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Entrevista

De dissidente do Juazeiro à Série C: Presidente da Juazeirense conta história do clube

Por Matheus Caldas

De dissidente do Juazeiro à Série C: Presidente da Juazeirense conta história do clube
Foto: Tiago Dias / Bahia Notícias

Em 2006, o deputado estadual Roberto Carlos (PDT) perdeu a eleição presidencial no Juazeiro. Após um pleito conturbado, um dos fundadores do Carcará decidiu, em 2008, fundar outro clube: a Juazeirense. Embora tenha estampado no escudo o ano de 2006, foi mesmo dois anos depois que o Cancão de Fogo foi fundado. “O design errou na hora da numeração. Como estávamos apressados, ficou 2006 mesmo (risos)”, conta, em entrevista ao Bahia Notícias. E, 11 anos depois, o clube conquistou uma façanha que durava décadas: conquistou o primeiro acesso do interior da Bahia em competições nacionais, ao subir para a Série C de 2018. Para o dirigente, no próximo ano, o intuito é brigar pela permanência. Em 2019, o planejamento já é brigar por uma vaga na Série B. Contudo, ele brinca com a possibilidade de novamente surpreender o futebol nacional. “Mas, se isso vier antes, beleza. Isso será espetacular”, projeta. Dentre outros assuntos, o cartola falou sobre as dificuldades de se manter um clube sem calendário, apresentou os projetos da Juazeirense para o futuro e contou sobre a emoção de ter eliminado o favorito América-RN na Série D. 

A Juazeirense foi o primeiro clube do interior a conseguir acesso em competições nacionais. Como o clube recebeu isso?

Nós fizemos uma programação para a Juazeirense, um planejamento, que começou em dezembro do ano passado. Nós traçamos metas. E, nessas metas, nós traçamos que gostaríamos muito de buscar a Série C. E aí fizemos esse planejamento. Na primeira fase, disputaríamos com um time mais modesto e na segunda fase iríamos reforçar. E assim foi feito, e graças a Deus tivemos êxito. Essa classificação foi muito importante não só para nós, mas para o futebol baiano.

Em que momento da competição você viu que realmente o clube tinha condições de subir para a Série C? 
No mata-mata contra o Jacobina. Ali nós mostramos que tínhamos potencial. No jogo em Jacobina, saímos na frente, Jacobina empatou, depois viramos e saiu o empate. Ali eu vi que o time estava coeso, entrosado. E aí, desse dia para cá, vencemos por 3 a 0, fomos contra o Fluminense de Feira, em Feira, fizemos um jogo emocionante, empatando em 3 a 3. Mas foi contra o Jacobina que eu disse: ‘Vamos buscar a vaga que a gente tanto almeja’.

Qual o momento mais marcante na campanha da Juazeirense na Série D?

A decisão antecipada contra o América-RN. Aquele jogo lá em Juazeiro foi marcante, emocionante. Tínhamos pela frente uma grande equipe, centenária, que já esteve por duas vezes na Série A. Muita experiência, muitos jogadores bons, uma equipe de muitos torcedores. Mas a gente, no primeiro tempo, fez um grande jogo. Perdemos vários gols. E, no segundo, aqueles três gols, o 3 a 0... Foi emocionante. Poderia ter sido quatro ou cinco. Infelizmente, perdemos dois gols. Mas, ali, foi emocionante e a antecipação da final da Série D.

No Baiano, a Juazeirense montou um elenco caro, trouxe Ávine e contratou o Danilo Rios que acabou não jogando. No entanto, acabou brigando contra o rebaixamento. Naquele momento, você temeu pelo futuro do clube?
Não. Infelizmente, a equipe não engrenou. Não foi a questão da qualidade dos jogadores. Foi o tempo que não tínhamos para treinar. Estávamos disputando paralelamente a Copa do Nordeste e havia jogos quarta e domingo, com viagens difíceis. Fizemos uma viagem de Juazeiro para Guanambi para jogar contra o Flamengo. Foram 1.200 km. De lá, fomos jogar no Maranhão contra o Sampaio Corrêa. Imagine. Não tínhamos tempo para treinar. Aí, realmente, tivemos esses problemas. Mas, mesmo não tendo feito um bom campeonato, ficamos em sétimo lugar e não ficamos em momento nenhum na zona de rebaixamento.

