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O poder da palavra ‘golpe’

Por Francisco Viana

O poder da palavra ‘golpe’
Foto: Acervo pessoal

Lula foi condenado no último dia 24 e não houve grandes protestos por parte da população, mas uma coisa é certa: eleições sem Lula não valem.

 

Além de liderar as pesquisas de intenção de voto, ele é uma liderança de expressão internacional ou, como disse Bono Vox, vocalista da influente banda U2, em vídeo no Youtube, “um tesouro global”.

 

Eleição sem Lula é golpe, repete a oposição. Essa palavrinha “golpe” é mais poderosa do que a vã filosofia possa imaginar. Repetida várias vezes, soa como uma figura de retórica que pode ser definida como um anacenose, ou seja,  soa como um apelo à indignação, deixa claro o quanto é intenso o perigo golpista. Historicamente a anacenose foi o famoso recurso retórico utilizado por Churchill (“sangue, suor e lágrimas”) para mobilizar a Inglaterra contra os nazistas. Churchill, por sua vez, foi buscar inspiração em Cícero (44 a.C.), Tito Lívio (29 a.C.), John Donne (1611), Lord Byron (1823) e Theodore Roosevelt (1897). Deu certo. Os ingleses lutaram até a vitória.

 

“Golpe” para os leigos e amadores pode parecer uma ingenuidade radical ou, como diria Lenin, uma “doença infantil” do radicalismo. Não é. Encarna a memória da ausência de democracia no Brasil que se materializou com o golpe militar-civil de 1964. É um recurso de comunicação muito vigoroso que desperta emoção e leva as pessoas a acreditar que há um golpe em marcha.

 

Assim, é que a eleição sem Lula passará a ser vista e percebida, tanto nacional como internacionalmente. À anacenose se soma uma outra figura de retórica a anáfora, que é a repetição em sentenças sucessivas da ameaça às elites e seu anacronismo.

 

Consequentemente, é importante que se veja que a comunicação do PT está longe de ser o]ingênua, radical ou amadora. É sim, sofisticada e tem objetivos. O problema está na estratégia eleitoral petista. Será uma frente de esquerda? Será uma frente ampla incluindo as forças liberais? Incluirá algum tipo de autocrítica?

 

A tradição brasileira ensina que quando os liberais são deixados de lado as coisas caminham em terreno pantanoso e não dão certo. Basta ver o que aconteceu com o presidente constitucional João Goulart. Agora com o Brasil nas mãos dos conservadores – designação elegante que é sinônimo de direita –, seria saudável para a democracia se Lula disputasse a presidência. Isso porque seu julgamento deve transbordar do terreno jurídico para o terreno político. Sua reputação junto aos mais pobre, como a de Getúlio Vargas, tem razões para existir.

 

O que acontecerá se ele ficar de fora do pleito? Certamente, haverá grande frustração popular. Há risco de uma guerra civil? É cedo para dizer, como é cedo para prever como o eleitor de Lula reagirá. Porém, um fato parece certo: sem Lula as futuras eleições não terão graça ou no mínimo soarão como se fosse um golpe.

 

* Francisco Viana é jornalista e doutor em Filosofia Política (PUC-São Paulo)

 

* Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias