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Entrevista

Alice Portugal ataca ACM Neto e diz que gestão municipal foi para "menos de 30%" da população - 19/09/2016

Por Bruno Luiz

Alice Portugal ataca ACM Neto e diz que gestão municipal foi para "menos de 30%" da população - 19/09/2016
Foto: Fernando Duarte / Bahia Notícias

Debutando na disputa eleitoral pela prefeitura de Salvador, a deputada federal Alice Portugal (PCdoB) tenta amealhar votos com a estratégia de descarregar contra o principal adversário, o candidato à reeleição ACM Neto (DEM), artilharia pesada. Entre as críticas dirigidas ao democrata, está a de que ele seria “golpista” por ter se mostrado a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff, fez uma gestão para apenas “menos de 30%” da população soteropolitana, deixando de lado as áreas periféricas da cidade, e “muito ruim” em serviços públicos. Na avaliação da candidata, o governo de Neto também não avançou muito em relação ao do ex-prefeito e atual candidato a vereador, João Henrique (PR). Para ela, a gestão do democrata é derivada do segundo mandato do progressista, que saiu do comando do Palácio Thomé de Souza com altos índices de rejeição, ao contrário de Neto, e carrega consigo “as cicatrizes” da administração do ex-prefeito. Mas, além das críticas a Neto, Alice promete focar sua gestão, caso seja eleita, em políticas para “diminuir as desigualdades em Salvador”. De acordo com a comunista, a capital baiana apresenta grandes problemas na Saúde e Educação, consideradas por ela áreas “cruciais que precisam ser atacadas”, como falta de médicos nas unidades de saúde e déficit no número de vagas nas creches municipais. Para saná-los, Alice promete ampliar a quantidade de vagas e colocar mais profissionais nos postos de saúde. “São grandes entraves [Saúde e Educação], porque o atual governo municipal é muito ruim de serviço. Ele tem uma capacidade de propaganda enorme, que está envolvida com a própria ação empresarial do atual gestor, mas, do ponto de vista de serviços, da Saúde e Educação, eles são muito precários em Salvador. A prefeitura não chega para quem mais precisa desses serviços”, critica.

Quais são os principais desafios para o próximo prefeito de Salvador?
O grande desafio é fazer escolhas que apontem para a diminuição das desigualdades em Salvador. Salvador é uma cidade repartida, com quase três milhões de habitantes, 60 bairros, mas que você observa, e é táctil, a existência de duas cidades. A cidade formal, de frente para o mar, e a cidade da maioria. Então, o grande desafio é estabelecer políticas públicas que induzam a diminuição das desigualdades e faça da nossa querida Salvador uma única cidade.

Em 2012, a pauta da eleição foi centrada na administração do ex-prefeito João Henrique, com candidatos negando qualquer relação com o ex-gestor e muitas críticas. Houve alteração no cenário em relação à atual administração?
A atual administração vem do segundo governo de João Henrique. Então, elas trazem consigo as cicatrizes. A atual administração tem um bloco, estabelecido, e que é um bloco também que, do ponto de vista político, tem uma identidade umbilical. É o bloco do golpe. Que ajudou o deslocamento desse centro político para a direita, levando ao impeachment fraudulento da presidenta Dilma Rousseff. Portanto, eles têm identidade integral. O DEM, o PSDB e os partidos que estão sob esse guarda-chuva. No meu caso, eu também tenho um bloco. E este bloco tem lado, o lado da democracia. É uma eleição plebiscitária, um sim ou não a posições políticas muito objetivas. Um sim ou não a um projeto elitizado, de interesse do segmento empresarial mais forte, relacionado com a indústria da construção civil de luxo, e o outro bloco relacionado a políticas públicas, a uma visão mais social de governo para a cidade.

O município é responsável por serviços básicos ao cidadão, especialmente na área de Saúde e Educação. Quais os entraves a serem vencidos nessas áreas prioritárias?
São grandes entraves, porque o atual governo municipal é muito ruim de serviço. Ele tem uma capacidade de propaganda enorme, que está envolvida com a própria ação empresarial do atual gestor, mas, do ponto de vista de serviços, da Saúde e Educação, eles são muito precários em Salvador. A prefeitura não chega para quem mais precisa desses serviços. Em relação à Saúde, a nossa compreensão é que este é um problema crucial, que primeiro precisa ser tratado. A minha compreensão é que precisamos, em Salvador, primeiro terminar o Hospital Municipal, que ele foi prometido na campanha eleitoral do atual gestor e, agora, às vésperas da eleição, ele está fazendo a terraplanagem. Segundo, é preciso garantir médicos em todos os postos de saúde. Há uma variação instável da presença de equipes multidisciplinares nas unidades de saúde. Colocar as UPAs pra funcionar. O prefeito negou o que o governador ofereceu, que são cinco policlínicas. Ele aceitou duas e não aceitou as demais. Eu vou aceitar as três policlínicas, que são para garantir o acesso a especialidades, a exames. Eu tenho um programa consistente em Saúde. Colocar o Conselho Municipal de Saúde para funcionar efetivamente. Aumentar o número de agentes comunitários de saúde e combate a endemias, que houve uma diminuição na atual gestão. Há uma manobra muito ruim para tentar concentrar os agentes, tirando os agentes de suas comunidades. Se eles são comunitários, devem estar na comunidade que eles conhecem, pois eles vão a lugares que o Correio não vai, a polícia não vai e que é fundamental que ali se faça a hidratação de uma criança desidratada, meça a pressão do idoso. Então, a minha ação será abrangente no setor Saúde. No setor Educação, a nossa ideia é ampliar o número de escolas com ensino em tempo integral. A tentativa de proteger a infância e juventude será algo permanente, porque, quanto mais tempo a criança estiver na escola, menos tempo estará vulnerável nas ruas. A nossa ideia é ampliar essa oferta de educação integral, garantindo que tenhamos, acima de tudo, um olhar para a valorização do magistério e do servidor da educação. Eu tenho a honra de ter sido uma dos quatro deputados que criou o Piso Nacional do Professor. Meu compromisso é pagar o piso, garantir que o professor tenha a oportunidade de uma expansão dos seus conhecimentos e sua formação. Instalar o programa Pró-funcionário, para profissionalizar o funcionário das escolas e criar o programa Escola Aberta, que consiste em, nos fins de semana, abrir o espaço das escolas para a comunidade, evidentemente com o controle da segurança e garantia patrimonial da escola, mas para atividades esportivas, cursos profissionalizantes rápidos, que possam ajudar a comunidade a integrar pais de alunos, alunos e a comunidade de cada bairro. O Plano Nacional de Educação, que eu tive o prazer de participar do debate, estabeleceu 20 metas para que possamos, em 10 anos, superar as desigualdades e lacunas educacionais brasileiras. Nós temos uma meta muito grande em Salvador, que é aumentar a oferta de creches. A presidenta Dilma criou um programa chamado Brasil Carinhoso, que é estruturado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Essas creches foram oferecidas a Salvador, e o prefeito não aceitou as creches, pois dizia que não tinha terreno. Eu própria sugeri que fossem verticalizadas, já que temos carência de terrenos pelo grande adensamento populacional nos bairros populares e periféricos da cidade, mas isso não foi feito. Nós temos hoje uma rede de creches heróica. Merecia um prêmio de solidariedade internacional. Mas a prefeitura deixa de pagar, quebra convênio ou não convenia, como eu achei lá na associação Ampla, em Plataforma, uma creche com vaga para 100 crianças, que a prefeitura não conveniou. E, realmente, é uma coisa fundamental, porque é direito da criança, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, e é uma ferramenta, estrutura pública emancipatória, para a mulher e para a família. Temos muitos casos de mulheres que não trabalham porque não têm com quem deixar essas crianças. A prefeitura, ao invés de conveniar ou criar creches, dá R$ 50, num cadastro que vamos rever, pois eu pergunto: quem toma conta de uma criança por R$ 50. Vamos criar 50 mil novas vagas de creches. Vamos fazer isso desde o primeiro dia na prefeitura, iniciar esse processo de ampliação das vagas de creche.


As transferências diretas da União, via FPM e outras fontes, sofreram quedas nos últimos anos. Como administrar a máquina com escassez de recursos? O aumento da arrecadação do município não acompanha o aumento das despesas, como resolver esse problema?
Primeiro, governar é fazer escolhas. Se você tem determinado valor à disposição do município, você tem que definir a prioridade daquele investimento. Por exemplo, se eu tenho R$ 70 milhões em caixa, eu poderia fazer uma restauração do Rio Vermelho, devolvendo o seu bucolismo, garantindo a estrutura confortável e urbana para os frequentadores daquele tradicional e cultural bairro boêmio da cidade. Mas eu poderia gastar R$ 10 milhões, R$ 15 milhões e, com R$ 60 milhões, por exemplo, fazer 20 creches. Vamos ter que dispor dos mesmos recursos de que dispõe o atual prefeito possivelmente, para iniciar, e, evidentemente, o que teremos que fazer, e tomaremos essa decisão discutindo com a comunidade. Eu tenho certeza que os bairros de classe média, classe média alta, estariam contemplados se eles verificassem que o recurso da prefeitura está sendo aplicado para ter menos criança na rua, menos vulneráveis nas ruas, mais educação, mais saúde, pois alivia as tensões sociais e garante acesso aos direitos. Então, eu vou fazer as escolhas, porque, na minha opinião, ele faz as escolhas erradas. Infelizmente, por menos de 30% da cidade, esquecendo o restante.

