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Entrevista

Isaac Edington avalia que proteção a marcas é "capital social" absorvido pela prefeitura - 02/06/2014

Por Lucas Cunha / Juliana Almirante

Isaac Edington avalia que proteção a marcas é "capital social" absorvido pela prefeitura - 02/06/2014
Fotos: Rebeca Menezes
O titular do Escritório Municipal da Copa do Mundo (Ecopa), Isaac Edington, avalia que o modelo de proteção a marcas, que garante zona de exclusividade para os patrocinadores do torneio da Fifa, é um “capital social” que foi absorvido pela prefeitura, usado antes mesmo de o Mundial começar. “A prefeitura não tira dinheiro dos cofres públicos, porque o que tem é para educação e saúde. A gente ajuda a financiar a festa e, nesse ano, ainda sobrou um dinheirinho no cofre da prefeitura. Ou seja, nós nos apropriamos desse benefício e a Copa do Mundo ainda nem começou. Fizemos isso já no Carnaval”, afirmou o secretário, em entrevista ao Bahia Notícias. O chefe da Ecopa acredita que os possíveis protestos populares que devem acontecer na cidade durante a competição esportiva não repetirão o tom adotado no ano passado. “Eu vou torcer para que esse tipo de coisa, se tiver que acontecer, seja pacífica. Não estou sentindo aquele clamor da Copa das Confederações. De acordo com as informações que a gente troca com os órgãos, eles também não sentem isso”, espera. Também articulador do movimento Salvador Vai de Bike, Isaac adiantou que a administração pretende lançar um novo projeto voltado para bairros periféricos, que já tem o nome provisório de "Bike Comunidade". “Nós estamos buscando a iniciativa privada para buscar levar a bicicleta para as comunidades. O conceito é ter um bicicletário público, 100% gratuito, com bicicletas disponíveis não só para você usar 45 minutos, mas sim entre três e quatro horas, para que toda a família possa utilizar”, informou.
 

Bahia Notícias - O que é responsabilidade do Escritório da Copa do Mundo (Ecopa)?
 
Isaac Edington -  A ideia é ter, dentro da prefeitura, um órgão responsável por toda a articulação dos projetos da Copa do Mundo. No fundo, todos os órgãos têm contribuição, então o Ecopa é muito mais para essa articulação. É claro que tem alguns projetos que são somente da Ecopa. Nas cidades-sede, em algumas a pasta é escritório e em outras é secretaria. O prefeito não quis, com toda razão, criar mais uma secretaria. O escritório é uma estrutura pequena, de umas 10 pessoas. A interface é tanto com os órgãos municipais, quanto estaduais, federais e parceiros comerciais.
 
BN - Nessa reta final, quais são os principais desafios? Principalmente depois de definida a realização do Fan Fest...
 
