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Entrevista

Jarbas Magalhães, especialista em Direito Eleitoral

Por Francis Juliano | Fotos: Cláudia Cardozo

Jarbas Magalhães, especialista em Direito Eleitoral
Fotos: Cláudia Cardozo / Bahia Notícias
Saída do bojo da minirreforma política de outubro do ano passado, a nova lei eleitoral promete coibir os exageros das últimas eleições, principalmente quanto a gastos de campanha. Após 17 anos, o país vai realizar novamente eleições em que não serão permitidas doações de empresas para campanhas. A última foi em 1989. Em entrevista ao Bahia Notícias, o especialista e professor em direito eleitoral Jarbas Magalhães alerta os eleitores para a fiscalização da lei.  “Não vai ser simples, e é preciso ficar muito atento em como os financiamentos vão se desenrolar”, disse ao Bahia Notícias. Ele explica que só pessoas físicas podem pôr dinheiro em campanha e atentando para o limite da generosidade: 10% da renda obtida em 2015. Para Magalhães, candidatos que exercem funções precisam ficar atentos às decisões do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM). Gestões reprovadas podem tirar candidaturas do páreo, como fazer um candidato ganhar nas urnas e não levar depois da posse, já vestido no paletó. “Seria bom que as decisões viessem antes dessa eleição, mas pode ocorrer depois dos registros de candidaturas. Muita gente já está com a espada na cabeça por isso”, declarou. Leia a entrevista na íntegra abaixo:
 


 
O que é muda efetivamente nesta eleição em relação à de 2012?
Esta é uma eleição inédita no que tange a vários aspectos. O primeiro é o financiamento por parte de pessoas jurídicas, que antes podia, mas o Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu. Agora, apenas pessoas físicas podem doar. O candidato pode usar recursos próprios ou verba de fundo partidário. A última eleição que tivemos em que era só permitido dinheiro público em campanha foi em 1989. Não vai ser simples, e é preciso ficar muito atento como os financiamentos que vão se desenrolar.
 
 
No interior, geralmente os grupos que comandam o poder político têm também maior poder econômico. O dinheiro que entra na campanha muitas vezes vem de empresas ligadas às mesmas famílias. Como é que fica agora? Essas empresas vão poder doar?
Pessoa jurídica de forma alguma vai poder doar. O que pode são pessoas físicas. Os sócios dessas empresas é que podem doar, e dentro de limites.
 
 
Vamos dar um exemplo. O sujeito, como sócio da empresa, saca um dinheiro da empresa e faz a doação ao grupo a que está ligado. Isso não é um drible na lei?
 
A lei prevê como parâmetro da doação o quê a pessoa física auferiu de renda em 2015. Então, ela só pode doar 10% daquilo que acumulou no ano passado. Isso vai ser demonstrado no Imposto de Renda. É a forma de a legislação coibir esse tipo de drible. Já aquele que declarou que não teve rendimentos em 2015, não pode doar nesse ano. Tem que lembrar também que se a pessoa extrapolar os 10%, ela pode ser multada de cinco a dez vezes sobre o valor extrapolado, e ainda ficar inelegível.
 
 
A duração das campanhas ficou mais curta. Isso prejudica a avaliação do político pelo eleitorado?
De certa forma sim. O encurtamento beneficia mais quem já tem mandato, o mais conhecido. Assim, creio que o processo de renovação das lideranças políticas se torna mais lento. Sem falar que é no período eleitoral que os candidatos são mais questionados pelos eleitores, é o momento de maior exposição, do pedido de voto propriamente dito. É o momento que ocorre os embates, enfim. Nesse ponto, embora seja razoável o argumento de que a redução vai baratear os custos da campanha, acho que não foi bom para o eleitorado e para o processo de renovação política, que é muito importante. Nas outras eleições, a campanha durava 90 dias. Com a reforma eleitoral do ano passado, ficou agora em 45 dias de campanha [início em 16 de agosto]. 
 
 
O que o político não pode fazer até o começo da propaganda eleitoral?
Agora, a lei diz que propaganda expressa é que é proibida. O candidato não pode dizer: “vote em mim”.
 
 
Só isso?
Mas essa lei de certa forma flexibilizou as campanhas. Permitiu a ida de pré-candidatos a emissoras de rádio e TV para falar de possíveis projetos políticos, autorizou a realização de reuniões internas, patrocinadas pelos próprios partidos, para tratar de planos de governo, uma série de coisas.
 
 
No interior há muito candidato que usa o microfone de emissoras de rádio para se promover. Como identificar o abuso da lei?
De fato, no interior há muita gente que usa o rádio e, em alguns, a TV para promover nomes de políticos. A nova lei eleitoral obriga que seja dado tratamento igual aos candidatos. Então, aquele candidato que se sentir prejudicado, ou o cidadão que perceber que há um desequilíbrio, ele pode denunciar. O ministério público eleitoral é o órgão que pode receber essa denúncia tanto dos candidatos como do cidadão para investigar se determinada emissora está realmente beneficiando uma candidatura. Lembrando que esse uso de rádio pode configurar algo mais grave, com a cassação do registro ou do diploma do candidato beneficiado caso ele seja eleito.
 
