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Entrevista

‘Temos um déficit de 317 defensores públicos no estado’, diz presidente da Adep-BA

Por Cláudia Cardozo. Fotos: Jamile Amine | Bahia Notícias

‘Temos um déficit de 317 defensores públicos no estado’, diz presidente da Adep-BA
Fotos: Jamile Amine | Bahia Notícias

A nova presidente da Associação dos Defensores Públicos da Bahia (Adep-BA), Ariana de Sousa Silva, falou em entrevista ao Bahia Notícias sobre os objetivos de sua gestão, no biênio 2014/2016. Segundo Ariana, seu principal desafio da categoria é a aprovação da Emenda Constitucional 80, a qual prevê que a União e os Estados tem que colocar um defensor público em cada comarca. "Hoje temos 266 defensores públicos na ativa (no estado), com um total de 583 cargos previstos na nossa lei. Isso representa um déficit de 317 defensores. Foi avaliado que na Bahia há uma necessidade de 1239 defensores. Hoje, efetivamente, temos um déficit de 973 defensores". Como líder da associação, Ariana também se posicionou sobre o atual momento do Judiciário no País. "O Sistema de Justiça precisa avançar como um todo. Se todos não tiveram alinhados para solucionar os problemas da Justiça, que são enormes, com problemas estruturais, de gestão até orçamento, então não tem como a gente avançar nessa parte. A sociedade civil também precisa participar, sendo chamada para contribuir na busca das soluções". Leia a entrevista completa na coluna Justiça.


Quais razões te levaram a lançar candidatura para presidência da Adep?
As razões são dar continuidade ao trabalho da Dra Soraia [Ramos], de fortalecimento da carreira de defensor público e, com isso, contribuir para o crescimento da instituição como um todo. Então, a gente está com bastante gás para tocar todos os projetos que já vinham sendo realizados pela Dra Soraia e acrescentar outros no formato da nova diretoria.

A senhora já participava anteriormente da gestão de Soraia Ramos?
Na verdade, eu não participava. Mas eu sempre estava lá nas atividades. Eu tenho essa veia associativa já desde pequena, de ser líder de sala, sempre buscar melhorias para os alunos na época da escola. Então eu já tinha essa veia associativa. E aí, me interessei, ajudava no que ela precisava para estar alavancando a carreira do defensor público, e com isso, contribuindo para o crescimento da instituição.

Quais são os desafios da Adep que tem aí pela frente, tendo em vista uma luta, que é nacional, para aumentar o número de defensores públicos, de como isso se reflete diretamente na sociedade, e até mesmo aqui na Bahia, em que boa parte dos servidores não são concursados?
A aprovação da Emenda à Constituição 80 prevê que a União e os Estados tem que colocar um defensor público em cada comarca, em cada unidade jurisdicional. Há uma necessidade de se fazer concursos públicos e ocupar esses cargos que hoje estão vagos. A nossa principal proposta é a defesa da implantação efetiva e integral dessa Emenda Constitucional 80, que reposicionou a Defensoria no cenário político. Ela saiu da seção de advocacia pública e teve uma seção própria, de autônoma. Hoje, advogado é advogado, e defensor público é defensor público. Cada um na sua atribuição, dentro do sistema de Justiça. A gente está buscando essa implementação. E isso vai refletir na própria instituição, que é necessária até mesmo para assegurar o Estado Democrático de Direito. Temos também a luta de colocar defensores públicos em outras comarcas, mesmo porque hoje temos defensores aprovados e não chamados no último concurso de 2010. Hoje temos 266 defensores públicos na ativa, com um total de 583 cargos previstos na nossa lei. Isso representa um déficit de 317 defensores. A Anadep – que é a Associação Nacional dos Defensores Públicos – fez um mapeamento de todas as Defensorias Públicas e o déficit de defensores pelo Brasil, em parceria com o Ipea. Foi avaliado que na Bahia há uma necessidade de 1239 defensores. Hoje, efetivamente, temos um déficit de 973 defensores. São muitos para poder garantir o acesso à Justiça àquela pessoa que não tem condição de pagar advogado. Além disso, contribuir na própria formulação das políticas públicas. A Defensoria não é só a atuação individual. Ela também tem ação coletiva. E ela é um instrumento para efetivação das políticas públicas. Ela tem um viés mais social, além da sua atribuição individual. Nós temos agora 17 aprovados aguardando a nomeação, e pelo mapeamento da Anadep, observou-se que a Bahia é a terceira pior estada no país em déficit de defensores. Ela precisa ser observada e valorada pelos nossos governantes para ter a sensibilidade, da necessidade de ter mais defensores, porque é nosso material humano. Sem eles, a gente não cresce. Além disso, também tem a atividade meio. A gente precisa de concursos para servidores, e para isso, a gente precisa ter aprovado nossa lei de plano de cargos e salários, que hoje está na Assembleia Legislativa, aguardando a votação. Na verdade, a Defensoria é um órgão de execução, ela não pode trabalhar sozinha, ela precisa de todo esse aparato, para até mesmo otimizar sua mão de obra. Isso porque, o defensor público faz, hoje, desde a função do estagiário até altas peças jurídicas, da alta complexidade. Então, você acaba subutilizando a mão de obra, extremamente qualificada e, de uma certa forma, cara, para estar fazendo outras funções que poderiam ser feitos com um dispêndio de recurso menor.