IE - O Fan Fest é um evento que tem uma complexidade de realização, porque é uma dinâmica, uma operação de praticamente 30 dias. A ideia é que a gente, em Salvador, exercite até outro formato. A Fifa não está gostando muito disso, mas de fato, é um evento muito dispendioso para acontecer e, dentro da política do prefeito, a ideia é não investir dinheiro público em um evento como esse. Tem sido a política dele em eventos da área de entretenimento. A ideia é que grande parte ou sua totalidade seja paga com parceiros comerciais. A Fan Fest é complexa, porque os patrocinadores já pagaram por isso. Dentro do processo de negociação com a Fifa, a organizadora do evento, há patrocinadores e parceiros comerciais que já pagaram para ter uma série de propriedades. A exemplo, a Coca-Cola comprou os direitos de ser patrocinadora da Copa do Mundo e é também do Fan Fest – porque nem todos do Fan Fest são patrocinadores do todo. A Coca-Cola tem o direito de explorar o advento da taça, como o tour que esteve aqui em Salvador. Então há o grupo maior de patrocinadores da Copa e há um grupo menor apenas do Fan Fest. Essa turma já pagou para estar no Fan Fest. Há locais específicos na formatação do evento, para as marcas e os patrocinadores da Fan Fest. No pórtico, no material que será distribuído lá, são comuns essas ativações. Só que, no caderno de encargos para a realização do evento, tem um dispositivo que diz o seguinte: os patrocinadores têm tais direitos, porém as cidades-sede poderão oferecer direitos adicionais e captar recursos com isso para ajudar a custear o evento. A TV Globo tem direito sobre a transmissão e as atrações. Essa é a configuração, mas acontece que grande parte das despesas acaba indo para o Município. A Fifa já entra com uma parte muito importante e custosa, o telão, que começou a ser montado hoje no Farol da Barra; os pórticos e algumas coisas que já estão dentro dessa negociação. Porém, as grandes atrações, por exemplo, em tese, fariam parte dos atributos da TV Globo. Só que quando se coloca grandes atrações, como é o caso da Bahia, amplia-se muito a estrutura que tem que ser feita para dar suporte. Por exemplo, havia no projeto inicial Psirico e Asa de Águia. A TV Globo pagaria o cachê, mas o resto todo, os equipamentos de som e luz ficariam por conta do Município. É claro que, em um mundo ideal, já é de grande ajuda pagar o cachê do artista, mas para a prefeitura é cruel, com a situação financeira de Salvador como a gente encontrou. Então o prefeito disse que nesse formato não dava. Havia o projeto de se fazer o evento no Jardim de Alah, que é um lugar bacana, mas muito complexo. O custo de cercamento é enorme. O prefeito buscou preservar todo esse processo de negociação, mesmo com a mídia querendo saber, para não atrapalhar. A gente teve que segurar bastante isso em função de querer fazer o evento, que a gente acha importante, porque é gratuito. Na Arena Fonte Nova só cabem 55 mil pessoas e irão acontecer seis jogos. E as pessoas que não têm condições de comprar ingressos? Então a ideia é ter um lugar bacana, onde possa ser montado esse telão e tenha um conceito de fan park. Tecnicamente, seria um lugar fechado, com controle rigoroso de entrada e saída, porque se tiver capacidade para 20 mil pessoas, só vai poder entrar essa quantidade. Até isso é uma complexidade operacional. Por exemplo, o Jardim de Alah só o cercamento custava mais de R$ 1 milhão. Na tentativa de diminuir o custo disso, a gente pensou no Comércio também. Ficaram quatro lugares sendo estudados, sempre com o desafio do custo. Nesse meio tempo, o Ministério Público já tinha dado a recomendação [de não gastar dinheiro público com o evento] e não poderia ser diferente, veio de encontro ao desejo do prefeito. Não dá para cumprir todas as exigências da Fifa. Deixando claro que tem muito mito em relação a isso. É um contrato que, logicamente, não foi assinado por essa administração e sim pela anterior. De fato, todas as cidades-sede têm o mesmo contrato. Da mesma forma que o governo brasileiro se candidatou para fazer a Copa, houve uma série de exigências para o governo. As cidades se habilitaram para levar a Copa do Mundo e realizar uma série de coisas. Isso tudo é previsto no contrato. Então para nós é uma complicação. É um descumprimento do contrato, mas não dá para sacar dos cofres públicos para cumprir um contrato que, em tese, essa administração não assinou, mesmo sendo um compromisso de Estado.
 
 
BN - O que aconteceu, no fim das contas, é que todos os patrocinadores vinculados à Copa do Mundo vão arcar com esses custos da estrutura do evento?
 
IE - Os patrocinadores do Fan Fest, nesse caso específico, que se diferencia, estão nos ajudando, juntamente com a Fifa e os parceiros comerciais, a custear o evento. Caberá a nós aquilo que – o que é recomendado [pelo MP] e tem a ver com o conceito da gestão do prefeito – for de direito de qualquer evento dessa envergadura que fosse acontecer na cidade. A gente teria que entrar com a higienização do local, com ordenamento do comércio informal, com a parte de limpeza, segurança, ordenamento do trânsito. Tudo isso é custo. 

BN - Em quanto está estimado o custo?
 
IE - A estimativa é que gire em torno de R$ 2,5 milhões. 
 
BN - Qual era o custo inicial, previsto pela Fifa, se seguisse o contrato?
 