 
A presidente da União dos Municípios da Bahia (UPB), Maria Quitéria, esteve aqui no Bahia Notícias e disse que neste ano, muitos candidatos vão querer ficar em segundo, torcendo para quem vencer nas urnas erre na lei. Assim, o segundo colocado ganharia no final. Quais são os erros que podem de fato ocorrer com mais regularidade no interior?
Olha, os casos que configuram cassação são: compra de votos,; uso abusivo da máquina pública, prefeitos que tentam se reeleger geralmente direcionam sua gestão para beneficiar as candidaturas, seja obrigando servidores a fazer campanha ou desvirtuando programas sociais para beneficiar determinados apoiadores; e o uso abusivo do poder econômico. Sobre o comentário de Maria Quitéria, da UPB, não sei se foi a intenção dela, mas não existe mais a possibilidade de o segundo colocado assumir. Se o primeiro colocado for cassado terá necessariamente que haver uma nova eleição. Direta ou indireta. Caso ele seja afastado em até três anos e meio de mandato, a eleição é direta. O povo vota. Se o afastamento ocorrer nos últimos seis meses, a eleição é indireta, feita pela Câmara de Vereadores. 
 

 
 
Como saber que determinado político faz uso abusivo do poder econômico?
Agora, as campanhas eleitoras têm um limite de gastos, e há uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que estabelece o valor máximo que cada município deve gastar com campanhas de prefeitos e vereadores. 
 
 
É fácil de acessar na internet? 
Muito fácil. Se você foi no site do TSE e ver normas para eleições em 2016, verá que há um anexo dos mais de 5 mil municípios do país. Esse limite leva em consideração os valores gastos nas eleições de 2012. Com base naquela eleição, a resolução prevê que 70% do que foi gasto em 2012 deve ser o limite para 2016.
 
 
Sobre a questão da compra de votos. A gente sabe que o uso do celular pode ser uma arma para denunciar esse tipo de crime. De que forma o cidadão pode usá-lo corretamente?
Eu sempre digo que a política substitui a guerra. Então, em uma eleição municipal, um grupo sempre está em pé de guerra com o outro. Então, o que acontece. Muitas vezes rivais criam uma situação para prejudicar o adversário. Basta um voto para cassar mandato. Por isso que a gravação tem que ser vista com muito cuidado. Porque em vários casos, o eleitor tenta induzir o político a cometer algum deslize. Não quero isentar os políticos. Mas tem eleitor que está mal-intencionado e quer forjar flagrante. A gravação de celular era permitido quando um dos interlocutores sabia do ato. Hoje, em dia, a jurisprudência dos tribunais eleitorais e o próprio TSE têm repudiado esse tipo de gravação. Eles entendem que seria uma prova ilícita porque um dos interlocutores nãos estava sabendo da gravação, porque ia ferir a intimidade do cidadão. O ideal é que o cidadão procure o Ministério Público para apurar o crime. Agora, se o fato foi gravado em ambiente aberto, aí a gravação é permitida, porque não haveria problema de ferir a intimidade. O sujeito que se propõe a comprar voto em ambiente aberto não estaria preocupado com o pressuposto da intimidade. Mas esse tema é vacilante, ora os juízes entendem de um jeito ora de outro. 
 
 
Sobre propaganda visual. Será que vamos ter menos poluição deste tipo nas cidades nas eleições deste ano?
Creio que vai ser muito menor. A nova lei proibiu aquelas placas que os políticos colocavam nas vias públicas. Pinturas de muro também estão proibidas. Plotar o carro todo também não pode, ficando permitido apenas o adesivo, dentro do limite de 0,5 m², aquele perfurado no fundo do carro. Aí vai depender do tamanho do vidro do carro. Pôr placa também não pode. O que pode é colocar cartaz do tamanho máximo de meio metro (0,5 metro quadrado). Santinho, praguinha, essas peças ainda estão liberadas.
 

 
 
 
Você acredita que as trocas de partidos pela janela partidária podem interferir positivamente no processo político no interior do estado?
A janela partidária foi uma resposta do Congresso ao rigor da fidelidade partidária. Houve muitas cassações de mandatos de vereadores por conta da troca de partido, que era uma prática muito comum. Então, o legislador confirmou o principio da fidelidade partidária, mas atenuou o rigor, dizendo que no mês anterior do prazo final para filiação o vereador poderia trocar de partido. Acho que foi uma solução boa, justa. Se por um lado o parlamentar tem o dever de ser fiel ao partido no qual disputou o pleito eleitoral por quase todo o mandato, respeitando a vontade do eleitor, por outro é saudável, principalmente no interior, que o vereador tenha liberdade para optar por qual partido pretende disputar a eleição. Isso porque, muitas vezes, um grupo político rival ao vereador passa a controlar o partido no município e deixa ele em uma situação complicada, correndo até o risco de não ter legenda para disputar. É o que chamam da ditadura dos dirigentes partidários. Por isso, considero boa a hipótese da janela da Lei dos Partidos, que ocorre no sétimo mês anterior à eleição de outubro. [Prazo se encerra em 2 de abril].
 
 
Uma coisa que preocupa muitos os candidatos é em relação às decisões do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM). Como é que fica a situação dos candidatos que foram punidos pelo tribunal? Eles ficam inelegíveis?
Olha, com a alteração da Lei da Ficha Limpa houve alterações importantes na questão da inelegibilidade, que decorre das decisões dos tribunais de contas. Até a eleição de 2014 havia o entendimento que no caso de prefeitos, quem daria a última palavra sobre as contas seria a Câmara de Vereadores. Era pacífico. Mas a partir de 2014 a jurisprudência do TSE mudou e passou a admitir que o órgão competente para analisar as contas de gestão seria o TCM. O Ministério Público Eleitoral defende a tese de que a última palavra sobre aprovação de contas seja dada ao TCM. Há ainda muita dúvida sobre se a decisão do TCM gera ou não essa inegibilidade. É um debate que será levado para a Justiça Eleitoral e ela terá de definir. Certamente, vão ocorrer várias impugnações com base no entendimento de que o TCM é quem pode reprovar contas. Seria bom que as decisões viessem antes dessa eleição, mas pode ocorrer depois dos registros de candidaturas. Muita gente já está com a espada na cabeça por isso. Atualizado as 19h.