Como tem sido o relacionamento da Adep com o Executivo e o Legislativo?
Estamos em constante diálogo com o Legislativo e com o Executivo. O governador Jaques Wagner sempre recebeu a associação para ouvir nossas demandas. Na inauguração da nova sede no CAB, em seu discurso, ele se comprometeu em aprovar a Lei de Cargos e Salários, para justamente dar condições da Defensoria crescer, e cumprir a Emenda Constitucional 80 - também conhecida como PEC das Comarcas e Defensoria Para Todos.

De todos os pontos da pauta da associação sobre valorização dos defensores, qual é a prioritária?
É preciso lutar pela valorização da carreira, especialmente, na adoção de medidas que assegurem a dosimetria, principalmente a remuneratória, das demais carreiras essenciais à Justiça: Ministério Público e a Magistratura. Hoje, a gente tem que buscar essa simetria, porque a Constituição nos dá isso. Hoje é preciso que a gente tenha autonomia orçamentária, administrativa e financeira. Só que a financeira, ela está um pouco mitigada, porque ainda não temos um valor, um percentual específico na Lei de Responsabilidade Fiscal, como tem o MP e o Poder Judiciário. Então, nossa autonomia financeira está ficando mitigada por conta disso. É uma luta também nacional, para que a Defensoria possa estar com esse percentual assegurado, porque se a gente não tiver isso, não tem como avançar. A gente tem autonomia financeira, através de um projeto de lei que foi aprovado por unanimidade, para que se tenha um percentual de até 2% do orçamento público. E no último minuto, a presidente Dilma Rousseff vetou o projeto de lei, e desde então, temos feito uma luta para botar o veto em pauta, e até então, não se conseguiu derrubar esse veto. A gente precisa da autonomia financeira para avançar, sem isso, a gente fica trabalhando de uma forma precária, e isso reflete na prestação de serviço ao cidadão.

Como é feita a proposta orçamentária da Defensoria?
Nós passamos a nossa proposta de orçamento para o Executivo – inclusive, ela deve ser votada por agora. Houve uma redução no orçamento para 2015 em R$ 10 milhões, e isso vai ter um impacto na estrutura da Defensoria Pública, e com isso, a gente não tem como avançar. A gente teve até um retrocesso aí, nos investimentos públicos.

Uma das reclamações constantes da sociedade é a falta de defensores no interior. Como a associação vê a interiorização da Defensoria?
É um problema grave, inclusive por conta da falta de defensores, cidades como Eunápolis, com um porte considerável, tem um presídio instalado lá, e não tem um defensor público. O coberto é pequeno, e a gente sempre precisa priorizar as unidades que tem maiores problemas estruturais. Por conta disso é que eu sempre bato nessa tecla que a gente precisa chamar defensores públicos para atuar nas cidades do interior, porque os problemas nessas cidades, de falta de defensores, prejudicam a população. Tem cidades com problemas de violência contra mulher sem defensores para fazer toda essa política institucional voltada ao combate da violência contra mulher. Sem defensor, a gente não tem como trabalhar essas questões.