Juazeirense não tomou conhecimento do América-RN no Adauto Moraes

Foto: Carlos Humberto / Agência CH

Você acha que faltou experiência para a Juazeirense nesse caso?
Faltou experiência. Nós deveríamos ter feito dois times para jogar. Um para jogar no baiano e outro no Nordeste. Por exemplo: os times pequenos que disputaram os regionais e a Copa do Nordeste, como Sampaio Corrêa, Juazeirense, Serrano, que desceu no Baiano e nunca mais voltou... O Vitória da Conquista. Nenhum fez boa campanha. Mas, realmente, faltou um pouco de experiência. Hoje eu digo com muita segurança que o processo que deveríamos ter feito era contratar um time para cada competição.

Qual a projeção que a Juazeirense faz para os próximos anos?
Queremos fazer uma boa competição na Série C no ano que vem. Claro, se a gente puder subir, beleza. Mas o projeto é que a gente se mantenha bem na competição em 2018. Em 2019, aí sim, vamos sonhar em buscar uma Série B. Todo time sonha em crescer e nós não somos diferentes. Nosso projeto é fazer uma boa competição em 2018 e em 2019 tentar subir. Mas, se isso vier antes, beleza. Isso será espetacular. Mas pode ter certeza que daremos muito trabalho a Bahia e Vitória aqui no estadual.

A Juazeirense agora entra na Série C numa condição diferente. É uma competição com clubes mais tarimbados. A Juazeirense entra como um clube se ambientando no cenário nacional. O que o clube tem como pensamento para poder se manter na Série C?
Estamos conversando com Vitória e Bahia para que eles possam abrir esse convênio para que jogadores da dupla Ba-Vi ajudem a Juazeirense nessa competição. Não encontraremos vida fácil na competição. O Santa Cruz pode cair, o Figueirense pode estar entre os que disputarão a Série C... São times que estão em Série A, Série B do Brasileiro. São times experientes. Mas, certamente, contarei com Bahia e Vitória, além de contatos de outros clubes no Brasil. Já estamos mantendo esse contato para fazermos uma grande equipe. Estamos também trabalhando muito a divisão de base, pois sabemos que ali está o futuro da Juazeirense se manter em atividade e ganhar dinheiro para fazer o que a Juazeirense precisa.

Então, a Juazeirense, diferente de outros clubes do interior do país, não é só uma empresa, mas uma equipe que está aí para se enraizar...
Com certeza. Nossa equipe é uma sociedade desportiva. A finalidade primordial é fazer a alegria do torcedor, principalmente da região do Vale do São Francisco. Mas, se pudermos revelar jogadores, beleza. A Juazeirense é um clube sem fins lucrativos, mas aí se monta uma estrutura de um CT com dignidade, de trabalhar a divisão de base com mais força. Nós, inclusive, temos que dizer que estamos investindo muito na base. Nós estamos com um núcleo em Salvador disputando o Baiano infantil e juvenil. O sub-20 participará em novembro da Copa do Nordeste.

Em 2018, o clube terá o calendário um pouco maior. Essa é a principal reclamação dos clubes menores do país. O que você acha que poderia ser melhorado? E você acha que o calendário que o clube tem já dá para manter as finanças?
Manter as finanças, não. Eu acho que a CBF, a FBF também, deveriam buscar mecanismos de estruturar melhor esses clubes. Por exemplo, a gente não pode disputar uma competição dessas, para disputar contra equipes tradicionais, como Santa Cruz ou Figueirense talvez, sem ter uma folha de R$ 300 mil aproximadamente. E onde vamos buscar esse dinheiro? A CBF não patrocina a Série C. Eles dão 28 passagens de avião, alimentação no hotel e 28 hospedagens. É muito pouco para se manter uma equipe. Mas estamos atrás alguns parceiros. Alguns empresários já sinalizaram que querem nos ajudar. Faremos um grande time trazendo jogadores de Bahia e Vitória.

Então, no caso, o clube está tentando driblar as dificuldades impostas pelo calendário deficitário...
Eu sempre digo que os clubes pequenos são milagreiros do futebol. Têm que driblar essas questões todas para fazer o futebol. Bahia e Vitória, não. É diferente. Eles têm uma estrutura por trás muito grande.

Quais são os projetos que a Juazeirense efetivamente tem para se modernizar?
A gente fazer nossa sede administrativa. Estamos solicitando ao governador Rui Costa que nos ceda uma área em Juazeiro. Estamos trabalhando nosso CT. Compramos a o espaço, estamos fazendo a terraplanagem, buscando parceiros para construir esse CT que será um dos mais modernos na Bahia. E a nossa loja, que já estamos na fase final. É uma loja que venderá os produtos da Juazeirense. O torcedor chega para comprar nosso produtos, e tem que recorrer às lojas. Algumas não vendem, só vendem camisas... Queremos oferecer tudo dentro dessa estrutura. Deveremos inaugurá-la até dezembro. Temos que fazer parceiros também. Acho que o futebol só cresce com parceiros.

