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Entrevista

Taíssa Gama avalia que números da violência contra a mulher não cresceram: "Eles apareceram" - 19/06/2017

Por Guilherme Ferreira / Ailma Teixeira

Taíssa Gama avalia que números da violência contra a mulher não cresceram: "Eles apareceram" - 19/06/2017
Fotos: Tiago Dias / Bahia Notícias

De janeiro a maio deste ano, a Bahia registrou 15.751 casos de violência contra a mulher – número que engloba desde ameaça até feminicídio, passando por casos de homicídio, tentativa de homicídio, estupro e lesão corporal. Os dados foram divulgados no último mês pela própria Secretaria de Segurança Pública do Estado (SSP). No entanto, no entendimento da secretária Municipal de Políticas para Mulheres, Infância e Juventude, Taíssa Gama, isso não necessariamente significa que houve um crescimento. "Eu digo que os números não cresceram, eles apareceram. Porque com o Disque Denúncia e essas propagandas todas no 190, os números estão aparecendo, as denúncias estão sendo feitas", defende Taíssa em entrevista ao Bahia Notícias. Há cinco meses à frente da pasta, a secretária garante que tem assistido todos os bairros de Salvador, sendo Valéria e a região do Subúrbio os que apresentam situação mais crítica. Com apoio das prefeituras-bairro, a SPMJ também tem trabalhado em ações para erradicar o trabalho infantil.

 

De que forma a secretaria trabalha para combater os casos de violência doméstica contra a mulher? As vítimas podem recorrer à prefeitura de alguma forma para fazer a denúncia ou buscar algum tipo de ajuda?

A denúncia, na verdade, não. A denúncia é feita no Ministério Público, na Deam [Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher] ou na Defensoria Pública. A partir daí, essas instituições encaminham essas mulheres, se for o caso, pra gente ou pra Casa Abrigo do Estado porque como quem faz a nossa segurança é a Guarda Municipal, a gente não pode atender mulheres com risco iminente de morte. Quem faz isso é a Casa Abrigo do Estado. Mas o que é que a gente faz? A gente faz ações, campanhas de conscientização para as mulheres denunciarem pelo Disque Denúncia, pra conscientizar sobre o amparo que elas têm, que elas podem, sim, denunciar e ter uma rede de proteção que vai encaminhar ela pra o caminho que ela precisa.

 

E com a abrangência dessas campanhas de conscientização, de que forma essa mensagem chega para as mulheres de toda a cidade?

Sim, a gente faz tanto campanhas de eventos, chamando as lideranças comunitárias femininas com toda a rede de proteção – Ministério Público, Defensoria –, como a gente fez em março, e a gente mostrou pra essas lideranças femininas todo o serviço que as mulheres têm de proteção, pra que elas fossem multiplicadoras nas suas comunidade. Tanto ações assim quanto palestras que a gente faz em universidades, nas próprias comunidades, nas prefeituras-bairro, então a gente tem feito diversas ações nesse sentido. Tanto que o Disque Denúncia hoje, os números estão aparecendo mais. Eu digo que os números não cresceram, eles apareceram. Porque com o Disque Denúncia e essas propagandas todas no 190, os números estão aparecendo, as denúncias estão sendo feitas.

 

Tem estimativa de quantos bairros já foram alcançados por ações nesse sentido?

A gente tem alcançado todos divididos pelas subprefeituras. Como a gente tem trabalhado muito nessas subdivisões, então a gente está alcançando todos. Não só em relação às mulheres. O que a gente pode usar das subprefeituras nessa divisão, a gente faz de acordo com isso.

 

 

Falando em números, a Secretaria Estadual de Segurança Pública recentemente divulgou uma pesquisa relacionada à violência contra a mulher e apontou que dos 158 casos de estupro registrados no Estado entre o início do ano e maio, 34 aconteceram na capital. Além disso, que dos 111 homicídios dolosos contra mulheres, 17 foram em Salvador. Houve uma avaliação da secretaria sobre esses números? Qual a conclusão que vocês chegaram com base neles?

Isso é uma questão de segurança pública que a gente sabe que a segurança em Salvador está muito complicada. A gente sabe que o empoderamento das mulheres está incomodando muito os homens que ainda vêm com essa cultura do machismo. E a gente precisa mudar isso desde a escola. A gente está introduzindo agora, nas escolas municipais, junto com a secretária [de Educação] Paloma Modesto, a Escola sem Machismo, que é um programa da ONU. Então, assim, acreditamos que seja também uma forma cultural e uma questão de segurança pública. A gente tem tudo o que fazer, a Ronda Maria da Penha, que é um excepcional serviço, a gente tem as duas Deam’s, que também tem um serviço muito bom. Então, eu acho que realmente é uma questão de cultura, cultural e de segurança pública.

