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Entrevista

Presidente da Ampeb crê que crise não pode ser desculpa para mudanças ruins para o MP

Por Júlia Vigné

Presidente da Ampeb crê que crise não pode ser desculpa para mudanças ruins para o MP
Foto: Divulgação / AMPEB
A atuação do Ministério Público da Bahia (MP-BA) foi avaliada por Janina Schuenck, presidente da Associação do Ministério Público da Bahia (Ampeb). A gestora completou um ano à frente do órgão e também comentou, em entrevista ao Bahia Notícias, a situação das comarcas no interior do Estado e a importância da atuação do MP diante da situação e crise política e econômica atual. “Nesse cenário de crise política e econômica, o MP deve exercer o protagonismo, garantindo os direitos da sociedade, zelando para que as prerrogativas na sua atuação independente sejam estabelecidas, e zelando para que não haja mudança nos instrumentos de atuação sob o argumento de que a crise impõe”, afirmou Janina. E adicionou que “é preciso, nestes momentos, estar atento, não transigir com garantias e com prerrogativas, ainda mais no caso do Ministério Público (MP), que existe para assegurar a independência no trabalho desenvolvido em prol do interesse público.” 
  
O país passa por um momento de crise política e financeira. O ano também será marcado por eleições estaduais. Quais os desafios estruturais e institucionais que o atual contexto impõe ao Ministério Público e consequentemente à Ampeb?
Em cenários de crise é que se forjam grandes líderes. O cenário de crise não é só um cenário de lamentação. É onde podemos buscar fortalecimento institucional. É preciso, nestes momentos, estar atento, não transigir com garantias e com prerrogativas, ainda mais no caso do Ministério Público (MP), que existe para assegurar a independência no trabalho desenvolvido em prol do interesse público. Existe uma operação, que é a Lava Jato, que está alcançado grandes figuras, no cenário político e econômico do país. Isso faz com que, dentre outras consequências, haja uma melhor percepção do trabalho do parquet no combate à corrupção e à criminalidade, que é uma das funções na defesa do interesse público. Mas a gente tem um exponencial de dificuldade decorrente da atuação do ministério em cenário de crise política, que são os Projetos de Lei e de Ementa à Constituição que afetam diretamente à atuação ou afetam garantias do Ministério Público.  Existem projetos que atingem diversas áreas, por exemplo o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) 65/2012 prevendo a desnecessidade de licenciamento ambiental para obras de grande impacto. E isso na área ambiental será um desastre, além de o MP na parte ambiental. De outro lado, existem projetos que buscam cercear direitos do MP, como a do teto remuneratório. Por exemplo, em época de eleição é formada a Justiça Eleitoral, que não tem um corpo próprio. Quando os juízes e promotores trabalham para a justiça eleitoral e não exerce sua função natural, é pago um percentual para esses juízes e promotores que estão tendo um acréscimo em seus trabalhos ordinários. E isso é uma distorção, é uma forma de retaliação que a gente não pode admitir. Alguns principais ataques vem diretamente à atuação do MP, como esse Projeto de Lei 233/2015, que versa sobre o regramento do inquérito civil e dos procedimentos correlatos a cargo do MP. Então nesse cenário de crise política e econômica, o MP deve exercer o protagonismo, garantindo os direitos da sociedade, zelando para que as prerrogativas na sua atuação independente sejam estabelecidas, e zelando para que não haja mudança nos instrumentos de atuação sob o argumento de que a crise impõe algumas mudanças que não são nem justificadas no cenário normal, nem no cenário de crise.

A gestão da procuradora-geral de Justiça, Ediene Lousado, está prestes a completar quatro meses. Quais são as impressões desses primeiros meses e como anda o diálogo entre a procuradoria-geral e a Ampeb?
Nós já tivemos a oportunidade de conseguir uma conciliação num procedimento de controle administrativo que a AMPEB tinha iniciado no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) no ano passado a respeito de uma regra que havia sido reeditada. A regra afirmava que não poderia haver servidor e promotoria vaga, o que muitas vezes repercutia em portas fechadas à população por inexistir alguém para atender. Essa regra havia sido reeditada e questionada no CNMP pela Associação, porque muito embora não tivesse o servidor, há um promotor que vai lá substituir. Sabemos que há um cenário de crise econômica, mas essa medida vem desde antes da crise e ela não poderia ser uma justificativa para que essa situação se eternizasse. Então tivemos o procedimento de controle administrativo de outubro do ano passado e a gente conseguiu, pela iniciativa do relator do CNMP, que propôs uma audiência de conciliação e a procuradora-geral assentiu em rever o ato e já fez uma publicação na qual a regra passa a ser buscar uma melhor estrutura dentro das possibilidades e a regra de inexistência de servidor deixa de existir. Isso foi um grande avanço para assegurar estrutura ao promotor e o funcionamento do serviço à população.  Tivemos a oportunidade dessa conciliação e a AMPEB está aberta para buscar soluções conciliatórias, mas também está atenta para tomar todas as medidas que se fizerem necessárias quando uma solução antecipadamente conciliatória não for possível.

