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Entrevista

Carlos Pereira, prefeito de Cachoeira

Por Francis Juliano

Carlos Pereira, prefeito de Cachoeira
Foto: Divulgação / Prefeitura de Cachoeira
Cachoeira, no Recôncavo baiano, ocupa as primeiras posições quando o assunto é o reconhecimento da identidade negra pelos próprios habitantes. Na ‘Heroica', como é conhecida desde a independência do Brasil na Bahia, em 1823, quase a metade da população se autoafirma negra (40,6%), e a maioria (87%) se inscreve como afrodescendentes, segundo o último censo do IBGE. No entanto, a cidade ainda tem que enfrentar situações que dificultam a preservação das tradições afro-brasileiras, como a iniciante regularização fundiária nos terreiros de candomblé e os dilemas de comunidades quilombolas. Para saber mais sobre a cidade e alguns dos temas dela, o Bahia Notícias conversou com o prefeito José Pereira (PP). Na entrevista, ele também falou de ações para o “povo de santo”, disse que em Cachoeira todo mundo tem um pé no “terreiro” e comentou sobre a relação entre adeptos do candomblé e de igrejas evangélicas. “Aqui em Cachoeira todo mundo tem um pé no terreiro”, comentou.  
 

Foto: Francis Juliano / Bahia Notícias
 
O senhor entrou na prefeitura em 2013. De lá para cá, quais as foram as ações feitas para dar mais poder à causa negra e afrodescendente, que em Cachoeira tem uma importância maior, dada à composição de negros e afrodescendentes da cidade?
Quando nós assumimos em 2013, o primeiro passo foi criar a coordenação de reparação racial, que não existia no município. Nós criamos um departamento responsável para discutir e criar políticas públicas para o povo negro. A partir daí, a gente vem discutindo a questão da regularização fundiária dos terreiros de candomblé, que são os maiores responsáveis pela preservação da cultura de matriz africana no município. 
 
O senhor fala em regularização fundiária. Qual é a situação do município em relação a esse tema, principalmente porque toca em um problema dos terreiros de candomblé, que precisam de áreas para a realização de rituais?
Esse era o grande problema dos terreiros de candomblé daqui. Eles não tinham a titularidade das terras. Por isso, nós provocamos o Incra, o governo federal, a Sepromi, para fazer essa discussão e só agora conseguimos avançar.  Na sexta 20 de Novembro, assinamos o cadastro de oito terreiros. 
 
Existem quantos terreiros na cidade? A prefeitura tem alguma meta para regularizar terreiros até o final da gestão, no ano que vem? 
São 80 terreiros no total. A meta é que até o final do próximo ano a gente consiga pelo menos regularizar metade de todos.
 
O último censo do IBGE, feito ainda em 2010, diz que Cachoeira é a quarta cidade baiana onde as pessoas se afirmam negras, com 40,6%. Somando pardos e negros, o município vai para 87% de afrodescendentes. O senhor tem dados mais atualizados produzidos pelo próprio município a respeito do percentual de negros e afrodescendentes na cidade?
Os dados que nós temos são esses do IBGE mesmo.
 
E sobre as comunidades quilombolas? Quantas já foram regularizadas?
Também estamos conversando com o Incra. Algumas comunidades, como Engenho da Ponte, Kalembá, Engenho da Praia, Kaonge, já tiveram a regularização e a titularidade da terra. A gente também está tentando regularizar a comunidade de Tabuleiro, que já está em processo de discussão com a própria comunidade.
 

Foto: Divulgação / Prefeitura de Cachoeira
 
O senhor é adepto de alguma religião específica?
Sou católico, mas aqui em Cachoeira todo mundo tem um pé no terreiro.
 
Imagino que em Cachoeira, assim como em outras cidades, existam igrejas evangélicas. Como é a convivência entre o candomblé e os evangélicos na cidade?
É respeitosa. A gente não tem muito conflito nos seguimentos religiosos. A gente se respeita muito. Mas nós sabemos que tem igrejas evangélicas e protestantes com pessoas radicais e que cometem discriminação contra o povo de santo. Mas no geral não temos maiores conflitos.
 
Mesmo a segurança pública sendo de competência do estado, a prefeitura tem algum órgão, ou ouvidoria, para encaminhar casos de discriminação, quando eles ocorrem?
Temos uma ouvidoria para tratar de questões de segurança de maneira geral. Nos casos de discriminação, seja religiosa ou de gênero, por exemplo, é a nossa coordenação de reparação racial que cuida deste tema.
 

Foto: Divulgação / Prefeitura de Cachoeira
 
A gente recebe também queixas de leitores do BN que moram em Cachoeira. Eles cobram maior assistência da prefeitura em localidades como Iguape, São Francisco do Paraguaçu, Kalolé, Kaonge, que para eles estão desassistidos. Como a prefeitura tem tratado essas comunidades? 
Há dois meses começamos a nos reunir mensalmente com os conselhos quilombolas, com a representação de todas essas comunidades, seja Iguape, São Francisco do Paraguaçu, Engenho da Ponte, Engenho da Praia, Kalolé. Tivemos uma primeira reunião em setembro, no cinema de Cachoeira, e agora no dia 27 de novembro tivemos uma reunião no Engenho da Ponte. Diante dessas reivindicações e cobranças, a gente tem ouvido e tentado resolver. Existe uma reunião em que eles levantam os casos que precisam ser solucionados e tem outra que serve para avaliação do que já foi resolvido.  E a gente consegue avançar muito. Na saúde, a gente já conseguiu entregar uma ambulância para as comunidades que não contavam com o serviço, assim como na infraestrutura, trabalhamos na recuperação de estradas vicinais. Além disso, trabalhamos a educação quilombola, que foi também reivindicada pelas comunidades. 
 
Como o senhor vê a contribuição da UFRB durante esses anos que a universidade se instalou na cidade no debate e no enfrentamento do racismo?
Extremamente positivo. Só fez contribuir. Levantando questões, discutindo dentro da universidade, principalmente por conta dos cursos de humanidades e letras que ficam aqui, como serviço social, história, e que sempre trazem questões de interesse do povo negro, seja na cultura, no gênero, na raça.