 

O Centro Loreta Valadares acaba ficando sobrecarregado com o fechamento de serviços disponibilizados pelo governo da Bahia?

Sim, muito. Mas a gente está de todas as formas fazendo com que os horários se encaixem, os funcionários fazem toda essa parte de agenda deles pra atender a todos porque já foram encaminhados alguns casos pra gente, de mulheres… Porque é bom frisar que o Loreta não tem o mesmo serviço do projeto Viver. O Loreta só atende mulheres maiores de 18 anos, vítimas de violência ou mulheres antecipadas. Então, assim, o Viver ainda deixa de atender meninos vítimas de violência, mulheres menores de idade e famílias porque lá atendiam família como um todo e a pessoa entrava e fazia todos os serviços. O Loreta não tem todos os serviços. Lá eles tinham serviço de médico, se precisasse da pílula do dia seguinte, aquele coquetel que toma em caso de DSTs e outras coisas. Então, o Loreta é um atendimento psicológico, pedagógico pra quando essa mulher vai com o filho, mas o filho não é vítima de agressão, ele vai acompanhando a mãe, entendeu? A gente não tem esse atendimento que o Viver tem. Mesmo assim, está super sobrecarregado e com as agendas bem apertadas.

 

Tem alguma forma de mensurar essa sobrecarga? O número de atendimentos dobrou, triplicou?

Dobrou. Desde 25 de abril, quando foram encaminhadas, pela própria coordenadora do projeto Livre, algumas mulheres de lá.

 

 

Um levantamento do IBGE que foi divulgado essa semana aponta a Bahia como o segundo estado com maior número de crianças trabalhando. Como a secretaria avalia essa questão, especificamente em Salvador?

A gente está fazendo um trabalho bem amplo diante dessa pesquisa que saiu. A gente já estava trabalhando com as baianas de acarajé, que tem muita criança trabalhando nos tabuleiros e isso, a Superintendência do Trabalho estava multando, inclusive, multou uma baiana: R$ 450 por criança. E a gente resolveu fazer também nas subprefeituras, chamando as baianas de cada área pra poder erradicar o trabalho infantil, mostrar a elas os perigos da exposição das crianças ao sol, perigo de queimadura, de assédio sexual, várias coisas que envolve o trabalho infantil. Sem contar com o cansaço da criança que no outro dia na escola, termina perdendo o foco, concentração e muitas coisas. Vemos com muita preocupação essa questão e estamos fazendo ações de conscientização. A Semps [Secretaria de Promoção Social e Combate à Pobreza] agora, dia 20, tem o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, o Peti, que é um programa de dentro da pasta – ele não veio pra SPMJ. Eles estão fazendo uma ação lá na Estação da Lapa, justamente pra alertar ao combate.

 

Essa questão do trabalho infantil também é trabalhada por meio de palestras em diferentes bairros? Tem alguma outra maneira que a prefeitura trabalha nesse quesito?

Tem. Nessas ações que a gente está fazendo sobre as baianas de acarajé, a gente tem chamado muitos educadores da prefeitura, então eles vão e, com isso, nas próprias escolas, eles estão identificando alguns casos. Quando a gente fala em trabalho infantil tem também o trabalho infantil doméstico e assim foi relatado casos de eles identificarem a criança que chega na escola com fome, já querendo comer. Por quê? “Ah, não, porque eu não lavei a louça, então, meu pai e minha mãe não me deram comida, disse que eu ia ficar de castigo”. Então, a gente vai identificando várias formas de trabalho infantil que não é só aquela que o pessoal vê, de estar quebrando pedra. É trabalho infantil dentro de casa, é trabalho no tabuleiro, vendendo na sinaleira… Todos esses trabalhos que a gente chama de invisíveis aos nossos olhos, mas que existem, que são ilegais.

 

E as crianças falam com agentes da secretaria?

Não, com psicólogos da própria escola. Toda escola tem a parte de psicólogo e pedagogo, psicopedagogo. A partir dessa identificação, eles trabalham junto com a família, às vezes chamam o Conselho Tutelar que é responsável também por esse cuidado com as crianças.

 

E há algum diálogo da secretaria com as escolas pra que o trabalho seja no sentido de descobrir novos casos?

Sim, a gente vai agora atuar diretamente com isso, mas sempre lembrando que esse Programa de Erradicação do Trabalho Infantil é um programa especial, que fica na diretoria especial da Semps, que é o Peti.

 

Especificamente sobre a questão de baianas de acarajé, você mencionou que houve um caso de uma baiana que foi multada. Existem outros casos assim?