Como é que a Adep avalia a gestão da defensora-geral da Bahia, Vitória Bandeira?
A nova diretoria está entrando agora, e nós estamos tentando formar pontes para o diálogo, como já vinha sendo feito pela antiga gestão – porque é preciso ter esse alinhamento. Não posso dizer que a gente tem que trabalhar junto, porque, por vezes, os interesses se conflitam, mas nós temos que trabalhar alinhado, porque o interesse é o crescimento da instituição. Porque se reflete na prestação do serviço ao usuário da Defensoria Pública, e por isso, temos que ter esse diálogo com a defensora-geral, Vitória Bandeira. Já marcamos um encontro nesse mês ainda, para tratar questões da carreira e das demandas judiciais, para ver se a gente consegue formalizar algum tipo de consenso, para buscar essa valorização.

Como é que a senhora avalia a gestão de Soraia Ramos à frente da Adep?
Eu parabenizo a diretoria pela atitude, porque ela conseguiu colocar a associação dos defensores em âmbito estadual e nacional, em grande evidência, tem um trabalho comprometido, sempre voltado para o defensor público. E isso foi mais um dos motivos que me levaram a lançar candidatura, para dar continuidade a esse trabalho que ela vem desenvolvendo nos últimos dois anos. A associação ganhou um espaço e uma notoriedade nesses dois anos.


A Adep também participa aí da chamada Mesa de Articulação, que discute os problemas do Judiciário baiano. Essa crise do Judiciário, em que medida, afeta a Defensoria?
O Sistema de Justiça precisa avançar como um todo. Se todos não tiveram alinhados para solucionar os problemas da Justiça, que são enormes, com problemas estruturais, de gestão até orçamento, então, não tem como a gente avançar nessa parte, se todos os atores estiverem envolvidos e comprometidos em solucionar os problemas da Justiça. A sociedade civil também precisa participar, sendo chamada para contribuir na busca das soluções.

A demanda da Defensoria ainda é muito alta?
A demanda é sempre muito grande. Os defensores estão com inúmeros problemas, até mesmo para exercer sua atividade fim. A nova diretoria está com um projeto, que será lançado, provavelmente em fevereiro ou março, que é chamado ‘Pé na Estrada’. Nós vamos visitar todas as comarcas que existem um defensor público para gente fazer um diagnóstico das condições de trabalho do defensor, da demanda do defensor, para fazer um relatório, para verificar se a instalação do defensor é própria, se é cedida, se tem convênio, se tem servidores, se tem servidor em convênio com a prefeitura, quantos servidores, quantos defensores públicos naquela comarca, o número de atendimentos, para buscar melhorias para o defensor. Nós vamos fazer um Raio X das comarcas, e ao final, levar esse diagnóstico para defensora-geral. Muitas vezes, o defensor está na comarca, longe da capital, e a gente não sabe em que condições esse defensor estão trabalhando, quais dificuldades ele enfrenta na comarca. Por isso nós temos essa atribuição de ingressar com ações civis públicas para minimizar as demandas individuais e trabalhar nas demandas coletivas. É por isso que a Defensoria é tão importante na efetivação das políticas públicas, que vai desde a construção da agenda, junto com a sociedade civil, até o monitoramento dessa política pública, se ela é eficiente.

Na sua concepção, a agregação das comarcas por parte do Tribunal de Justiça da Bahia, atrapalha a atuação dos defensores?
A Defensoria é autônoma para dispor os seus cargos. Ela pode fazer uma avaliação de como os defensores vão trabalhar nas comarcas agregadas. No momento é feito uma reformulação de todas as unidades da Defensoria, e sempre se observa a demanda, o adensamento populacional, os problemas daquela região, e se faz uma análise também da necessidade da população naquele local.