IE - O projeto era de R$ 20 milhões, valor do investimento do projeto como um todo, o que era completamente irracional. Os R$ 2,5 milhões seria a parte dentro do serviço público, o que a gente estima, quando junta todas as operações. O prefeito disse que não é a Fan Fest que vai mudar esse princípio de que a gente tem que entrar com o que nos cabe e a grande infraestrutura tem que ser paga  pelos parceiros comerciais e patrocinadores. Isso o prefeito não abriu mão desde o início. É importante ressaltar que a gente sempre quis fazer o evento. A ideia foi tentar aglutinar esse interesse, para que a cidade não ficasse de fora disso e pudesse fazer dentro de sua condição. Não vai ser um projeto de R$ 20 ou 30 milhões, como algumas cidades se dispuseram. Fortaleza está com um grande projeto. Mas cada qual com o seu cada qual. Recife, inclusive, está em uma situação muito semelhante a nossa. O projeto deles foi muito enxugado. Nós até trocamos muita figurinha com Recife nesse sentido, até Belo Horizonte também. Eu e o secretário [da Copa] de Belo Horizonte nos falávamos quase diariamente. Ele falava que a gente ainda tem praia e lá não tem nada, só boteco. A gente é até privilegiado. O Farol da Barra é um dos cartões postais da cidade e tem uma característica, que junta o útil ao agradável, apesar de toda complexidade: é uma região que, devido às obras, já está interditada. E, fundamentalmente, é uma região que já possui um cercamento natural, sem a gente precisar investir praticamente R$ 2 milhões em cercamento. Já se tem algumas interdições nas ruas e até isso favoreceu. Se fosse um pouquinho maior, seria melhor porque o palco é muito grande. O palco vai ficar localizado em frente ao prédio Oceania, olhando para o Farol da Barra, até porque não dá para colocar no farol por conta do gramado. O público vai se aglutinar do outro lado, de costas para o farol e aquela parte da esquerda, na Avenida Sete de Setembro, terá um pórtico de entrada. Terá outro de saída depois do farol. A gente quer que nesse espaço, segundo o conceito, vire um fan park. Estamos ainda nas tensões com a Fifa, porque não vai fechar, mas vai ter um controle de entrada. No jogo do Brasil, vai ter um controle maior. A ideia é que as pessoas possam andar livremente por ali. Os patrocinadores têm o direito de fazer as suas ativações, que normalmente têm a ver com entretenimento e contato com a marca. 
 
BN - Como vai ser o funcionamento do Fan Fest?
 
IE - Na maioria dos dias, os jogos começam às 13h. A ideia é transmitir no telão os seis jogos em Salvador; os jogos do Brasil, independente de onde eles sejam; finais e semifinais. Vai dar em torno de 16 dias, a depender dos resultados. A ideia é que tenha o horário de ativação, às 10h, quando o espaço já fica disponível, apenas com o controle para saber a quantidade de pessoas que têm ali dentro. 
 
BN - Os shows serão provavelmente mais tarde?
 
IE - Como só ontem [dia 29] batemos o martelo, o secretário Guilherme Bellintani [titular da Sedes] já está trabalhando para fazer. É outro conceito dentro daquela linha de preservar o recurso público. Será uma programação muito mais cultural e intimista para aquela região. Primeiro, foi pensada a questão financeira. Não dá para ter um show de Asa de Águia. A gente adoraria, mas nessas circunstâncias... Por outro lado, a gente já tem um ano inteiro de programação dessa na cidade. O próprio carnaval já demanda muito isso. A ideia é fazer iniciativas que sejam muito mais intimistas. Estou falando isso pela hipótese que está sendo montada lá. Entre o intervalo de um jogo e outro, a gente teria uma atividade. Esse calendário que o secretário é feito lá na Saltur [Empresa Salvador Turismo].
 
 
BN - Então, serão atrações locais? Não se pensa em fazer parceria com os países que vêm jogar aqui em Salvador?
 
IE - Não sei, mas tudo pode acontecer, Acho que, a partir de segunda-feira, o secretário poderá dar um panorama de tudo. A secretaria já tem expertise nesse tipo de atividade e não terá muita dificuldade em montar algo sem deixar de perder o brilho do local. De fato, não terão grandes shows. 
 
BN - Além da Fan Fest, o que Salvador vai oferecer para quem vier para cá, para brasileiros e estrangeiros?
 
IE - A prefeitura não tem um orçamento para a Copa do Mundo, mas o desafio, de acordo com o pensamento do prefeito, e é o que está alinhado com nosso, é de que a gente tem que melhorar a cidade. E a cidade está melhor. Na Copa das Confederações, a cidade não estava legal. Praticamente não tinha nenhum recapeamento de asfalto. A cidade tinha muito buraco, muito problema ainda com a iluminação. Então todo o investimento tem sido de deixar a cidade em uma condição melhor. Estando melhor para o cidadão soteropolitano, definitivamente estará melhor para aquelas pessoas que nos visitam. Tivemos várias entregas em relação a isso, na Boca do Rio, nas praças do Campo Grande e na Piedade. Os investimentos foram acelerados para a Copa do Mundo. A cidade está muito melhor iluminada e o processo de recapeamento asfáltico está em andamento, bastante adiantado, em lugares prioritários. Está sendo um esforço muito grande para acelerar. A gente está tendo um problema muito sério agora com a Coelba. A Coelba está detonando muita coisa e o prefeito ficou muito chateado quando a gente mostrou algumas fotos. A gente já vem há um mês e meio mostrando [à Coelba]. Ontem a gente teve um estresse lá na prefeitura e a Coelba se comprometeu a entregar em 72 horas.
 
BN - O que houve?

