouco eficiente. Então, o que o estado e a população estavam cobrando? Uma base de apoio da Polícia Civil e da Polícia Militar, que existia nas décadas de 1980 e 1990 no povoado de Loreto, que fica próximo às margens da BR 101. O que posso dizer é que esse posto foi reativado. Além disso, a PRF também tem feito operações junto com a Polícia Federal (PF) na localidade, e a sede da Polícia Civil fica a 12 km da BR, o que também colabora.
 
O número de policiais que vocês dispõem para a segurança da microrregião é suficiente?
Não, mas isso é uma realidade não só de recursos humanos, como também previdenciária. A polícia envelheceu, muita gente está de licença médica ou em direito de prêmio, e outros estão se aposentando. Mas o governo do estado fez dois concursos públicos e agora neste mês está prestes a fazer uma nomeação. A questão do contingente policial é um fator que tem que ser repensado, mas não é impeditivo. A gente está fazendo com as condições que tem. Temos armamentos necessários, viaturas novas, e já está em plena conclusão o concurso de delegados, investigadores e escrivães para reforçar o contingente.