Esse foi o único de chegar a multar, mas estão sendo identificados alguns casos e a gente está tendo essas reuniões nas subprefeituras, que está indo o Ministério Público do Trabalho, com a Dra. Virginia Sena. Vai Dr. Antonio, que é auditor da Superintendência do Trabalho. Então, assim, Rita [Santos], que é presidente da Associação das Baianas de Acarajé (Abam) formou uma rede mesmo pra tentar erradicar isso.

 

É possível que aconteçam fiscalizações na rua?

Vai acontecer, mas aí é a partir da Superintendência do Trabalho. A gente não tem o poder. A gente fiscaliza como qualquer cidadão e pode fazer a denúncia, mas a fiscalização de multar só pela superintendência.

 

Sabe dizer a partir de quando?

Já está sendo feita. Primeiro eu acho que vem a fase de conscientização e depois de muita insistência, eu acho, vem a parte da multa.

 

A secretaria, então, fica mais com a parte de conscientização.

Isso, de ações transversais, como educar, conscientizar…

 

 

As esferas estadual e federal também possuem pastas voltadas para mulher. Existe algum diálogo com essas pastas, com o objetivo de pensar em projetos voltados para o setor?

Sim, a gente tem pensado, inclusive, pra trazer pra Salvador a Casa da Mulher Brasileira. Já existe o projeto, tem o convênio entre o governo estadual e o governo federal. É como era o projeto Viver, só que agora o nome é Casa da Mulher Brasileira. Ou seja, a mulher chega, vítima de violência, e é atendida por todas as esferas – Ministério Público, Defensoria. Vai estar tudo ali dentro. Isso é um projeto assim, que tem cinco meses que eu estou na pasta, e é um projeto grande, que a gente vem fazendo no âmbito estadual e federal.

 

Já tem uma estimativa de quando ele deve sair do papel?

Tem o projeto pronto, o governo já deu o terreno, foi feito o estudo do terreno, mas já está pra construir.

 

Onde vai ser?

Eu não sei te dizer aonde vai ser, mas já foi feito todo esse estudo. Eu estive em Brasília há um mês, conversando com a secretária Fátima Pelaes e ela disse que realmente já está bem adiantado esse projeto. Já conversei também com a secretária [estadual] Julieta Palmeira e ela confirmou que está tudo caminhando. E pra gente vai ser muito bom, para as mulheres de Salvador.

 

Tem alguma estimativa de quando deve ser aberto?

Eu acho que até o final desse ano é bem capaz de estar concluindo isso. Não sei te dizer ao certo porque é um convênio estadual e federal, apesar do município também estar participando porque tem serviços que vão ser prestados pela gente.

 

 

Você comentou que tem cinco meses na pasta. O que é que você pensa em fazer possivelmente até o final dessa gestão do prefeito ACM Neto? Quais os projetos a longo prazo da secretaria?

A gente agora conseguiu a oficialização das baianas de acarajé como ocupação na CBO [Classificação Brasileira de Ocupações] nacional. Isso pra mim vai ser um marco, a gente sempre vai poder falar que as baianas lutam por isso desde 2015. A gente tem uma previsão de abrir mais dois centros de referência: um no Subúrbio e outro em Valéria. Porque são os locais de maior índice de violência contra a mulher, então a gente tem a intenção de abrir esses dois. A gente está abrindo também mais um centro de encaminhamento, lá na Estação da Lapa, que a mulher vai chegar, ela pode ser atendida lá com a psicóloga, junto com a assistente social, ou ela pode ser encaminhada para o centro ou para a Defensoria. Por isso que a gente está chamando de Centro de Encaminhamento. Mas vai ser na Estação da Lapa porque o Centro de Referência Loreta Valadares, apesar de ficar em Brotas, bem localizado, algumas mulheres ainda sentem dificuldade na localização. Então, na Estação da Lapa, no trânsito dela do trabalho, pra levar o filho, alguma coisa, ela pode ser atendida ali. Em relação à infância e juventude, a gente tem diversos projetos sendo encaminhados, mas ainda em processo de construção.

 

Você falou que os bairros onde são registrados os maiores números de casos de violência são Valéria e Subúrbio. Existe alguma explicação pra isso?

A gente ainda está estudando o porquê disso, mas são hoje, pela Secretaria de Segurança Pública, os dois lugares de maior violência.

 

Secretária, há alguns meses houve aquela questão da discussão com a sua assessora, que acabou repercutindo muito na imprensa. Quais foram as consequências daquele caso e qual lição você tira dela?

É um caso que a gente está resolvendo na Justiça e pode ter certeza que na hora que for resolvido, vocês vão saber o porquê aconteceu, agora eu não tenho porque falar.

 

Mas trouxe alguma consequência negativa para o seu trabalho dentro da secretaria?

Pra mim, trouxe um arrependimento por ter feito. Claro que a gente quando erra... Eu já disse que eu errei, pedi desculpas, mas é uma coisa que eu prefiro tratar na Justiça.