IE - Em torno do Dique do Tororó estão tendo muitas obras. A gente tem acompanhado e as obras não estão terminando, nem tem ninguém trabalhando. Depois de tudo que a gente fez naquela região. Então, estamos fazendo lá na região dos Barris a reforma dos passeios. É uma preocupação que as pessoas possam caminhar. Tem uma rota de pedestres ali, o próprio governo está ajudando nisso, naquela região do Pelourinho. Fizemos uma operação no Gravatá, na semana passada, também com o apoio da polícia. Os elevadores estão funcionando já. Conseguimos há algumas semanas que o ciclista circulasse no Elevador Lacerda, aos domingos, e em breve vamos abrir para todos os dias. 
 
BN - O senhor também articula o programa Salvador Vai de Bike. Como avalia o andamento do programa? O turista que vier para a Copa já tem condições de andar de bicicleta na cidade?
 
IE - Sem sombra de dúvida. Foi um programa que lançamos em setembro do ano passado. A gente tem dados impressionantes em relação a isso. Para você ter uma ideia, foi um trabalho que fizemos em tempo recorde. Porque dentro do Salvador Vai de Bike tem uma parte muito importante que é o sistema de bicicletas compartilhadas. O projeto como um todo prevê, além da implantação desse sistema, todo um trabalho de conscientização e educação, relacionado à parte de comunicação, que é multiplataforma. De setembro até hoje, tivemos distribuição de material, capacitação de pessoas, fórum, seminários. Estamos trabalhando em algumas coisas de políticas públicas, requalificando a estrutura cicloviária na cidade. A gente está requalificando as ciclovias na orla, criando alguns espaços novos, na Cidade Baixa, Pernambués, Vitória, Largo de Roma, Ribeira. Está quase triplicada a estrutura cicloviária. O que se entende de estrutura são ciclovias, ciclofaixas e ciclo-rotas, fora as operacionais que a gente já tem. A gente lançará, inclusive, o primeiro circuito ciclocultural. A gente vai deixar disponível, principalmente com a Copa do Mundo, para os turistas. Essas ciclofaixas têm o atrativo cultural muito importante no entorno delas. 

BN - Como funciona o circuito?
 
IE - Do Campo Grande ao Centro Histórico, naquele caminho tem uma série de estruturas arquitetônicas, praças, patrimônio histórico da cidade que, até para nós, soteropolitanos, passa um pouco despercebido. A ideia é que se possa, de bicicleta, parar e admirar aquele. patrimônio cultural que tem ali. É uma forma de atrair as pessoas para aquela parte da cidade Para nós, é muito fácil botar a ciclofaixa na orla e, certamente iriam ter muito mais ciclistas, mas a ideia é abrir novas oportunidades, levar pessoas para o espaço público e estimular as pessoas a andarem de bicicleta. No sistema de bicicleta compartilhada, a gente concluiu 40 estações. A gente começou no dia 22 de setembro, Dia Mundial Sem Carro. Em Recife, esse sistema funciona há mais de um ano, com mais do que o dobro do nosso funcionamento e a diferença de Recife para nós é muito pequena. Nós temos metade das estações e isso significa que nossas bicicletas rodam o dobro. Isso tem surpreendido nossos parceiros. Nesse sistema de bicicleta compartilhada, a ideia é andar pequenas distâncias e usar como mobilidade urbana. A ideia é que se pegue em uma estação e devolva a bicicleta na outra. Aqui em Salvador, o pessoal pega e roda o que você não tem ideia. É comum ver nas estações, como ali no Espaço Glauber Rocha, na Piedade e Campo Grande, que o pessoal está indo para Barra, Rio Vermelho.
 
 
BN - E houve registros de roubos e furtos?

IE - Sim, de vez em quando. A gente tem registros de pequenos vandalismos. Um dos locais onde mais tiveram casos de vandalismos foi na estação do Largo de Roma, surpreendentemente. A gente até conseguiu pegar dois marginais que estavam lá, junto com a Guarda Municipal. Algumas pessoas tentam tirar as bicicletas também. Lógico que é uma coisa que a gente não deseja. Mesmo com isso, Salvador tem índices muito bons em termos disso, que foi uma coisa que nos surpreendeu muito positivamente.  
 
BN - Há uma tentativa de expansão para regiões mais periféricas da cidade? Há pesquisas que mostram que a população mais pobre usa mais a bicicleta por conta da questão financeira... 
 
IE - É um projeto custoso, que dificilmente a iniciativa pública poderia financiar. A configuração é que ele é todo financiado pela iniciativa privada, pelo fato do trabalho de exposição de marca institucional desses parceiros. Nesse caso específico, foi o Banco Itaú.
 
BN - Mas eles querem a marca deles em Mussurunga, por exemplo?
 