Como a senhora avalia a atuação do MP no interior do Estado? Quais são os maiores desafios de quem atuam nessas comarcas? 
Eu penso que o grande desafio para o promotor do interior é a questão estrutural e a acumulação de função, que não significa dobro de salário. Atualmente nós temos pelo menos 180 promotorias vagas. Isso significa que mais da metade dos aproximadamente 300 colegas do interior tem que substituir e acumular funções. Ou até mesmo os colegas da capital têm que se deslocar para essas comarcas. Isso é algo que precisa ser visto pelo Estado, eu não digo imediatamente porque é impossível fazer concurso público em um ano de crise econômica, mas em médio prazo isso precisa ser visto porque, no momento em que as demandas da sociedade se tornam mais complexas, no momento em que o Ministério Público mostra a sua atuação, naturalmente as demandas reprimidas aparecem. Mas o grande desafio atual é acumular funções e gerenciar toda a demanda da sociedade em mais de uma atribuição. É preciso que a gente tenha uma adequada previsão orçamentária do Estado para que o MP tenha estrutura para desempenhar dentro de sua função. Eu digo mais, inclusive teria que ter uma mudança em âmbito nacional no que diz respeito à Lei de Responsabilidade Fiscal, porque essa lei coloca como limite para o judiciário 6% da receita corrente líquida e para o MP, quando foi feita em 2001, previa 2%. E, como eu disse, no momento em que a instituição mostra trabalho, demandas reprimidas aparecem e a instituição vem sendo cada vez mais suscitada, então esse percentual de 2% máximo precisaria ser revisto. Isso deveria ser adequado porque a nomeação de novos membros para ocupar essas promotorias esbarra no limite financeiro que é o limite prudencial com gasto e despesa com pessoal e a gente ainda tem uma margem no Estado da Bahia. Outro desafio desses promotores é a dificuldade que ainda temos com a segurança institucional. Os promotores muitas vezes atuam no interior enfrentando organizações criminosas e essa questão de segurança institucional poderia ser aperfeiçoada. Eventualmente nós somos surpreendidos com casos de violência e a segurança institucional precisa ser aprimorada.

Atualmente o MP baiano apareceu em 22° lugar no último ranking do último trimestre no Portal da Transparência. Na sua avaliação, quais são as chances da Bahia aparecer melhor colocada nas próximas avaliações? E você vê um motivo pelo qual o MP-BA teve esse posicionamento? 
Eu não tenho como mensurar as chances. Isso depende muito mais de uma postura da gestão da instituição. O que eu posso pontuar a respeito é que o MP tem como uma das suas metas de gestão estratégica a transparência dos órgãos públicos e, inclusive, foi premiado por essa meta recentemente. E que se o CNMP está vendo essa necessidade de melhora, que a gente deva aprimorar essa questão da transparência dentro da própria instituição. Eu acho que precisamos avançar nesse ranking, mas não tenho exatamente como mensurar as chances porque é necessário uma mudança de postura para se adequar ao que o CNMP exige. Eu sei que são vários os critérios analisados, então não vejo um motivo específico. Com certeza tem muita coisa a melhorar em publicação de atas, em fornecimento de informações. A gente espera que a procuradoria-geral avance nesse sentido em resposta aos expedientes, mas com certeza precisamos implementar a meta dentro da instituição.
 
A sua gestão completou um ano em junho. Que avaliação a senhora faz do seu período frente a associação? Qual a diferença da Ampeb de hoje para a que a senhora assumiu do ex-presidente?
Posso dizer que as gestões anteriores da Ampeb sempre encontraram um desafio e foram melhorando e as subsequentes, a partir dessa melhora, conseguem desenvolver uma atividade ainda mais aperfeiçoada. Eu encontrei a Ampeb com um aspecto gerencial muito bom, muito organizado, especialmente em relação a finanças, a pessoal, e isso possibilita sempre avançar. Entretanto, o fato de encontrar bom não nos autoriza cruzar os braços. Mas com certeza encontramos a AMPEB em uma situação de organização favorável para que pudéssemos continuar exercendo as funções, que são muitas, não apenas de congraçamento dos associados, temos também a prestação de serviço jurídico, intermediação de serviços, questão jurídica em processos administrativos, defesa de ataques pessoais que o membro do MP possa ter sofrido, entre outros. O momento político tem intensificado a necessidade de atuação institucional em um nível nacional. O momento externo ele já dá uma ideia de como vai ser a gestão. Essa questão da crise político e econômica, o “boom” legislativo de projetos de leis que estavam tramitando há muito tempo voltaram e essa atuação institucional em âmbito nacional teve que ser intensificada naturalmente, por causa dessa demanda. O que eu posso dizer de marca, de diferente, na atual diretoria é que a gente tem buscado aprimorar a comunicação. Com os associados, veículos de imprensa e com a própria sociedade.