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A impenhorabilidade dos bens das micro e pequenas empresas

Por Felipe Vieira Batista

A impenhorabilidade dos bens das micro e pequenas empresas
Foto: Acervo pessoal
O art. 833, caput, V, do CPC estabelece a impenhorabilidade dos seguintes bens: “os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício da profissão do executado”. O dispositivo funciona como verdadeiro mecanismo de preservação da atividade profissional, instituindo em favor do profissional liberal uma blindagem de patrimônio em relação aos bens indispensáveis ao desempenho de sua atividade.

A citada salvaguarda tem fundamento na própria ideia de dignidade humana: parte-se da premissa de que a eventual interrupção da atividade profissional representa cerceamento dos próprios meios de que o executado dispõe para solver adequadamente seus débitos e manter uma existência digna.

A leitura do art. 179, da Constituição Federal, por sua vez, revela que se deve conferir às micro e pequenas empresas tratamento jurídico diferenciado voltado a incentivá-las, o que, de igual modo, tem fundamento na noção de que a atividade incentivada promove a existência digna.

Em um primeiro momento, as decisões do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça caminhavam para a conclusão de que a impenhorabilidade acima referida tinha por beneficiárias as pessoas físicas, excluindo-se, pois, as pessoas jurídicas (ainda que fossem micro ou pequenas empresas). No entanto, a percepção de que grande parte da atividade profissional é exercida por meio de micro e pequenas empresas fez com que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça avançasse em prol de tais sociedades; isto é, a impenhorabilidade foi estendida a tais pessoas jurídicas, restringindo-se a blindagem, contudo, aos bens necessários ao exercício de atividade profissional pelo próprio sócio. Ou seja, foram abarcadas pela proteção as micro e pequenas empresas em que o sócio exercesse a atividade pessoalmente.

Contudo, a proteção acabou sendo banalizada na jurisprudência, chegando-se ao ponto de admitir pontualmente a impenhorabilidade de todo e qualquer bem que se mostrasse indispensável à atividade empresarial (STJ, Segunda Turma, AgRG no Ag 1.396.308/RS, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 01/06/2011), o que,  de certo modo, dificultou a cobrança de dívidas e incentivou a inadimplência.

Já no recente julgamento do REsp 1.224.774/MG, ocorrido em 10 de novembro de 2016, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (última instância em matéria de interpretação de Lei Federal) tratou novamente do tema. Na oportunidade, historiou toda a controvérsia existente a respeito da matéria e reestabeleceu/reavivou a conclusão de que a impenhorabilidade do art. 833, V, do Código de Processo se estende apenas às micro e pequenas empresas, abarcando, porém, apenas os bens móveis indispensáveis ao exercício pessoal de atividade pelo sócio.

A postura merece aplausos.

Ao prestigiar o citado entendimento, o Superior Tribunal de Justiça trouxe o incentivo/proteção adicional ao pequeno empreendedor (o que encontra evidente amparo no art. 179, da Constituição), ao passo que, numa segunda vertente, não estendeu a benesse a ponto de incentivar a inadimplência.

Por outro lado, a leitura do Acórdão revela que a Corte se preocupou em ser coerente com o que vinha sendo decidido sobre a matéria; vale dizer, o Colegiado expôs todo o histórico jurisprudencial a respeito do tema para só depois acenar com a impertinência de determinados entendimentos isolados e delinear o caminho a ser seguido.


*Felipe Vieira Batista é advogado, sócio do Joau Bastos Lopes Advogados Associados,especialista em Direito Processual Civil pela Faculdade Baiana de Direito (2012) e mestrando em Direito Público (Processual Civil) pela Universidade Federal da Bahia - UFBA

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