IE - A questão não é essa. Como teve o Largo de Roma e a gente ainda está insistindo. Gostaríamos de ter 300 estações de compartilhamento. Uma cidade como Salvador não comporta economicamente. Um projeto como esse dificilmente será levado para lugares muito longínquos. No mundo inteiro, não é assim que funciona. Não é uma questão de ser zona nobre ou periferia. Porque o Centro Histórico e a orla são usados por todos. Outro ponto é que esse tipo de bicicleta compartilhada não é para ser levada para pontos muito longínquos. Primeiro, porque é um custo operacional muito grande para fazer a manutenção, porque são ilhas. Porém, a gente está trabalhando em outro projeto, só não vou dizer detalhes dele porque tem todo um contexto exclusivamente para isso. Talvez seja a primeira iniciativa no Brasil. De forma provisória, tem o nome Bike Comunidade, é um projeto inovador e pioneiro. De todas as pesquisas que nós fizemos, só consegui achar uma cidade quem tem algo parecido. Nós estamos buscando a iniciativa privada para buscar levar a bicicleta para as comunidades. O conceito é ter um bicicletário público, 100% gratuito, com bicicletas disponíveis não só para você usar 45 minutos, mas sim entre três e quatro horas, para que toda a família possa utilizar.  Esse lugar vai ser todo financiado e vai ser oferecido para comunidades que participem. A comunidade tem que tem uma associação, que fique responsável. Vamos entregar tudo, mas terá que participar e cuidar. Cada casa seria cadastrada e até quatro familiares poderiam usar o sistema. Teria uma minioficina de bicicleta. Até porque há pessoas tão pobres que não têm nem como consertar a própria bicicleta. A ideia é ter um lugar público em que seja possível fazer ajustes na bicicleta. Um formato que a gente está estudando é que a comunidade que cuidar desse local possa inclusive ter sustento com esse espaço instalado. Eu não deveria estar falando disso ainda (risos). Isso vai trazer um benefício muito grande para a cidade como um todo. Fora isso, tem o ponto alto de uma iniciativa como essa que é a questão da integração. Por exemplo, tem uma rádio que costumar bater muito na secretaria porque fizemos uma ciclofaixa em Pernambués, dizendo que não se vê ciclista na região. Não vê porque você fica o dia todo no estúdio e não está vendo ninguém andar de bicicleta. Agora pergunte ao ciclista se quer que tire. Eu sou ciclista e ando de bicicleta mesmo, não é conversa. Os carros já ocupam a cidade 365 dias por ano e quando você abre um espaço é assim. 
 
BN - Mas existem vias que ficam complicadas. A Rua Manoel Barreto, na Graça, é bem estreita e a ciclovia ocupa praticamente metade da rua. A rua teria que se adequar à bicicleta? Não teria que procurar uma rua em que fique melhor? 
 
IE - Eu concordo em parte. O maior problema da Manoel Barreto somos nós. É uma rua em que, antigamente, se estacionavam dos dois lados, o que é um absurdo. Depois se liberou apenas um lado. É uma rua em que, infelizmente, nós usamos em alta velocidade. Então dá muito bem para passar só um carro de vez e ter a ciclofaixa.
 
BN - O que eu vejo é que muitos carros passam em cima da ciclofaixa, por conta do estacionamento...
 
IE - Ali foi uma falha mesmo da Transalvador e Fabrizio Muller [titular da Transalvador] já assumiu isso. É porque faltou conectar com a ciclovia da Vitória, no meio da Graça. Todos aqueles carros do caminho serão retirados. O pessoal fala que nunca viu ninguém subindo a Manoel Barreto, mas não interessa, tem gente descendo e está conectando a um ponto importante da cidade. A grande questão, que foi uma falha operacional deles, era fazer, nos próximos dias, essa conexão. Hoje a ciclovia parece sem sentido porque falta a conexão com a Vitória. Mas o fato é que nós somos muito espaçosos no trânsito. De fato, nós temos a cultura do carro, mas isso não pode fazer com que a gente não crie oportunidade para isso. O ponto mais importante disso é trabalhar para que o motorista e o ciclista convivam, porque é previsto no Código de Trânsito. A prioridade máxima é o pedestre e, depois, o ciclista. Só que a maioria dos motoristas acha que o ciclista não deveria estar ali. Ele tem o direito de estar ali, assim como o carro e, além disso, tem a prioridade. O principal benefício desse programa para a cidade foi que a gente tirou o ciclista da invisibilidade. A gente botou a pauta do ciclista na discussão da cidade. Hoje eu vejo que os motoristas buzinam para mim, antes eles xingavam. Depois da Copa, vamos começar um novo trabalho de conscientização exclusivamente com os motoristas nas garagens de ônibus. Tem que ter o compartilhamento das vias entre o ciclista e o carro. Para isso, o carro tem que dar uma distância de um metro e meio na hora de ultrapassar e o ciclista tem que parar na sinaleira, não andar na contramão e no passeio.
 