Você acha que esse acesso pode ser um legado para outros clubes do interior da Bahia?
É como diz aquele ditado: porteira que passa um boi passa uma boiada. A história quis que a Juazeirense fosse o primeiro clube baiano a conquistar uma vaga na Série C. Aí, amigo, a fila andou. Pode ser que outros clubes tranquilamente conquistem isso. Desde 2014, quando participamos por experiência eu vi que era possível. Quando eu vi que a coisa era possível, disse: "vamos investir mais um pouquinho". Ano passado batemos na trave e esse ano conseguimos. Aí entrou também a FBF que teve uma grande participação. 

Fale um pouco sobre a história do clube para que o torcedor baiano conheça um pouco mais...
A Juazeirense foi fundada em 2008, embora o escudo tenha estampado em 2006. O design errou na hora da numeração. Como estávamos apressados, ficou 2006 mesmo (risos). O clube nasceu de uma dissidência do Juazeiro. Fui presidente do Juazeiro por dois mandatos, sou fundador do clube. De repente, disputei uma eleição em 2006 para a presidência. Entrou política no meio. O prefeito da época (Misael Aguilar Silva Júnior) achou que eu estava me aproveitando politicamente. Empatou o resultado. Como o estatuto não dizia nada, a eleição foi prorrogada para a outra semana. Então, na semana seguinte eu perdi um voto. Aí o candidato dele ganhou por um voto. E aí o torcedor que estava lá gritou em coro para que eu fundasse um outro clube e que o Juazeiro iria se acabar e cair. Realmente, o Juazeiro foi para a segunda divisão no mesmo ano e nunca mais teve sucesso.  Aí nasceu a Juazeirense. 

Foto: Tiago Dias / Bahia Notícias

Hoje você pode dizer que é torcedor do Juazeiro e da Juazeirense?
Sou torcedor fanático da Juazeirense. O Juazeiro está no meu coração, porque coisa do coração a gente não manda. Mas a minha grande paixão é a Juazeirense. Como diz o ditado, o Juazeiro já era. Agora, meu foco primordial é a Juazeirense.

Uma questão que vem perdendo força: nos últimos anos, houve uma corrente que apoiava o fim dos estaduais. Como você veria esse eventual fim do estadual?
Eu não apoio. Sou totalmente contra. Eu acho que nós devemos reformular, melhorar, principalmente na questão de qualidade. Acho que os clubes grandes deveriam aproveitar principalmente o primeiro semestre, pois é um laboratório para as competições nacionais. Bahia e Vitória só não estão piores porque disputaram o Baiano. E o estadual não é fácil para eles. Certamente eles têm uma estrutura maior, jogadores de qualidade muito maior que os nossos. Agora, esse campeonato é base para as competições nacionais que eles participam. Mas, o que pode melhorar? Eles (Bahia e Vitória) fazerem parcerias com os clubes. A FBF buscar parcerias financeiras para melhorar a estrutura de qualidade dos nossos times, como é a Federação Paulista. A FPF paga mensalmente aos clubes que disputam a Série A do Campeonato Paulista. Aqui na Bahia deveria ser dessa forma também. Buscando parceiros, investiremos muito mais.

Mas você não acha que os estaduais estão defasados? 
Estão. Nós temos que procurar uma outra fórmula para, inclusive, atrair melhor os torcedores.

Você acha que os clubes menores têm culpa nessa atual estrutura do futebol nacional?
Tem. Muita culpa. Tem muita confusão. Tem muitos dirigentes que não têm estrutura nenhuma para dirigir um clube e querem ser presidente e, talvez, por uma briga interna, aí se dá oportunidade a um cidadão que não tem estrutura econômica, nem administrativa, para administrar um clube de futebol. Isso requer uma agilidade grande do administrador, além do tempo. Requer isso. É uma empresa que depende de resultados positivos. Esse problema que os clubes brasileiros enfrentam é, na maioria, dirigentes que não sabem administrar. Vamos focar num dos maiores clubes do Brasil: o Flamengo. Enquanto teve brigas internas, não conseguiu crescer. Quando chegou um cara capaz de administrar, o Flamengo há dois anos já é um clube que todo jogador quer jogar. Antes, muitos não queriam. É um clube que tem aberto porta para muitos investirem e tem mostrado que é capaz.