O relacionamento com outros entes federativos é essencial para a administração pública. Como trabalhar de maneira harmônica em prol dos interesses da cidade – ainda que grupos políticos distintos administrem tais entes?
De maneira republicana. Eu tenho uma posição diametralmente oposta a do presidente golpista, interino, Michel Temer, e, evidentemente, isso tem sido expressado na minha ação como deputada federal, no meu quarto mandato. Do ponto de vista político, vou continuar asseverando a ilegitimidade dessa experiência de governo. No entanto, por Salvador, tudo. Vou ao governo federal institucionalmente. Vou pedir, no primeiro dia, aliás, pedirei uma audiência com o presidente interino, golpista, mas é quem responde pela máquina. E, para Salvador, o que Salvador merece. E Salvador merece muito mais. Então, vamos manter a porta do governo federal, seus ministérios. Vamos buscar parcerias nacionais e internacionais para melhorar a vida das pessoas, fazer de Salvador uma cidade mais moderna. Vamos incrementar essa relação com o governo estadual, que já é generosa para a cidade. O governador Rui Costa tem se mostrado amigo de Salvador. Por ter nascido numa encosta, tem essa compreensão social. Fez 80% das obras das encostas. O prefeito, as que prometeu, não realizou. No Barro Branco, 22 mortes. Até hoje as obras não estão terminadas. Isso não é mostrado na televisão. Então é muito importante que essa relação seja incrementada. Assim como a busca de parcerias com o setor privado, mantendo a independência do setor público, estaremos incentivando para melhorar a performance social, empresarial, do dinamismo econômico e do trabalho, pois Salvador voltou a ser a capital do desemprego. Estaremos atuando em todas as fronteiras.

Salvador apresenta índices de desemprego acima da média nacional. Como minimizar tal número? Quais áreas devem ser consideradas prioritárias para geração de emprego e renda?
É interessante dizer que não foi só a crise mundial que levou a Salvador a esses índices dramáticos, trazendo de volta uma medalha que não gostaríamos de ganhar em tempos olímpicos, que é a medalha da campeã do desemprego, desemprego que havia caído de 2003 a 2011 e voltou a crescer. Entre os jovens de 16 a 24 anos, alcança 36,1%. É dramático entre os jovens. Maior entre os negros, 18,9%. Os não negros, 15,5%. É maior entre as mulheres, 20,5%, que entre os homens, de 17%. Efetivamente, vamos ter que tratar desse drama. Não adianta fechar os olhos, que a prefeitura não tem o que a ver com o desemprego. Eu pretendo implantar uma agenda do trabalho decente em Salvador, para proteger a infância, garantir a Lei do Estágio. Essa é fundamental. O serviço público municipal pode absorver jovens aprendizes como estagiários, isso é possível fazer. Por meio de incentivos fiscais, buscar trazer empresas limpas para Salvador. O exemplo de Recife é fortíssimo, com o polo digital. Nós temos como entrar na agenda da economia criativa, uma cidade que tem esse Carnaval e outras festas. Nós podemos investir nesse aspecto. Eu vou tomar uma posição, tratei muito desse assunto com o senador Otto Alencar, para reduzir o ISS nas áreas mais desassistidas em geração de emprego e renda. Se você diminui o ISS no Jardim Cruzeiro, atrai alguma empresa para se instalar ali. Queremos capilarizar comércio, indústria, emprego, consultórios pela cidade. Nossa ideia também é criar uma política municipal de economia solidária. Salvador não tem, por exemplo, estímulo para criação de cooperativas e associações. Nós temos bordadeiras, mas os bordados do Mercado Modelo são, em grande parte, cearenses. Os ferramenteiras que fazem as estruturas metálicas da Ilha do Rato. Queremos profissionalizar aquele pessoal, criar cooperativas, associações, conveniar com o Sebrae, estimular que paguem a previdência, criar um catálogo de serviços em Salvador, para que o morador da Pituba possa chamar o encanador ou eletricista que mora no Subúrbio. Salvador não tem um catálogo de prestação de serviços. É muito importante oferecer esse banco de dados de trabalho, estimular e criar um investimento do crédito familiar e solidário em Salvador. A Bahia já tem o Credibahia, que é o microcrédito, que fez o Ceará um estado capilarizado nesse investimento. Não é possível não fazer isso em Salvador. Vamos também ampliar as unidades do Serviço Municipal de Intermediação de Mão de Obra, só temos cinco. Vamos criar esse programa de apoio ao trabalhador autônomo, que é essa ideia de associativar, criar o catálogo. Vamos constituir essa política. Trabalho será uma prioridade. A prefeitura não pode fechar os olhos. Cursos de qualificação do trabalhador. Unificar com o governo do Estado um convênio que nós possamos utilizar os períodos de menos fluxos nas escolas estaduais para fazer esses cursos, mesmo os de curta duração. A prefeitura não fechará os olhos para o desemprego.


O próximo prefeito de Salvador precisa de quais qualidades ao chegar ao cargo?
Garantir a qualidade da democratização nas relações municipais. É preciso ter essa opinião de que a cidade não tem dono. Que o dono dessa cidade é povo dessa cidade. Botar os conselhos para funcionar, ouvir a cidade acerca de seus destinos. Ser ético, ter efetivamente a garantia de olhar de frente os cidadãos e cidadãs de nossa cidade de forma igual. E, ao mesmo tempo, ser desprovido de arrogância. Ter qualidade e humildade de aproveitar o que há de bom nos processos anteriores de governo e buscar fazer o melhor naquilo que ainda não foi feito em Salvador.