 
BN - Após o fim a Copa, como você fica na prefeitura?
 
IE - Eu recebi o convite para cuidar da Copa do Mundo e o escritório cuida também da Olimpíada. No decreto municipal que criou a pasta, diz que cuidará da Olimpíada. Se eu vou ficar ou não, é outra história, mas pode ser que isso aconteça. Depois que a Copa termina, ainda tem uma série de obrigações, porque precisa fechar o projeto como um todo. O mandato no escritório da Copa termina em dezembro. Já começamos  a ter entendimentos com o comitê organizador olímpico de que Salvador será sede da Olimpíada. Estão previstos pelo menos seis jogos de futebol e existe possibilidade de ter algumas coisas a mais, depende muito de alguns projetos que têm acontecido no Rio de Janeiro. Pelo fato de a gente ter empreendido essa medida do uso de bicicletas na cidade, o prefeito diz que, como inventamos isso, vamos cuidar. Mas uma vez que eu saia, isso vai ter continuidade, essas coisas não acabam.
 
BN - Se fosse pela sua vontade, você ficaria?

IE - Não, não sei. Eu sou empresário e recebi esse convite para ajudar o prefeito dentro das minhas possibilidades desse período. Mas falar de futuro é sempre complicado porque não está nas mãos da gente.
 
BN - E a sua relação com a Secopa, do governo estadual?
 
IE - Eu já tinha um relacionamento anterior com o secretário Ney Campello e já fomos colegas de Colégio Militar. Nós somos parceiros e completamente alinhados com relação aos projetos. Lógico que cada um tem seus projetos, mas eu diria que um dos grandes benefícios que fica para o poder público aqui na Bahia é que, pela primeira vez, é possível ver um grupo de pessoas trabalhando paralelamente, cuidando de uma coisa. Não tem um chefe do outro. Tem um órgão municipal sentado com um órgão estadual, com gente do governo federal, da polícia, com o COL [Comitê Organizador Local], da Fifa, todo mundo trabalhando para fazer uma entrega só,  a Copa do Mundo. Eu considero isso um benefício de grande importância, com capital social, importante para a cidade de Salvador. Um das coisas que mais me chamou atenção quando eu cheguei –  e foi avaliado pelo comitê organizador da Fifa – foi a operação de trânsito para a Copa das Confederações, que foi a melhor entre todas as cidades-sede. Isso porque teve um grupo de pessoas se reunindo, nessa troca grande, e é o que vai acontecer agora na Copa do Mundo. Esse trabalho multidisciplinar é um ativo que fica para a cidade. Sobre a Fifa, dizem que tem grandes imperialistas, mas é uma federação com o padrão de organização devido à cultura, porque são suíços, alemães. Falando de planejamento, são precisos e têm exigências para que as coisas aconteçam no cronograma. Porque diferentemente de qualquer projeto, para a Copa do Mundo, não tem como ter atraso, porque milhões de pessoas vão assistir aquilo, a partir de tal hora, a bola vai rolar. Botar a estrutura pública nessa vibe é complicado. 
 
BN - Quantos por cento você avalia que conseguiu fazer?
 
IE - Um ano e poucos meses foi muito pouco. Salvador fez um milagre. Foi muita determinação do prefeito e dos órgãos todos. Nós temos na prefeitura um grupo no WhatsApp para todos os secretários. Enquanto eu converso com vocês, só da minha equipe tem treze mensagens novas. 
 
BN - O prefeito é ativo no WhatsApp?
 
IE - Totalmente. Tem horários em que ele não dorme, porque se chover, acontecem problemas. Eu não costumo desligar o celular. Agora a gente está na fase de resolver problemas. Temos um grupo chamado Pente Fino, onde as pessoas mandam fotos de problemas vistos na cidade. No caso específico da prefeitura, para mim foi frustrante. Gostaria de ter feito muita coisa na área da educação e a gente fez muito pouco. Poderíamos ter feito muito mais na área esportiva. Com a cidade financeiramente melhor, a gente poderia feito além do que a gente precisaria fazer. O projeto estava pronto desde 2009, mas praticamente começou a ser feito em 2013. Em função disso, teve que ter um esforço para entregar a cidade da forma que ela está, muito melhor. Não é ainda o ideal, como a gente gostaria. Ainda assim, está muito melhor do que eu imaginava no início, mas eu gostaria de ter feito mais coisas.
 
BN - Você falou, em um artigo, sobre a marca “Salvador”. Que marca você acha que fica?
 
