Usamos cookies para personalizar e melhorar sua experiência em nosso site e aprimorar a oferta de anúncios para você. Visite nossa Política de Cookies para saber mais. Ao clicar em "aceitar" você concorda com o uso que fazemos dos cookies

Marca Bahia Notícias Justiça

Entrevista

Ranieri Resende - Professor da Pós-Graduação em Direito do Trabalho da UFBA

Por Cláudia Cardozo

Ranieri Resende - Professor da Pós-Graduação em Direito do Trabalho da UFBA


Bahia Notícias: Quais são os direitos dos trabalhadores garantidos na constituição e na Convenção das Leis Trabalhista, e se eles têm o direito à greve?
 
Ranieri Resende: O direito de greve é garantido tanto na Constituição Federal, quanto em tratados internacionais que se referem aos direitos humanos. Na Constituição, nos temos o artigo 9º, que prevê o direito ao exercício da greve pelos trabalhadores. Nós temos também o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966, que versa no seu artigo 8º sobre o exercício legítimo do direito de greve, condicionado à regulamentação da lei de cada país. Não existe direito absoluto. O Direito é necessariamente vinculado as suas condições de implementação. No caso do direito de greve, existe uma série de condições que precisam ser respeitadas antes da deflagração do movimento. Nós costumamos dizer que não existe greve ilegal, o que existe é greve que, por descumprimento dessas normas, se torna abusiva.
 
BN: Como os trabalhadores podem se organizar para reivindicar melhorias das condições de trabalho?
 
RR: Primeiramente, os trabalhadores precisam, junto com a sua entidade sindical representativa, estabelecer uma pauta de reivindicações. A greve não é um movimento meramente político. Ele é um movimento vinculado a uma pauta prévia que deve ser apresentada para empresa ou para o sindicato patronal para que, a partir do esgotamento de todas as tratativas negociais, sendo frustrada a negociação coletiva, se possa, aí sim, partir para a paralisação. Porque a definição de greve pela própria lei é a suspensão das atividades profissionais dos trabalhadores. E precisa ser temporária. Não existe greve por tempo indeterminado, pois a greve é um estado de exceção dentro da empresa. Tanto que os contratos de trabalho ficam suspensos nesse período. A partir do esgotamento dessa negociação, em que não se logra êxito, essa pauta de reivindicação precisa ser oficializada por intermédio de uma assembleia. Para isso, é necessário um edital de convocação de uma assembleia e os estatutos das entidades sindicais possuem previsões específicas sobre esse procedimento. Lançado o edital convocando a assembleia geral para esse fim específico, a assembleia delibera sobre a greve e ela é soberana. Os trabalhadores são soberanos para estabelecer quais os pleitos para melhoria das condições de trabalho que vão ser objeto daquela paralisação. Deflagrada a decisão por parte dos trabalhadores, é preciso, também, comunicar isso oficialmente à empresa ou ao sindicato representante da categoria econômica das empresas, através do aviso prévio de greve, porque as empresa também tem os seus direitos. Elas possuem o direito ao princípio da não surpresa. Para as atividades normais, o aviso deve ser feito 48h antes, e para serviços essenciais. 72h antes da paralisação. Esses são procedimentos fundamentais, tanto das tratativas de esgotamento, quanto o aviso prévio para legitimar e cumprir o que exige a lei de greve.

BN: Qual seria o tempo determinado de uma greve?
 
RR: Isso depende de cada movimento. Nós já tivemos greves de determinadas categorias no passado que duraram meses, por exemplo, a de professores de universidades federais. A concepção da paralisação temporária não quer dizer que o sindicato vai previamente definir o prazo, mas que a ideia de suspensão do contrato de trabalho, ela mesma não pode ter a ideia de definitividade. Não se suspende o contrato de trabalho para sempre, tanto que é uma situação provisória. A ideia de colocar nos editais prazos indeterminado é uma prática, mas que efetivamente esse prazo precisa ter uma definição quanto ao seu término, não no início, mas que durante o curso da greve, isso esteja sempre presente. Caso contrário, nós não vamos nem trabalhar com a ideia de suspensão de contrato de trabalho, mas sim, com a finalização do contrato de trabalho. A greve pode ser parcial ou total, quando envolver apenas um setor específico da fábrica ou a totalidade da empresa. E um requisito essencial é que seja pacífica. Não há nenhuma viabilidade de o Direito resguardar qualquer ato de violência ou atentatório ao direito dos trabalhadores que queiram, porventura, trabalhar. É por isso que se diz que, a partir do momento em que os trabalhadores que aderem à paralisação passam a agir com violência, com impedimento de acesso à fábrica ou do acesso ao local de trabalho, isso configura uma conduta abusiva, e a greve passa a ter uma natureza não mais de legitimidade resguardada pela lei, pela Constituição e pelos tratados internacionais.
 


BN: É permitido fazer "piquetes" nas entradas dos locais de trabalho? A polícia pode ser acionada para permitir a entrada dos trabalhadores no local de trabalho e como, nesse caso, ela deve agir?
 
RR: O acesso à empresa tem que ser livre. A existência dos chamados "piquetes", que são os impedimentos de acesso, é vedada por lei. O que a lei permite é que haja um livre trânsito dos representantes dos trabalhadores no sentido de exercer o convencimento, para que esse direito seja livre, para que a divulgação dos motivos da paralisação seja livre. O empregador não pode, efetivamente, trazer uma vedação e nem punir aqueles que participem livremente da paralisação. Ocorre que, existem abusos, e esses abusos são objeto de decisão do Poder Judiciário e, em muitos casos, as empresas conseguem decisões na Justiça do Trabalho para que se ordene a intervenção policial para conter o eventual excesso. Mas, efetivamente, esse trabalhador que quer trabalhar, que quer ter acesso, ele não pode ter seu acesso impedido por seus colegas ou pela entidade sindical. A atuação da força policial tem que estar legitimada por razões jurídicas, seja em um caso em que se cumpre uma ordem judicial para garantir o acesso dos que querem trabalhar, e garantir o funcionamento da empresa, principalmente nas atividades emergenciais, como em fábricas que trabalham com fornos e caldeiras que não podem parar, e se pararem, há um sério risco de explosão. Para evitar um risco maior para os meios de produção, a própria Lei de Greve garante que essas atividades emergenciais sejam tuteladas por um acordo entre empresa e trabalhadores, para que, dentro desse plano emergencial, não haja prejuízos. E, por incrível que pareça, a própria Lei de Greve garante que, se não se chegar a um acordo quanto a essas atividades que visam impedir um grande prejuízo para os meios de produção, que a própria empresa atue emergencialmente contratando mão de obra em caráter urgente para cuidar que não haja prejuízo fora dos limites admissíveis. Então, quando nós temos uma situação de greve, como a dos rodoviários, notamos que há duas condutas muito interessantes a serem analisadas: uma é por parte dos trabalhadores, que não estão se dirigindo à porta das garagens e não tem impedido o acesso – pelo que eu acompanhei. De outro lado, temos as empresas que mantiveram suas garagens trancadas e não viabilizaram o transporte desses trabalhadores até a empresa, para que eles possam, aí sim, recolher os ônibus e colocá-los nas ruas. Nós temos aí o que se chama de responsabilidade compartilhada. Não apenas por parte dos trabalhadores, mas também pela própria empresa, e vale a pena lembrar que transporte público é uma atividade essencial e que é preciso manter um percentual mínimo para não gerar prejuízos irreparáveis à população. Dentro dessa lógica, quando o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) estabelece uma penalidade (uma multa diária), para o caso de descumprimento desse percentual mínimo de ônibus circulando nas ruas, e nós verificamos também que as empresas não se moveram para que isso acontecesse, a "culpa" não é só dos trabalhadores. Mas é também das empresas que não disponibilizaram os meios para tanto.
 
BN: Porque muitas greves chegam até a Justiça trabalhista?
 
RR: Impasse. Nós temos uma Constituição que estimula a negociação coletiva como principal meio para a solução do conflito de trabalho. Quando nem o sindicato dos trabalhadores, nem a empresa ou o sindicato que representa as empresas conseguem chegar a um acordo final, seja por intermédio de um acordo coletivo de trabalho, seja por intermédio de uma convenção coletiva de trabalho, esse conflito tende a se judicializar. Aí nós temos a medida do dissídio coletivo, que é o meio jurídico cabível perante o TRT para os conflitos trabalhistas. Ele possui competência para tanto, desde que as partes que estavam negociando considerem que há um comum acordo para que o Judiciário decida. Não basta apenas instaurar o dissídio coletivo de natureza econômica, como nós chamamos, mas que as duas partes considerem e elejam o poder judiciário como árbitro desse conflito. Essa foi uma reforma muito importante que aconteceu na Constituição Federal e que antes, independente do comum acordo entre as partes, iam parar no judiciário. Na prática, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) e os Tribunais Regionais do Trabalho ficavam abarrotados de dissídios coletivos. E cá entre nós: nem sempre a decisão do Poder Judiciário em questões de direito coletivo do trabalho são as melhores para os trabalhadores ou são as melhores para os empregadores. O melhor caminho é a negociação coletiva. E nesse sentido vale a máxima: é melhor um acordo ruim, do que uma sentença pior ainda.
 
