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Mãe Stella, a Bahia te reconhece

Por Vera Lúcia Barbosa

Mãe Stella, a Bahia te reconhece
Foto: Divulgação
No último dia 14, cumprindo mais uma agenda do mês de agosto, o já consagrado Agosto da Igualdade, participei, na Assembleia Legislativa, da Sessão Solene proposta pelo deputado Marcelino Galo para a entrega da Comenda 2 de Julho à Senhora Mãe Stella de Oxossi.  Encontrei um plenário repleto de pessoas que prezam e respeitam a cultura do povo do nosso Estado, que é plural na sua diversidade e, por isso, deve ser exemplo para o Brasil em lições de respeito, convivência e apreço.

Ao ser chamada pelo governador Rui Costa para representá-lo naquela Sessão tão especial, fui tomada pelo sentimento de alegria e ao mesmo tempo percebi o peso da responsabilidade de participar de um momento tão nobre. Mas lembrei logo que sou da terra, da terra mais profunda, da qual nunca fui dona, mas uma simples filha, aprendendo a respeitá-la sempre como a nossa mãe. Este ensinamento veio na vida militante do movimento das trabalhadoras rurais e sem terra. E aí, vi logo uma aproximação com Mãe Stella de Oxossi, com a cidadã do mundo Maria Stella de Azevedo Santos, religiosa do Candomblé, mulher que respeita a terra e a natureza.

Porque o Candomblé é feito de terra, de água, de folha, dos elementos mais essenciais da natureza, segundo informações repassadas pelos mais velhos, algo também percebido na liturgia do povo de santo. Estive recentemente, numa quarta-feira, no Ilê Axé Opô Afonjá, dia em que é servido o Amalá de Xangô, a comida sagrada dividida com as pessoas, e fui conhecer o museu mantido por Mãe Stella de Oxossi. Nessa visita, mais uma vez vi os elementos da roça, do interior, dos ribeirinhos, das comunidades tradicionais, vi as ferramentas, comumente utilizadas pelo nosso povo trabalhador rural. Vi as sementes e ervas usadas na cura e na alimentação, e me senti novamente em casa.

Vi no Museu Afro do Opô Afonjá, muitas razões para a missão da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial do Estado da Bahia (Sepromi), que tanto tem ainda por fazer, apesar do muito trabalho feito, para melhorar a vida das comunidades tradicionais e combater o racismo e a intolerância religiosa que ainda paira em nossas instituições.

Na histórica Sessão Solene que aconteceu em plena Década Internacional Afrodescendente, diversas autoridades, reunidas com o povo da Bahia, reverenciaram a nossa querida sacerdotisa.

Sem coincidência alguma, foi numa sexta-feira dedicada a Oxalá. Justa homenagem a uma mulher negra, enfermeira formada na Escola de Enfermagem e Saúde Pública, que durante trinta anos visitou lares e pessoas doentes. Mãe Stella é, também, uma intelectual que participou de conferências mundiais para falar da tradição dos orixás e trouxe novas ideias sobre o sincretismo religioso.

Abraçamos aquela que recebeu, ainda, o título de "Doutora Honoris Causa", concedido em 2009 na Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Todos e todas pediram a bênção à mulher de Candomblé que em 2013, também foi eleita para a Academia de Letras da Bahia, com dezenas de livros publicados, artigos semanais no Jornal A Tarde e premiada pelo Jornal Estado de São Paulo.

Senhora Mãe Stella, a Bahia te agradece. Em seu nome, agradece a todas as Mães, Iyalorixás e mulheres do Candomblé que fizeram de suas mãos, oração; de suas palavras, orientações; que fizeram de suas vidas, templos; que fizeram de seus templos, lugar de acolhimento, posto que, são os terreiros de Candomblé, sobretudo, lugares de inclusão e convivência entre mães, pais, filhas e filhos.

Nós do Governo da Bahia, tanto entendemos assim que o governador Rui Costa se reuniu, recentemente, com lideranças religiosas para tratar da violência, ouvindo com respeito as lideranças ali presentes, numa reunião do programa Pacto pela Vida, considerando e levando em conta as suas contribuições para juntos construirmos uma sociedade mais justa, menos desigual e mais fraterna. Sabemos que o Estado vem tentando fazer a sua parte na democratização do acesso às políticas públicas. Com o conjunto da sociedade, diante da credibilidade de diversas das suas lideranças, estimularemos a prática do respeito e da solidariedade, não haverá ambiente fértil para apelos espúrios e absurdos como, por exemplo, a proposta de redução da maioridade penal. No lugar de mais prisões deve haver mais salas de aulas, mais cinemas e teatros, mais praças de esportes, melhor saúde e muito amor nos corações, como bem ensina Mãe Stella.

Nesta Década Afrodescendente, cujos pilares são "reconhecimento, justiça e desenvolvimento", nada mais oportuno que reconhecer o trabalho social que a Senhora Mãe Stella realiza no Terreiro do Ilê Axé Opó Afonjá, localizado no bairro popular de São Gonçalo do Retiro. Além do Museu Afro, que funciona todos os dias, lá são realizadas oficinas para a produção de pano da costa, artesanato de ferro, com práticas de metalurgia. A comunidade também dispõe de uma biblioteca no local e, ousando na sua ação educadora, Mãe Stella criou mais um espaço de incentivo à leitura, este itinerante, que desde o ano passado percorre os bairros da cidade incentivando a leitura. Há muitos anos, também funciona na área do Opô Afonjá, a Escola Municipal Eugênia Ana dos Santos, que tem esse nome em homenagem a Mãe Aninha, primeira Iyalorixá do espaço religioso.

Mãe Aninha profetizava que chegaria o dia em que os homens de anéis bateriam a cabeça para Xangô. Ela se referia aos novos doutores, filhos e filhas de santo que deveriam estudar e ter uma formatura. Pois bem, a escola que leva o seu nome e que funciona dentro do Ilê Axé Opô Afonjá, forma duzentos e oitenta estudantes na comunidade. São doutores de Mãe Aninha, são os doutores de Mãe Stella, são da raiz de Mãe Senhora.  

Assim seguimos no reconhecimento ao esforço civilizatório do povo de santo na construção da Bahia e do Brasil, na afirmação da nossa africanidade enquanto um dos elementos da nossa formação. Buscando a justiça e o desenvolvimento pretendidos e merecidos, nos pautando pela agenda positiva oferecida por parte do movimento negro brasileiro, tudo no esforço para reduzir as desigualdades e sermos uma pátria mais acolhedora. É o trabalho de construção de uma sociedade que respeite as diferenças religiosas, as questões raciais e individualidades, agregando diversas frentes, pensamentos e lideranças. Parabéns Senhora Maria Stella de Azevedo dos Santos. Vida longa à nossa Mãe Stella de Oxóssi. 


* Vera Lúcia Barbosa é secretária de Promoção da Igualdade Racial do Estado da Bahia

* Os artigos reproduzidos neste espaço não representam, necessariamente, a opinião do Bahia Notícias.