IE - A tão criticada Fifa, que virou a “Geni” [personagem da música Geni e o Zepelim, composta por Chico Buarque] do Brasil. A Copa do Mundo virou depositária de todos os problemas do país, o que é uma irracionalidade. A gente sempre teve muitos problemas não resolvidos e com a Copa não iríamos jamais resolvê-los em tão pouco tempo. Então não dá para atribuir à Copa do Mundo, muito pelo contrário. O que acontece é que a Fifa, dita como os imperialistas maldosos, tem uma coisa muito interessante que nós nos apropriamos e hoje a cidade já goza de benefícios dessa forma de atuar. É um processo chamado de programa de proteção às marcas, que é muito comum em organizações estruturadas desse porte, onde a marca é um ativo. Recentemente, a Apple e o Google são as marcas mais famosas do mundo. O Itaú a mais valiosa do Brasil e atribui-se à bicicleta grande parte desse valor agregado a ela. É um item simples de mobilidade urbana. Voltando à questão da marca, para um evento como esse acontecer, os patrocinadores precisam ter uma entrega muito eficiente para compensar o dinheiro que pagaram. A cidade tinha um ativo, o Carnaval, que era vendido por certo valor para que os patrocinadores tivessem garantidas as suas exibições de marca no evento, durante determinado período de tempo. Mas isso era uma piada, porque, por exemplo, a Ambev patrocinava o Carnaval, tinham banners espalhados pela cidade, com o pagamento de um valor ridículo, mesmo assim importante para ele como empresa. Em compensação, todas as outras cervejas eram vendidas pelos ambulantes, que vestiam camisa do produto. No fundo, o consumidor nem lembrava quem era o patrocinador do Carnaval. Quando eu entrei na prefeitura, a gente viu que a zona de exclusividade dos patrocinadores que pagaram pelo evento fazia parte do compromisso da cidade-sede. Não dá para ter naquela zona uma ativação de marca de um concorrente. Um evento patrocinado pela Ambev não pode ter Schincariol com o banner naquela zona. Mas isso acontecia no Carnaval de Salvador. Quando a gente viu a forma com que esse programa é feito [pela Fifa], vimos que era uma coisa interessante, que não existia no Carnaval. Isso na verdade é usado no mundo inteiro, na Fórmula 1. A gente via como cliente, não como organizador. Então no dia que a gente teve acesso a essa informação, de que a gente ia estruturar o programa de proteção à marca, eu mostrei ao presidente da Saltur, quando Cláudio Lima ainda era presidente e disse que isso era bacana. Não precisou eu ter terceira reunião com a turma da Saltur e o pessoal sacou logo qual era o valor agregado a isso. Resumindo: no Réveillon, no Rio Vermelho [Yemanjá], já entrou o programa de proteção a marcas feito pelo Município com os órgãos municipais. O que foi arrecadado no Carnaval foi o caso mais emblemático: quatro ou cinco vezes mais. E ainda se conseguiu fazer com dois produtos diferentes. Além dos outros patrocinadores, havia duas cervejarias patrocinando o mesmo evento, em circuitos diferentes. Foi uma guerra lá, porque a Ambev tentou furar esse bloqueio. Dificilmente, qualquer gestor público que venha depois dessa administração, se não fizer isso, vai ser um imbecil. Porque funcionou desde que sejam usados esses princípios. Os patrocinadores ficaram supersatisfeitos, segundo pesquisa feita por Guilherme [Bellintani]. Os números são monstruosos e as marcas acham que valeu a pena pagar por isso. Logicamente, pagou mais caro, mas teve resultado. No modelo anterior, ele pagava achando que ia ter resultado e o Município também não teve porque foi pouco dinheiro. Dificilmente, daqui para frente, seguirá o conceito de que o uso de ativos da cidade não dá para ser vendido por qualquer dinheiro. Tem que pagar caro, porque é o maior evento da cidade, um dos maiores do mundo, tem o valor agregado, tem visibilidade. Então não dá para pagar R$ 3 mil para participar, tem que pagar caro mesmo. A prefeitura não tira dinheiro dos cofres públicos, porque o que tem é para educação e saúde. A gente ajuda a financiar a festa e, nesse ano, ainda sobrou um dinheirinho no cofre da prefeitura. Ou seja, nós nos apropriamos desse benefício e a Copa do Mundo ainda nem começou. Fizemos isso já no Carnaval. 
 
 
BN -  Isso foi impacto da Copa na gestão?
 
IE - Exatamente. Foi um capital intelectual que foi absorvido, não foi um viaduto novo, que não deixa de ser importante. 
 
BN - A medida foi até chamada, à época do Carnaval, de 'padrão Fifa'...
 