BN: Muitas vezes, a Justiça estabelece uma multa diária, tanto para os sindicatos dos trabalhadores, quanto para o sindicato patronal, quando há uma desobediência de uma determinação. Essas multas geralmente são pagas? Há possibilidade de recorrer? No caso dos rodoviários, foi estabelecida uma multa diária R$ 50 mil. Quais são os precedentes desses tipos de ações?
 
RR: Quando a Justiça considera a greve abusiva, é estabelecida uma multa para que o sindicato dos trabalhadores arque com esse ônus, porque ele é, efetivamente, o legítimo representante dos trabalhadores. Ocorre que sempre há recurso contra essas decisões. A decisão decretada, por exemplo, pelo TRT, com toda certeza, vai ser objeto de um recurso dirigido ao TST em Brasília (DF). Eu recordo que na greve de 2006, houve uma condenação do sindicato dos rodoviários da Bahia, em torno de R$ 150 mil em razão de três dias de paralisação. Perante o TST, em análise de um recurso ordinário do sindicato dos trabalhadores, essa multa foi retirada. Então, é possível que haja uma reforma dessa decisão em outro tribunal superior e que se extirpe a multa. Caso seja mantida, essa multa é dirigida ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e não é revertida simplesmente para os sindicatos patronais.
 
BN: Essa desobediência seria uma estratégia de luta da categoria? É melhor descumprir a determinação da Justiça, ser multado e depois recorrer?
 
RR: É uma questão de estratégia política. Muitas vezes, o próprio sindicato já dispõe de recursos para bancar essa despesa, caso a paralisação seja de poucos dias. Mas uma multa dessa magnitude, considerando uma greve que dure aproximadamente dez dias, vinte dias, trinta dias, ela se torna insustentável. E quando a greve dura muito tempo, o próprio Poder Judiciário enxerga com outros olhos a conduta daquele sindicato profissional, por transmitir uma ideia de radicalidade. Há uma tendência que, em greves longas, a questão da multa não seja tão mitigada assim. Isso devido aos impactos extremamente negativos, principalmente para a população, nos casos de greve de serviços essenciais, como uma greve no setor de telecomunicações, de tratamento de água, de tratamento de esgoto e de transporte coletivo. Nós temos uma série de serviços fundamentais em que os efeitos do movimento grevista vão para muito além dos portões da fábrica. E isso vai depender da sensibilidade do magistrado diante de um movimento dessa magnitude.
 
BN: No caso dos serviços essenciais, é estabelecido que uma percentagem mínima esteja em funcionamento. No caso dos rodoviários foi determinado que 60% da frota estivessem em plena operação nos horários de picos, que não foi cumprido. Quais as implicações penais o sindicato dos trabalhadores pode sofrer?
 
RR: Existem basicamente três implicações de natureza: trabalhista, como é o caso da própria multa diária estabelecida; nós temos consequências cíveis, que é do ponto de vista das responsabilidades e das conseqüências dos danos causados pelo descumprimento dessa ordem e, nesse ponto, as próprias empresas têm legitimidade para pleitear isso, de apurar os prejuízos gerados pelo descumprimento da ordem judicial e requerer na Justiça a reparação desses danos; e por fim, podemos ter consequências de natureza penal se houve excessos e dano ao patrimônio, caso esse dano tenha sido intencional, o que pode ser apurado em juízo penal, inclusive com punição dos envolvidos em condutas antijurídicas dessa natureza.
 
BN: Nas redes sociais, os internautas chegaram a propor que a greve dos rodoviários deveria acontecer de outra forma, não com a paralisação da atividade, mas sim com o serviço na rua e com a liberação das catracas. Essa liberação seria uma forma legítima de fazer uma mobilização, ou seria considerado apenas um protesto? Isso também poderia ser considerado como uma atitude que causaria danos a empresa?
 
RR: A liberação das catracas no âmbito do transporte coletivo público pode trazer outras implicações, inclusive para os próprios trabalhadores que vão estar diretamente nesses veículos. Vamos imaginar a situação de um motorista e de um cobrador que adotam uma postura dessa natureza. A empresa vai ter legitimidade para puni-los individualmente, inclusive do ponto de vista disciplinar, com advertência, suspensão e até rescisão do contrato de trabalho com justa causa. O risco para esse trabalhador é muito alto com esse tipo de conduta. Alguns vão estar nos ônibus e praticar essa conduta, outros não. Com essa conduta será o sujeito, o indivíduo, que vai assumir o ônus para si. Eu acredito que é um movimento muito arriscado para esses trabalhadores e a empresa vai ter ai uma legitimidade de buscar a punição desses trabalhadores. Eles estariam, digamos assim, causando um prejuízo para empresa e, em contraponto, esses prejuízos não vão afetar só a patrimonialidade jurídica do movimento como um todo, mas também do sujeito que individualmente fizeram essa liberação. E outra, ele não está deixando de trabalhar. Greve é paralisação da atividade profissional. Nesse caso, o trabalhador não está exercendo, estritamente, o direito de greve. Ele está indo além: ele está indo trabalhar, exercendo sua atividade laboral e causando prejuízos à empresa.
 
BN: A legislação prevê alguma proteção para os trabalhadores que participam dos movimentos grevistas?
 
RR: Durante a greve, o contrato de trabalho fica suspenso. Nesse período, é vedada qualquer rescisão de contrato de trabalho. Os trabalhadores não podem ser demitidos durante o estado de greve. E logo após o término da greve, caso a empresa adote uma postura de perseguição, de punição a esses trabalhadores pelo simples fato de eles terem participado do movimento grevista, isso pode ser objeto de demanda judicial, titularizada por esses trabalhadores por prática antissindical, por prática contra a organização sindical, e contra  as próprias liberdades fundamentais. Isso não quer dizer que os trabalhadores tenham estabilidade empregatícia, mas eles não podem ser punidos ou perseguidos durante ou logo após a paralisação em virtude desse fato.
 
BN: Nesse caso, os sindicatos podem ingressar com um pedido de reintegração do trabalhador ao quadro de funcionários da empresa?
 
RR:
O pedido de reintegração pode ser feito de forma isolada ou, juntamente com o pleito de indenização por danos materiais e morais sofridos pelos trabalhadores que foram injustamente demitidos ou perseguidos quando o Direito veda esse tipo de conduta.
  
BN: Na greve dos rodoviários foi divulgado que as empresas contrariam mão de obra temporária para colocar os ônibus em circulação. Essa contratação é permitida por lei? Existe diferença entre os serviços normais e essenciais?
 
RR: O que a lei prevê quanto à possibilidade de contratação de mão de obra terceirizada é apenas em caráter emergencial, quando trabalhadores e empresa não chegam a um acordo quanto àquelas atividades mínimas necessárias para que não haja prejuízo na empresa. Quando se fala em serviços essenciais, a lei traz uma solução diferente. Ela diz que, caso não se chegue a um denominador comum quanto ao percentual mínimo de manutenção das atividades, a lei coloca no colo do Poder Público a responsabilidade de atuar. É uma conduta, de certa forma, de pouca prática. Confesso que eu não tenho muitos exemplos para citar em que o Poder Público tenha interferido diretamente no caso de atividade essencial e passado a prestar esse serviço no lugar daquelas concessionárias de serviço público, como é o caso do transporte coletivo. Eu prefiro considerar que a responsabilidade nesse caso é partilhada. As empresas podem contratar uma mão de obra emergencial? Podemos acreditar que sim, desde que haja um acordo entre as partes envolvidas.
 
BN: Desde o início do ano, várias greves foram deflagradas, e ao que tudo indica, outras categoriais deverão paralisar até o final do ano. Você acredita que exista um alinhamento entre as centrais sindicais para que as categoriais promovam paralisações para pleitear suas reivindicações e qual seria o motivo?
 