IE - Sim. O bar ainda poderia vender Skol dentro do circuito, mas os ambulantes foram cadastrados. Durante a Copa, será a mesma coisa. Vamos cadastrar 100 ambulantes para o Fan Fest. Eles terão farda e isopor para vender os produtos. A maioria das cidades-sede não tem isso porque é proibido. Aqui nós brigamos para ter. Esse know-how a gente já absorveu, já começou a usar e começou a ter resultado antes da Copa vir. Eu considero que será uma burrice tremenda que o próximo gestor que assumir o município não continue fazendo isso. O torcedor que vem ver a Alemanha jogar, ele viria de qualquer jeito, poderia ser na Cochinchina. Ele não sabe exatamente o que é o Brasil. Sabe o que é o Rio de Janeiro e o Nordeste nem sabe que existe. Mas ele vem acompanhar a seleção da Alemanha. Virão cinco mil holandeses que nós vamos ajudar a interagir com o público baiano. Se essa turma tiver uma experiência bem sucedida aqui, irá voltar. O que está atrás dessa turma também são as corporações e empresas. Então se Salvador estiver melhor, mais organizada, com acordos de marcas cumpridos, verá que é um ambiente legal para fazer negócio. E pode ser um lugar interessante para fazer evento, porque está organizado. Com tudo isso, a gente começa a atrair outras iniciativas, seja para a parte do entretenimento ou, para os servidores públicos, fica o aprendizado. Quando você sai de uma empresa, o que você aprendeu leva consigo. Uma cidade como Salvador dificilmente será a mesma depois de um evento como esse. Logicamente que há todo um contexto de mau humor relacionado à Copa do Mundo, com toda a indignação que a gente tem com um monte de coisas que o Brasil precisa.
 
BN - O senhor acha que o tom dos protestos deste ano vai ser igual ao da Copa das Confederações ou mais fraco? Qual a sua aposta?
 
IE -  Eu não consideraria se vai ser mais forte ou mais fraco. Eu vou dar um exemplo clássico disso. Eu tenho três filhas: uma de 23, uma de 20 e uma de 9. Às duas primeiras, eu disse que não iriam para as manifestações.  Foram três horas de “lero”, eu ouvindo as duas me dando lição de moral. “Você está nos impedindo de uma coisa que você sempre nos ensinou: pensar com a minha própria cabeça”. Então, nós negociamos. “Olha, vai ter quebra-quebra, vá pelos cantinhos e tal”. Elas foram mobilizadas por aquele contexto. Duvido que elas participem esse ano. Os jovens foram motivados a fazer aquilo ali. Teve aquele pequeno grupo de gente que foi para sacanear. Se vai ser mais violento ou não, depende dessa sacanagem. Aquela turma que foi para o Iguatemi foi outra, pararam, mas não quebraram nada. Já a turma que estava na Avenida Joana Angélica, em frente ao nosso escritório, foi gente que espatifou. 
 
BN - Mas também porque na Avenida Joana Angélica teve o bloqueio da Fifa...
 
IE - Nos Barris também teve, mas é isso que eu estou dizendo. Imagine que você quer entrar em um lugar que é perímetro de segurança, é lógico que vai ter conflito. Então se você foi para lá,foi para o conflito. Quem veio para cá [Iguatemi] foi por outras razões. É lógico que tem muitos interesses dentro do próprio governo federal, tem os sindicatos que são cooptados para isso. Por mais que o governo federal seja ligado ao PT, tem racha dentro, tem gente querendo desestabilizar a prefeitura por alguma razão. Nesse caso foi mesmo muito ligado ao governo federal. Então vai depender da valorização desses grupos.  Tem gente que diz que se o Brasil ganhar a Copa vai ser bom para a Dilma e acho isso uma bobagem. Eu não sou político, sou empresário. Tenho meus relacionamentos, mas não tenho partido, não sou contra nem a favor do PT. Mas é uma imbecilidade achar que se o Brasil ganhar Dilma será eleita. Até porque nós estamos em junho, a Copa termina em julho, ainda vai demorar um tempinho para novembro. Ainda sou capaz de dizer que, se fosse à boca da eleição, três dias antes da votação, talvez influenciasse um pouco, mas acho que ganhando ou perdendo, não é isso que vai definir a situação eleitoral da presidente Dilma. Acho que a gente tem que ganhar a Copa do Mundo mesmo, torço para que o Brasil ganhe. Eu vou torcer para que esse tipo de coisa, se tiver que acontecer, seja pacífica. Não estou sentindo aquele clamor da Copa das Confederações. De acordo com as informações que a gente troca com os órgãos, eles também não sentem isso. Existem os movimentos que eles estão monitorando. Mas eu torço para que isso não estrague uma festa que a gente queria tanto que acontecesse no Brasil. Acho que tem que fazer mesmo [manifestação], com a indignação que nós temos com uma série de coisas.