RR:A organização de movimentos interestaduais, na velocidade que nós estamos vivenciando, é realmente uma surpresa. Nós tínhamos, muitas vezes, movimentos isolados, um em cada cidade, sem uma articulação que tornaria o movimento unificado. Mas hoje, nós vivenciamos uma realidade diferente. Tivemos o exemplo de movimentações nesse sentido quando houve a greve dos policiais, quando houve greve envolvendo o corpo de bombeiros, e agora nós estamos verificando tanto no âmbito dos rodoviários, quanto aos metroviários, uma movimentação em várias capitais brasileiras no mesmo sentido. É óbvio que é fruto de uma articulação política, mas é preciso ter uma cautela muito grande com relação a esse tipo de movimentação para que a pauta de reivindicações seja autêntica. Que a pauta de reivindicações de cada grupo de trabalhadores possua uma realidade vinculada a cada categoria. À exceção de sindicatos nacionais como dos professores de universidades federais e como o sindicato dos auditores fiscais da receita, sindicatos em que o movimento é necessariamente nacional, porque a categoria que eles representam é nacional, esse tipo de articulação nos diversos pontos do país precisa ter um critério de autenticidade das pautas reivindicatórias, para que isso não se torne meramente um movimento político. É preciso deixar claro que o intuito da greve, a razão de ser da paralisação das atividades profissionais não é focado em um questão meramente política, ela deve visar sempre à melhoria das condições de trabalho. Quando a pauta de reivindicações fugir disso, vai estar também fugindo da finalidade da própria norma que defende o direito de greve.




 

BN: Você acredita que a própria conjuntura econômica que o Brasil atravessa favorece para que as greves sejam deflagradas por querer repartir melhor o "bolo” que cresceu nos últimos anos?
 
RR:
O Brasil tem vivido um clima de prosperidade, e é natural que haja um anseio por parte dos trabalhadores por considerar esse momento propício para apresentar as suas reivindicações e os seus pleitos. Eu acredito que é uma movimentação que tem que vir casada não apenas com a perspectiva do momento que estamos vivenciando agora, mas também com as perspectivas a curto, médio e longo prazos. É preciso que, dentro da formatação de todos os pleitos que estão sendo colocados hoje, que se enxergue não apenas aquilo que está restrito a essa imediatidade, mas que se pense nessa conjuntura política-econômica virtuosa que nós estamos passando dentro do critério de sustentabilidade, e que para isso é preciso uma confluência tanto por parte do empresariado, quanto por parte do Poder Público e dos trabalhadores. Sem dúvida, é importante que esse bolo seja dividido, mas não só agora. É preciso que haja uma postura de constante negociação coletiva para que o consenso prevaleça sempre. A ideia de um movimento grevista é sempre sinal de que a negociação de alguma maneira falhou. É sinal que houve uma frustração nas tratativas negociais. Eu acredito que seja preciso que essas três partes, Poder Público, empresariado e trabalhadores, tenham em mente, e visem sempre concentrar suas energias nessas negociações coletivas, antes que a situação descabe para o movimento grevista. Acredito, ainda, que o excesso de greves, esse boom de paralisações, é parte de algo de outra natureza, de um movimento de certa intransigência de um, ou de alguns dos sujeitos envolvidos nessa tratativa.
 
BN: Um dos entraves nessas negociações são os aumentos reais pleiteados por cada categoria. Você acredita que os sindicatos só se atenham a questão do reajuste salarial, ou que existam outras pautas nessas negociações, que visem à qualidade de vida dos trabalhadores?
 
RR: 
Eu acredito que o grande mote das pautas reivindicatórias, por incrível que pareça, não deve estar estrito ao reajuste ou aumento real do salário. Quando nós falamos em reajuste, nós estamos falando na correção da perda inflacionária. Quando falamos em aumento real, nós implementamos o reajuste, corrigimos a inflação e damos algo a mais. Eu acredito que as pautas reivindicatórias devem estar bastante vinculadas à questão da promoção da dignidade do trabalhador. Ao mesmo tempo em que nós temos essa pauta forte, de aumento real, acredito que temos um déficit muito forte, principalmente por parte das empresas, do tratamento digno desses trabalhadores. Um exemplo claro dessa situação, é quando nós temos uma paralisação motivada por problemas de eleição sindical, no caso de eleição de representantes de base desses trabalhadores, em que a empresa adota uma postura de um combate direto a esse tipo de iniciativa democrática e pune o trabalhador pelo mero fato de haver feito parte da eleição, por sua inscrição para participar da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), ou pelo fato de ele ter protocolado ou manifestado o intuito de participar de uma eleição de representante de base. As pautas reivindicatórias que temos vão muito além da questão de reajuste. Temos diversas condições de trabalho vinculadas a insalubridade, periculosidade, e que não são pagos e que a empresa simplesmente faz vistas grossas. Esses auxílios são uma indenização por haver um dano não reparado ao trabalhador.